O
equinócio do Outono chega na quarta-feira às nove e meia da manhã. Num dos dois
dias do ano em que a duração do dia é igual à da noite, a eclíptica passa para
o lado de “baixo” do equador celeste, sinalizando o início do Outono no nosso
hemisfério Norte.
Ao
contrário do que nos ensinaram das escolas, a Terra não tem só dois movimentos,
o de rotação em torno de si mesma e o de translação em volta do Sol. Dos mais
de dez movimentos que faz para além daqueles dois um deles, que já é conhecido
há alguns séculos, chama-se precessão. Tal como um pião que roda em torno do
seu eixo, mas de forma inclinada, também a Terra roda em torno do seu eixo,
estando este inclinado cerca de 23,5º em relação à perpendicular da eclíptica
que corresponde à órbita em torno do Sol.
Por isso, os pólos da Terra vão
descrevendo um círculo em torno da perpendicular da eclíptica, que se repete a
cada 26.000 anos, significando isso que não apontam sempre para o mesmo local
da esfera celeste. É assim que, se actualmente a estrela que vemos mais próxima
do pólo Norte é aquela a que chamamos Polar, daqui a uns 13.000 anos será a
estrela Vega que estará nesse local, para daqui a 26.000 anos ser de novo a
Polar, após o fecho do círculo.
Desde
muito cedo que os homens se habituaram a olhar para o firmamento, retirando
informações da regularidade dos movimentos dos diversos astros que viam, o que
lhes permitia prever eventos astronómicos. Daí às tentativas de prever o seu
próprio futuro através dos astros foi um passo, tendo-se assim desenvolvido a
astrologia, que ainda hoje tem muitos seguidores, como se vê nas televisões e
jornais. Só que, a realidade é muito mais complexa do que a simples observação
dos astros no firmamento. Além de a esfera celeste ser muito enganadora, dado
que os astros estão todos a distâncias muito diferentes de nós, embora pareçam colados
numa esfera, na realidade eles não estão sempre no mesmo sítio consequência,
entre outras causas, da precessão dos equinócios. Por isso, aquelas cartas
astrológicas muito bonitas e complexas que se fazem para prever a vida das
pessoas falham por completo para além claro, de todos nós termos a liberdade de
escolher os nossos caminhos independentemente do que alguns pensam “estar
escrito nas estrelas”. Quando olhamos para a História, podemos ter a tentação
de pensar que há uma lógica interna, um fio condutor qualquer pré-determinado
que a explica. Na realidade, a complexidade das relações sociais e económicas é
tão grande, que muitos dos eventos que mudaram o caminho da História poderiam
não ter acontecido ou poderiam ter funcionado ao contrário, apenas com uma
pequena variação de factores completamente imponderável.
Com
a evolução do conhecimento científico, a astrologia cedeu o seu papel à
astronomia, estando hoje remetida para o lugar das curiosidades e da exploração
dos mais crédulos.
Mas
a humanidade parece gostar e até precisar muito de “forças”, “magnetismos” e
“atracções” mais ou menos ocultas para explicar o que lhe vai acontecendo. Nas
últimas dezenas de anos novas cartas astrológicas parecem ter vindo substituir
as antigas, com o objectivo de prever e, se possível, construir o futuro. Acompanhando
a crescente invasão de toda a actividade humana pelas finanças, os economistas,
particularmente os que se dedicam à econometria, têm vindo a desenvolver
modelos matemáticos cada vez mais complexos e inacessíveis ao vulgar cidadão,
onde introduzem uma imensidade de dados históricos, assim calculando
multiplicadores que, como por magia, se aplicados ao presente permitiriam conhecer
o futuro. Esquecendo-se daquela velha história que ensina que o bater de asas
de uma borboleta no Japão pode provocar um furacão no Atlântico, pretendem
reduzir a complexidade das relações humanas a uma simples relação directa de causa-efeito,
sem perceberem que tomam o lugar das leitoras de cartas Tarot. E, ainda por
cima, com frequência erram gravemente no cálculo dos multiplicadores, como já
aconteceu com o próprio FMI.
Certamente
que o conhecimento do passado, também nas chamadas ciências económicas, é
extremamente importante para tomar boas decisões, até para evitar erros
passados. Mas daí a pensar que se pode prever o futuro com fórmulas matemáticas
que ainda por cima escondem pressupostos escolhidos à vontade do freguês, vai o
passo que faz a diferença entre a ciência e a... chamemos-lhe fantasia, que até
tem o condão de deixar mal quem nela cai na asneira de confiar cegamente.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 21 de Setembro de 2015