segunda-feira, 15 de março de 2021

Pandemia e solidão

 


É sabido que, para alguém se tentar passar despercebido ou mesmo se esconder, a melhor maneira de o conseguir é no meio de uma multidão em vez de um lugar deserto. Progressivamente, ao longo dos últimos anos, a internet veio acolher milhões e milhões de pessoas nas chamadas redes sociais, de onde é cada vez mais difícil fugir dada a sua capacidade de substituir os meios de comunicação clássicos e a possibilidade que oferece a toda a gente de participar comentando ou criticando aquilo que vê. Isto é feito sem filtros, o que transmite a sensação, apenas aparente, de participar em algo de concreto. Podemos mesmo afirmar que a multidão está hoje nas redes sociais, com consequências sérias para a sociedade a vários níveis e também para cada indivíduo por si mesmo que, tantas vezes, acredita no anonimato da sua participação nas redes e em passar despercebido. Na realidade, ao navegar vai cedendo dados para um mar de informação comprada e vendida por valores verdadeiramente colossais que está a retirar às televisões, às rádios e à imprensa escrita a publicidade de que sempre viveram, com a agravante de que a maior parte da informação que circula não é paga a quem a produz.

Contudo, esta nova multidão cibernética é, em grande parte, composta por pessoas que, quando desligam o computador ou o telemóvel, se vêem na sua realidade tantas vezes pautada por uma enorme solidão. A internet tomou conta da sua vida, quer para a informação ou para o lazer quer, sobretudo, para os contactos e relações inter-pessoais. A realidade do dia-a-dia transformou-se numa infindável sucessão de sessões de recepção de dados, sem dádiva de nada, sem partilha de nada de concreto.

A pandemia que atravessamos veio acentuar esta situação que já vinha em crescendo, de uma forma impressionante, alastrando-a a novos estratos sociais e etários. O tele-trabalho confina trabalhadores em casa, ligados com a empresa através do comutador; desde a falta de contacto humano com colegas ao abuso de horas de serviço em que horários diários e até fins-de-semana se diluem no dia dos trabalhadores, até à circunstância de se ter os filhos em casa, eventualmente com aulas pela internet, tudo contribui para um desfazer da vida «normal» e para uma situação de isolamento do exterior.

As famílias ficaram separadas. Avós não visitam filhos e quase não acompanham o crescimento dos netos que, por sua vez, crescem sem aquele equilíbrio educacional que os avós sempre proporcionam. As habituais visitas entre famílias amigas há mais de um ano que estão suspensas, fazendo-se o relacionamento por telefone ou, no melhor dos casos, por tele-conferência. Aquelas conversas e mesmo discussões que são a base da construção de amizades, solidariedades e mesmo de cumplicidades deixaram de existir.


Crianças e adultos «ligados» à net durante a maior parte do dia não fazem o necessário exercício físico, não praticam um inter-relacionamento emotivo pessoal que lhes permita um equilíbrio psicológico. São solitários em construção, se não o são já mesmo.

É sempre perigoso e delicado fazer generalizações, mas penso não ser abusivo se disser que os portugueses são usualmente tidos como sendo de uma grande afabilidade não sendo contudo, muito alegres e expansivos, como outros povos vizinhos. Não é, certamente, por acaso que o fado é a nossa música mais característica. É por isso que um ano inteiro de confinamento obrigatório em cima das nossas características próprias não pode deixar de vir a deixar sequelas na nossa sociedade, precisamente num país que, antes da pandemia, já era conhecido por ser dos que mais anti-depressivos consumia por habitante. Um exemplo de abuso notório no tratamento do que se passa é a notícia em letras garrafais de há poucos dias dando nota de que a GNR tinha acabado com um convívio ilegal de jovens na Mata do Bussaco: vai-se a ver e tratava-se de um encontro de cinco jovens naquele local ao ar livre. Será que o comando local da GNR não tinha mais nada que fazer do que alardear uma situação daquelas?


A solidão provocada terá, contudo, implicações muito mais sérias naqueles que têm as suas personalidades em construção, isto é, nas crianças e jovens. Não vejo preocupações com isso, mas é a razão pela qual as escolas devem (têm de) ser libertadas, em definitivo, o mais urgentemente possível para retomarem a educação. Para tal, será necessário que se adoptem medidas sanitárias concretas e caras para com as comunidades educativas? Pois que se tomem e com a maior urgência!

Sobre os perigos da actual situação, relembro o filósofo Carl Jung: «A solidão é perigosa e viciante. Quando você se dá conta da paz que existe nela, não quer mais lidar com as pessoas».
 
