segunda-feira, 9 de abril de 2018

LARGO DA RAINHA SANTA PRIVATIZADO?



Se há devoção enraizada numa população é aquela que os habitantes da Cidade de Coimbra tem pela Rainha Santa. E com toda a razão, dada a relevância história daquela mulher que, quando era ainda uma jovem infanta de 12 anos, veio de Aragão para casar com o Rei D. Dinis em 1282, entrando para sempre no coração do povo conimbricense. Tendo falecido no dia 4 de Julho de 1336, foi sepultada originalmente no Mosteiro das Clarissas existente na margem esquerda do Mondego a que a Rainha Santa deu grande apoio em vida. Com os sucessivos alagamentos causados pelas cheias do rio, veio a ser construído um novo mosteiro no alto do vizinho Monte de Nossa Senhora da Esperança que ficou conhecido como Mosteiro de Santa Clara-a-Nova, também designado como Convento da Rainha Santa Isabel, para onde foi trasladado o seu corpo em 1677.
Após a implantação da República em 1910 a parte Norte do Mosteiro passou a ser propriedade do Exército, que aí teve instalações a funcionar até aos finais do Séc. XX. Os outros espaços, incluindo a Igreja, claustro, hospedaria e casas do hospício, ficaram desde o Séc. XIX propriedade da Confraria da Rainha Santa.
Em frente de todas estas instalações existe o Largo da Rainha Santa que, além de proporcionar uma vista privilegiada da Cidade, funciona como acesso quer à Igreja e respectivo claustro e outras instalações anexas, quer ao antigo Convento que pertence ao Estado português.

A localização e características do edifício do antigo Convento sugerem de imediato a sua utilização turística, lamentando-se que o Estado tenha deixado aquelas instalações ao abandono desde que o Exército deixou de as utilizar. Em 2016 o Governo criou o programa REVIVE que visa entregar três dezenas de instalações abandonadas deste tipo espalhadas por todo o País. O Mosteiro de Santa Clara-a-Velha foi incluído neste programa, aguardando-se que seja aberto o respectivo Concurso para que finalmente, aquele magnífico espaço tenha uma utilização adequada contribuindo para a dinamização turística de Coimbra e correspondente actividade económica e ainda para a melhoria da imagem da cidade.
A Igreja da Rainha Santa Isabel do Mosteiro de Santa Clara-a-Nova, para além de acolher a urna de prata e cristal que contém o corpo da Rainha Santa, é de uma grande riqueza arquitectónica e artística. O claustro construído pelo húngaro Carlos Mardel em 1733 é menos conhecido mas surpreende sempre quem o visita pela primeira vez pela sua beleza e ambiente de recolhimento que proporciona. A Confraria da Rainha Santa Isabel precisa de encontrar financiamentos para zelar por este património. É, por isso, inteiramente justificado que os visitantes paguem pelo acesso às edificações, contribuindo para a sua manutenção.
Já o pedido de pagamento para acesso ao Largo da Rainha Santa que a Confraria da Rainha Santa Isabel começou a praticar desde há algum tempo é algo difícil de compreender e mesmo inaceitável pelos poderes que têm a responsabilidade de zelar pelos espaços públicos a começar por os manter nessa situação. Trata-se de um miradouro de uso público geral e acesso livre desde há muitas dezenas de anos, utilizado por turistas e por conimbricenses como cenário ideal para fotografias. Acresce que por este largo se pratica o acesso às instalações detidas pelo Estado agora integradas no programa Revive. Será que a Confraria tenciona começar a cobrar portagem de passagem aos futuros utentes da Pousada ou Hotel que aí será instalado? Não há ideia de alguma vez o ter feito quando o Exército utilizava as suas instalações e muito menos cobrou renda quando no Largo estiveram expostas ao público peças de artilharia e a famosa chaimite BULA cujo papel no dia 25 de Abril de 1974 é bem conhecido. Acredita-se que existam documentos antigos que atestem a “propriedade privada” do Largo pela Confraria. Mas a “actualidade” existente pelo menos desde a implantação da República dita outra realidade completamente diferente. Este passo dado pela Confraria poderá dever-se a um lapso interpretativo e não a quaisquer outros interesses. Por isso mesmo deverá ser rapidamente corrigido, sem ser necessário que a República, através das entidades responsáveis, se veja obrigada a proceder a uma providência cautelar sobre o Largo da Rainha Santa devolvendo-lhe o estatuto que permita a liberdade de acesso que teve durante praticamente uma centena de anos.

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