segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

MÁRIO SILVA: ARTE E CIÊNCIA



Na passada sexta-feira o Mestre Mário Silva celebrou em Coimbra o seu 83º aniversário. Entre os amigos que jantaram e festejaram no Pavilhão Centro de Portugal, contaram-se os Antigos Orfeonistas que acrescentaram a sua própria arte ao encontro festivo. Ocasião para juntar mais jovens e menos jovens à volta de quem fez da sua vida uma juventude perene e cheia de irreverência.
O pintor Mário Silva é filho de um outro Mário Silva, o físico e professor da Universidade de Coimbra, único português a ter acompanhado as grandes descobertas da Física levadas a cabo no Instituto de Rádio em Paris nos anos vinte e trinta do século XX. Sob a direcção de Madame Curie e ao lado de uma plêiade de alguns dos maiores cientistas do século, Mário Silva aí se doutorou e participou no desenvolvimento da Física que viria a mudar toda a face da Ciência. Infelizmente, pouco tempo depois do seu regresso a Coimbra, velhas teias inquisitoriais (algumas ainda hoje persistentes) e a sua corajosa afirmação de independência de espírito e de apego ao valor da Liberdade, ditaram uma vergonhosa expulsão da sua Universidade em 1947, com origem directa em Salazar, injustiça só de alguma forma reparada pela sua simbólica e tardia reintegração em 1976. Com ele foram expulsos os seus assistentes, tendo-se assim perdido toda uma oportunidade de envolvimento da Universidade de Coimbra na vanguarda da Ciência da altura. Entre eles, contava-se João Teixeira Lopes que vim a conhecer e a admirar, que me contou sobre a vida de Mário Silva, bem como as caçadas com Adolfo Rocha e as tertúlias e partidas de cartas na Rua Ferreira Borges com, entre outros, Paulo Quintela, Teixeira Ribeiro e o mesmo Adolfo Rocha (M. Torga). O saudoso Mendes Silva não podia perder a oportunidade de passar pela presidência da Câmara de Coimbra sem homenagear a memória do Professor Mário Silva e foi a seu Filho que pediu ajuda na concretização do monumento.
O Mestre Mário Silva não seguiu as pisadas de seu Pai na Física. Quando jovem ainda andou pelas engenharias, mas decidiu percorrer o seu próprio caminho onde é grande, enorme: na Arte. Personalidade fascinante pela sua capacidade de chocar através da irreverência que nunca o abandonou, o que poderá assustar quem não o conheça mais de perto. Pessoalmente é de uma delicadeza e de um carinho para todos os que o rodeiam que comove. Dele não se dirá que ama a humanidade em abstrato e sim todos e cada um dos homens e mulheres que a compõem. Ver o Mestre Mário Silva a partilhar com crianças a sua Arte e a ensiná-las a produzir obras com as mais diversas técnicas é uma experiência inesquecível.

A sua pintura marca todos os que a conhecem. Terá este ou aquele período com mais elementos comuns de identificação, mas a sua obra é imediatamente reconhecível. Desde os quadros sobre a repressão e libertação até às representações de Coimbra, são todos reconhecíveis e admiráveis. A sua estatueta de bronze de Cristo na cruz é impressionante na ultrapassagem da dor do sacrificado pelo abraço que parece dar a todos os que sofrem. Como não podia deixar de ser, o artista esteve representado em exposições por todo o mundo e há obras suas em diversos Museus de Arte Moderna e Contemporânea em Portugal, mas também na Europa, EUA, Canadá e Brasil. Recebeu inúmeros prémios, de que saliento apenas o Prémio Internacional da Paz, pelo Instituto Internacional de Estudos Humanísticos de Roma - Fundação para os Poetas, Escritores, Pintores e Jornalistas em Itália (83).
O Mestre Mário Silva, que nasceu em Cimbra, vive hoje em Lavos na Figueira da Foz, sendo significativamente vizinho de pescadores. É a prova viva da ligação íntima entre a Figueira da Foz e Coimbra, pelo que não se deveria esperar muito mais para que estas cidades se unam numa justa homenagem comum ao Artista maior que é Mário Silva.
Pela minha parte, de forma modesta, e dado que a língua pertence aos que a praticam, a liberdade de escrita permite-me que assim manifeste de forma plural o reconhecimento e respeito que Pai e Filho me merecem: Pelo que nos deram e dão, bem hajam, Mário Silva.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 3 de Dezembro de 2012