Texto publicado originalmente no Diário de Coimbra
Fotos recolhidas na Net; se tiverem direitos de autor, agradeço que me informem para serem retiradas

segunda-feira, 8 de março de 2021

Música para a ansiedade

 


Que o Papa Francisco é uma personagem brilhante do nosso tempo, aliando uma inteligência arguta a uma simplicidade desarmante é algo que todos percebemos desde que ocupou a cadeira pontifícia, como Bispo de Roma. Há poucos dias mostrou-nos mais uma sua faceta com a seguinte frase: "A minha ansiedade está bastante controlada. Quando me deparo com uma situação ou tenho de enfrentar um problema que me causa ansiedade, eu ataco-a. Tenho vários métodos para o fazer. Um deles é ouvir Bach". Sendo como é, no seu caso sem qualquer dúvida, um homem de Fé, o Papa Francisco tem certamente a felicidade de ter no seu coração e no cérebro as ligações divinas que lhe permitirão encontrar meios para encarar os problemas que todos os dias se lhe depararão e que grandes serão alguns deles, dada a dimensão da casa que governa. E, no entanto, tem a humildade de reconhecer que um dos métodos para enfrentar as dificuldades é inteiramente humano, recorrendo à satisfação que a beleza da arte transmite, no caso a música de um homem, que por acaso até era protestante, mas que dizia que compunha para maior glória de Deus.

Homem esse, do mais comum que se possa imaginar que, como se costuma dizer, tinha uma catrefada de filhos, que gostava de comer e beber bem e que, muito simplesmente, vivia de compor música para acompanhar as celebrações do Domingo seguinte ou da festa litúrgica importante que se seguia. E é assim que temos as suas Cantatas, Missas e as suas Paixões, mas também os Concertos de Brandeburgo as Sonatas e Partitas, para além de muitas outras obras que o seu cérebro produzia em catadupa, para além de ele próprio as interpretar de forma virtuosa em diversos instrumentos. Agradeçamos ao compositor Felix Mendelssohn que iniciou no século XIX a recuperação da música de Bach então praticamente esquecida, para ser hoje tão amada e considerada no mundo inteiro que o compositor deixou de ser apenas representante do período Barroco para ser um dos maiores, se não o maior, da História da Música.


E não é que, sendo eu o mais comum e mais anónimo dos homens me acontece encontrar aqui um ponto de contacto com o Papa Francisco? Também eu, quando alguma ansiedade me ataca tenho o hábito, já antigo, de ouvir Bach. Adianto mesmo quais as obras do grande compositor da época barroca que uso com esse fim: a cantata BWV 106, dita Actus Tragicus ou, quando o tempo abunda mais, a Paixão Segundo S. Mateus. Já agora, partilho haver outro compositor, mais moderno, que se juntou a Bach naquele papel de ansiolítico auditivo privado que é Mahler em várias das suas composições, nomeadamente a Quarta Sinfonia e alguns Lieder maravilhosos, em particular, por Jessie Norman ou Dieter Fischer Dieskau. Dieskau, cuja audição me faz sempre recordar o excelente amigo que já não está entre nós, o Eng. Azevedo Gomes, com quem mantinha as mais amistosas discussões sobre qual a mais perfeita Paixão de Bach, sendo que ele preferia a segundo S. João, por mais intimista.

Por que caminhos nos leva a música, mesmo que seja apenas falar sobre ela sem a ouvir, embora o esteja a fazer neste momento, através de um dos novos meios que vieram transformar por completo a forma como a ouvimos. O “streaming” através dos vários fornecedores do mercado que hoje já oferecem uma qualidade de som apreciável, bem como a possibilidade de ouvir emissoras de rádio pela internet, permite-nos libertar daquilo de que gostamos menos, através da audição de emissões especializadas nos mais variados tipos de música ou mesmo em compositores ou intérpretes específicos. No caso concreto, delicio-me com Glenn Gould e a sua interpretação ao piano das Variações Goldberg, lá está, de Bach, sem ter que me maçar a trocar de CD no aparelho, já que se controla tudo pelo écran do telemóvel que, neste caso sim, se pode chamar verdadeiramente inteligente.


Há muito tempo que se diz que ouvir 5 minutos de Mozart de manhã é a melhor garantia de um dia feliz. Neste caso simples tratar-se-ia de uma terapêutica preventiva, mas muitos cientistas já mostraram que a Música pode mesmo ter fins terapêuticos, desde o princípio até ao fim da vida, nas mais diversas condições. A musicoterapia pode ser usada nos cuidados paliativos ao promover o relaxamento e ajudando a diminuir a dor, podendo ainda ser benéfica na reabilitação da motricidade e em outros contextos que necessitem de apoio emocional. O conhecimento, ainda que empírico, dos efeitos benéficos da música em contexto de saúde não é uma novidade dos nossos dias A tradição hebraica diz que David tocou harpa para livrar o rei Saul do um espírito e os gregos, certamente não por acaso, tinham Apolo como deus da música e da medicina.

