Há quem pense que
a paz é a ausência de guerra. No entanto, pode-se estar num determinado momento
a gozar a paz, enquanto alguém prepara afanosamente uma guerra inevitável, tal
como o fim das guerras visíveis não significa que se entre em paz. Do
conhecimento de que a realidade é mesmo assim, duas conclusões se costumam
tirar. A primeira é que, se queremos a paz, temos que estar preparados para a
guerra; mesmo quando adormecemos numa paz tranquilizadora que nos leva a diminuir
os gastos militares, o melhor é ter aliados que nos garantam apoio, no caso de
virmos a necessitar dele. A segunda é que, por mais que isso nos custe, a paz
não surge normalmente por si mesma; para existir, é necessário construi-la,
dedicar-lhe esforços e energia.
O “médio-oriente”
tem sido fonte de graves conflitos com consequências humanitárias graves, como
aliás sucede hoje em parte da Síria e do Iraque onde um bando de islamitas
fanáticos tenta, com os meios do século XXI, implantar um regime puramente medieval
a que chama “califado”.
Um dos países mais
importantes da região é o Irão. Quer do ponto de vista de dimensão, de
localização e até mesmo histórico, o Irão ou como era antes conhecido, a
Pérsia, é um país incontornável no delicado e extremamente complicado xadrez do
médio-oriente. Que se pode igualmente tornar muito perigoso. Após a instauração
da República Islâmica em 1979 sob a liderança xiita do ayatollah Khomeini, o
Irão fechou-se numa teocracia radical, alterando completamente o modo de vida
dos iranianos até aí ocidentalizado. O Irão, que em 1968 havia subscrito o
Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, iniciou então um ambicioso
programa nuclear, que muitos temeram ter como fim último, não a utilização
pacífica da energia nuclear, mas a produção de armas nucleares. Alguns dos
periclitantes equilíbrios do “médio-oriente”, tendo em conta a reduzida
dimensão de Israel e o permanente conflito entre xiitas e sunitas, passam por o
xiita Irão ser uma potência económica comparável aos seus vizinhos sunitas,
designadamente a Arábia Saudita e por não surgirem novos países com capacidade
militar nuclear. Por isso, a partir de 2002, quando os rumores sobre os
esforços iranianos para conseguir a bomba atómica se tornaram em indícios
sérios de que tal estava a suceder, o ocidente iniciou um programa de sanções
económicas contra ao Irão que se reflectem hoje seriamente no modo de vida dos
iranianos.
O actual
presidente iraniano é Hassan Rohani, que participou nas antigas negociações
nucleares e que foi eleito com promessas de compromissos sérios com a
comunidade internacional, com o objectivo de acabar com o isolamento iraniano e
com as sanções económicas de que os iranianos estão cansados. Pelo seu lado, o
presidente Barack Obama decidiu juntar a comunidade internacional e aproveitar
a nova situação interna no Irão, mais favorável a negociações.
Depois dos
necessários contactos informais e secretos prévios, iniciaram-se as negociações
oficiais entre o Irão e o chamado grupo P5+1 constituído pelos cinco membros
permanentes do Conselho de Segurança (EU América, França, Grã Bretanha, China e
Rússia) mais a Alemanha que já fazia parte do grupo europeu que antes tinha
conduzido negociações com o Irão.
O objectivo
essencial do P5+1 era evitar que o Irão venha a desenvolver armamento atómico
ou, pelo menos, que o desenvolva de forma clandestina nos próximos anos.
As negociações
políticas, com as dificuldades que se podem adivinhar, chegaram a bom termo há
cerca de uma semana. Restam pormenores técnicos, apesar de tudo ainda muito
difíceis de acertar, até à data fixada de 1 de Julho para a assinatura do
Acordo que, a ser atingido, será histórico e provará, uma vez mais que, se
queremos a Paz, temos que trabalhar por ela.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Abril de 2015