sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

A NOSSA LIBERDADE



Durante anos a Grã Bretanha, nomeadamente a sua capital Londres, foi o símbolo da coexistência pacífica e respeitosa entre representantes de todo o mundo e múltiplas manifestações culturais. Nós portugueses, habituados durante muitos anos a viver num mundo fechado, espantávamo-nos pela maneira como nos passeios da cidade passavam sem qualquer conflito hindus vestidos a rigor e com turbante, muçulmanos vestidos à sua maneira, hippies floridos, homens de negócios com sobretudo e chapéu londrino e Yuppies vestidos igualmente à sua maneira própria. Era, no fundo, um sinal de civilização.

Tudo começou a mudar com Salman Rushdie nos anos 80, que foi objecto de uma fatwa decretada pelo Ayatolla Khomeini, então o supremo líder iraniano, ordenando a sua morte por qualquer muçulmano que o conseguisse fazer, por causa da publicação de um livro da sua autoria.

Hoje assiste-se ao desmoronar de todo este edifício, com o próprio arcebispo de Canterbury, líder da Igreja anglicana, a propor a integração de preceitos da sharia no direito inglês. Para dar uma ajuda, a administração do metro londrino acaba de proibir a colocação de cartazes alusivos a uma exposição sobre o pintor Lucas Cranach, o Velho na Royal Academy of Arts que reproduz um quadro daquele pintor alemão renascentista com uma “Vénus” nua.

O motivo apresentado foi “levar em linha de conta todas as categorias de passageiros e fazer o possível para não os chocar”.

Dado que ninguém acredita que os londrinos se tenham tornado de repente tão puritanos que se impressionem com uma “Vénus” nua do século XVI, é óbvio o motivo: não ofender os muçulmanos.

É toda a nossa tradição cultural e civilizacional, o que inclui a liberdade, que começa a estar em causa.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

BEETHOVEN

Já publiquei neste blogue trechos de compositores que muito admiro, a começar por Bach.
Tenho resistido a citar Beethoven, por puro pudor. Como Leonard Bernstein disse, afinal é preciso reconhecer que Beethoven é de facto o maior compositor que jamais existiu. Algumas das suas composições estão hoje tão divulgadas, que quase se tornam banais na nossa vida, o que é uma perfeita injustiça.
Hoje apeteceu-me colocar aqui o segundo andamento da 7ª sinfonia, sendo que esta está longe de ser das mais conhecidas, mas cuja audição aconselho, quer aos mais conservadores, quer àqueles que gostam de música mais contemporânea. Outra das minhas preferidas é a sexta, mas fica para um destes dias.
Esta interpretação é da Filarmónica de Berlin, dirigida por Karajan. A minha preferência iria para a interpretação da Filarmónica de Viena dirigida por Simon Rattle, mas não a encontrei no You Tube. Fiquemos com esta um pouco mais romântica, mas belíssima.

REABILITAR A BAIXA DE COIMBRA



A Baixa de Coimbra encerra diversas fragilidades de ordem física, social e económica que se interligam no espaço e no tempo e cuja percepção imediata se traduz na actual degradação de grande parte dos edifícios.

O diagnóstico está basicamente feito nas suas diversas vertentes. Os caminhos para sair desta situação são diversos e implicam escolhas e tipos de intervenção pública ou privada diferentes.

Um dos caminhos seria o de promover a recuperação do edificado tal como previamente existente, sem preocupação com a sua adequação às necessidades dos utentes dos dias de hoje. Corresponde a uma visão museológica da cidade, não cuidando da sua sustentabilidade económica e exigindo a aplicação de fundos públicos em quantidades massivas. Como é bom de ver, se esta actuação é possível perante um ou outro edifício mais representativo do ponto de vista patrimonial, a evolução económica do país é completamente incompatível com esta atitude perante grandes áreas da cidade.

Outro caminho é o preconizado pela legislação existente com vista à reabilitação de zonas urbanas históricas, que deu origem à formação das Sociedades de Reabilitação Urbana cujo objectivo é promover o procedimento de reabilitação urbana nessas áreas.

Nos termos definidos para as SRU, a reabilitação urbana deverá ser prioritariamente realizada pelos proprietários dos prédios localizados nas áreas definidas para a sua acção. As SRU começarão por preparar os documentos que regem as intervenções do ponto de vista urbanístico, devendo os projectos de reabilitação sujeitarem-se às normativas por eles definidas. Apenas nos casos em que os proprietários não podem ou não pretendem realizar a reabilitação dos seus prédios, as SRU avançarão com os seus poderes de intervenção que incluem os de expropriação.

