domingo, 24 de outubro de 2010

Evangelho do dia

Evangelho segundo S. Lucas 18,9-14.

Disse também a seguinte parábola, a respeito de alguns que confiavam muito em si mesmos, tendo-se por justos e desprezando os demais: «Dois homens subiram ao templo para orar: um era fariseu e o outro, cobrador de impostos. O fariseu, de pé, fazia interiormente esta oração: 'Ó Deus, dou-te graças por não ser como o resto dos homens, que são ladrões, injustos, adúlteros; nem como este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de tudo quanto possuo.' O cobrador de impostos, mantendo-se à distância, nem sequer ousava levantar os olhos ao céu; mas batia no peito, dizendo: 'Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador.' Digo-vos: Este voltou justificado para sua casa, e o outro não. Porque todo aquele que se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado.»

sábado, 23 de outubro de 2010

A explicação que faltava

"Relação com Sócrates é de absoluta normalidade"

(Cavaco Silva ao Expresso)

Ouçam quem sabe

"O principal de um grande líder é formar líderes melhores do que ele próprio"

Belmiro de Azevedo

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

TEMPOS DIFÍCEIS


Não são fáceis os tempos que atravessamos e os que se aproximam não parecem vir trazer mais facilidades, como se pode inferir de tudo o que “vemos, ouvimos e lemos”.
A discussão política tem vindo a ser muito centrada em volta do orçamento de Estado para o próximo ano, por uma razão muito simples. As finanças públicas estão a um nível próximo da hecatombe que se chama bancarrota. De acordo com os observadores externos, as medidas duríssimas em termos de impostos que aí vêm vão implicar uma recessão económica no próximo ano ou muito perto disso, quer por via do desinvestimento, quer por via da descida abrupta do consumo interno (et pour cause…).
Temos dois problemas muito graves: o primeiro está agora à vista de toda a gente e consiste num Estado com uma despesa desmesurada que tem que ser alimentada com impostos. O outro é o estado da Economia que será gravíssimo, embora não haja ainda uma noção clara do que se passa. De facto, o critério que foi adoptado internacionalmente para medir o crescimento económico dos países é o do Produto Interno Bruto porque permite obter medições fáceis de comparar. De acordo com muitos especialistas, o país está a viver uns dez por cento acima das suas possibilidades, tendo em conta precisamente critérios de produtividade associados ao PIB. Desconfio, no entanto, que a situação seja muito mais grave. Na medição do PIB entram bens tangíveis e bens não tangíveis. Ora bem, o que verdadeiramente interessa em termos económicos, é aquilo que se faz e que pode ser vendido, nomeadamente exportado. E aí, o nosso défice deverá ser muito mais elevado, talvez três vezes maior do que aquele que acima indiquei. Desde pelo menos a década de 90 que a Economia portuguesa, aquela que origina produtos vendáveis em concorrência, tem vindo a ser erodida. O que se passou na agricultura e nas pescas está à vista de todos. Mas também boa parte da indústria tem vindo a sofrer com as políticas seguidas pelos governantes. Quer isto dizer que as medidas de arrefecimento do nível de vida vão continuar e ainda acentuar-se, se queremos recuperar competitividade e voltar a convergir com a média europeia, o que é crucial para nos podermos manter no clube de ricos que é a União Europeia com o seu Euro fortíssimo.
Há noções que temos que ter bem conscientes, quer ao nível de despesas nacionais, quer locais. A loucura despesista que nos assolou a todos nas últimas décadas tem de ser contida. A nível nacional já todos percebemos os disparates das SCUTS, dos novos e menos novos aeroportos (como o do Porto), dos TGV’s, dos estádios vazios de assistentes, das auto-estradas ao lado umas das outras, dos centros culturais faraónicos, das sedes ceaucesquianas de bancos do Estado, dos moinhos de vento pagos pelas nossas facturas de electricidade, etc. etc. etc.
Mas a nível local também não é mais possível pretender que cada povoação tenha o seu pavilhão coberto como eu costumo dizer. Nem se compreende que uma Universidade tenha edifícios inteiros às moscas e continue a querer meter o Rossio na Betesga como a futura (?) biblioteca da Faculdade de Direito, bem como aquela colina inteira do pólo III junto aos HUC. Peço desculpa a quem não gosta, mas alguém tem que dizer que “o rei vai nu”.
Esta crise vai tocar a todos. Este é o tempo de por os pés no chão, repensar tudo e decidir onde melhor gastar o dinheiro dos impostos. Não nos esqueçamos fundamentalmente, que o Estado aos seus diversos níveis existe para as pessoas e não o contrário, porque se trata do Bem Comum. Que todos tenhamos consciência disso e saibamos contribuir ao nosso nível para a mudança necessária e urgente.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 18 de Outubro de 2010

