domingo, 23 de abril de 2023

O REGRESSO DA POLÍTICA

 


A maioria absoluta alcançada nas eleições realizadas há pouco mais de um ano pelo PS dirigido por António Costa parecia ter retirado a política da atenção mediática, substituída por questões que à superfície parecem mais técnicas que outra coisa. A política pura e dura retirara-se para as catacumbas dos centros de poder totalmente ocupados e geridos pelo partido do Governo, permanecendo bem escondida dos olhares dos portugueses. Essa ocupação vai tão longe que abrange mesmo as entidades reguladoras da economia que, por definição, deveriam ser independentes mas para onde foram sendo dirigidos ex-governantes, desde ministros a secretários de Estado. Cá fora, para discussão pública, foram ficando assuntos diversos e irrelevantes para o futuro da generalidade dos portugueses, de que a eutanásia será o exemplo mais óbvio.

Tudo isto ia correndo, até que….. foi «destapada» a TAP na comissão de inquérito da Assembleia da República, dando razão ao velho ditado que nos ensina que «zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades».

A actuação da gestão da TAP e, principalmente, dos membros do Governo directamente responsáveis pela companhia está para além do compreensível pelo cidadão comum, ainda por cima tratando-se de uma empresa renacionalizada pelo Governo de António Costa depois de privatizada como mandava o memorando de entendimento assinado por Sócrates com a Troica e onde foram metidos 3,2 mil milhões de impostos dos portugueses. Esta situação, só por si, aconselharia qualquer Governo, a começar pelo seu primeiro responsável, a ter especiais cuidados com tudo o que dissesse respeito à empresa, ao contrário da perfeita balbúrdia que todos vamos descobrindo.

E a explicação habitual de que se tratava de assuntos técnicos caiu por terra, devido às evidentes interferências governamentais na própria gestão diária da TAP. O assunto tornou-se, assim, eminentemente político, com consequências que ainda não são visíveis neste momento, mas que se vão adivinhando.

Começou mesmo a falar-se abertamente de dissolução da Assembleia da República, com o próprio presidente da República a referir-se à hipótese como sendo uma prerrogativa constitucional de que não abdica. Muitas vozes, incluindo a do presidente, vão contudo adiantando não ser este um momento adequado para que tal aconteça, por razões conjunturais ligadas à guerra na Ucrânia, à inflação e sobretudo, por não se ver alternativa eleitoral viável ao partido Socialista. Quanto às razões conjunturais, são apenas areia atirada aos olhos dos portugueses, não fazendo qualquer sentido e nem vale a pena comentá-las. Já o argumento da falta de alternativa exige mais cuidado na sua abordagem. De facto, se a Democracia tem uma vantagem, é precisamente a de haver sempre alternativa: quem escolhe é o povo que, por definição, sabe o que faz. Na minha opinião, embora haja uma crise governativa sistémica, ela não é novidade nenhuma e é mesmo anterior à actual maioria absoluta pelo que, neste momento, não há ainda uma razão concreta que, por si, justifique a dissolução da Assembleia.

Claro que uma hipótese de ultrapassar a crise que tem vindo a criar seria o próprio partido Socialista assumir as suas responsabilidades de partido com maioria absoluta e substituir todo o governo, com o primeiro-Ministro à cabeça. Foi, por exemplo, o que fez recentemente o partido Conservador no Reino Unido, correndo com o primeiro-ministro incapaz de dar a volta à situação não uma, mas duas vezes. Todos sabemos, no entanto, que os nossos deputados não têm independência suficiente para tomar tal atitude, sejam de que partido forem, porque na realidade não são escolhidos pelos portugueses mas sim nomeados pelos directórios partidários para preencherem as listas apresentadas a eleições. Pelo que esta solução não será certamente seguida pelo PS, embora haja sempre uma primeira vez para estas coisas.


E, aqui, é evidente a responsabilidade grave que o PSD tem neste momento. A meu ver não pode estar à espera que o poder lhe caia nas mãos, mais cedo ou mais tarde. E precisa de sacudir rapidamente, e de vez, o colete de forças que o PS habilmente lhe colocou com o Chega. Para tal, tem uma saída viável a curto prazo, à semelhança de Sá Carneiro em 1979, mas atendendo aos tempos actuais. Deverá organizar um congresso para construção de uma alternativa com todo o centro-direita e independentes, incluindo Iniciativa Liberal e o CDS. Sim, neste último caso poderia mesmo tentar anular a asneira das últimas eleições, garantindo-lhe lugares em listas comuns nas próximas eleições. Eleições que, apesar de tudo, poderão ocorrer bem mais cedo do que se espera, pelo que a urgência é óbvia.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em  17 de Abril 2023

Imagens recolhidas na internet

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