segunda-feira, 3 de abril de 2023

DAS EMPRESAS EM PORTUGAL


 É talvez uma das piores heranças da geringonça que permitiu a António Costa governar o país depois de ter perdido as eleições em 2015. Nos últimos anos tornou-se praticamente consensual na sociedade portuguesa um sentimento de oposição sistemática às empresas, principalmente às grandes e, com toda a naturalidade de uma evidência instalada, contra aquelas que apresentam grandes lucros ao fim do ano. Se isto não é novidade por parte dos apoiantes do PCP e do BE que rejeitam em absoluto o liberalismo e o sistema económico que lhe está subjacente que é o capitalismo, já é um pouco surpreendente que posições muito semelhantes surjam de quem não se assume como comunista ou mesmo socialista da nova vaga.

Parece que o sucesso das empresas é equivalente ao assalto automático ao bolso dos consumidores, mais parecendo que os portugueses se tornaram neste séc. XXI seguidores de Proudhon, para quem “a propriedade é o roubo”.

E, ao longo dos anos, foi-se instalando uma ideia generalizada de que é positivo que a nossa economia seja constituída em mais de 98% por micro, pequenas e médias empresas, que estarão mais perto dos consumidores e dos seus interesses imediatos, ao contrário das grandes que são uns monstros exploradores que, por vezes, até instalam as suas sedes em outros países. Nada de mais errado.

Recentemente, foi tornado público um estudo conjunto da Associação Business Roundtable e da Nova Information Management School denominado “Análise prospetiva do impacto do crescimento das grandes empresas em Portugal” que procedeu a uma avaliação do impacto das grandes empresas na economia nacional.

Surpresa das surpresas: 1% das empresas do país são responsáveis por gerar 57% do valor Acrescentado Bruto. Os números do estudo mostram que, no período entre 2016 e 2019 as grandes empresas nacionais foram, em média, 3,7 vezes mais produtivas que as médias empresas e geraram um VAB dez vezes superior ao dessas mesmas empresas.

Mas as surpresas não se ficam por aqui. O prof. Bruno Damásio da Nova IMS e investigador responsável pelo estudo fez notar “o forte impacto que as organizações de grande dimensão têm, tanto a nível económico, como dos trabalhadores e do próprio Estado”. De tal forma que, “para além de 57% do VAB, essas grandes empresas garantem por si 62% das exportações, 48% dos gastos com pessoal, 64% das contribuições para a segurança social e 71% dos impostos entregues ao Estado. Significa isto que 1% das empresas contribuem com muito mais do que as restantes 99% do tecido empresarial, constituído por pequenas e médias empresas”, como vincou ainda Bruno Damásio.

Para além disso, as grandes empresas pagaram, em média, salários de 30.900 euros, o que significa mais 30% do que as médias e mais 70% do que as pequenas empresas.


É fácil percebermos que algo está profundamente errado nas políticas que temos seguido. Mas este estudo vem provar, à evidência, um dos principais problemas da nossa organização económica. A produtividade e o crescimento dos rendimentos, quer dos investidores, quer dos trabalhadores, estão em linha com o crescimento das próprias empresas e não na continuidade de uma economia baseada essencialmente em muitas micro, pequenas e médias empresas que apenas subsistem num mercado pobre e pouco sofisticado.

Como resultado, o que vemos é um Estado que, paulatinamente, se vai transfigurando de “social” em “assistencialista” à medida que vamos empobrecendo relativamente aos parceiros europeus. Isto apesar dos fundos que nos vão enviando para isto e mais aquilo e ainda recuperação (de quê?) e de resiliência (será que sabem ao menos o que é?), mas nunca para que as empresas cresçam, sejam competitivas, tenham lucros a sério e possam pagar ordenados semelhantes aos dos outros europeus.

E o que mais perturba no meio disto tudo é que pareça que ninguém com responsabilidades políticas esteja a dar conta disto e andemos para aí todos entretidos a catar quem fica com o IVA do galão ou do croissant do pequeno-almoço ou se os imigrantes nos vão destruir a nossa sagrada vivência. Ou ainda se presidente da República e primeiro-Ministro andam de candeias às avessas ou vão juntos à bola. Já agora, a Roménia (a Roménia, lembram-se do Ceausescu????) que as previsões apontavam que nos apanharia em riqueza em 2024 já o fez em 2022. Os outros vêm já a seguir, se continuarmos com esta conversa da treta de achar que “as empresas são o roubo”, quando o Estado é que não consegue cumprir as suas obrigações mínimas na saúde, na educação, na justiça, na defesa, etc. etc.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 3 de Abril de 2023

Imagens recolhidas na internet

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