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

PREFERIR ORIGINAIS


Nos últimos tempos surgiram em Portugal notícias sobre a descoberta de fraudes de pinturas de pintores conhecidos cujas obras atingem elevados valores no mercado. Embora seja relativamente frequente, a falsificação de quadros não deixa de ser surpreendente. Os compradores são normalmente pessoas com grande poder económico e supostamente com suficientes conhecimentos técnicos que lhes deveriam permitir evitar serem enganados de forma por vezes grosseira. Mas o desejo de possuir originais valiosos é tão grande que cega muitas vezes.
Já noutra forma de arte, a música, os originais são as obras tocadas ao vivo. De facto, as gravações, ainda que ouvidas com os melhores aparelhos reprodutores de som não passam disso mesmo: reproduções de originais. As obras musicais tocadas ao vivo nunca se repetem em absoluto, pelo que esses espectáculos são sempre uma experiência nova. Isto é válido para diversos tipos de música. Há poucos dias tivemos o exemplo da vinda dos U2 a Coimbra. Todas aquelas dezenas de milhares de pessoas que se deslocaram a Coimbra para os ouvir e ver ao vivo têm as gravações das suas músicas em casa, nos carros e nos aparelhos de MP3. Mas o entusiasmo pelo original é tão grande que motivou aquela festa gigantesca. Acresce que a música dos U2, sendo em si mesma algo limitada em termos harmónicos e melodiosos como toda a música rock e pop, é acompanhada nos concertos por toda uma parafernália tecnológica que entusiasma vivamente os assistentes, o que é impossível de suceder na audição da música gravada.
Os apreciadores de Jazz, cuja característica principal é o improviso, sabem bem que ouvir um CD nunca substituirá uma sessão ao vivo. Os festivais de Jazz atraem sempre milhares de fans em todo o mundo que não perdem a oportunidade de ir ouvir presencialmente os seus músicos preferidos e sentir toda a emoção da música a ser construída à sua frente.
Na chamada música clássica passa-se algo semelhante. Não há dois maestros que interpretem a mesma obra de maneira rigorosamente igual. Para além das partituras permitirem sempre alguma margem de interpretação, a sensibilidade pessoal dos maestros, a sonoridade própria das diferentes orquestras e as diferentes combinações de programas permitem obter sensações diferentes de cada vez que se vai a um concerto, que se torna assim uma experiência irrepetível. O hábito de ouvir gravações, possibilidade tecnológica que tem evoluído de forma impressionante, veio alterar os comportamentos dos públicos dos concertos de música clássica, nem sempre para melhor. À audição dos diferentes andamentos segue-se agora um silêncio quase litúrgico, mesmo em peças que literalmente pedem aplausos nessas alturas. Mas hoje em dia batem-se palmas de maneira muito circunspecta apenas no final das peças, olhando-se mesmo de lado para os assistentes que, entusiasmados pela música que ouviram nos diversos andamentos, são automaticamente levados a aplaudir os músicos que, esses sim, ficam bem satisfeitos quando percebem que o público gostou mesmo do que ouviu.
Outra originalidade bem curiosa, mas na realidade sem graça nenhuma, passou-se no último “dia mundial da música”, entre nós. Segundo uma notícia deste mesmo jornal de 2 de Outubro último, “nas principais comemorações do dia Mundial da Música no distrito de Coimbra que decorreram ontem, no mosteiro de Lorvão, não houve música”. Pelo resto da notícia, percebe-se que houve mais uma promessa de reabilitação futura do órgão de tubos daquele Mosteiro. Não está mal. Bem podem esforçar-se os elementos da Orquestra Clássica do Centro a fazer chegar a música de qualidade a todo o lado e a toda a gente, que as comemorações oficiais do Dia Mundial da Música se fazem “a dar música”, como se costuma dizer: mais uma originalidade dos nossos tempos e da nossa região.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 11 de Outubro de 2010

