Há um ano
estávamos em situação de pré-bancarrota, isto é, o Estado português não
dispunha de fundos para cumprir as suas obrigações nem sequer para pagar aos
seus funcionários, não havendo quem nos emprestasse dinheiro, a não ser em
condições de agiotagem pura. Foi o ministro das Finanças dessa altura que nos
avisou do facto, obrigando o então primeiro-ministro a chamar a “troika” que
nos trouxe o dinheiro que os mercados nos negavam, a troco de condições que
fomos obrigados a aceitar. Ficámos assim, durante algum tempo, com acesso a
dinheiro emprestado sem ter que ir ao mercado pedi-lo, o que significa uma
segurança temporária, mas uma segurança, apesar de tudo.
Mas há uma área
da actividade económica que, quer entre nós, quer a nível mundial, continua a
provocar as mais fundadas preocupações e que é aquela que deu origem ao termo
que dá o título a esta crónica: precisamente a banca.
Não se passa
praticamente um dia em que não nos cheguem más notícias da banca. Ontem foi a
colocação do Facebook no mercado. Apesar de montada por um dos mais
prestigiados bancos, o Morgan Stanley, a sensação é de que a operação foi uma
autêntica barracada. Claro que uma barracada gigantesca, da ordem de 16 mil
milhões de dólares, o que deu muito dinheiro a ganhar a alguns “felizardos”, já
que a avaliação da rede social foi claramente inflacionada, antes da entrada em
bolsa. Pelos vistos, dentro do próprio Morgan Stanley alguém se apercebeu da
“bolha” que se estava a encher, avisando alguns investidores privilegiados do
facto. Claro que, entretanto, as acções já desceram uns 17% e continuam a cair.
Ainda ontem,
mas mais perto de nós, soube-se que, em apenas cinco dias, os três maiores
bancos privados portugueses perderam 660 milhões de euros na sua capitalização.
As acções do Millennium BCP, por exemplo, já não chegam a valer 10 cêntimos.
Anteontem foi a
notícia chocante para todo o mundo, da descoberta de uma perda de mais de 2 mil
milhões de dólares no banco que até agora era o paradigma mundial de segurança
nos investimentos, o JPMorgan Chase. O único banco de investimentos que passou
incólume pela tempestade financeira de 2008/2009, que tem no seu interior uma
segurança contra falhas ao mais alto nível que pode existir, em que o
responsável pela área ganhou o ano passado 15 milhões de dólares, veio agora
descobrir no seu interior uma carteira de investimentos que é afinal um buraco
de 2 mil milhões. É obra; até porque essa carteira destinava-se precisamente a
precaver os resultados do banco contra baixos crescimentos económicos. Lá está,
vai-se a ver e trata-se de “produtos derivados”, quase impossíveis de gerir
racionalmente por pessoas, para além dos programas automáticos
hipersofisticados que fazem perder a relação com a realidade. Os tais
“derivados” a que Warren Buffet costuma chamar “armas de destruição maciça”,
mas de que até o JPMorgan não consegue fugir.
Aqui entre nós,
anteontem o fundador do BCP Eng. Jardim Gonçalves chamou dramaticamente a
atenção para o que está a acontecer na banca portuguesa em consequência das
medidas de recapitalização impostas pelos burocratas europeus e que a curto
prazo vão acabar por entregar os bancos portugueses a estrangeiros, por valores
ridículos.
A economia
portuguesa anseia pelo dinheiro que os bancos não são capazes de lhe fornecer
em condições aceitáveis. Provavelmente, porque não o têm, já que o seu problema
é sobreviver, gerir a dívida pública que tiveram que comprar e ainda responder
às exigências de recapitalização inventadas pela União Europeia. Um país
pequeno como o nosso, que está pejado de auto estradas do lá-vai-um e que têm
que ser pagas, endividado até ao tutano, com a economia estagnada, com um
Estado habituado a gastar muito mais do que recebe em impostos, não está
provavelmente em condições de exigir nada perante a União Europeia e baixar a
cabeça, já que o seu problema é safar-se da tempestade.
Mas não podemos
deixar de ter consciência de que grande parte dos males europeus actuais vem
dos erros gigantescos da actividade financeira, em particular da banca, havendo
uma enorme responsabilidade das entidades que a deviam regular como os bancos
centrais. Acresce que os dirigentes políticos europeus estão claramente
impreparados para lidar com forças tão poderosas como os gigantescos fluxos
financeiros que diariamente dão várias voltas à Terra, não se sabendo nunca
exactamente onde estão, nem para onde se dirigem. Os mercados são essenciais à
vida económica nos seus mais diversos níveis, mas os Estados e neste caso a
União Europeia têm que ter capacidade e meios para se defender, evitando dar o
ouro ao bandido como se costuma dizer e preservando os seus cidadãos dos
predadores de que individualmente não se podem defender.
Publicado originalmente no diário de Coimbra em 28 de Maio de 2012