As alterações que estão a
acontecer em todo o mundo, surgidas após o fim da chamada “guerra fria” que, bem
vistas as coisas, já acabou há trinta anos mas também da globalização que se
lhe seguiu e da velocidade com que a tecnologia informática toma conta da
economia e do nosso dia-a-dia, sugerem cada vez mais que devemos adoptar uma
postura conservadora perante a realidade.
A economia sofreu uma
“financeirização” que se traduz num peso crescente do sector financeiro,
nomeadamente da banca de investimento, que se afastou há muito das necessidades
de financiamento da restante economia para viver de si e para si. E mal se
compreende que, perante dificuldades que são da sua própria responsabilidade, a
banca seja hoje em dia sistematicamente “salva” pelos impostos dos cidadãos,
numa demonstração obscena de “privatização dos lucros e socialização dos
prejuízos”. Trata-se de uma das áreas em que é cada vez mais aconselhável adoptarmos
uma atitude defensiva, com a noção de que as transformações em curso na banca
não estão a trazer benefícios para os cidadãos na sua vida, antes pelo
contrário.
Mas as actividades
económicas também estão a trilhar caminhos que não são os melhores, favorecendo
o desperdício com a generalização do “usar e deitar fora”. Tal é perfeitamente
visível no vestuário em que uma poderosa indústria de marketing leva os
consumidores a comprar sucessivamente peças que rapidamente deixam de se usar
para substituir por outras a que rapidamente acontecerá o mesmo. As
necessidades são artificialmente criadas, criando mercados que de outra forma
nem existiriam. A roupa de qualidade feita para durar é substituída por roupa
comprada à tonelada na China e outros países do Oriente que mal pagam aos operários,
muitas vezes crianças. A transição das lojas de rua para os shoppings que, a
meu ver erradamente, estão abertos todos os dias da semana, ajudou a este
efeito nefasto para toda a gente, excepto para os negociantes deste tipo de
roupa que, rapidamente, atingem o patamar das maiores fortunas do mundo.
E o ambiente também sofre
com esta evolução. O desperdício gigantesco gerado por este tipo de economia é
um peso morto que cada vez custa mais a fazer desaparecer. A chamada “economia
circular” é uma designação simpática para algo que sempre se fez, quando as
dificuldades económicas eram gerais e era preciso poupar e fazer render tudo,
como as pessoas das aldeias bem faziam desde há milénios. A recuperação do
conceito, com novas roupagens, é positiva se acompanhada por uma efectiva
consciencialização ambiental e não for tomada como mais uma nova forma de
manipulação.
O ambiente em que a
humanidade se desenvolveu e cresceu já não tem nada a ver com o que era e isso
deve-se, essencialmente, à acção do homem. A obrigação de todos nós, dentro das
nossas possibilidades, é tentar que as gerações vindouras venham a ter, pelo
menos, a qualidade ambiental que recebemos; a apropriação da defesa do ambiente
por parte de algumas posições ideológicas é mais uma das contradições do nosso
tempo, que temos de denunciar porque contrária a toda a prática efectiva, como
foi possível verificar pelo altíssimo grau de poluição ambiental existente em
toda a Europa oriental aquando da libertação democrática.
A revolução das tecnologias
de informação em curso pode significar uma das maiores ameaças à liberdade
individual. As redes sociais e a Google parecem muito simpáticas mas, às
escondidas, já sabem mais sobre nós, os nossos hábitos e as nossas necessidades
do que nós próprios. E transformam essa informação em dinheiro, para eles,
claro, enquanto nos vão transformando em marionetas formatadas e controladas à
distância.
O respeito pelo passado
significa preocupação e também respeito pelos que virão depois de nós. Não
podemos ter complexos relativamente à denúncia do que está actualmente
terrivelmente mal e que está a estragar o que havia e ainda há de bom.
E será a Cultura, que não
tem a ver com a poderosa indústria do entretenimento nem com a massificação do
turismo, que nos dará as chaves da lucidez perante os actuais desafios, que não
podem ser enfrentados com as dicotomias políticas a que estamos habituados, porque
transversais à sociedade.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 17 de Junho de 2019