Viver numa cidade tem claras vantagens relativamente a fazê-lo numa povoação de pequena dimensão, dada a existência de uma rede de infraestruturas importante. As cidades oferecem ainda uma variedade de serviços cuja existência próxima facilita a vida dos seus habitantes, para além de proporcionarem mais e melhor emprego.
Coimbra pode bem servir de exemplo prático para esta afirmação. Ultimamente tem vindo para o espaço público o conceito de “cidade de 15 minutos” como um ideal alcançável. E possível. Basicamente trata-se de um conceito de ambiente urbano em que todas as necessidades diárias dos residentes possam ser respondidas a uma curta distância a pé ou de bicicleta. O que nos remete para a mobilidade urbana, a pé, de bicicleta e os outros modos, públicos e privados.
Quanto às deslocações a pé, muito há a dizer do que se passa na nossa cidade. Pois que não se pode pretender fomentar o andar a pé na rua sem se garantir as necessárias condições de conforto e segurança já que, em termos rodoviários, os peões são utilizadores vulneráveis.
Os passeios devem, em primeiro lugar, ter os pavimentos em bom estado e serem dotados de um revestimento uniforme. Se a chamada “calçadinha à portuguesa” é atrativa e muitas vezes uma obra de arte, só o é quando tem desenhos a duas cores e não quando é apenas executada com pedras de calcário; neste caso, na maior parte das vezes é mais adequado e eficiente encontrar outras alternativas de pavimento, mais resistente e confortável. Por outro lado, a largura dos passeios deve permitir, não só a passagem de peões nos dois sentidos, como ter espaço para a passagem de carrinhos de bébé e mesmo cadeiras de rodas, isto é, deve ser inclusiva. Se estas características são exigíveis em passeios novos, nos antigos há que estudar bem a colocação de árvores, mas também de postes de iluminação e mesmo de sinais de trânsito. Tudo isto exige um trabalho permanente de adaptação dos passeios de acordo com estas exigências, para além da reparação pontual dos pisos.
Mas andar a pé na cidade obriga necessariamente a situações de conflito com outros meios de transporte. É o caso das passagens para peões, onde tantas vezes se verificam acidentes graves em que a vítima é sempre o peão. Por esse motivo devem ser bem localizadas e estar em perfeitas condições de visibilidade e com sinalização adequada.
Há casos especiais de passagens para peões que merecem também um tratamento especial. As passagens para peões localizadas junto das escolas devem ter iluminação própria e adequada, para além de ser considerada a sua dotação de sinalização luminosa (semáforos) que deverão ter ainda alerta de velocidade instantânea excessiva. Não será preciso identificar aqui quais os locais onde esta actuação deverá ter lugar, já indo atrasada muitos anos. Nesta situação estão igualmente instalações de saúde, onde a colocação destes sistemas é urgente, como é o caso do novo Centro de Saúde da Av. Fernão de Magalhães. Ultimamente decorre uma acção de adaptação de passagens de peões às normas de inclinação máxima e substituição de pavimento por outro adaptado a invisuais, o que se saúda. Mas é preciso muito mais e, essencialmente, de forma sistemática. O estacionamento na via pública, ainda que represente alguma receita, não pode ser autorizado se não deixar qualquer espaço para os peões como sucede na Rua Martins de Carvalho por trás do Mercado D. Pedro V numa situação diária perfeitamente vergonhosa, com os peões a protegerem-se com dificuldade entre os carros estacionados.
Penso não restarem dúvidas sobre quem deve ser mais protegido na via pública, que são os peões, embora seja evidente que, na prática, são os veículos automóveis os mais favorecidos pelas entidades responsáveis, basta ver o que se gasta nos pavimentos nas ruas e comparar com os passeios. Seja a cidade ou não “de 15 minutos”, muita coisa tem de ser alterada para dar aos peões o lugar que lhes é devido na via pública
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 3 de Março de 2025