A Música é muitas vezes classificada como a arte suprema. Mas, a verdade é que, tal como outras formas de arte, desde a Literatura à Pintura e à Escultura, a sua fruição associa completamente a razão e a emoção, os dois lados da moeda que, de acordo com o cientista António Damásio caracterizam e explicam verdadeiramente a inteligência humana.
 
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 8 de Março de 2021
 

segunda-feira, 1 de março de 2021

Stefan Zweig, artista sem concessões

 


De quando em vez, sem que pareça haver uma razão concreta para tal, pode ser um odor, a passagem num certo local, sei lá o quê, vem-nos à memória algo absolutamente corriqueiro como a compra de um livro ocorrida há dezenas de anos. Se essa compra tiver sido numa loja de praia que até vendia livros e que já não existe por ter dado lugar a um conjunto chocante de falta de gosto de prédios de minúsculos apartamentos de praia para emigrantes e o livro também tiver ficado na memória, estão juntos motivos mais que suficientes para surgir uma crónica algo diferente. E se isso tudo servir para desviar o espírito dos tempos que correm, ainda melhor. O autor do tal livro é Stefan Zweig, o seu título, «24 horas na vida de uma mulher», e ficou-me na memória desde essa altura em que o li, diga-se na juventude dos vinte anos, dando gosto a revisitação. Obra aparentemente simples, mas de uma densidade psicológica enorme e demonstrativa da capacidade de Zweig de analisar as mais profundas emoções e sentimentos do ser humano.

Em Agosto de 1940 Stefan Zweig e a sua mulher Lotte Altmann viajaram de Nova Iorque para o Brasil pela primeira vez, regressando pouco tempo depois para residirem nesse país de que Zweig tanto gostou, tendo mesmo sido o escritor a dar-lhe o epíteto que lhe ficou colado: «Brasil, país do futuro».

Stefan Zweig era um austríaco de ascendência judaica, nascido em Viena em 1881 no seio de uma família de posses. A sua obra variada e extensa é testemunho do seu amor pela dignidade humana, do seu desejo de uma sociedade respeitadora da Liberdade, da noção da necessidade da Cultura para o desenvolvimento humano, bem como da sua admiração pelos autores das mais diversas artes.

Na obra «Momentos Estelares da Humanidade» Stefan Zweig aborda, em catorze episódios, aqueles que considerava serem dos momentos mais importantes da humanidade, numa escolha assim justificada:

«O que normalmente se desenrola devagar, de maneira sucessiva ou sincrónica, comprime-se num único instante que determina e decide tudo […] Procuro aqui evocar, a partir das mais variadas épocas e regiões, alguns desses momentos estelares; chamei-lhes assim porque, resplandecentes e inalteráveis como estrelas, brilham para além da noite do efémero.»

Nos dias de hoje, em que se elege como fundamental o que é tantas vezes ligeiro e inconsequente, impressionará o que Stefan Zwieg considerava verdadeiramente fundamental, como sejam a conquista de Bizâncio pelos turcos, a descoberta do oceano Pacífico por Núñes de Balboa, como surgiu o hino A Marselhesa, a história de amor que inspirou Goethe para a «Elegia de Marienbad» ou mesmo a crise que levou Handel a compor o seu «Messias», entre outros.


De entre as numerosas biografias que Stefan Zweig escreveu, e não esquecendo a de Romain Rolland, saliento a obra «Triunfo e Tragédia de Erasmo de Roterdão» sobre Erasmo de Roterdão, grande defensor do acesso à cultura: «Aquele que sabe sugerir aos homens um novo ideal, a fé no progresso moral da humanidade, torna-se o guia dos seus contemporâneos: Erasmo foi esse homem.». Publicada em 1934, anunciava os temores do escritor perante os totalitarismos que surgiam na Europa que todos hoje sabemos iriam em breve envolver o continente e a seguir o mundo inteiro numa tragédia inominável, consequência dos fanatismos contrários à tolerância e ao diálogo.

Nesse mesmo ano de 1934 Stefan Zweig exilou-se da Áustria prevendo o que se iria seguir após Hitler ter chegado ao poder na Alemanha no ano anterior com as suas políticas anti-semitas. Apesar de a religião não ter na sua vida um papel central e assumindo que apenas por acidente de nascimento os pais eram judeus, Stefan Zweig sabia que as suas origens e o humanismo e pacifismo que adoptava não seriam tolerados pela barbárie que se afirmava.