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

REPÚBLICA


Os acontecimentos que de alguma forma alteraram o rumo da nossa História devem ser recordados ou mesmo comemorados quando essa alteração se veio a revelar benéfica. Faz amanhã cem anos que foi implantada a República em Portugal. Data importante, porque marcou uma viragem na nossa História.
A Monarquia que, de tantos séculos de existência se havia entranhado na História de Portugal tinha claramente envelhecido no início do Séc-XX, do que é prova toda a História do Séc- XIX português. Curiosamente, foi o Ultimato inglês que veio acabar por cortar laços históricos de relação íntima entre o povo urbano e a Coroa, laços esses já enfraquecidos desde a ida da Coroa para o Brasil e da revolução Liberal, cerca de cem anos antes.
Hoje em dia, um século após 1910, a comemoração da República já tem pouco a ver com o fim da Monarquia e sim com o que aconteceu desde então.
Cabe aqui dizer que sou republicano, mas que não renego a nossa História e não esqueço os mais de setecentos anos em que Portugal foi uma Monarquia com muitos momentos altos de afirmação ao mais alto nível mundial.
Também não partilho da ideia de que a Democracia e a Liberdade são exclusivos da República. As actuais Monarquias constitucionais actualmente existentes por essa Europa fora são a prova de que os valores democráticos e o desenvolvimento económico e social são compatíveis com a manutenção de Monarquias. Há apenas uma pequena diferença que me faz ser republicano e que é a não aceitação de que alguém possa exercer cargos públicos, ainda que de simples representação, apenas por direito de nascimento. É o princípio da Igualdade. Como se costuma dizer, a diferença poderá parecer pequena, mas viva a diferença!
A comemoração da República é assim, para mim, um acto de cidadania porque significa a possibilidade de todos serem iguais perante a Lei, residindo na vontade do Povo a escolha de quem o governa e representa, aos diversos níveis.
Não é, definitivamente, uma comemoração da primeira República que de facto, pouco tem para ser comemorada. Na realidade, à chamada “ditadura de João Franco” dos últimos anos da Monarquia, sucedeu-se a “ditadura do Partido Republicano Português” e uma sucessão de oito presidentes e 45 governos que tiveram o fim que se sabe escassos dezasseis anos depois com a ditadura militar instaurada por Gomes da Costa que abriu a porta ao Estado Novo. A violência que tomou conta das ruas durante a primeira República principalmente em Lisboa, com os seus pontos máximos nas lutas de 1915 e assassinato do presidente Sidónio Pais, bem como a incapacidade de os partidos ultrapassarem as lutas entre si continuam como exemplo acabado do que não se deve fazer.
Felizmente, temos hoje um quadro completamente diferente. Portugal é um país democrático bem integrado em comunidades internacionais. A União Europeia constitui-se hoje na instância que nos chama à pedra quando caímos nos velhos hábitos de falta de controlo nas despesas públicas e nos afastamos do caminho do desenvolvimento económico, como infelizmente acontece hoje. Está assim afastada a hipótese de alteração de regime por via de “putsh” militar sempre presente há cem anos, vindo de fora e sem grandes possibilidades de contestação a obrigação de regresso aos equilíbrios financeiros e às boas contas.
Os problemas pontuais como a crise que vivemos hoje não nos podem fazer esquecer que, apesar de tudo, Portugal está integrado no grupo dos países mais desenvolvidos, tendo níveis de desenvolvimento sociais e económicos quase impensáveis há cem anos. Razões para não perdermos a esperança e comemorarmos a República que temos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 4 de Outubro de 2010

