segunda-feira, 3 de junho de 2024

POPULISMOS

 


Há poucos dias a campanha eleitoral em curso para o Parlamento Europeu produziu mais uma das muitas afirmações populistas em que tem sido pródiga. Alguns dos partidos concorrentes, já nem sei quais, mas da esquerda e da direita, propuseram um ordenado mínimo igual para todos os países da União. Não sei mesmo se os proponentes se apercebem do que estão a propor, acredito que não, estão apenas a competir para conquistar o primeiro lugar num patético campeonato de populismo. Na realidade, atingir um tal desiderato só seria possível com um extremo aprofundamento da integração económica e financeira na direção do federalismo europeu, algo que estará certamente nos antípodas da vontade dos seus proponentes. Acresce que, se em Portugal o ordenado mínimo anda por pouco mais de 800 euros, países europeus há em que o seu valor é superior a 2.400 euros. Como nenhum país iria aceitar diminuir o valor do seu ordenado mínimo, para ser comum em toda a União esse seria também o valor em Portugal, país em que o ordenado médio anda pelos 1.310 euros. Fácil se torna verificar a tontice da proposta, mas a verdade é que foi feita.

O populismo não é um fenómeno dos dias de hoje, mas parece ter ganhado asas, talvez com a actual facilidade de comunicação proporcionada pelos novos meios cibernéticos.

O populismo é partilhado pela esquerda e pela direita, havendo sinais da sua prática por todos os partidos, mas constitui a própria base do discurso em partidos localizados nos extremos do leque político. As consequências da governação populista são bem conhecidas. Desde meados do sec. XX que as américas central e do sul se tornaram em exemplos dos resultados do populismo levado à governação, alternando mesmo entre líderes populistas de esquerda e direita. Os resultados são facilmente visíveis, sendo paradigmático o exemplo da Argentina, um dos cinco países mais ricos do mundo há cem anos, mas que vegeta hoje numa penúria triste e desconsolada como resultado de políticas populistas, no caso chamadas justicialistas.


Há cem anos, os outros partidos dos extremos eram os partidos “revolucionários” que adoptavam uma filosofia abrangente que tudo explicava e que proporcionaria uma solução global e “justa” para os problemas da sociedade, hoje praticamente desaparecidos. Os de direita incluindo nazi e fascistas, foram derrotados numa trágica guerra mundial. Os de esquerda subsistiram à sombra do império russo/soviético e os que resistiram ao desaparecimento da URSS tiveram que se “democratizar” integrando-se naquilo a que chamavam “democracia burguesa” e sujeitando-se às suas regras. É o caso do “nosso” partido Comunista que se viu obrigado a abandonar a conquista do poder pela via revolucionária, sendo hoje um partido perfeitamente integrado no sistema democrático.

Mas o populismo continua bem vivo, como vemos nesta campanha eleitoral. Como o termo “fascista” ficou desgastado ao longo dos anos pela sua utilização abusiva pela esquerda sobre tudo o que fosse de direita, o partido actualmente mais à direita, o Chega, é normalmente classificado como sendo da “direita populista”. E o facto é que este partido, que conquistou 50 lugares na Assembleia da República, é inteiramente populista, não se lhe conhecendo qualquer ideologia política nem respostas concretas para os problemas nacionais. Embora não devamos esquecer que, para pagar o acréscimo de despesa pública que propõe, não se tenha lembrado de outra solução senão que taxar as grandes empresas, incluindo a banca, pelos seus “lucros excessivos”. Curiosamente, ou talvez não, exactamente a solução preferida pelo Bloco de Esquerda para os mesmos problemas. Como se costuma dizer, os extremos tocam-se e não é raro que o façam! Até no uso mais descarado de um populismo sem limites. O que me parece deveria ser um critério básico de rejeição de qualquer partido, pela falta de respeito que mostra pelos eleitores.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 3 de Junho de 2024

Imagens retiradas da internet

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