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segunda-feira, 21 de março de 2011
PONTO VERNAL
segunda-feira, 14 de março de 2011
O MAR (JÁ) NÃO É PORTUGUÊS
“Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!”
Fernando Pessoa perpetuou na sua “Mensagem” o mito do mar português de forma magnífica. Mas, se muito do mar já foi português, isso pertence a um passado cada vez mais longínquo. Nas últimas dezenas de anos esfumou-se a nossa marinha mercante e com ela as escolas de marinhagem. Quase se eliminou a frota de pescas e, embora continuemos a ser o povo que mais peixe come na Europa, isso deve-se a um bom hábito alimentar que resiste, já que a maior parte do peixe fresco que consumimos hoje em dia é importado. Os nossos estaleiros navais vegetam com poucas encomendas, embora os estaleiros de reparação comecem agora a recuperar, mas bem longe da relevância mundial que tiveram até aos anos setenta do século passado. Para um país que tem uma relação comprimento de costa sobre a sua área tão esmagadora e com o historial náutico que tem, é apenas ridícula a fraca actividade ligada aos desportos náuticos.
No dia da tomada de posse para o seu segundo mandato, o Presidente da República entendeu por bem reafirmar o seu compromisso com o Mar, destacando a importância da chamada Agenda do Mar.
Claro que o teor do discurso de tomada de posse e as reacções que originou atraíram a atenção dos media e a Agenda do Mar passou mais uma vez relativamente despercebida. Mas não devia. A recuperação económica do país é a única verdadeira saída para os nossos problemas, incluindo o desemprego. O resto são paliativos para uma situação grave de dívida externa e de défice de contas públicas.
E, de facto, a economia do mar tem uma potencialidade gigantesca para ajudar o país a recuperar da letargia económica. O saudoso Ernâni Lopes lutou durante anos para que os responsáveis políticos acordassem para o riquíssimo conjunto de actividades económicas relacionadas com o mar, a que sugestivamente chamava “hipercluster do mar”. Portugal continental tem uma extensão de costa com mais de 900 km. A zona económica exclusiva portuguesa tem mais de 1.700.000 km2, sendo a terceira maior da União Europeia. Podemos mesmo considerar que o abandono a que os nossos sucessivos responsáveis têm votado este sector é apenas criminoso. As áreas da Defesa e Segurança – Marinha de Guerra, Transportes Marítimos Europeus, Portos e Investigação e Desenvolvimento constituem, no seu conjunto, um sector gigantesco que deve ser tratado de forma integrada numa perspectiva de crescimento económico sustentado e de grande futuro. Não podemos é continuar a comprar submarinos em vez de patrulhas oceânicos em quantidade, nem ter costa marítima vigiada com radares móveis e binóculos. Nem gastar fortunas em brincadeiras grotescas como a cobra produtora de electricidade das ondas. Nem fechar linhas férreas, cruciais para a circulação de mercadorias trasfegadas nos portos.
O crescimento económico do país não pode passar pelo esquecimento de todo este potencial, que ainda por cima entronca no passado mais brilhante que tivemos. A visão política estratégica é crucial para que a nossa economia recupere e venha a proporcionar aos portugueses níveis de vida comparáveis aos da Europa do Norte como todos desejamos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 14 de Março de 2011
quinta-feira, 10 de março de 2011
A morte da executiva bem-sucedida
A morte da executiva bem-sucedida
Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no peito, vacilou, cambaleou. Deu um gemido e apagou-se. Quando voltou a abrir os olhos, viu-se diante de um imenso Portal.
Ainda meio tonta, atravessou-o e viu uma miríade de pessoas. Todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender bem o que estava a acontecer, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes:
- Enfermeiro, eu preciso voltar com urgência para o meu escritório, porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque o meu seguro de saúde é Platina, e isto aqui está a parecer-me mais a urgência dum Hospital público. Onde é que nós estamos?
- No céu.
- No céu?...
- É.
- O céu, CÉU....?! Aquele com querubins, anjinhos e coisas assim?
- Exacto! Aqui vivemos todos em estado de graça permanente.
Apesar das óbvias evidências, ausência de poluição, toda a gente a sorrir, ninguém a usar telemóvel, a executiva bem-sucedida levou tempo a admitir que havia mesmo batido a bota.
Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação era inaceitável. Porque, ponderou, dali a uma semana iria receber o bónus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa.