Sendo nessa altura já um dos escritores mais famosos e vendidos do mundo, passou a viver em Inglaterra, tendo obtido a cidadania britânica. Na sequência da invasão nazi da Europa, Zweig e a sua mulher foram para os Estados Unidos em 1940 estabelecendo-se em Nova Iorque por pouco tempo, dado que após a viagem ao Brasil em Agosto desse mesmo ano, decidiram estabelecer-se no país sul-americano em Petrópolis, perto do Rio de Janeiro. Já no Brasil escreveu a obra autobiográfica «O Mundo que Eu Vi» em que se mostra nostálgico perante um mundo e uma Europa desaparecida com a Primeira Guerra Mundial.


Face à hecatombe da Grande Guerra que não suportavam ver, Stefan Zweig e a sua mulher Lotte decidiram pôr termo à vida em 1942 com uma nota de despedida em que o escritor se explicou: «Deixo saudações a todos os meus amigos: talvez vivam para ver o nascer do sol depois desta longa noite. Eu, mais impaciente, vou-me embora antes deles».

George Steiner, que há pouco tempo nos deixou, ensinou-nos esta necessidade de luta constante pela cultura, pelo direito ao belo, pela complexidade das relações e pelo conhecimento e História, algo que se torna tão importante nos dias de hoje. Se há alguém por quem devemos ter respeito será por quem não suporta viver num mundo inimigo da cultura onde o materialismo e o fanatismo imperem. Por isso relembrar pessoas com Stefan Zweig, é tão importante.
 
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 1 de Março de 2021

Diana Krall - Crazy

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

«Sociedade dividida e democracia»

 Citando Joaquim Aguiar, no Jornal de Negócios:

«Uma sociedade dividida é estruturada por polarizações (antagonismos baseados em conflitualidades de tipo étnico, de tipo religioso ou justificados pelas interpretações da origem das desigualdades sociais, que produzem visões do futuro radicalmente distintas) que geram democracias instáveis e poderes políticos débeis. (...) 


Uma sociedade dividida por polarizações políticas configura um específico campo de possibilidades, que fica mais orientado para o distributivismo interno (para reduzir a conflitualidade) do que para a comparação competitiva com as outras sociedades e, menos ainda, para a preparação da defesa contra possíveis intenções externas de dominação. Uma sociedade dividida é uma sociedade virada para dentro de si própria. E a sua preferência pelo distributivismo implica que tenha uma grande tolerância ao endividamento, que pode mesmo evoluir para uma propensão natural, e à estagnação do seu crescimento económico, que aparece como o efeito natural dessa divisão polarizada da sociedade.

O campo de possibilidades de uma sociedade dividida, que é também um sistema político de poder débil, encontra o seu obstáculo intransponível quando chega ao fim a possibilidade de recurso ao endividamento de que depende para sustentar o distributivismo que usa para reduzir a conflitualidade - mas que não serve de nada se não conseguir escapar à estagnação do seu crescimento económico e dos seus indicadores de competitividade.»

Nos últimos anos temos assistido a uma polarização que traz à tona extremismos artificiais mas que marcam fortemente o ambiente político e social, com consequências evidentes no desenvolvimento económico.



segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Uma sociedade em mudança, mas para onde?

 


Sinal dos tempos: quando abro o jornal de manhã, vou directamente ao obituário verificar, sempre com alguma ansiedade, se entre os numerosos óbitos está o de alguém conhecido ou amigo. Essa secção, há poucas semanas, chegou a ocupar três páginas, andando agora normalmente pelas duas.

E, como é normal que suceda numa hecatombe desta dimensão com mais de duzentas mortes diárias em Portugal durante semanas, lá aparecem mesmo notícias do falecimento de pessoas apenas conhecidas, com quem nos cruzámos uma ou outra vez ao longo da vida ou mesmo com quem mantínhamos relações de amizade. O que se passa no cemitério do Alto de S. João em Lisboa que foi recentemente notícia na comunicação social é apenas um exemplo: uma nova secção de sepulturas aberta que levaria normalmente um ano a ser preenchida foi ocupada em 50% em apenas dois meses.

Os funerais que já por si são sempre para todos nós algo de penoso em que participamos por reverência para com a pessoa falecida ou para com os seus familiares transformaram-se em cenas de um irrealismo estranho.

