Com a urbanização crescente e o abandono dos campos, as cidades tornaram-se o local normal para se viver. Podemos (e devemos) pôr em causa o modelo de crescimento que deu origem à transferência populacional para as cidades e para o litoral. Mas isso não impede que nas cidades haja mais emprego, que esses empregos sejam essencialmente em serviços e comércio, em vez dos duros trabalhos da agricultura. Nas cidades há também mais oferta de ensino e de cultura, proporcionando-se assim mais qualidade de vida às chamadas classes médias.
A evolução da economia através da globalização e da "desmaterialização" da execução de muitas tarefas, leva a que as cidades tenham já hoje um papel determinante na cena internacional, ultrapassando mesmo as limitações geográficas e mesmo de soberania.
A gestão das cidades é hoje uma tarefa imensa e diversificada. Desde as responsabilidades a nível das infra-estruturas, ao ensino a diversos níveis com tarefas inerentes como transportes e refeições escolares, a políticas de apoio a juventude, terceira idade e desporto. Políticas a nível social, como habitação. Políticas de recuperação de centros degradados. Políticas de atracção turística. Políticas de desenvolvimento a médio e longo prazo, como planos de urbanização e estratégicos. Políticas de promoção do desenvolvimento económico, que deverão aproveitar todas as sinergias existentes, como escolas tecnologias a nível superior, indo chamar os investidores e não ficando à espera que apareçam.
Políticas de afirmação própria das cidades, através da Cultura, apoiando quem faz cultura e diferença.
Com tudo isto e muito mais, torna-se difícil contornar dois obstáculos grandes à gestão das cidades. Em primeiro lugar, as máquinas burocráticas que uma legislação pesada e uma partidarite absurda fizeram crescer até um ponto insustentável e que ocupam boa parte do tempo e dos esforços dos responsáveis eleitos. Em segundo lugar, as grandes questões estratégicas não devem fazer esquecer que as cidades existem já. E têm cidadãos que todos os dias usam infra-estruturas públicas, incluindo o espaço público. É este espaço utilizado todos os dias pelas pessoas desde que saem de casa para trabalhar, fazer compras, fazer jogging, passear as crianças, etc., que lhes fica no olhar e constrói o seu mundo real quotidiano. Não é preciso que esse espaço público seja luxuoso, como tantas vezes se vê hoje, num desbaratar inconsciente de dinheiros. Agora, tem é que estar cuidado, limpo, confortável, seguro.
Ao longo dos anos já fiz várias sugestões nestas linhas para que aquele objectivo seja alcançado de forma barata e eficiente. Relembro duas: o patrocínio de construção e manutenção de pequenos jardins por empresas ou outras instituições que lhes estejam próximas; a adopção dos gestores de bairros, que poderão ser reformados ou mesmo desempregados, cujo trabalho será andar pelas ruas e comunicar às autarquias (câmaras e juntas de freguesia) a existência de lixo acumulado, um buraco na calçada, uma grade estragada, um vidro partido ainda que num edifício privado, um banco partido, etc. etc.
As cidades têm que se afirmar num contexto muito difícil e sofisticado. Mas se não forem simpáticas e acolhedoras para os seus próprios cidadãos, isso não valerá de nada. E é tão fácil. Basta estar atento aos pormenores, cuidar das pequenas coisas e perceber que acima de todos os grandes projectos estão as pessoas, por mais simples que possam parecer.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 22 de Agosto de 2011
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