segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Da informação e da alienação




 O mundo inteiro passa por uma fase de acontecimentos excepcionais de cujas notícias tomamos hoje conhecimento através de numerosos meios de comunicação, desde a internet e redes sociais até à televisão e os meios mais clássicos como os jornais e as revistas.
Mas será que aquilo que chega até nós se pode considerar informação? Isto é, traz a verdade dos factos depurada das visões e ideologias pessoais de que a trata até chegar ao destinatário, ou mesmo das opções políticas ou comerciais dos proprietários desses meios?
A minha visão sobre o assunto é que não e que o jornalismo está infelizmente em decadência, não tanto por culpa dos jornalistas, mas pela degradação da independência da informação.
Todos sabemos que, em guerra, a primeira vítima é a verdade, enterrada debaixo da propaganda. Mas nos tempos de paz que hoje vivemos é muito preocupante que os cidadãos conscientes tenham que sistematicamente colocar em causa a informação que lhes é fornecida, para que o seu conhecimento da realidade seja o mais possível conforme com os factos.
Entre nós pratica-se, quer nos jornais, quer nas estações televisivas, um jornalismo dito informado, que confunde sistematicamente notícia com opinião, quando estas áreas deviam ser claramente separadas.
Alguns exemplos da actualidade. O nosso antigo primeiro-ministro António Guterres é um dos candidatos ao lugar de Secretário Geral das Nações Unidas. Percebe-se que para os portugueses haja um interesse particular neste acontecimento, mas tal não justifica um completo desvirtuar das notícias, sempre dadas em função do candidato português. Não é dada informação concreta sobre as competências do Sec. Geral das Nações Unidas, nem sobre as capacidades dos outros candidatos, nem sequer sobre o procedimento da sua escolha que não é bem uma eleição como é dito por aí.
Terminou o folhetim das eventuais sanções a Portugal por parte da União Europeia por incumprimento do défice. Quem lesse os jornais e visse a televisão nestas últimas semanas pensaria que estávamos em guerra com o resto da Europa, tais eram os termos em que a questão era apresentada. Compreende-se que os diversos partidos, apoiantes do actual governo e do anterior, usassem de factores emotivos para apresentarem as suas razões porque poderão eventualmente ter consequências eleitorais a curto ou médio prazo e sabe-se como a emoção, particularmente com recurso a patriotismo ou mesmo nacionalismo pode ter consequências nas opções dos eleitores. Mas só se pode lamentar que a dita informação televisiva e escrita tenha ido pelo mesmo caminho. Porque é que os portugueses não foram informados em concreto sobre o significado do défice das contas públicas e sobre a sua evolução nos últimos anos? Porque não foi explicado o conceito de défice estrutural, fundamental para as decisões europeias depois do Tratado Orçamental? E este mesmo tratado, voluntariamente subscrito por Portugal, significa o quê e para que serve? Depois da decisão da União Europeia de não aplicar sanções, o que significaram os termos usados de que seriam “injustas e injustificadas”? Não adianta esclarecer nada?
Nas eleições presidenciais americanas estão finalmente escolhidos os candidatos dos partidos republicano e democrata que se defrontarão em Novembro. Qualquer um de nós terá certamente a sua preferência também aqui e eu pessoalmente nunca apoiaria Trump e penso que Hillary será até muito melhor presidente do que foi o marido. Mas é deprimente seguir a nossa comunicação social sobre estas eleições. O grau de informação é praticamente zero, já que Donald Trump é sistematicamente alvo de ataque, sem que sejamos minimamente informados sobre os motivos concretos da sua aceitação entre o eleitorado americano; até à escolha de Hillary Clinton pelo partido democrata na recente convenção, o eleito da nossa comunicação social era obviamente Bernie Sanders, resumindo-se as notícias sobre H. Clinton a uns e.mails e à hipótese de ser presa. Será que os portugueses não merecem uma informação independente sobre estas eleições tão importantes para todo o mundo?
E os exemplos podiam seguir por aí fora, não havendo espaço para mais. Além de ser muitas vezes engajado politicamente e tratar os seus consumidores como mentecaptos incapazes de distinguir a informação da manipulação, o nosso jornalismo dito sério está a seguir o caminho da exploração do escandaloso e do sensacionalismo, tal como antes se praticava apenas na comunicação social dita tabloide. Quando se apresenta alguma notícia incómoda, ela vem sempre acompanhada de explicação sociológica ou política, condicionando automaticamente a sua recepção. Em vez de se informar pratica-se alienação, já que se apresenta uma realidade desvirtuada e falsa em vez da verdadeira.

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