Para quem tenha
seguido as recentes eleições presidenciais americanas com algum interesse e
fomos muitos, o resultado final foi uma surpresa atendendo às sondagens e,
essencialmente, ao que ao longo da campanha fomos lendo, ouvindo e vendo nos
mais diversos órgãos da comunicação social, nacionais e estrangeiros.
Por isso coloco no
título desta crónica a palavra “imprevisto”. Trump foi dizendo, ao longo de
toda a campanha, que iria mudar por completo o mapa político da América. Na
verdade, foi isso mesmo que aconteceu, contra o que diziam as sondagens. A
diferença que se verificou relativamente ao previsto, que dava Clinton como
vencedora com uma margem de 3%, foi relativamente curta: menos 2%, tendo Clinton
obtido mesmo mais votos do que Trump na globalidade. O problema é que as
sondagens eram feitas a nível nacional e as eleições são feitas estado a
estado, sendo estes muito diferentes entre si em termos de número de eleitores
e, essencialmente, em termos sociais.
Uma pequena alteração favorável a Trump a
nível de vários estados mudou tudo e passou os representantes ao colégio
eleitoral para o lado do candidato republicano. As técnicas das sondagens
atingiram hoje um apreciável desenvolvimento. Sucedeu que, nesta campanha,
houve um erro generalizado na consideração das diversas “fatias” do eleitorado,
tendo sido claramente sub-estimado aquilo a que se chama “os trabalhadores
brancos” e que eram os antigos “operários” outrora tão acarinhados pelas
esquerdas que nos últimos anos têm vindo a transferir os suas cuidados para as
mais diversas minorias. E isso, como se encontra claramente demonstrado na
revista Economist, fez toda a diferença, já que são esses os que mais sofrem com
as alterações económicas dos últimos anos, em particular depois da recessão de
2008. Acresce que não fazem parte daquelas minorias sistematicamente faladas na
comunicação social pelo que foram esquecidos nas sondagens. Mas não por Trump,
cuja mensagem agressiva de mudança contra o “establishment” que lhes retirou
qualidade de vida, lhes foi estrategicamente direccionada com os resultados que
agora se conhecem.
Esta vitória de
Donald Trump não aparece isolada. Surge poucos meses depois do referendo da Grã
Bretanha que optou pela saída da União Europeia numa afirmação contra o
liberalismo e contra a globalização. Teme-se que este movimento populista venha
ainda a influenciar decisivamente as próximas eleições em França, na Holanda e
mesmo na própria Alemanha, o que alterará completamente a política
internacional tal como a conhecemos hoje.
A comunicação
social tem tido também um papel importante nesta evolução da situação política
que se está a verificar nas democracias um pouco por todo o lado. A comunicação
social tem alinhado sistematicamente com um “politicamente correcto” radical
que abafa todas as opiniões que não vão com o “mainstream” instalado” e com as
novas agendas de grande parte da esquerda que substituiu a procura do bem-estar
da maioria das populações por uma re-engenharia social que a maioria nem
compreende nem apoia, embora se cale. Algum dia apareceria a reacção a esta
manipulação grosseira e arrogante da realidade, já que o cântaro tantas vezes
vai à fonte que algum dia lá fica. Seria irónico, se não for trágico, que essa
reação venha precisamente da parte de quem menos se imaginaria, já que tida
como garantida, à partida
Outro grande
derrotado nestas eleições foi o próprio Obama que sai da presidência pela porta
baixa. Oito anos depois de ter corporizado a “mudança”, foi clamorosamente derrotado
por uma nova vontade de “mudança”, não só pelo que fez ou não fez nesses
mandatos, mas por se ter envolvido como o fez na campanha de Hillary Clinton,
que assumiu ser a sua sucessora política e fez dessa continuidade o seu maior
cavalo de batalha. Os dez milhões de votos perdidos em oito anos entre uma e
outra eleição para algum lado foram e muitos terão mesmo ido para Trump.
Provavelmente os verdadeiros
responsáveis por esta evolução política nunca o reconhecerão, por arrogância
intelectual e por puro oportunismo político. Estas eleições merecem ainda
muitos mais comentários. Acabaram por ter dois contendores finais que, cada um
à sua maneira, não suscitaram grandes simpatias generalizadas, acabando por
funcionar cada um deles como o mal menor contra o outro. Como referi em
diversas vezes, Donald Trump não é do meu agrado: não gosto do estilo, não
gosto da conversa e não gosto das amizades. E receio, fazendo votos que me
engane que, no que a nós europeus interessa, vá muito mais longe nas suas
políticas do que prometeu na campanha eleitoral.
Nota: gráficos recolhidos em: http://www.economist.com/news/united-states/21710024-how-mid-sized-error-led-rash-bad-forecasts-epic-fail
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