jpaulocraveiro@ gmail.com "Por decisão do autor, o presente blogue não segue o novo Acordo Ortográfico"
domingo, 11 de fevereiro de 2018
ORTODRÓMIAS E LOXODRÓMIAS
Ao contrário das viagens terrestres, em que o caminho a percorrer se encontra bem delineado por caminhos ou estradas, nas viagens marítimas e aéreas de longas distâncias exige-se a utilização de métodos que recorrem a cálculos astronómicos.
Nessas viagens é necessário conhecer as coordenadas do ponto de partida e do ponto de destino e escolher um itinerário.
Como a Terra é esférica, o itinerário tem que ser adaptado a essa
circunstância, havendo dois tipos de trajecto a escolher: derrota
ortodrómica e derrota loxodrómica (derrota é nome marítimo de percurso).
Uma ortodrómia utiliza o troço de um círculo máximo que passa pelos dois
pontos, à superfície da Terra. É um trajecto que minimiza assim a
distância a percorrer entre os dois pontos.
No entanto, como as cartas que se utilizam na navegação são planas,
sendo a de Mercator a mais utilizada, aquele trajecto aparece como uma
curva nestas cartas.
Para navegar, é necessário seguir um rumo, pelo que a ortodrómia é muito
difícil de seguir, exigindo que se estivesse permanentemente a mudar o
rumo.
O processo alternativo mais fácil é traçar uma recta entre os dois
pontos na carta plana, traçando uma loxodrómia e definindo assim um rumo
constante com um azimute fixo marcado na girobússula.
Só que o que na planta parece o trajecto mais direito, significa um
trajecto que em grande parte dos casos é muito mais longo. Pode-se fazer
uma mistura, adoptando um conjunto de loxodrómias que se aproximem mais
da ortodrómia.
A nossa vida não é uma esfera, mais se assemelhando a uma viagem com
altos e baixos. Mas também neste caso a maneira de chegar a um objectivo
não é muitas vezes aquela que à primeira vista parece a mais direita,
já que os sistemas de coordenadas em que nos movemos fazem parecer
simples o sistema terrestre já de si bem complexo.
Publicado em Janeiro de 2008 e republicado aqui
quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018
segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018
Corrupção: um imposto escondido
Há momentos em que a actualidade se nos impõe de
uma forma tão impressiva, que não podemos fugir dela, por muito que
desejássemos que a realidade da nossa sociedade de hoje fosse diferente.
Felizmente, a corrupção é vista pela esmagadora maioria
dos cidadãos como algo de errado, ainda que muitas pessoas não se apercebam do
seu profundo significado e encontrem até motivos para a sua não reprovação
completa ou mesmo desculpabilização. Não vivemos numa sociedade em que o
“bakshish” seja norma, mas há muitos afloramentos de atitudes que não andarão
muito longe. Por exemplo, todos conhecemos casos de políticos, da esquerda à
direita, que transitam entre os ministérios e as grandes empresas com o maior
dos à-vontades, demonstrando que aquilo que se dizia ser próprio de um regime
antidemocrático se verifica também em democracia, isto é, “o que interessa não
é ser ministro, é ter sido ministro”.
Por estes dias um caso de corrupção, mais
propriamente por enquanto, de suspeita de corrupção, atingiu em pleno o cerne do
último reduto da defesa da sociedade como um todo colectivo e dos cidadãos a
nível individual, que é a Justiça. Dois juízes desembargadores da Relação de
Lisboa, um homem e uma mulher, foram constituídos arguidos por suspeita de
crimes relacionados com recebimento de dinheiro em troca de decisões judiciais
favoráveis. O caso atinge tais proporções que o Conselho Superior da
Magistratura suspendeu-os por entender que, e não é um qualquer cidadão mais
revoltado que o escreve, “em ambos os
casos, indicia-se, pois, uma muito grave, dolosa e reiterada violação dos
deveres profissionais a que se encontram adstritos os magistrados judiciais,
suscetível de se repercutir na sua vida pública de forma incompatível com a
credibilidade, prestígio e dignidade indispensáveis ao respetivo exercício
funcional”.
Já tínhamos um antigo Primeiro-ministro acusado de
corrupção a aguardar julgamento, já tivemos antigos ministros condenados,
banqueiros e gestores de grandes empresas uns condenados e outros à espera de julgamento
e por aí fora, agora temos juízes desembargadores também acusados de corrupção.
Este caso dos juízes desembargadores arguidos por
suspeita de corrupção vem juntar-se a esses casos de grande notoriedade dos
últimos anos que, apesar de tudo, são a prova de que a Justiça é o grande
garante do primado da Lei e que, embora seja um lugar comum dizê-lo, funciona.
E é precisamente quando a Justiça funciona
colocando em causa os mais poderosos, seja pelo dinheiro, seja pela relevância
das suas funções como políticos ou juízes, que vemos imediatamente um exército
bem treinado saltar para a comunicação social a colocar em causa precisamente
esse funcionamento.
Desde meados da semana passada que assistimos a
especialistas em todas as televisões e nas páginas dos jornais a clamar contra
a violação do segredo de justiça e contra uma suposta judicialização da
política ou a denunciar, pasme-se, a “agenda da PGR”. Quem estiver distraído,
poderá mesmo ser levado a pensar que os arguidos são vítimas e não suspeitos de
serem criminosos e que a Democracia poderá estar a ser posta em causa, quando é
ao contrário. A comunicação social é acusada dos piores crimes por divulgar
informação sobre os processos e não os deixar ficar na sombra, enquanto
curiosamente se louvam filmes como “The Post” ou “Os Homens do Presidente” que
mais não são do que símbolos da liberdade de imprensa contra os mais poderosos.
