quinta-feira, 5 de agosto de 2021

A PONTE DO «JÁ AGORA»

 Uma das primeiras coisas que me ensinaram num grande grupo económico quando lá trabalhei há uns anos, foi que ali não havia »obras do já agora». Durante as obras era proibido ir metendo mais isto ou aquilo, supostamente para melhorar. Exactamente o contrário do que acontece no Estado, Autarquias incluidas.

Vejam só esta notícia recolhida hoje no jornal e a calma olímpica com que um presidente da Câmara justifica um aumento de 50% nos custos.

Assim , nunca iremos lá.



segunda-feira, 2 de agosto de 2021

HEROÍNAS VERDADEIRAS

 


Lembro-me bem do espanto colectivo que aquela menina de 14 anos provocou por todo o mundo através da transmissão directa pelas televisões, entre nós e infelizmente ainda a preto e branco, a partir de Montreal no Canadá aquando dos Jogos Olímpicos de 1976. A ginasta romena Nadia Comăneci atingia a perfeição na sua actuação nas barras assimétricas, sendo a primeira da história dos jogos a obter a nota 10. Não se ficando por aí, a ginasta acabou por conquistar três medalhas de ouro e ainda mais seis notas 10 durante aqueles jogos, tendo estado presente nas seis finais em que tal era possível.

A sua execução dos exercícios, em particular na trave, era demonstrativa de uma forma absolutamente natural de se mover no aparelho que tanto medo provoca aos atletas vulgares, algo que com Nadia pura e simplesmente não acontecia. Essa atitude foi uma constante em toda a sua carreira de ginasta, desde a idade de seis anos em que chamou a atenção pelo seu completo à-vontade sobre os aparelhos. Durante a sua carreira como atleta olímpica, Nadia Comăneci conquistou nove medalhas incluindo cinco de ouro, além de quatro medalhas mundiais e doze europeias. Recordo ainda esses jogos de Montreal quando o nosso grande Carlos Lopes, dando tudo o que tinha, perdeu nos últimos metros a final dos 10.000 metros contra Lasse Viren, para vir a vencer a maratona, oito anos mais tarde, em Los Angeles para orgulho e entusiasmo de todos os portugueses.


Já não tenho uma memória tão vívida da actuação de outra grande ginasta, a soviética Olga Korbut, nos Jogos Olímpicos de Munique em 1972, talvez porque esses jogos ficaram impressivamente marcados pelo massacre levado a cabo por terroristas palestinianos sobre atletas israelitas. Mas nesses jogos e apenas com 17 anos, um pouco mais de 1,5m e 40 kg de peso, Olga Korbut deu nas vistas pelas suas extraordinárias actuações acrobáticas, recebendo três medalhas de ouro e a prata nas barras assimétricas. Há mesmo dois movimentos na ginástica acrobática inventados por Olga Korbut e que por isso levam o seu nome, um nas barras assimétricas e outro na trave. Também Korbut manifestava uma total naturalidade em cima dos aparelhos enquanto executava movimentos de extraordinária dificuldade e enorme perigo, tanto maior quanto mais espectaculares e motivadores de entusiasmo do público. Nesses jogos de Munique, um extraordinário atleta português, Fernando Mamede, mostrava quanto a condição mental pode afectar as prestações físicas, não sendo capaz de ultrapassar o stress que sempre acompanha a competição desportiva a alto nível, não o deixando obter as suas marcas habituais de treinos. Como prova da sua real categoria, ficou o recorde mundial dos 10.000 m obtido em Estocolmo em 1984.


Em Julho de 2021 realizaram-se finalmente em Tóquio os Jogos Olímpicos que deveriam ter tido lugar no ano anterior, adiados por causa da pandemia COVID-19. E, na equipa norte-americana de ginástica artística está incluída Simone Biles, já consagrada como a melhor ginasta de sempre. Biles, de 24 anos de idade, 1,42m e menos de 50 kg de peso é a atleta mais medalhada de sempre na modalidade, em campeonatos mundiais e jogos olímpicos, num total de 25 medalhas, sendo 19 delas de ouro. Nos jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016, os únicos em que tinha anteriormente participado, subiu 5 vezes ao pódio, para receber 4 medalhas de ouro e uma de bronze. Foi a primeira ginasta a ganhar três Campeonatos Mundiais consecutivos no individual e é a única a ter o seu nome em quatro movimentos tendo sido, há poucos meses, a primeira mulher a conseguir fazer um salto (Yurchenko Double Picke) no cavalo, algo que até então apenas alguns homens conseguiram executar. A sua capacidade física extraordinária permite-lhe executar movimentos quase impossíveis de imaginar, com uma elegância, uma destreza e um domínio do corpo unanimemente considerados pelos especialistas como a perfeição.

E no entanto…em Tóquio Simone Biles sentiu, logo nas primeiras actuações ainda nas eliminatórias, que “quando estava no ar, não sabia onde estava”. E desistiu da competição. De facto, aqueles exercícios realizados a uma velocidade vertiginosa exigem, não só um completo e perfeito controlo muscular, mas também uma atitude desprendida perante a sua concretização. E terá sido este aspecto que falhou a Simone Biles. Já muito se disse e escreveu pelos mais diversos especialistas para tentar explicar o sucedido, falando-se mesmo em saúde mental. Penso que a realidade é muito mais simples. Aquelas grandes ginastas Olga Korbut e Nadia Comăneci tinham 14 anos aquando dos seus maiores sucessos na ginástica. Tal como em outros desportos que necessitam de controlo físico e mental extremos, há um limite de idade (pessoal) a partir do qual o cérebro tem que tratar de muito mais informação do que quando se é praticamente criança. E, seja qual for o motivo da desistência de Simone Biles, não se trata de um fracasso, uma vez que ela já não tem nada a provar. E sim, é uma verdadeira heroína. Não só pelos sucessos, mas também por como lidou com as suas falhas.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 2 de Agosto de 2021

Imagens recolhidas na internet

Jonas Kaufmann - Turandot, Atto III: "Nessun Dorma"

segunda-feira, 26 de julho de 2021

A MANGA

 


À partida o título desta crónica poderá, na sua simplicidade, nada significar para os leitores do Diário de Coimbra. Contudo, tanto por mim próprio como por muitos outros clientes, é assim que carinhosamente é designado um restaurante de Coimbra cujo nome completo é “Jardim da Manga”.

