segunda-feira, 17 de junho de 2024

COIMBRA A NÃO GOSTAR DE SI MESMA

 


Na semana passada passaram 300 anos sobre o nascimento, em Coimbra, de Carlos Seixas. É quase certo que muitos conimbricenses que não tenham um gosto ou interesse pessoal pela área de actividade em que se distinguiu Carlos Seixas não tenham dado pela efeméride. E, no entanto, Carlos Seixas é considerado um dos maiores compositores portugueses de música erudita, dentro do género Barroco, aquele que se praticava durante a época em que viveu, isto é, o sec. XVIII. Além de um compositor excepcional que criou um estilo próprio, foi também um executante virtuoso no órgão e no cravo, razão por que muito novo foi para Lisboa onde foi organista da Sé Patriarcal e da Capela Real. Mas nem por isso se deu conta na nossa Cidade de qualquer actividade cultural refente a Carlos Seixas e à sua obra. Vá lá que, por enquanto, há uma rua com alguma dimensão que leva o seu nome, mas provavelmente a maioria dos seus moradores não será capaz de dar qualquer informação sobre quem foi Carlos Seixas. E nem sequer é da sua responsabilidade que tal suceda. Se as instituições educativas e as elites e responsáveis culturais não se preocupam com a divulgação e promoção do que de excelente tem a nossa História, quem o fará?

Será uma característica da nossa Cidade: toda a gente refere genericamente gostar muito da Cidade, considerando-a mesmo superior a muitas outras que trata até com um certo desdém. Mas costuma dizer-se que o diabo está sempre nos detalhes e é aí no concreto da realidade que a coisa fica diferente. Esquecemo-nos frequentemente de cuidar de nós e do que é nosso, que tantas vezes não fica a dever nada ao que trazemos de fora, que consideramos superior só porque vem de Lisboa ou do Porto, curvando-nos muitas vezes a outros interesses que tantas vezes nos são desfavoráveis. E demasiadas vezes atacamos mesmo quem por cá tenta fazer o melhor, apenas por motivos políticos partidários ou mesmo invejas pessoais.

No passado dia 10 de Junho comemorou-se, como é habitual, o chamado “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas”.

Como este ano passam 500 anos sobre o nascimento de Luís de Camões e temos comemorações da efeméride durante dois anos, que não podemos fazer a coisa por menos, pelos vistos temos mesmo necessidade de prolongar comemorações. E ainda bem já que, enquanto celebramos datas do passado, nos esquecemos do resto o mesmo é dizer da realidade presente.


E as comemorações dos 500 anos de Camões tiveram início em Coimbra com cerimónias na Universidade, incluindo sessão solene com presença do Presidente da República e concerto musical nos Gerais, com direito a transmissões televisivas em directo. Só que, mais uma vez, o espectáculo musical, programado e realizado em Coimbra, não contemplou a Orquestra Clássica do Centro, que é da nossa Cidade e da qual tem todas as razões para se orgulhar, pela sua excelência. Por isso mesmo a devia apresentar sempre que possível, mas, antes pelo contrário, de novo se contrataram outros músicos para a performance. Temos mesmo complexos estranhos que nos impedem de ver o melhor que temos.

De novo, e lamentavelmente, Coimbra a não gostar de si própria. Quando é que mudaremos de destino?

Publicado no Diário de Coimbra em 17 de Junho de 2024

Imagens recolhidas na internet

Sem comentários: