Os resultados das eleições
britânicas da passada quinta-feira vieram confirmar as tendências das últimas
semanas, com a vitória do partido Conservador liderado por Boris Johnson e a
derrota do partido Trabalhista de Jeremy Corbyn. Se alguma surpresa houve tem a ver com
a dimensão da vitória dos conservadores que obtiveram o seu melhor resultado
desde Margaret Tatcher garantindo uma maioria absoluta confortável de 365
lugares num total de 650, mais 39 do que os necessários para essa maioria. Notória
foi também a pesada derrota dos trabalhistas que perderam 59 lugares, obtendo
apenas 203, o pior resultado do partido desde a Segunda Guerra.
A generalidade dos portugueses
terá ficado surpreendida pelos resultados dado que, durante a campanha a nossa
comunicação social, em geral, apresentava Boris Jonhson como um palhaço e
Jeremy Corbyn como uma pessoa respeitável em quem se podia confiar. Depois de
conhecidos os resultados apareceram as mais desencontradas justificações para
os mesmos, tentando desvalorizar o seu significado intrinsecamente político,
com uma boa dose de hipocrisia. O nosso primeiro-Ministro veio mesmo explicar que
os britânicos manifestaram «cansaço» com o processo do Brexit. Vale a pena
relembrar que a democracia inglesa é a mais antiga e estável da Europa, que
nestas eleições a taxa de participação foi de 67% (comparemos com o que se
passa por cá) e que o Governo agora escolhido o foi para 4 anos, sendo o Brexit
apenas uma das matérias da governação, ainda que muito importante e urgente.
Estas posições têm dois problemas: em primeiro lugar tentam menorizar o
eleitorado britânico que vai a eleições há muito tempo, devendo as suas escolha
democráticas ser respeitadas, ainda que não concordemos com elas; acresce ainda
que há uma grande probabilidade de esses comentários sofrerem um efeito de «boomerang»
político sobre quem os faz imaginando que os portugueses também são tão tontos
que não percebem as verdadeiras motivações que lhes estão subjacentes.
O eleitorado do Reino Unido
rejeitou com muita força o caminho que lhe era proposto por Corbyn, com um
programa político que fazia lembrar o esquerdismo dos anos 60/70 do século
passado, ressuscitando a luta de classes e a intervenção profunda do Estado na
vida económica e social. Este velho marxismo não tem nada a ver com a
social-democracia do Norte da Europa, antes remetendo para a prática de países
que, ao adoptarem esse caminho degradaram as suas economias e se empobreceram
irremediavelmente.
Lembrando aspectos do antigo trabalhismo, mas
radicalizando-os, Corbyn tentou passar por cima da História do seu próprio
país, fazendo por esquecer as razões dos sucessos eleitorais de Margaret
Tatcher e da «Terceira Via» trabalhista que se lhes seguiram. Jeremy Corbyn teve
sinuosas posições quanto à realização de eleições e as suas duvidosas (para
dizer o mínimo) posições anti-semitas também não devem ter ajudado a afirmar
uma posição de sensatez e equilíbrio. A sua vida política terá terminado neste
acto eleitoral, tendo agora o Partido Trabalhista quatro anos pela frente para
reformar toda a sua estratégia política para o país.
Boris Johnson é uma personalidade
complexa. Conseguiu obter os favores do eleitorado e, pelo lado do Parlamento,
tem uma vida facilitada pela frente. O seu maior adversário pode ser ele
próprio e a sua personalidade. Possui uma formação intelectual de grande
densidade, sendo o seu percurso académico prova disso mesmo. Contudo, ao mesmo
tempo cai sistematicamente na tentação de mentir, manipular a realidade e fá-lo
com o ar de quem tira o máximo divertimento pessoal disso.
É, agora, claro que o Brexit será
uma realidade a curto prazo. Os britânicos assim o escolheram, tendo o direito
de o fazer. Só podemos esperar que do lado do seu novo governo haja a
consciência de que o Reino Unido já não é uma potência imperial e que deverá
evitar ser uma marioneta nas mãos de Putin e Trump. Do lado da Europa, que
infelizmente volta a ser continental, façamos votos de que a atitude de tentar
castigar o país que sai seja substituída por uma atitude construtiva que
permita encontrar os melhores laços para um relacionamento mutuamente
proveitoso.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 16 de Dezembro de 2019
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