E foi aí que o interlocutor sugeriu:
- Talvez seja melhor a senhora conversar com Pedro, o coordenador..
- É?! E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?
- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.
- Assim? (...)
- Quem me chama?
A executiva bem-sucedida quase desabava da nuvem. À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro.
Mas, a executiva tinha feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu logo:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século veio?
- Do XXI. O distinto vai dizer-me que não conhece o termo 'executiva'?
- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro. Se me permite, gostaria de lhe fazer uma proposta. Basta olhar para essa gente toda aí, só na palheta e andando a toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistémica.
- É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reorganização. Por exemplo, não vejo ninguém usando identificação. Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Percebeu? Sem controlo, há dispersão. E dispersão gera desmotivação. Com o tempo isto aqui vai acabar em anarquia. Mas podemos resolver isso num instante implementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização e um organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver.
- !!!...???...!!!...???...!!!
- Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Accionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Óptimo. O passo seguinte seria partir para um downsizingprogressivo, encontrar sinergias high-tech, redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, parece-me extremamente atractivo.
- Incrível!
- É óbvio que, para conseguir tudo isso, teremos de nomear um boardde altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias da praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho a certeza de que vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar num Turnaround radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que a senhora terá um futuro brilhante... se for trabalhar com o nosso concorrente. Porque acaba de descrever, exactamente, como funciona o Inferno...
Max Gehringer
(Revista Exame)
segunda-feira, 7 de março de 2011
Não à dívida
CIDADES: SERES VIVOS
Alguém comparou o desenvolvimento das cidades com a evolução do ADN, numa imagem extremamente feliz. A complexificação das células conduziu ao ser vivo mais completo que é o ser humano. As células evoluíram, ganharam especializações e agruparam-se em conjuntos de níveis diferentes, com tarefas próprias sucessivamente mais complexas, como os órgãos e os sistemas. Mas mesmo esses sistemas não são nem existem senão para uma função que agrupa todas as células: a vida do ser (humano, neste caso). A vida desse ser só é possível através de um relacionamento com o meio exterior, que lhe fornece os elementos necessários ao seu funcionamento, o meio ambiente. É assim que, logo após o seu nascimento, todos os seres vivos, incluindo os humanos, se inserem no meio ambiente, o que deverá suceder da forma mais harmónica e sustentável possível.
De forma semelhante, os agregados humanos evoluíram desde a ocupação das cavernas naturais até formar os sistemas altamente complexos e estruturados que são as cidades que hoje conhecemos.
As cidades fornecem habitação, trabalho, segurança, mobilidade, formação, diversão, cultura, conhecimento e possibilidade de relacionamento com muitos outros semelhantes, através de relações de vizinhança. Por isso as cidades são hoje tão parecidas com seres vivos complexos. Com uma complexidade acrescida. Enquanto os seres vivos têm o seu desenvolvimento espacial bem definido que está controlado através do seu ADN, as cidades podem crescer de forma anárquica e tornarem-se mesmo desagradáveis para quem lá vive, ou, pelo contrário, serem harmoniosas, funcionando os seus diversos subsistemas de forma coerente, contribuindo todos para uma boa qualidade de vida dos seus habitantes que são a sua razão de ser.
Ao longo dos anos, a organização das cidades foi-se especializando nas suas diferentes áreas. Há leis relativas ao planeamento urbanístico e à gestão urbanística. Há leis que limitam os níveis de ruído. Há regras para a organização do sistema viário e mesmo para a circulação viária. Há regras para a distribuição das fontes energéticas e da água, bem como da sua recolha e tratamento depois de utilizada. Há regras para a definição do que é o património histórico de interesse colectivo, bem como para a sua protecção e utilização. As cidades desenvolveram sistemas de utilização comum, como os de carácter desportivo e de lazer.
É assim que as autarquias têm imensos sectores especializados que tratam de áreas diversas e com poucos pontos de contacto, para além do orçamento municipal e que exigem conhecimentos técnicos e legais profundos para que sejam eficientes. Cai-se assim na tentação da especialização técnica aliada à burocracia que leva à falta de perspectiva de conjunto e da noção de cidade como ser vivo que necessita que todos os seus sistemas trabalhem de forma integrada para o mesmo objectivo que deverá ser definido pela Política.
