segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

GERIR PROJECTOS OU PANDEMIAS

 


Há muito mais em comum na gestão de projectos e na de uma pandemia do que se possa pensar, à partida com uma palavra chave: planeamento.

Na experiência profissional da minha vida como engenheiro tive que lidar com vários tipos de projectos e de diversas dimensões. E posso garantir que há regras e procedimentos a seguir que são comuns a todos eles, independentemente das suas características próprias. Quando não são cumpridos, o que acontece é que quando se chega ao fim do prazo, o projecto não está concluído e muitas vezes nem se sabe quando estará porque não foi agarrado a tempo. O mesmo sucede com os custos: quando não há controlo férreo desde o primeiro momento, nunca se sabe realmente quanto a mais vai custar o projecto.

Trata-se de verdades lapalissianas, que toda a gente deve saber, mas que na realidade são seguidas em determinados sectores e noutros não. Em Portugal é muito raro que as obras levadas a cabo pelo Estado cumpram prazos e orçamentos aprovados. Já por diversas vezes abordei as razões nestas linhas, que surgem desde a elaboração dos projectos propriamente ditos, aos concursos e respectiva legislação, à falta de controlo e fiscalização das execuções e também à incapacidade dos gestores, neste caso, políticos impreparados para decidir em situações de conflito ou de risco. Por outro lado já repararam que nas empresas privadas é raro que os projectos não se façam no prazo estabelecido e sem custos a mais? É que o dinheiro aplicado é dos próprios e ai do gestor de projecto que for incompetente e não cumpra os objectivos definidos!

Com todas as possibilidades de errar, gerir projectos não é uma das actividades mais fáceis na vida, principalmente quando são complexos, inovadores ou contêm em si factores de imponderabilidade que obrigam a escolhas sem certezas absolutas.

Olhemos com estes olhos de gestor de projecto para o que se tem passado em Portugal com a pandemia COVID-19, com o Estado a gerir tudo. Podem dizer-me que há aspectos específicos que são do conhecimento apenas de especialistas, sejam epidemiologistas, virologistas, de pneumologia ou de Medicina Interna, ou de gestão hospitalar. Tal como acontece noutros projectos, em que há especialistas em várias áreas, seja fundações especiais, AVAC ou telecomunicações, betão armado ou eficiência energética, para falar na minha área profissional. Em todos os projectos há especificidades a tratar por especialistas e depois há quem gere todas essas áreas como um maestro de orquestra e que é o responsável último pelos resultados obtidos, sabendo que no fim é que vão aparecer sempre as incapacidades na gestão dos projectos.

E na questão da pandemia o que é está a acontecer? Um rotundo falhanço na sua gestão. Não é, certamente, à toa que Portugal de auto-proclamado «milagre» na Primavera, no Inverno passou para o pior do mundo em termos de infecções e de número de mortos por milhão de habitantes. Depois de a tragédia acontecer de nada adianta chorar e atirar a culpa para outros, neste caso os cidadãos portugueses que são exactamente os mesmos de antes, as circunstâncias que politicamente lhes impuseram é que são diferentes.


Durante os 8 ou 9 meses de intervalo entre as duas primeiras vagas, como lhes chamam, deviam ter sido previstas soluções sanitárias capazes para enfrentar as piores situações possíveis. Aí é que se deviam ter gasto dinheiro e esforços. O que foi feito? Em relação a aumento de equipamentos de saúde e sua coordenação esperou-se pela evolução da pandemia para se ir reagindo em conformidade tentando controlar os danos. Só que, quando os limites são ultrapassados, surge a tragédia. Evitável com o esforço e a competência que se exigem a um bom gestor de projecto que é neste caso todo o governo e o ministério da saúde, em particular.

Não se conclua daqui que esta crónica é uma crítica dirigida apenas ao governo ou aos partidos que o sustentam. De facto, o principal responsável da situação a que chegámos é o governo porque em governação não se pode levar o bife sem os ossos. Mas onde está a fiscalização que os partidos não governamentais devem fazer na Assembleia da República? Não podem esperar pelo fim para espetar a faca, devem ter a grande maçada política de falar enquanto a gestão está a ser mal feita ou mesmo não é feita, de todo. Com uma catástrofe destas não se deve pensar nos votos ou que o poder nos caia no colo, mas sim criticar e propor soluções construtivas. E todos, mas todos, têm as suas próprias responsabilidades. O próprio Presidente da República sai muito mal de todo este processo. O estrito cumprimento da legalidade não pode ser o único critério de aferição da actividade governativa e, se há algo que os cidadãos deste país não podem esperar é ver os seus responsáveis máximos a chorar sobre leite derramado. A consequência de tudo isto é que tomamos consciência de que só podemos confiar em nós mesmos para nos tentarmos proteger ao máximo que pudermos. É triste, mas é assim. Resta-nos o confinamento para cumprir o mais escrupulosamente possível.
 
