segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

PACtuar com Van Rompuy?



A União Europeia discute neste momento o seu orçamento para 2013. Poder-se à pensar que uma coisa é o orçamento habitual anual e outra coisa é a situação de alguns países da união que atravessam problemas tais que, ou já estão a receber apoio financeiro como Portugal, a Grécia e a Irlanda, ou tentam fugir a essa possibilidade, casos de Espanha e Itália. Mas a visão das coisas não deve, ou não deveria, ser essa. As opções políticas da União em termos de economia têm tido e continuam a ter, consequências nos diversos países, normalmente para o bem, mas também demasiadas vezes para o mal.
Foi por definições estratégicas definidas na União Europeia que, por exemplo entre nós, se abandonaram ou diminuíram drasticamente actividades económicas ligadas à indústria pesada (metalúrgica, por exemplo), agricultura e pescas. Começa hoje a sentir-se que mais valia não termos sido “bom aluno” nessa matéria e que deveríamos antes ter mantido, ampliado e beneficiado algumas actividades económicas tradicionais em que tínhamos capacidade produtiva instalada, conhecimento e até competitividade. Não o fizemos e estamos hoje numa situação em que a necessária recuperação industrial tem que começar quase do zero em muitas áreas.
A agricultura é uma actividade económica essencial. É sabido que boa parte dos campos do país foi abandonada, tendo mesmo havido subsídios da União Europeia para tal. A chamada PAC (política agrícola comum) sempre beneficiou os grandes produtores (alemães e franceses) em detrimento dos pequenos e dos países periféricos. No início da PAC, os dinheiros europeus destinavam-se apenas a subsidiar os preços dos produtos agrícolas da Europa, com custos altos e não competitivos. A filosofia da PAC evoluiu nos últimos anos, pela diminuição gradual dos apoios directos à produção (o chamado pilar 1), passando-os para o investimento (pilar 2). No entanto, a actual proposta do presidente do Conselho Europeu Herman Van Rompuy veio inverter esta tendência virtuosa, propondo cortar mais no pilar 2 do que no pilar 1. Sucede que os apoios da PAC recebidos por Portugal estão dentro da média europeia quanto ao pilar 2 (investimento), mas abaixo no que respeita ao pilar 1; a presente proposta é, assim, prejudicial aos interesses portugueses, já que precisamos de investir massivamente em agricultura para ajudar à recuperação económica. Razão mais do que suficiente para se perceber que também do lado do orçamento anual da União poderá vir mais ajuda para ultrapassarmos a actual difícil situação em que nos encontramos, até porque o sector agrícola é dos poucos que tem crescido (2,8%).
Claro que os gastos da União com a agricultura são mínimos (0,4%) quando comparados com o total de investimento público europeu, mas mesmo assim a PAC absorve cerca de 40% do orçamento europeu, o que traduz bem a sua importância. Tratando-se de uma indústria que produz menos de 2% do produto europeu e emprega menos de 5% da força de trabalho da União, facilmente se percebe até que ponto a União se encontra ainda enfeudada aos interesses dos agricultores franceses, alemães e do antigo Benelux e receia a capacidade reivindicativa do seu lobby. Basta recordar as impressionantes manifestações de tratores em Bruxelas ou gigantesco banho de leite que ainda a semana passada os polícias apanharam em frente à sede da União. Mas o caminho deve ser o de apoiar cada vez mais o investimento no sector, levando a maiores eficiências e diminuindo drasticamente ou acabando mesmo com os apoios à produção, que subsidia produtos e baixa artificialmente os seus preços, à custa de impostos e das outras actividades económicas.
 O nosso interesse é claramente defender o investimento na agricultura, para a modernizar e tornar mais produtiva e eficiente. Devemos estar bem conscientes dele e exigir aos nossos representantes que nos defendam com eficácia, ao contrário do que se fez durante anos em que abatemos barcos de pesca e eliminámos produções agrícolas, tudo subsidiado por uma Europa artificialmente excedentária e ávida de mercados.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 10 de Dezembro de 2012

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