Os PDM, os planos de urbanização, a regeneração urbana, as políticas de espaços públicos, de desportos, de comércio, de habitação, de desenvolvimento económico, de turismo, de segurança, de transportes públicos, de educação, de cultura, de apoio social, de sustentabilidade ambiental e tantas outras de carácter sectorial devem ser coerentes com uma definição estratégica da própria Cidade. Nem sequer o planeamento do território e da sua ocupação deverá ser determinante do resto: ele próprio deverá ser coerente com as restantes políticas sectoriais e integrado na política estratégica da Cidade.
As cidades que pegam na sua História e desenvolvem uma ideia estratégica clara para o seu futuro conseguem tornar-se competitivas, ambientalmente sustentáveis e, acima de tudo, oferecer já hoje aos seus habitantes uma qualidade de vida que lhes permita serem verdadeiramente cidadãos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 7 de Março de 2011
sexta-feira, 4 de março de 2011
segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
O PSD e o País
Faz agora um ano que o PSD elegeu Passos Coelho como líder. As eleições directas que ditaram a sua escolha traduziram-se numa votação de mais de 60% dos votos dos militantes, contra candidatos do gabarito de Paulo Rangel e Aguiar Branco. Um resultado que apenas surpreendeu quem de facto não conhecia Passos Coelho, a sua forma séria de estar na coisa pública e a sua capacidade política.
Recorde-se que nas eleições internas de Maio de 2008 tinha sido escolhida Ferreira Leite com 38% dos votos contra Passos Coelho que nessas eleições obteve 31% e Santana Lopes 29,5 %. Nas eleições para a Assembleia da República que se seguiram, Passos Coelho foi excluído das listas de deputados do PSD, pelo que hoje não pode defrontar directamente o Governo no Parlamento, ao contrário do que sucede habitualmente nas democracias, e o PSD dirigido por Manuela Ferreira Leite obteve 29,1% contra 36,5% do PS, isto já em plena crise financeira. Como se sabe, a hora da verdade das lideranças partidárias verifica-se nos resultados das eleições legislativas e não noutro momento qualquer. Por isso mesmo se relembra igualmente que em 2005 Santana Lopes obteve 28,7% contra 45% do Partido Socialista. A História é o que é e não outra coisa qualquer e é sempre bom ter memória destas coisas.
Após a sua eleição como presidente do PSD, a acção de Passos Coelho tem-se pautado por duas características claras. A nível interno por uma preparação programática séria do partido para a sua acção governativa quando vier a ser chamado para essa responsabilidade e por uma acção construtiva de unidade interna, chamando a colaborar todos os que o quiserem fazer independentemente das suas escolhas pessoais anteriores. Já a nível nacional, a sua liderança tem-se caracterizado por uma acção patriótica que coloca sempre com muita sensatez o interesse nacional à frente do que possa parecer o interesse imediato do partido.
A aprovação do Orçamento de Estado para 2011 era crucial para o País, atendendo à delicada situação das contas públicas face ao défice, à dívida e à evolução da economia.
Nas eleições presidenciais, o PSD fez o que tinha de ser feito. Após a reeleição de Cavaco Silva à primeira volta, Passos Coelho esclareceu o significado político destas eleições, recusando retirar delas quaisquer consequências para a vida partidária.
Perante o anúncio da apresentação de uma moção de censura por parte do Bloco de Esquerda, Passos Coelho demonstrou mais uma vez como, na solidão da decisão crucial, é capaz de evitar as inúmeras armadilhas, optando pelo interesse nacional e demonstrando frieza de espírito, capacidade de análise e personalidade própria.
Muita gente, incluindo alguns responsáveis do PSD, tem comentado a falta de experiência de Pedro Passos Coelho. Esquecem ou omitem o que os portugueses exprimiram sobre essa experiência nas duas últimas eleições legislativas. Penso que o que acima fica escrito mostra bem que não é por falta de alternativa séria do PSD que este país não reagirá e terá capacidade de recuperar da situação em que se encontra hoje e para a qual Passos Coelho tem a grande, enorme vantagem de não ter contribuído em nada.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 28 de Fevereiro de 2011
domingo, 27 de fevereiro de 2011
Turismo de Portugal.
Hyperion
A lua de Saturno chamada Hyperion, numa fotografia tirada pela sonda Cassini e divulgada pela APOD de hoje.