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

CASA ONDE NÃO HÁ PÃO


Há um velho aforismo que diz que “casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”. Com uma observação mais cuidada das situações concretas, verifica-se que muitas vezes em substituição de “ninguém tem razão” se poderia antes dizer “todos têm razão” – pelo menos alguma.
A situação política do país teve uma evolução acelerada nas últimas semanas, acompanhando de perto a evolução das taxas de colocação da dívida soberana nos mercados internacionais.
A conversa deslocada que acompanhou o processo de apresentação da sua proposta de revisão constitucional por parte do PSD, foi subitamente substituída pela questão orçamental.
Aproveito para referir aqui que o PSD fez muito bem em propor uma revisão constitucional. O momento foi adequado, dado que a legislatura que agora começa tem poderes para rever a Constituição, fazendo todo o sentido que um partido reformista como o PSD sempre foi, olhe para a evolução social e económica do país que qualquer observador reconhece não ser famosa, antes pelo contrário, e proponha as reformas da lei fundamental que ache necessárias. Claro que as críticas e ataques à proposta são compreensíveis, dado que algumas posições ideológicas olham como sua uma Constituição que deve servir para que todo e qualquer partido legal possa governar segundo o seu programa, quando vencer eleições. Apropriação essa que, claramente, não é legítima. O exemplo da luta de Sá Carneiro para rever a Constituição no seu tempo não deve ser esquecido. Também nessa altura havia muita gente que se achava dona da Constituição, o que não impediu na altura o PSD de ir em frente, arrostar com muitas incompreensões e mesmo divisões e dissensões internas que acabam por fazer parte destes processos políticos.
A grande discussão sobre o Orçamento do Estado para 2011 faz todo o sentido. Será um documento fundamental para a credibilização externa do país mas sobretudo, para possibilitar um início de regresso a uma convergência económica com a União Europeia, que é o que verdadeiramente interessa. Só um crescimento sustentado em boas contas públicas abrirá caminho a uma recuperação económica que possibilite descidas da taxa de desemprego para níveis aceitáveis. E é na Assembleia da República que se deve discutir o Orçamento de Estado. O exemplo do “orçamento do queijo limiano” de má memória e que tão graves consequências teve não deve ser esquecido.
A possível vinda do FMI para nos obrigar a tomar medidas rigorosas e gravosas para todos não deve ser usada como chantagem sobre o Governo pelos partidos da oposição, nem ser aceite como única forma de o país tomar aquelas medidas que já todos sabemos muito bem quais são, porque a receita é sempre a mesma e já a conhecemos desde a década de 80.
Resta o presidente da República, em quem votei e por quem fiz campanha aquando da sua eleição e em quem irei muito provavelmente votar de novo. Penso que faz mal ao colocar-se de fora da solução, dando apenas sugestões e conselhos. Nas actuais circunstâncias exigir-se-ia muito mais, mesmo tendo em conta que as eleições presidenciais estão para breve. Não se percebe como é que ainda não convocou os líderes dos principais partidos para se definirem caminhos de convergência para a saída da actual situação, evitando em concreto a vinda do FMI. Tal como não se percebe que exija às propostas de revisão constitucional um “certificado” de qualidade que ninguém percebe bem qual é e que, tenho a certeza, receberia de Sá Carneiro uma resposta pouco agradável, se ainda fosse vivo.
NOTA: depois de escrita esta crónica, foi tornado público que Cavaco Silva convocou os partidos. Até que enfim.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 27 de Setembro de 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

BUSSACO FOI HÁ DUZENTOS ANOS



Faz este mês duzentos anos que se travou a Batalha do Bussaco, um dos recontros militares essenciais para impedir que as tropas napoleónicas ocupassem Portugal. De facto, foi em 27 de Setembro de 1810 que as tropas francesas comandadas por Massena encontraram os exércitos português e inglês comandados por Wellington na Serra do Buçaco.
Era já a Terceira Invasão Francesa, depois das anteriores comandadas por Junot e Soult. Desta vez, no intuito de resolver as coisas em definitivo, Napoleão enviou como comandante o Marechal Massena, a quem Napoleão chamava o “filho favorito da vitória”. A derrota do exército francês no Buçaco, não tendo sido definitiva, atrasou a marcha para Lisboa permitindo melhorar a preparação da defesa da capital nas Linhas de Torres Vedras e quebrou o moral francês. Massena provou o sabor amargo da derrota, tendo perdido no Buçaco cerca de 4.500 soldados, entre os quais 5 generais.
As Invasões Francesas foram um período decisivo da nossa História, com repercussões que duraram muitos anos. A derrota dos franceses foi crucial para a continuação de Portugal como Nação. Recorde-se que pelo Tratado de Fontainebleau de 1807, na sequência do Bloqueio Continental, Portugal seria dividido em 3 reinos. A integração das invasões francesas na História Europeia é aliás fácil de perceber apenas pelas suas diferentes designações: para nós, foram as Invasões Francesas, para os ingleses foram a Guerra Peninsular e os franceses chamaram-lhe Guerra da Libertação!
A fuga da família Real para o Brasil no dia 29 de Novembro de 1808, um dia antes da chegada de Junot a Lisboa, viria a ter consequências históricas de grande importância. Desde logo, a saída do país de toda a família real, juntamente com grande parte da aristocracia, quebrou laços sociais e permitiu a expansão das novas ideias do liberalismo, quando o país se viu finalmente livre dos invasores franceses. Apesar da derrota dos franceses, parece hoje pacífico que o “antigo regime” acabou também nesta altura. Depois, criou as condições para que poucos anos depois o próprio D. Pedro IV desse o grito do Ipiranga que tradicionalmente é tido como o momento que marca a independência do Brasil.
Durante as Invasões Francesas, o território português foi varrido por numerosos exércitos. Lembra-se que nessa altura os exércitos invasores se alimentavam daquilo de que se apropriavam à sua passagem, deixando tudo destruído. Por outro lado, os defensores adoptavam políticas de terra queimada, para impedir os invasores de encontrarem víveres. Os próprios ingleses, nossos aliados, foram de extremo rigor nessa actuação, punindo muitas vezes com a morte quem não queimasse e destruísse todos os seus bens para que os franceses não se pudessem alimentar. Caso para dizer que para os desgraçados camponeses o remédio foi muitas vezes pior que a doença!
É sobejamente conhecido que os franceses pilharam tudo o que puderam durante as invasões. Desapareceram obras de Arte, mobiliário, peças de ouro e prata, ficando apenas as pedras nuas dos palácios e das igrejas. Os campos ficaram arrasados. Com a independência do Brasil, deixaram de vir as riquezas que costumavam vir. As chamadas “lutas liberais” que se seguiram impediram a recuperação económica do país depois das invasões francesas, tendo ainda contribuído para aumentar a pobreza nacional. A governação do resto do século XIX foi quase sempre uma desgraça. Portugal perdeu o comboio do desenvolvimento do resto da Europa que se verificou durante esse século, com tremendas consequências que entraram bem dentro do século XX.
O conhecimento mínimo da nossa História é uma condição para percebermos o que somos hoje. Relembrar momentos cruciais como foi a “Batalha do Bussaco” é de grande importância. No Convento de Santa Cruz do Buçaco onde Wellington pernoitou depois da Batalha, está neste momento uma colecção de excelentes fotografias de reconstruções históricas de batalhas das Invasões Francesas, da autoria do Coronel Ribeiro de Faria. Caro leitor, a mata do Buçaco pode não ter sido escolhida para ser uma das nossas dez melhores maravilhas naturais. Mas não é por isso que deixa de ser uma maravilha. Vá lá por estes dias e visite a exposição, que vale a pena.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Setembro de 2010