No caso de Coimbra, a Coimbra Viva SRU tem já elaborado e aprovado o denominado Documento Estratégico de uma significativa zona da Baixa, estando a decorrer o procedimento que corresponde ao período em que os proprietários decidem se avançam ou não para a reabilitação dos seus prédios. Está igualmente a decorrer um concurso para escolher a entidade que elaborará o Documento Estratégico de outra zona importante da Baixa, que abrange o Terreiro da Erva.

Deve-se realçar que o Estado não intervém financeiramente neste processo, isto é, não existem subsídios para a reabilitação. Estão no entanto previstos alguns apoios relevantes, como sejam o IVA especial para a realização destas obras que é de 5% em vez de 21% normais, bem como a quase total dispensa de pagamento de taxas urbanísticas municipais e isenções de pagamento de IMI durante alguns anos.

A questão do financiamento das operações é muito relevante, dado que um apreciável número de proprietários entendem não fazer as obras pelos mais diversos motivos: ou porque são herdeiros que pelo seu elevado número não conseguem entender-se, ou porque não têm condições económicas, ou porque são muito idosos e entendem já não ter condições físicas e psicológicas para entrar neste processo, ou apenas porque não estão dispostos a fazer as obras.

A legislação em vigor permite que as SRU adoptem o princípio das parcerias público-privadas para a realização da reabilitação. As condições externas para o surgimento de parceiros privados para a reabilitação não são, no entanto, muito favoráveis neste momento, quer por uma certa retracção económica geral, quer pela crise financeira internacional ligada precisamente a alguns sectores do imobiliário. Sabendo-se que a reabilitação não é à partida uma actividade económica concorrencial face à construção nova em outras zonas urbanas, será necessário encontrar vantagens comparativas que compensem aquela desvantagem, designadamente para todos aqueles que preferirão residir numa zona histórica, o que exigirá esforços não só da SRU, mas também de outros sectores sejam públicos, sejam privados.

Outra solução será a constituição de fundos de investimento imobiliário, em que a subscrição de unidades de participação poderá ser feita em dinheiro ou através da entrega de prédios a reabilitar. Na conjuntura actual, talvez seja esta a via mais favorável para obter o necessário financiamento das operações de reabilitação. Uma vantagem será a possibilidade de os próprios proprietários participarem na reabilitação, sem terem de despender dinheiro, entrando com o valor dos seus prédios. Também as empresas e outras entidades interessadas na reabilitação poderão participar, bem como investidores a nível pessoal ou empresarial que pretendam rentabilidades competitivas com as oferecidas normalmente pelos depósitos bancários.

A Coimbra Viva SRU, em colaboração estreita com a Câmara Municipal de Coimbra e com o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana analisa as vantagens e desvantagens de cada uma das soluções. Não se poderá perder de vista que a reabilitação urbana da Baixa só será um sucesso se, além de manter moradores actuais, tiver a capacidade de atrair novos residentes, se conseguir reanimar economicamente o comércio local e se conseguir atrair novas actividades económicas e lúdicas, isto é, se conseguir recuperar a centralidade perdida.

Publicado em o "Campeão das Províncias" em 14 de Fevereiro de 2008

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

ABORTO

Segundo o Diário de Notícias de hoje, (ver link em baixo), uma rapariga de 19 anos, aluna de uma escola profissional de Viseu, tentou abortar nas instalações da própria escola, estando grávida de 5 meses. Como é natural correu mal e acabou por ser levada para o hospital local, onde se confirmou que a criança já estava morta.

Nestas circunstâncias, a brilhante actual lei do aborto obriga a levar esta rapariga a tribunal.

Nessa altura vamos observar de novo as habituais manifestantes à porta do tribunal a clamar pela injustiça da situação e “a defender o direito a mandar na sua barriga”?

http://dn.sapo.pt/2008/02/12/sociedade/estudante_19_anos_aborta_escola.html

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

URGÊNCIAS

Foi demitido o Director do INEM. Depois daquele famoso "prós e contras", fiquei esclarecido sobre o "iluminismo esclarecido" do ministério de Correia de Campos. A jactância demonstrada seria absolutamente inaceitável se não fosse apenas ridícula pela falta de ligação com a realidade.
No entanto, perante a divulgação pública daquela gravação de uma chamada telefónica entre o INEM e os bombeiros de uma terra qualquer abandonada do interior, dado que de certeza que não foram os bombeiros a fazer e publicar a gravação passada obsessivamente pelas televisões (incluindo a RTP), concluí imediatamente que alguém estava a "esturrar" o ministro. E não teria sido a oposição, que não tem meios tão sofisticados.
Só me resta concluir que, no mínimo, a nova ministra mostrou prudência com este acto de afastar o responsável do INEM, não vá o diabo tecê-las.