O vulgar uso do telefone é outra dimensão da alteração dos relacionamentos. É a medo que se liga para alguém para saber como passa, tantas são as vezes em que do lado de lá nos respondem que «fui apanhado pelo bicho» e estou a ver em que dá.

Os casais jovens com filhos em idade escolar passam também por experiências difíceis. Ter os filhos em casa em permanência com «aulas» à distância, enquanto se trabalha em casa em regime do chamado tele-trabalho é uma experiência que até pode ter alguma graça durante uma semana mas que se torna um fardo difícil de suportar durante muito tempo.

A permanência absoluta das notícias sobre a pandemia nos telejornais é cansativa, causa ansiedade generalizada e muita confusão nas mentes. As notícias diárias sobre abusos e atropelos na vacinação que deveria ser um exemplo de dignidade e respeito dada a extrema urgência na sua realização não ajudam nada a que haja confiança generalizada no sistema. Espalha-se a noção de que o tão característico «desenrascanço» português se generaliza mesmo entre responsáveis em diversas áreas, da política à administração pública, privada e social.


Verifica-se a mais completa indefinição e mesmo confusão sobre o confinamento em áreas económicas. O facto de se poder levantar refeições completas em restaurantes de take-away exceptuando bebidas, incluindo uma simples garrafa de água, é algo que não lembra a ninguém. Tal como as únicas lojas que vendem livros que estão fechadas serem as livrarias também é algo de surreal.

As proibições. Claro que se têm que aceitar limitações aos contactos pessoais para evitar os contágios ao máximo. Mas uma sociedade democrática e liberal não pode aceitar essas proibições durante muito tempo sem que tal tenha consequências graves no seu funcionamento normal futuro. Algo que já é muito evidente nos dias de hoje é uma radicalização de posições pessoais a propósito de tudo e mais alguma coisa. Desde a política até às redes sociais, passando pelo simples contacto diário entre as pessoas, uma espécie de violência endémica parece vir à tona à mínima contrariedade. A substituição do milenar aperto de mão por uns murros, ainda que pacíficos, poderá ser muito mais significativa do que à primeira vista possa parecer.

E o medo, sempre o medo omnipresente. O medo que os portugueses têm entranhado no mais fundo do seu ser, depois de centenas de anos de Inquisição, e uns tantos de ditadura política de que só agora estávamos verdadeiramente a aprender a sair. Como não se sabe onde está escondido um bufo que nos denunciará, também o maldito vírus pode estar na maçaneta da porta de casa, no saco do supermercado, no teclado do multibanco ou no ar no interior do autocarro.

Só mesmo o medo de não conseguir mais uma vez umas migalhas explica que as associações empresariais não se levantem em força contra a nova vaga de obras públicas faraónicas para gastar a chamada «bazuca» de dinheiro oferecido pela União Europeia em vez de o utilizar para capitalizar as empresas endividadas até ao tutano e promover a competitividade. O Estado todo-poderoso que temos vira uma vez mais para dentro de si mesmo os dinheiros vindos de fora em vez de apoiar firmemente a economia portuguesa. Economia essa que gera os impostos que o Estado gasta e que estão longe de ser suficientes para garantir o funcionamento do Estado Social que todos queremos sem necessidade de pedir mais dinheiro estrangeiro para o financiar. E, não nos esqueçamos, o medo é o primeiro inimigo da Liberdade.
 
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 22 de Fevereiro de 2021
 

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Vacinas: prioridades

Tendo em vista este gráfico referente às mortes até 17 de Fevereiro, as prioridades de vacinação não deviam ser as idades, sem mais tretas?



Autárquicas em Coimbra

 Recordo os resultados das autárquicas de 2017.

Somando as candidaturas do PSD/CDS e Somos Coimbra são só 5.000 votos de diferença, à partida. Só.
Claro que o PSD, ao entregar a liderança a José Manuel Silva que nas anteriores eleições teve menos 7.000 votos está por um lado a reconhecer que sozinho não chega lá e por outro, em caso de vitória, a assumir não poder contabilizar a Câmara de Coimbra como sendo sua. Porque, na verdade, não será.
Claro que, para mim, o importante é a gestão da Câmara, para bem do Concelho e dos seus munícipes.



quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

REVERSO

 Este é o meu Reverso, herdado de meu Pai. É do princípio da década de 60.

Foi inventado na década de 30, há quase cem anos, pela casa Jaeger-leCoultre a pedido dos jogadores de jockey na Índia para ser encontrada uma solução que evitasse a quebra dos vidros dos relógios durante os jogos.

O modelo ainda hoje é fabricado com diversas declinações de tamanhos, materiais e tipos de máquina.