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

SEGURANÇA RODOVIÁRIA (de novo)


Já por diversas vezes abordei nestas linhas a questão da sinistralidade rodoviária, nas suas diversas vertentes. Talvez por durante alguns anos ter tido relação profissional com matérias relacionadas com a segurança rodoviária desenvolvi um interesse especial por esta área, que se mantém até hoje.
O número de acidentes rodoviários e de vítimas teve nas últimas duas décadas um decréscimo notável em Portugal mas mantém-se, ainda assim, num nível excessivamente elevado com grandes custos sociais e muito sofrimento. Esse decréscimo está sem dúvida ligado a uma melhoria acentuada da segurança das novas estradas e ainda ao aumento de qualidade do parque automóvel.
Continuam, no entanto, a verificar-se circunstancialismos graves à volta da segurança rodoviária com consequências muitas vezes trágicas.
Desde logo, a manutenção de pontos negros claramente identificados que são autênticas armadilhas para os automobilistas incautos. Por exemplo, na semana passada verificou-se mais um acidente com vários automóveis envolvidos e uma série de feridos com gravidade na curva ao fundo da Av. Gouveia Monteiro. Claro que estava a chover; claro que algum automobilista seguiria a mais de 30 Km/h. Mas qualquer técnico de segurança rodoviária assegura que aquele local não oferece condições mínimas de segurança de circulação, daí a frequência dos acidentes.
A atitude geral dos automobilistas perante a estrada também tem que ser radicalmente modificada. Não pode continuar a ver-se automóveis e mesmo camiões literalmente “colados” uns aos outros nas auto-estradas. Não pode continuar a ver-se que muitos automobilistas não reduzem a velocidade quando as condições meteorológicas se alteram. É verdadeiramente assustador ver automóveis a circular a 140 km/h ou mais, com chuva.
E o que dizer da fiscalização do trânsito? Hoje em dia podem fazer-se centenas de quilómetros em auto-estrada e fora dela, sem se ver um único veículo de fiscalização de trânsito. Eventualmente, lá se lobrigam uns veículos escondidos ao lado da auto-estrada a tirar fotografias de controlo de velocidade actividade bem triste de caça-multa a que, pelos vistos, está reduzida a Brigada de Trânsito, ou o que resta dela. A esse propósito, aliás, não se percebem as vantagens de ter substituído a Brigada de Trânsito por 20 unidades territoriais, com comandos diferentes e autonomia própria. As consequências que se observam na atitude generalizada dos condutores estão bem à vista e só não vê quem não quer. O que se espera por reconhecer o erro e recuperar a unidade nacional de controlo de trânsito, com critérios uniformes de actuação e aproveitando as capacidades profissionais criadas ao longo dos anos, chame-se-lhe Brigada de Trânsito ou outra coisa qualquer, se o problema é o nome? A segurança rodoviária e por extensão, todos nós que diariamente circulamos nas estradas, exigem-no.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 13 de Setembro de 2010