Passam
agora vinte anos sobre o célebre relatório Porter que, como acontece em
Portugal com quase tudo o que é importante mas difícil, foi rapidamente
esquecido, submerso na espuma dos dias da politiquice e da sistemática
incapacidade portuguesa de olhar para longe e não perder o horizonte.
Dos
onze clusters estratégicos apontados
por Michael Porter, seis deles são hoje as áreas de actividade económica que
mais contribuem para as nossas exportações: calçado, texteis, madeira e
cortiça, vinho, turismo e automóvel. Não faz mal nenhum relembrar que os outros
cinco eram a educação, capacidade de gestão, financiamentos, gestão florestal,
ciência e tecnologia. Estes últimos sáo hoje considerados uma evidência, o que
não impede, no entanto, que ainda tenhamos falhas graves em alguns deles, como
sejam o financiamento e a capacidade de gestão das empresas. No que respeita
aos seis clusters económicos,
lembro-me bem de como certas elites deles desdenharam como pertencendo ao
passado, apontando para os serviços como o nosso futuro, que a indústria era
coisa do passado.
Nas
três últimas décadas viu-se assim vencer a ideia de que o crescimento económico
e correspondente emprego seria melhor conseguido através dos serviços, a que
correspondeu a outra face da moeda, isto é, o abandono da indústria, bem como
da agricultura e das pescas.
A
desindustrialização verificada em Portugal, que acompanhou aliás o que sucedeu
no resto da Europa (curiosamente com a excepção da Alemanha) é evidenciada pela
queda do peso da indústria transformadora na riqueza e emprego em Portugal de
17,1% em 2000 para 14% em 2013, depois de um mínimo histórico de 12,6% em 2009.
Para se perceber a ligação entre a redução da actividade industrial e as crises
económicas e financeiras dos países do sul da Europa, basta notar que na Grécia
o peso da actividade industrial no PIB passou entre 1995 e 2009 de 12,3 para
8,9%, na Itália de 21,5 para 15,8% e em Espanha de 18,5 para 12,3%. Já na
Alemanha, a variação equivalente foi de 22,0 para 21,8%.
A continuidade
da recuperação da actividade industrial que já se verifica é crucial para a
sustentação das nossas contas externas através das exportações. De acordo com o
governador do Banco de Portugal, a nossa economia só será saudável quando as
exportações representarem mais de 65% do PIB, sendo em 2013 de apenas 40%.
Mas
a reindustrialização não pode significar um regresso ao passado que já foi. Se
as indústrias que anteriormente fugiram para a Ásia e que estão a regressar
correspondem na realidade à nossa actividade industrial tradicional, o passo em
frente tem que significar uma atitude diferente, baseada do conhecimento que se
tem, mas adicionando-lhe valor acrescentado através de inovação e investigação que
signifique produtos competitivos para exportar. A mudança necessária para que a
inovação seja efectivamente produtiva é muito grande e as empresas industriais
têm que ter consciência disso. Basta lembrar que, enquanto em Portugal 22% da
investigação reside nas empresas, nos Estados Unidos esse valor é de 80%, mesmo
sabendo-se o nível da investigação universitária naquele país.
Por
outro lado, há em Portugal custos de contexto que nos últimos anos, mercê das
estratégias seguidas pelos sucessivos governos, constituem uma canga
pesadíssima para a indústria, limitando de forma grave a sua competitividade.
Sabe-se que os custos energéticos representam mais de 30% dos custos de
produção industrial, tendo Portugal o gás e a electricidade dos mais caros da
Europa. As diferenças desfavoráveis a Portugal no custo energético das grandes
empresas industriais chega a 10% relativamente a Espanha e 20% a França. O
défice tarifário, consequência da liberalização do mercado, virá também a
reflectir-se nas empresas industriais, diminuindo ainda mais a sua
competitividade, pelo que a alteração radical da política energética actual é
urgente e necessária.
O
próximo Quadro de fundos europeus designado Portugal 2020 apresenta um
levantamento de todos estes problemas, propondo respostas que parecem
adequadas. Depois dos gastos tantas vezes disparatados em infraestruturas não
indutoras de riqueza e tantas vezes redundantes, espera-se que desta vez seja a
economia real e particularmente a indústria, a receptora dos fundos europeus,
recuperando Portugal e os portugueses para um desenvolvimento sustentável que
garanta um futuro melhor aos nossos filhos e netos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 29 Setembro 2014
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