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 25 de Janeiro de 2021

sábado, 23 de janeiro de 2021

O fecho da Central de Sines e a nossa electricidade caríssima

 O Prof. Clemente Pedro Nunes explica assim as verdadadeiras razões para a EDP fechar a Central de Sines como ministro do Ambiente a bater palmas:

«A EDP quer fechar a central de Sines porque esta tem de enfrentar as FIT concedidas pelo Governo Sócrates a 7000 MW de potências elétricas intermitentes, eólicas e fotovoltaicas, e que têm a capacidade legal de a expulsar do mercado.

Sim, a eletricidade produzida a menos de 40 euros/MWh pode ser expulsa do mercado para o consumidor ser obrigado a pagar 380 euros/MWh de eletricidade produzida através duma FIT duma central fotovoltaica!

E, sem clientes, o que pode fazer a central de Sines?

Ou para, funcionando num regime de para-arranca ruinoso, ou reduz a operação, deixando de fornecer eletricidade à rede até chegarem de novo as “horas de ponta”.

Em qualquer dos casos, o resultado é também um desastre em termos do aumento das emissões de CO2.

Até 2019, a central de Sines beneficiava dum CMEC, que é um mecanismo contratual que garante que quem dele beneficie tem sempre uma rentabilidade muito atrativa, através duma compensação no final do ano.

Assim, a EDP não estava preocupada porque tinha a certeza de que, no final do ano, iria sempre ter um lucro garantido, mesmo que a respetiva exploração tivesse pesadas perdas devido à concorrência desleal das FIT.

A partir de 2019, e já sem os CMEC, a EDP passou a perder dinheiro com a central de Sines, “massacrada” pelas FIT concedidas às potências elétricas intermitentes.

O que se devia fazer era corrigir o disparate das FIT atribuídas às potências intermitentes.

Ou seja, negociar a alteração das FIT para que estas não tenham o “poder de destruir quem produz eletricidade em regime de mercado”.

Em circunstâncias normais, seria isso que a EDP deveria ter solicitado ao Governo.

Mas como a EDP foi, desde 2005, a grande defensora das FIT atribuídas a potências elétricas intermitentes, não podia vir agora destruir a base da sua campanha mediática.»

Prologue

Maddy Prior Steeleye Span mother and child

Vacinação em Portugal: A ficção e a realidade

 

Em 21 de Dezembro a conversa era esta:
 
«Em Portugal será possível vacinar contra a covid-19 até 75 mil pessoas por dia

Francisco Ramos, coordenador da task force criada pelo Governo para gerir o plano de vacinação contra a covid-19, diz que Portugal deverá comprar mais do que os 22,8 milhões de doses que já estão acordados com as farmacêuticas nos próximos meses.»

Até hoje a média diária é inferior a 8.000. A ficção e a realidade .

Também nisto devemos ser os melhores do mundo.

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

A nossa verdadeira desgraça

 Isto, relativo a 2019 portanto antes da pandemia, reflecte a nossa produtividade. 

E vai estar assim ou ainda pior depois da pandemia passar.

É fruto de dezenas de anos de governação socialista com excepção apenas do governo Passos Coelho sob as ordens da troika por causa do desnorte de Sócrates e todo o o PS.




COVID/NOTÍCIAS

 De acordo com Universidade de Oxford, Portugal é, neste momento, o segundo país do mundocom mais novos casos por milhão de habitantes. 

Certamente, vai ficar tudo bem, mas até lá chegar está tudo mal.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

SAGRES: SÍMBOLO E HISTÓRIA

 

Uma das marcas mais conhecidas de Portugal em todo o mundo chama-se NRP (Navio da República Portuguesa) Sagres e é um veleiro majestoso que serve de navio-escola à Armada Portuguesa. Todos os anos os cadetes da Escola Naval e futuros oficiais de Marinha embarcam na Sagres para durante uns meses, em condições reais de mar, treinarem e tomarem contacto real com a vida no mar.

Para além disso a Sagres serve muitas vezes de representação portuguesa no estrangeiro. Pessoalmente lembro-me, em particular, da participação da Sagres nas comemorações do bi-centenário dos EUA em 1976, juntamente com muitos outros navios de todo o mundo, em que o rio Hudson foi palco de uma magnífica manifestação festiva náutica. A Sagres, com a seu velame branco ostentando as cruzes de Cristo a vermelho distinguia-se orgulhosamente no meio das centenas de embarcações envolvidas.

Sendo um navio-escola, o seu lema é o da Escola Naval - «TALANT DE BIEN FAIRE» que vem do século XIV e
do início dos descobrimentos, significando VONTADE DE BEM FAZER e não capacidade ou talento para tal, como apressadamente muitos dizem, não notando na letra «a» da palavra «talant».