A corrupção é algo intolerável, que deve ser
combatido por razões éticas mas também por questões de justiça social. Os actos
de corrupção constituem um saque ao bem comum, com custos para toda a
sociedade. São um imposto escondido, que todos nós acabamos por pagar, para
benefício de uns poucos. A sociedade tem vindo, e bem, a criar mecanismos de
defesa contra a corrupção, como acontece com a obrigatoriedade da existência de
um “Plano de
Gestão de Riscos de Corrupção e Infracções Conexas” em todos organismos públicos, incluindo Empresas Públicas. Mas quando são
precisamente responsáveis de topo dessas instituições a resolver usar o seu
poder para extorquir dinheiro para as suas contas pessoais, no fim são apenas
as instâncias judiciais que têm capacidade para lhes suster o passo e os
castigar. Façamos votos para que a Justiça portuguesa continue, de forma
independente e cega aos privilégios, a defender a sociedade deste roubo social
que é a corrupção.
terça-feira, 30 de janeiro de 2018
segunda-feira, 29 de janeiro de 2018
A Democracia europeia
A questão da democracia na União Europeia é algo
que deve estar sempre em cima da mesa. A representação democrática numa União com
quase trinta países, todos eles com as suas identidades e História, para além
das suas próprias instituições democráticas, não é um problema de menor
importância. O seu deficiente funcionamento pode mesmo colocar em causa os
próprios fundamentos da União que, recorde-se, começou por ser económica mas
avançou depois para uma união política com avanços por vezes súbitos e
profundos.
Podemos estar neste momento perante uma dessas
situações, com dirigentes a pretenderem dar passos maiores do que as pernas
permitem e sem que os cidadãos sejam devidamente informados, havendo mesmo uma
cortina de secretismo a tentar tapar o que se passa.
Na última cimeira dos países do sul da Europa realizada em Roma há duas semanas, em
que participaram Malta, Chipre, França, Grécia, Itália, Portugal, Espanha e França,
os representantes desses países assinaram um documento que prevê listas
transnacionais para o Parlamento Europeu. Esta é uma das ideias com que o
Presidente francês Emmanuel Macron pretende o reforço e aprofundamento da
unidade europeia, ou “mais Europa” como ele costuma dizer. Consistiria na
criação de um círculo eleitoral supranacional nas eleições para o Parlamento
Europeu em que as listas seriam transnacionais. Significa isso que para esse
círculo nós portugueses, por exemplo, votaríamos não em listas propostas pelos
partidos portugueses como sucede hoje, mas em listas de partidos europeus que
integrariam os candidatos portugueses. Isto é, em vez de escolher deputados
portugueses para o Parlamento Europeu, votaríamos em conjuntos de deputados oriundos
dos vários países europeus, assim se diluindo a representação nacional no PE e,
em correspondência, a responsabilidade dos deputados perante o eleitorado
nacional.
Como é evidente, os
países pequenos e médios perderiam força perante os maiores como a Alemanha, a
França, Espanha e Itália que dominariam as listas à vontade, como já hoje são
preponderantes na orientação política dos grandes grupos partidários europeus.
Se actualmente é difícil encontrar alguém que consiga dizer quem são os
eurodeputados portugueses, imagine-se como será caso essa ideia vá por diante.
E coloco a questão no futuro e não no condicional, porque já deu para se
perceber que, de uma forma ou de outra, há quem esteja muito interessado em que
tal aconteça. Claro que, para alguns partidos, até daria jeito que os seus
candidatos fossem à boleia dos poderes europeus, mas de vantagens de secretaria
para os partidos políticos penso que a maioria dos cidadãos gostará pouco.
Dizem os defensores
desta ideia que assim se obteria uma visão mais global dos problemas europeus
em detrimento das visões nacionalistas e tantas vezes paroquiais de cada um dos
países individualmente. Como é evidente, as consequências seriam exactamente as
opostas, acentuando o afastamento já hoje existente entre as populações e os
seus representantes no Parlamento Europeu que deixariam de os representar em
favor dos directórios europeus das forças políticas em que se inserissem.
Seriam criadas condições para reacções de rejeição da União através do
surgimento de novos extremismos nacionalistas e agravamento dos já existentes,
numa altura em que o Brexit já está em andamento e se notam sinais
perturbadores em países do antigo bloco de Leste, mas também na Áustria,
podendo mesmo alastrar-se a Itália nas próximas eleições.
Percebe-se bem que Emmanuel Macron tenha feito esta
proposta, que vai objectivamente ao encontro dos interesses da França. Já não
se percebe que o grupo dos outros países do Sul da Europa tenha ido na cantiga
tão facilmente. E ainda menos que o nosso representante na cimeira, o
Primeiro-Ministro António Costa tenha assinado o documento sem ter havido
qualquer discussão pública ou explicação prévia ao país sobre o seu
significado, tendo-se ainda por cima manifestado publicamente como contrário às
listas transnacionais ao regressar a Portugal. Diferença de posições fora de
Portugal para europeus verem e dentro do país para os portugueses? De um
Primeiro-Ministro deve exigir-se mais coerência.
Uma política de aproximação da Europa aos cidadãos
não se fará nunca nas suas costas e tentando sub-repticiamente sobrepor camadas
políticas da União às soberanias nacionais. É por isso que, nós cidadãos, nos
devemos opor a estas decisões tomadas à revelia dos povos exigindo, neste caso,
que a posição portuguesa seja tomada na sede própria, isto é, na Assembleia da
República e não apenas pelo Governo, seja o actual ou outro qualquer no futuro.
Subscrever:
Comentários (Atom)



