segunda-feira, 23 de abril de 2018

COIMBRA DEMOCRÁTICA



A legislação que regulou a organização das Autarquias Locais após o 25 de Abril previu uma distribuição de responsabilidades e competências entre os diversos órgãos municipais muito diferente do estabelecido para a governação nacional. Fosse por razões conjunturais relacionadas com o PREC, fosse por se entender que as autarquias locais, mais directamente ligadas às populações e aos seus desejos, ganhariam vantagem em respeitar diferentes perspectivas, os órgãos executivos municipais incluíram representantes dos diversos partidos. Esta organização é inédita na sua formulação qualquer que seja o ponto de vista de onde se observe, em termos empresariais ou mesmo de organização política.
Este modelo de organização implica diversas consequências, dado que todos os vereadores eleitos têm iguais legitimidades políticas, logo responsabilidades perante o povo que os elegeu. Num Executivo Municipal não há, não pode haver, vereadores da situação e vereadores da oposição. Aliás, assim não fora e certamente a Lei não seria como é e os Executivos municipais seriam constituídos apenas por representantes dos partidos ou coligações vencedores das eleições, à maneira dos Governos nacionais. O lugar da afirmação e debate política partidário é a Assembleia Municipal, órgão fiscalizador. E não se diga que o que aqui afirmo é mera utopia ou que está desligado da realidade.
Como estamos na semana do 25 de Abril cabe aqui lembrar alguns antigos presidentes da Câmara do poder local democrático em Coimbra, com os quais tive o privilégio de trabalhar directamente, lembrança essa que servirá de prova do que acima deixo escrito. 
Recordo António Moreira em cujos executivos não havia qualquer diferença entre os vereadores, fossem de que partidos fossem. Todos eles colaboravam e participavam na gestão municipal, tivessem ou não pelouros atribuídos, como foram os exemplos de Santos Cardoso do PCP, Pinto dos Santos e Manuel Machado do PS, nestes casos mesmo com pelouros importantes, ainda que a coligação vencedora AD tivesse tido maioria absoluta. 
Mendes Silva, nunca suficientemente recordado, eleito pelo PS e que, antes das reuniões do Executivo, promovia a realização de encontros informais da vereação longe dos holofotes da comunicação social, sendo os assuntos calma e aprofundadamente discutidos e analisados a fim de que, após obtidos os consensos decorrentes de acertos, os mesmos fossem alvo de unanimidade na aprovação. Assim conseguiu que muito mais de 95% das decisões camarárias tenham merecido o voto favorável da totalidade dos vereadores. 
Claro que, para esta actuação, muito terão contribuído as suas capacidades pessoais únicas de trabalho e de diálogo, mas também a experiência pessoal notável, que vinha da presidência da Direcção da Associação Académica dos anos 50 que conseguiu do governo de então a edificação do complexo que inclui a sede da AAC, o Teatro Gil Vicente e cantinas em volta do seu jardim; ou do trabalho como Director Regional do Desporto, tempo em que Coimbra atingiu píncaros na natação e no basket como nunca mais se viu, nem com as instalações desportivas magníficas de que hoje dispõe.

Mais recentemente, também não foi por ter obtido maioria absoluta nas eleições que Carlos Encarnação dispensou a colaboração de vereadores de outros partidos, como foi o caso de Gouveia Monteiro do PCP.
Penso não ser preciso mais para se concluir da veracidade do que acima escrevi, isto é, que no Executivo Municipal não há vereadores da situação e da oposição. É esta a razão da legislação que regula o poder local e devem ser sempre encontradas soluções para que tal suceda, que nem passam obrigatoriamente pela entrega de pelouros, mas apenas pela partilha de responsabilidades e aproveitamento de capacidades.

Há mesmo matérias cujo interesse municipal ultrapassa as diferenças político-partidárias e para os quais o simples bom senso aconselha que se peça a colaboração efectiva de todos os vereadores. Por exemplo, uma candidatura a Capital Europeia da Cultura necessita de uma estrutura de missão profissional que a prepare. Mas será de toda a conveniência que o seu trabalho seja devidamente acompanhado e apoiado por uma Comissão de Acompanhamento em que tenham assento vereadores de todas as forças políticas quanto mais não seja, para que toda a Cidade tenha conhecimento do trabalho levado a cabo, tenha ou não a candidatura o êxito desejado.

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