A Sagres tem igualmente participado dignamente ao longo dos anos em numerosas regatas de veleiros, sempre com classificações de altíssimo nível e vitória em muitas delas. É tradição que as Marinhas de Guerra possuam veleiros servindo como navios-escola, todos eles de grande beleza que usualmente participam nessas regatas. Lembro-me, por exemplo, do «Amerigo Vespucci» da Marinha Italiana, do «Juan Sebastián de Elcano» da Marinha Espanhola, do «LIBERTAD» da Marinha Argentina, do «Eagle» da Guarda Costeira Americana e do «Tovarisch» (camarada em português) da antiga Marinha Soviética, entre outros. Como é natural, nas regatas de veleiros os motores vão selados para não serem utilizados mas curiosamente, entre os marinheiros das outras armadas, o «Tovarisch» era mais conhecido por “motorisch” pela utilização ilegal dos motores para que fosse possível à respectiva guarnição regressar a casa bem classificada, evitando dissabores das autoridades políticas. Toda a gente sabia e ninguém levantava ondas por tal facto, por camaradagem entre marinheiros.

A Sagres tem uma história que muitos portugueses desconhecem. Foi construída na Alemanha em Hamburgo em 1937, sendo o terceiro de uma série de três navios construídos por encomenda da Marinha Alemã. Recebeu o nome «Albert Leo Schlageter» e, no fim da guerra, foi entregue aos Estados Unidos que, por sua vez, o cederam ao Brasil onde navegou sob o nome «Guanabara». Em 1961 foi adquirido por Portugal para substituir a antiga Sagres que já não se encontrava em condições de cumprir os seus objectivos como navio-escola. Foi assim que, em Janeiro de 1962, o actual NRP Sagres foi aumentado ao efectivo dos navios da Marinha Portuguesa. Como curiosidade, os outros navios gémeos da Sagres construídos em Hamburgo tiveram como destino um, a União Soviética – «Tovarisch» e o outro os EUA – «Eagle».

O primeiro Comandante da Sagres chamava-se Silva Horta, era na altura Capitão-tenente e tinha sido igualmente o último comandante da anterior Sagres, tendo sido um Oficial distintíssimo da Marinha Portuguesa que viria a ser Almirante e exerceria ainda altos cargos na Marinha e na vida civil e política do país. A ida da primeira guarnição portuguesa para aparelhar convenientemente a Sagres e trazê-la na sua primeira viagem para Portugal revestiu-se de contornos trágicos, de que tomei conhecimento em primeira mão por um dos membros dessa guarnição, nessa altura Sargento, e com quem vim a trabalhar num navio quando prestei serviço militar obrigatório na Marinha, era ele já Oficial. O avião da PanAir que os transportou para o Brasil despenhou-se numa floresta brasileira e, das 88 pessoas a bordo, apenas sobreviveram 36 entre as quais os marinheiros portugueses que, por sorte, viajavam na cauda do avião que ficou inteira. Silva Horta comentaria a sorte que teve porque, à saída de Lisboa uma passageira lhe pediu para trocar de lugar, tendo perecido no acidente. Mas as circunstâncias do acidente não ficaram por ali. Os militares portugueses, alguns com ferimentos graves, ao verificarem que o avião poderia explodir por estar a arder, o que de facto veio a acontecer, retiraram com grande dificuldade todos os sobreviventes para longe do aparelho, muito antes de chegar qualquer socorro. A descrição vívida que o Tenente Custódio me fez do acidente, queda e posteriores acontecimentos é algo que não se esquece facilmente.

Depois de tudo, a nova Sagres largou do Brasil em 25 de Abril de 1962, pela primeira vez com a bandeira portuguesa, chegando a Lisboa em 23 de Junho após escalas em Recife, Mindelo e Funchal.

A Sagres é hoje, provavelmente, a única memória viva do país que já fomos, nos séculos XV e XVI, em que a nossa Marinha era a maior e mais importante do mundo. Não devemos ter saudosismos estéreis mas também não devemos ter vergonha de um passado em que fomos capazes de mostrar ao mundo a sua verdadeira dimensão.

E, como dizia o Almirante Silva Horta, «Um navio de vela tem muita beleza própria, não se desactualiza e é o único que pode representar, sem ser objecto de comparações melindrosas, a pequena Marinha de um país pequeno, num porto de um qualquer país, grande e poderoso». Longa vida à Sagres e aos seus marinheiros que hoje contam com mulheres, prova da evolução da nossa Marinha e de um Portugal que hoje tem que se afirmar já não lá longe, mas junto dos povos de quem saiu desde o seu início, na Europa.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 18 de Janeiro de 2021