segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Da arte de manipular eleitorados



Foi Medina que deu o pontapé de saída. Contudo, percebeu-se bem, através da instantânea adopção da ideia pelo Governo, que a jogada tinha sido previamente concertada, já que Medina é apenas, e por enquanto, presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Trata-se de uma daquelas medidas que ficam bem a qualquer político, sobretudo a um ano das eleições legislativas. Teve ainda a vantagem de retirar de cena o acto falhado de António Costa ao prometer diminuir o IRS durante algum tempo àqueles jovens que emigraram durante os tempos da troika que regressassem ao país e que colheu críticas justas à esquerda e à direita.
Fernando Medina anunciou a medida como sendo uma “revolução no preço dos transportes públicos de Lisboa” para o que tinha garantido o apoio dos municípios da área metropolitana de Lisboa (pudera!), tendo logo adiantado que já tinha entregue o dossier a Costa e Centeno, esclarecendo ainda que o plano custará 65 milhões de euro anuais. Todos os anos, claro.
E quem pagaria esta despesa acrescida com os transportes públicos de Lisboa? Todos os contribuintes do país, de Bragança a Vila Real de Santo António, da Guarda a Peniche. É que Medina propôs a Costa que inclua as verbas necessárias já no próximo Orçamento de Estado que será apresentado até 15 de Outubro na Assembleia da República. E em que consiste a tal revolução no preço dos passes sociais? Apenas na definição de um preço máximo de 30 euros por mês no interior de Lisboa e de 40 euros para viagens dentro dos 18 municípios da área metropolitana. Poder-se-ia dizer que foi com coisas destas que Maduro começou, com os excelentes resultados que todos vemos trazidos pelo socialismo (a este chamam-lhe bolivariano) na Venezuela. Medina não se preocupou em fazer contas aos montantes dos descontos perante o custo dos bilhetes. Não, vai-se a eles e zás, aplica-lhe um preço máximo, que os atarantados dos portugueses de todo o país pagarão! Tal como pagam e continuarão a pagar um escandaloso imposto sobre os combustíveis, visto que o magnânimo Medina já estabeleceu como verdade insofismável que os passes revolucionários para Lisboa serão muito mais justos do que baixar os combustíveis para todos os (malandros residentes a mais de 50 km da fronteira, direi eu) que se deslocam de carro.
E, segundo Medina, porque é que os cidadãos optarão pelo transporte individual, em vez de se deslocarem nos transportes públicos? Segundo o autarca, por falta de resposta do sistema público de transportes. Perante a solução revolucionária que ele encontrou para o problema, não pude deixar de recordar a resposta fantástica de Álvaro Cunhal em 1974 quando, regressado há pouco do exílio no Leste, deu a sua justificação para os portugueses terem tantos carros com pintura metalizada: é que eram tão pobres que se viam obrigados a escolher essa pintura porque dura mais. Isto é, o cego irrealismo ideológico e a necessidade de lhe adaptar a realidade, são caminho directo para o disparate.
Na verdade, num tempo em que os cidadãos se apercebem todos os dias da descida da qualidade da oferta dos sistemas públicos de transportes em Lisboa, sejam rodo, ferroviários ou fluviais, a fuga para a frente à custa dos impostos de todos os portugueses é uma má solução, além de injusta. Medina e os seus apoiantes governamentais bem podem argumentar que são os alfacinhas e os tripeiros que pagam a maioria dos impostos porque, na realidade, 70% do IRS é pago por 9% dos contribuintes e 20% do total do IRS recolhido pelas Finanças vem daquele 1% com os rendimentos mais altos. Escuso de falar na imensa percentagem de contribuintes daquelas áreas urbanas que pura e simplesmente não pagam IRS e que beneficiarão daquela medida. Revolucionária, no dizer de Medina.
O que Medina e Costa não dizem é que, se o objectivo é atrair utentes para os transportes públicos, seria muito mais eficaz melhorar em qualidade e quantidade a oferta dos mesmos em Lisboa. Mas lá está, as cativações e a praticamente inexistência de investimento público não deixam seguir esse caminho que custaria centenas de milhões de euros. E, além disso, para que é que interessam a eficácia e a competência na gestão da coisa pública, quando é muito mais barato gastar umas poucas dezenas de milhões em subsídios que, ainda por cima, são muito mais eficazes na obtenção de votos?

sábado, 8 de setembro de 2018

Brasil

O estado a que chegou hoje em dia o grande país nosso irmão que é o Brasil é terrível e assustador.
Alguém se lembra da diferença para como estava o Brasil aquando da saída do Presidente Fernando Henriques Cardoso, isto é, antes da passagem pelo poder dos presidentes do PT, Lula e Dilma? É só comparar e ver as consequências dessa governação.