Como são as pessoas que fazem as instituições, não é possível a um cliente já com alguma antiguidade falar da “Manga” sem referir quem faz o restaurante. Dirigido desde os anos 70 pelo Sr. Xico de saudosa memória que nos deixou há poucos anos, está hoje sob a responsabilidade dos filhos Pedro e Francisco que, com o resto do pessoal de que saliento a excelente cozinheira Sra. D. Judite e o Sr. Miguel na recepção personalizada, sabedora e inexcedível de simpatia aos clientes, souberam dar continuidade a esta casa marcante da gastronomia conimbricense. A ementa que varia todos os dias responde aos mais diversos gostos, mas pessoalmente não posso deixar de salientar o cozido à portuguesa, o cabrito assado, os crepes de bacalhau e a tarte de laranja. Tudo o que descrevi acima, e muito mais, permitiu a criação de um ambiente quase familiar que proporcionou, ao longo dos anos, a criação e manutenção de diversas mesas quase constantes, de diversos grupos profissionais, associativos, familiares e mesmo institucionais que frequentam a “Manga” como se de a sua cantina se tratasse. Por isso mesmo, a “Manga” não é um segredo bem guardado de Coimbra, mas um restaurante bem conhecido mesmo fora de portas.

Mas a “Manga” tem ainda algo de distintivo. A vista privilegiada de que se usufrui, quer no interior, quer na esplanada, é a de uma obra de arte que é classificada como Monumento Nacional desde 1934 e que dá o nome ao restaurante. De facto o restaurante está localizado por trás do interessante e belíssimo conjunto arquitectónico que actualmente tem a designação de “JARDIM DA MANGA”. Para descrever esta obra, socorro-me de um reconhecido especialista da História e da Arte Conimbricense, o meu estimado Amigo Doutor Pedro Dias que, na sua obra «Coimbra, Arte e História» propõe um Roteiro de Coimbra que inclui precisamente o “Jardim da Manga”. 


É assim que ficamos a saber que se trata de uma construção renascentista datada de 1533, construída portanto durante o reinado de D. João III, da autoria de João de Ruão que traçou o plano e executou os baixos-relevos para o interior das quatro capelas, tendo a obra de pedraria ficado a cargo de Pero de Évora, Diogo Fernandes e Fernando Luís. A sua construção foi promovida pelo Prior do Mosteiro de Santa Cruz, Frei Brás de Braga e localizou-se num dos três claustros do Mosteiro. Ainda de acordo com o Prof. Pedro Dias, trata-se de “uma das primeiras obras arquitectónicas inteiramente renascentistas feitas em Portugal e alia-se a este facto o seu valor simbólico, e a sua estrutura evocativa da Fonte da Vida, a que não terá sido estranha a intervenção de Frei Brás de Braga”.

Ainda de acordo com os professores Pedro Dias e Nelson Correia Borges, citados a partir do livro «Património Edificado com Interesse Cultural – Concelho de Coimbra editado pela Câmara Municipal, “o complexo do jardim é formado por um conjunto de construções circulares, interligadas entre si e rodeadas por pequenos tanques, tendo no centro um templete de planta circular, com um tanque ao centro…Este conjunto representa a Fonte da Vida, com o templete central a representar a Eternidade, ao qual dão acesso escadas com sete degraus, que simbolizam a Caridade, a Graça e o Espírito Santo, enquanto que os oito tanques unidos em pares simbolizam os quatro rios do paraíso e os jardins o próprio paraíso”.


Trata-se de uma obra arquitectónica que mais parece uma escultura, que permite uma visita informal dada a sua abertura que permanente, servindo ainda de cenário a belas fotografias, o que aliás acontece diariamente. Os pormenores de alvenaria são pequenas maravilhas, destacando por exemplo as gárgulas ou as oito colunas coríntias do templete central que sustentam uma abóbada esférica.

A designação antiga do conjunto seria «Fonte da Manga», mas a partir de certa altura generalizou-se a tradição de que o próprio rei D. João III o teria desenhado na manga do seu gibão. E assim ficou a ser conhecido como «Jardim da Manga» e é esta a designação que actualmente prevalece. E, como se costuma dizer, se não é verdade, é uma história bem encontrada. O que importa é que, à frente do excelente Restaurante Jardim da Manga, se encontra este Monumento sempre aberto ao público, coisa rara nos dias que correm.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 26 de Julho de 2021 

Fotos retiradas da internet

domingo, 25 de julho de 2021

Edith Piaf - NON, JE NE REGRETTE RIEN - legendado

OTELO

 Para além do que toda a gente recorda sobre Otelo, como estratega do 25 de Abril, como responsável das FP25, etc., etc., há algo que recordo, porque ainda hoje é a base do pensamento político de muitos portugueses, com as consequências que vemos todos os dias.

Numa visita à «social democracia» da Suécia, Otelo virou-se para Olof Palme e disse-lhe que em Portugal íamos acabar com os ricos. Ao que o primeiro-ministro sueco lhe respondeu: pois cá, andamos a tentar acabar com os pobres.