As negociações
servirão de pano de fundo para as eleições presidenciais francesas, e as
legislativas na Holanda e na Alemanha, o que evidentemente terá implicações em
ambos os sentidos. Enquanto os eleitores destes países estarão atentos à forma
como decorrerão essas negociações, os próprios negociadores europeus estarão de
alguma forma limitados nas posições a tomar. É a primeira vez que um membro da
União Europeia decide sair da União. Como é sabido, o Tratado da União
contempla essa possibilidade no agora famoso Artigo 50, que na realidade teria
sempre de existir, mas terá sido escrito no convencimento de que nunca seria
utilizado, sendo o caminho a percorrer ainda desconhecido.
O Reino Unido
pretende que a negociação se faça de forma global, isto é, discutindo as
compensações financeiras em simultâneo com as questões mais duradouras e
importantes, tais como futuras relações comerciais, circulação de pessoas, etc.
A União pretende, já hoje de forma clara, discutir e fechar o pacote financeiro
antes de partir para as negociações de todas as outras matérias. Esta questão
faz toda a diferença. Existe uma probabilidade clara de que, perante a conta a
pagar, se levante no reino Unido uma onda contra o Brexit que leve a um
volte-face de todo o processo, através de novo referendo. Os vencedores do
referendo de Junho de 2016 acenaram aos eleitores com números enganadores sobre
a permanência do Reino Unido na UE, designadamente com um diferencial de fluxos
de quase 500 milhões de euros desfavorável ao Reino Unido, por semana. Terá
sido este número, que de resto nem é verdadeiro, o motivo principal que levou
muitos britânicos a irem atrás da conversa dos populistas com Nigel Farage à
cabeça: a velha questão de decidir com a mão na carteira.
Contudo, a factura
que a União pretende apresentar ao Reino Unido irá cobrir os supostos custos de
permanência na UE por muitos anos. Mesmo que os britânicos venham a argumentar
que não é por saírem que têm que compensar a União Europeia por despesas
futuras, a verdade é que todas essas despesas foram aprovadas também por eles.
O valor total da
factura tem sido estimado por diversas entidades e deverá situar-se entre um
mínimo de 24,5 mil milhões de euros e um máximo de 72,8 mil milhões.
Se os britânicos se
recusarem a pagar, a questão seguirá para o Tribunal de Justiça e todo o
processo parará, sendo que, neste caso, quem ficará a perder será o Reino
Unido.
Aqueles que
convenceram os britânicos de que ficariam a poupar se saíssem da União, nunca os
avisaram dos custos da saída. Aliás, nem o governo britânico de Theresa May
algum dia preparou os cidadãos para essa factura e o prazo de dois anos para a
saída efectiva da União após a chamada do Artigo 50 é na realidade muito curto
para preparar uma saída que possa minimizar todos os custos directos e
indirectos. A realidade do Tratado implica que de um lado está apenas o país
que quer sair e do outro os 27 que têm todos de acordar nos termos da saída e
são esses que aprovam esses termos e não o que sai.
Os mais de seis
meses que já decorreram desde o referendo do Brexit estão a permitir a todos os
cidadãos europeus tomar consciência real dos custos da saída da União que serão
para qualquer país muito superiores à manutenção. Os populistas de esquerda e de
direita que conseguem os seus intentos pela defesa de um nacionalismo serôdio, pela
ameaça, pelo medo e pela mentira tenderão a ficar cada vez mais expostos na sua
argumentação. E certamente que as camadas da população mais jovens, já nascidas
ou tornadas adultas numa Europa sem fronteiras, com livre circulação de pessoas
e bens, não se conformarão em viver com fronteiras de novo instaladas que aliás
nunca conheceram, incluindo os jovens britânicos.
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