PADRE ANTÓNIO VIEIRA




Comemoram se este ano quatrocentos anos sobre o nascimento do Padre António Vieira, que nasceu em Lisboa em 6 de Fevereiro de 1608.

Dele disse Fernando Pessoa ser o imperador da língua portuguesa com tudo o que tal classificação implicará de não facilidade de leitura e interpretação. Apesar disso, ou quem sabe por isso mesmo, é hoje soberanamente quase esquecido a nível de ensino básico e secundário. Ainda me lembro de o estudar no segundo ciclo do Liceu, equivalente ao 9º ano da escolaridade de hoje, altura em a Selecta Literária lhe dedicava um grande espaço. Ao contrário do que se passa no Brasil, onde o Padre António Vieira é objecto de imensa veneração e de estudo a todos os níveis.

Foi uma figura maior da nossa História, a nível religioso, cultural e até politico.

São justamente famosos os seus sermões, onde usava abundantemente de alegorias, como é o caso do conhecido “Sermão de S. António aos peixes”.

Padre jesuíta formado em Salvador da Baía, António Vieira distinguiu-se pela sua acção apostólica junto dos índios, adoptando a perspectiva característica dos missionários da Companhia de Jesus baseada num grande respeito pela cultura dos povos locais. Em consequência, defendeu intransigentemente os índios dos colonos, o que lhe valeu aliás grandes inimizades.

Numa atitude rara e de grande avanço no seu tempo, opôs-se frontalmente à escravatura cuja abolição defendeu e foi ainda defensor dos judeus, opondo-se à distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos.

Claro que todas estas posições lhe valeram ataques da Inquisição a que ripostou, tendo mesmo obtido do Papa Clemente X a suspensão do Tribunal do Santo Ofício em Portugal durante algum tempo.

Durante a sua vida e particularmente no tempo de D. João IV, levou a cabo numerosas missões diplomáticas, tendo a sua acção sido crucial para o reconhecimento internacional da independência de Portugal recuperada em 1640. Em Roma, conheceu o maior sucesso tanto junto do Papa e da cúria romana, como da Rainha Cristina da Suécia que havia abdicado do trono e abraçado o catolicismo.

Depois de toda uma vida recheada, voltou ao Brasil e à defesa dos índios, tendo falecido na Baía em 18 de Julho de 1697.

O Padre António Vieira, pela obra que nos legou e pela acção de toda uma vida de afirmação de valores que deveriam ser de todos os tempos e ainda hoje muitas vezes esquecidos, bem merece toda a atenção e comemoração como exemplo maior da nossa História.


Publicado no DC em 11 de Fevereiro 2008


domingo, 10 de fevereiro de 2008

AINDA AS URGÊNCIAS

Após o afastamento de Correia de Campos tende a esbater-se a avalanche de notícias muitas vezes rocambolescas sobre os fechos de urgências.
Permanece, no entanto, um problema grave para além do sentimento de orfandade das populações do interior e da falta de coordenação entre INEM e bombeiros.
Nas urgências dos Hospitais da Universidade de Coimbra, que não são as de Faro e foram ampliadas para o Euro 2004 estavam, numa destas noites às 4 da manhã, 44 doentes em macas (a lotação prevista é de 17). Quando a uma situação destas se adiciona a circunstância (possível e pelos vistos frequente) de o chefe da equipa da urgência ter de apoiar ainda o seu serviço uns andares acima, a situação não andará longe do famoso caos.
Acresce que as unidades de saúde cujas urgências encerraram deixaram igualmente de internar esses doentes que vão para os hospitais centrais como os HUC que, com a sua lotação própria, dispensavam bem esta sobrecarga. Mais uma vez saliento que o SNS não cai fragosamente devido ao profissionalismo de médicos e enfermeiros que, como é habitual entre os portugueses, entendem colmatar com o seu empenho pessoal as falhas organizativas do sistema.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

SCHUBERT - continuação( 5)

Da banda sonora do Barry Lyndon faz igualmente parte o PIANO TRIO:

SCHUBERT - continuação( 4)

Quem se lembrar do Barry Lyndon de Kubrick recorda igualmente a DANÇA ALEMÃ (as imagens não são desse filme):

SCHUBERT - continuação( 3)

Aqui temos aquilo que para mim é o nec plus ultra de Schubert: o 4º andamento do Quinteto A TRUTA. Ainda por cima tive a sorte de encontrar a versão absolutamente superior tocada ao vivo por Daniel Barenboim, Zubin Mehta, Itzhak Perlman, Pinchas Zuckerman e a saudosa Jacqueline Du Pre.