Nuno Gonçalves Poças sobre um país que, obviamente, não é Portugal. Ou será que é?
«Imagine o leitor um país. Nesse país, os juízes do Tribunal
Constitucional são nomeados pelos partidos, podendo sair directamente
desse Tribunal para o Governo. O ministro da Justiça toma posse,
enquanto ministro, como juiz do Supremo Tribunal de Justiça, e na
qualidade de ministro toma decisões sobre, por exemplo, os salários dos
juízes do Supremo Tribunal de Justiça.
Nesse país, um adjunto do
ministro da Justiça pode sair do gabinete do Governo para ir
directamente para o seu lugar de procurador e investigar, por exemplo,
membros do Governo a que pertenceu por suspeitas de prática de crimes
económicos. Outro adjunto pode também ser procurador e juiz e até ter
sido condenado por pressionar outros procuradores para forçar o
arquivamento de um processo judicial que investigava um
primeiro-ministro, que veio a ser acusado de “mercadejar” a sua função,
por causa de um projecto imobiliário. Um outro procurador, que trabalhou
com este adjunto numa instituição internacional, foi nomeado, depois de
uns “lapsos” no currículo, para uma outra entidade internacional pelo
ministro da Justiça, que confirmou uma decisão de um Conselho Superior,
onde já se tinha sentado o seu Secretário de Estado, depois de aquela
entidade internacional ter decidido que havia outro candidato ao lugar
que reunia melhores condições para ocupar o cargo. Este procurador
nomeado era irmão de um antigo presidente de um instituto público que
aprovou o tal projecto imobiliário que acabou investigado por suspeitas
de corrupção do tal Primeiro-ministro acusado de “mercadejar” a sua
função. E era ainda irmão de um outro procurador que era considerado
influenciável pelo actual Primeiro-ministro para evitar a prisão de um
membro do partido a que pertence este Primeiro-ministro.
A
procuradora escolhida pela entidade internacional e preterida no seu
país estava, por sua vez, a investigar um processo judicial em que eram
arguidos um antigo secretário de Estado, um antigo presidente da
Protecção Civil e um antigo adjunto de um secretário de Estado, que
antes de ser membro de um gabinete governamental era padeiro e dirigente
do partido na sua terra. Nesse país, este secretário de Estado que
chefiava o ex-padeiro torna-se Ministro, tutelando um organismo que viu,
sob a sua alçada, ser assassinado um cidadão estrangeiro. Para resolver
este problema, foi demitido o director desse organismo, nomeado pelo
partido incumbente, e para o seu lugar foi nomeado novo director, antigo
membro do gabinete de quem o nomeou e também dirigente do partido
incumbente.
Este secretário de Estado, feito ministro, era, por
sua vez, casado com uma outra ministra, que depois foi nomeada pelos
colegas do Governo a que pertenceu para dirigir uma nova entidade,
criada para regular, de forma independente, um sector de actividade.
Nesse
país, o tal procurador que passou a adjunto do ministro da Justiça pode
ser casado com uma antiga assessora de um membro de um antigo Governo
do mesmo partido, depois feita presidente de uma fundação pública e
condecorada por um Presidente da República da mesma cor partidária. Essa
mulher do adjunto do ministro da Justiça pode, enquanto presidente da
fundação pública a que passou a presidir por indicação partidária,
adjudicar serviços ao cônjuge do ministro da Justiça para o qual o seu
marido, por sua vez, trabalha. O cônjuge do ministro pode também ser
nomeado para exercer funções públicas pelo cônjuge do outro ministro,
que também foi ministro e agora foi nomeado pelos seus antigos colegas
de Governo para liderar uma entidade reguladora independente.»
jpaulocraveiro@ gmail.com "Por decisão do autor, o presente blogue não segue o novo Acordo Ortográfico"
terça-feira, 22 de junho de 2021
Dia que é uma espécie de democracia
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