Passaram
na semana passada dez anos sobre a publicação do primeiro “Visto de Dentro” no
Diário de Coimbra. Curiosamente, tendo ido revisitar aquele texto, verifiquei
que o poderia ter escrito nos dias de hoje. Está lá a necessidade de
perspectiva construtiva sobre os problemas da sociedade, bem como a opção por
evitar juízos morais, a que acrescento hoje a fuga a proselitismos, no respeito
pelas opiniões alheias.
É
assim que, com todo o gosto, e pedindo licença ao jornal e aos leitores desta
crónica semanal, reproduzo aqui aquela crónica:
“Serve o título desta série de
crónicas de opinião para indicar que o autor assume claramente um
posicionamento no interior do actual sistema social, político e económico. E é
a partir das suas observações desse ponto de vista que se propõe partilhar com os
leitores do Diário de Coimbra os seus comentários que reflectirão as suas
concordâncias, discordâncias e eventuais perplexidades suscitadas por diversas
situações. O mundo de hoje, e particularmente Portugal, atravessa uma crise
sentida por todos, decorrente de alterações profundas e muito rápidas da
organização das sociedades a nível global, que se vêm adicionar a deficiências
estruturais crónicas. Levantam-se questões novas que exigem frequentemente
abordagens diferentes e soluções muitas vezes inovadoras. Tentar-se-á aqui
fugir dos juízos morais que se transformam hoje amiúde em armas de combate
político e de destruição, a fazer lembrar tempos inquisitoriais antigos que
deveriam estar já bem enterrados. Optar-se-á sim por posições optimizadoras e
construtivas, com o objectivo de poder contribuir para uma visão positiva da
sociedade, que tão necessária é para melhorar a auto-estima dos concidadãos.
Aproveito para lembrar uma pequena história certamente bem conhecida de muitos
leitores.
Há muitos anos, um viajante passou
por três canteiros que trabalhavam cada um sua pedra; á mesma pergunta sobre o
que faziam, obteve três respostas distintas:
O primeiro respondeu que trabalhava
para ganhar a vida; O segundo respondeu que talhava uma pedra; O terceiro
respondeu que construía uma catedral.
O que acha o leitor? Sente-se de
algum modo interpelado pela historieta? Ou acha que não tem nada a ver com os
dias de hoje?”
A
este texto inicial seguiram-se já 520 crónicas escritas e publicadas em tantas
outras semanas sempre à segunda-feira, sem qualquer interrupção. Dez anos é de
facto muito tempo. Deu para ver partir Pai e Mãe e muitos amigos e familiares,
uns muito chegados, outros nem tanto, para o maravilhoso nascimento de netas e
até para ver os gráficos dos monitores no hospital a ficarem subitamente todos
horizontais após uma operação cirúrgica delicada e ter a felicidade de voltar a
acordar poucas horas depois.
O
“estatuto editorial” definido na primeira crónica foi sendo mantido com algum
cuidado, embora tenha consciência de que em alguns dos textos a situação
abordada ou mesmo o contexto pessoal levaram a que tivesse tido havido um pouco
mais de acutilância na abordagem. Mas algures terei escrito algo que aprendi há
muitos anos e costumo citar com frequência: admito tudo, fanáticos é que não,
isto é, podemos ou devemos mesmo ser intolerantes com a intolerância.
Escrever
a crónica semanal tornou-se um hábito, quando não mesmo uma necessidade. Às
vezes perguntam-me como encontro temas para tantas crónicas. Quase sempre é a
realidade que se impõe, mas acontece às vezes não ter vontade de escrever sobre
ela porque muito francamente me aborrece e é então que saem os textos de que
gosto mais. Outras vezes são as crónicas que ganham vida própria e, no fim, têm
pouco a ver com o que comecei a escrever. Muitas crónicas obrigam a fazer algum
estudo, porque descobri ter leitores que procuram informação onde eu supunha
haver apenas opinião, embora o mais sustentada que me seja possível.
De
vez em quando um leitor vem ter comigo a comentar este ou aquele aspecto, a
discordar desta ou outra opinião. Principalmente para esses a quem agradeço as
críticas e comentários, mas não nego que também para minha própria satisfação
pessoal, continuarei a dedicar os sábados de manhã à escrita, até porque aquilo
que calamos não existe.
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