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Artemisia, mulher forte, artista maior



Pode-se dizer que foi no atelier de Caravaggio que tudo começou. Pintor que só muito depois do seu desaparecimento viria a ser conhecido como um dos maiores da História da Pintura, pela força e novidade da sua pintura, em vez de o ser pela vida agitada que levou.
Filha do pintor Orazio Gentileschi que trabalhou com Caravaggio, Artemisia nasceu em Roma em 8 de Julho de 1593. O pai cedo reconheceu em Artemisia um talento excepcional, tendo mesmo feito dela sua aprendiz, em vez de algum dos seus cinco irmãos rapazes, contrariando o que era normal nesse tempo. Artemisia foi muito além do seu pai na pintura, demonstrando ter assimilado melhor do que ele as inovações artísticas de Caravaggio, designadamente no realismo das formas humanas, muito em particular as femininas, bem como no contraste entre luz e sombra.
Sendo mulher, sentiu grandes dificuldades em ser aceite em ateliers, tendo sido violada aos 17 anos pelo seu tutor, o pintor Agostino Tassi, após o que se seguiu um julgamento que a terá marcado ainda mais do que o acto que lhe deu origem. Por essa altura mudou-se para Florença, onde pintou para o Doge Cosme II de Médici, tendo a sua obra sido rapidamente reconhecida e foi mesmo a primeira mulher a entrar na Academia das Artes do Desenho daquela cidade, apenas com 23 anos.
Artemisia Gentileschi afirmou-se pela sua Arte, sendo célebres os seus quadros onde aborda temas frequentemente de grande dramatismo, com mulheres fortes e insubmissas e cenas de confronto pessoal baseadas nas mitologias ou bíblicas. A pintora utilizou frequentemente o auto-retrato para representar as heroínas dos seus quadros, como é o caso do quadro que representa a mártir Santa Catarina de Alexandria. Por esse motivo, e pela temática muitas vezes abordada, durante muito tempo considerou-se que a sua obra tinha origem auto-biográfica com base na sua experiência pessoal quando, na realidade, a sua pintura releva muito mais da sua personalidade independente e do temperamento próprio. Ao longo da sua vida tratou sempre com grande firmeza dos aspectos económicos ligados à sua actividade, para além de não se ter eximido a ter relacionamentos com outros artistas e mecenas. Artemisia, ao contrário do que era regra nos séculos XVI e XVII, negociava ela mesma as suas obras, fazendo frequentemente a sua promoção junto dos maiores mecenas, por toda a Europa, nunca deixando de vincar a qualidade do seu trabalho. Quer nos aspectos profissionais e artísticos, quer nos aspectos da vida pessoal, foi sempre uma mulher muito à frente do seu tempo, demonstrando uma independência pessoal e uma modernidade notáveis.

O primeiro quadro que assinou é o conhecido “Susana e os Velhos” de 1610, tema abordado por muitos outros pintores ao longo da História, mas em que a jovem Artemisia consegue já transmitir sensações intensas, com grande dramatismo e violência, quer pelo temor da personagem feminina, quer pela maldade e amoralidade explícita dos dois velhos. Este quadro é anterior à violação de que foi vítima, demonstrando que a temática que abordou ao longo da vida não foi consequência desse facto, mas da sua escolha deliberada.
Depois de Florença, Artemisia Gentileschi voltou a Roma, tendo ainda vivido e trabalhado em Veneza, Nápoles e em Inglaterra a convite do Rei Carlos I, regressando definitivamente a Nápoles que nesse tempo pertencia à Coroa d Aragão, onde terá morrido por volta de 1656.
Num mundo artístico que era então totalmente masculino, Artemisia Gentileschi afirmou-se por si própria, estando a sua obra ao mais alto nível, devido à sua genialidade. Hoje em dia, mercê da sua afirmação como mulher num mundo de homens, a que se junta a provação sexual por que passou enquanto jovem, muitos procuram ver traços feministas na sua obra. Contudo, tal consideração significa uma redução da sua obra, que se impõe definitivamente ao lado dos maiores artistas de sempre, independentemente do seu sexo.
As obras de Artemisia Gentileschi, podem ser admiradas nalguns dos melhores museus do mundo, como a “Alegoria da Pintura” em Roma na Galleria Nazionale di Palazzo Barberini, ou o brutal “Judith e Holofernes” em Nápoles no Museo Nazionale di Capodimonte, e ainda o impressionante “Yael e Sísera” no Museu de Belas Artes de Budapeste, ou o definitivo “Suzana decapitando Holofernes” na Galleria degli Uffizi, em Florença.

Angela Gheorghiu - Lascia ch'io pianga - Rinaldo

sábado, 1 de setembro de 2018

Carta do leitor no Diário de Coimbra

Como se costuma dizer, nem sempre, nem nunca.
Mas é agradável verificar que os nossos escritos são compreendidos. Mais isso do que uma auto-satisfação sem sentido só por se saber lido.
Agradeço os comentários simpáticos de João Boavida.