segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Donne - Zucchero obrigado aos meus visitantes de Itália

“A Banca em Portugal”



Comecei por colocar no título desta crónica “a banca portuguesa”, mas depressa me dei conta do erro que constituiria. É que quase já não há banca portuguesa, isto é bancos com capital social de origem maioritariamente portuguesa. O que tem consequências para o tecido empresarial, porque a falta de capital em Portugal se estende até à Bolsa reduzida hoje à sua ínfima espécie, não constituindo alternativa efectiva à capitalização das empresas.
O que aconteceu aos bancos em Portugal nos últimos quinze anos é um pesadelo. Começou em 2008 com a nacionalização do BPN. Em vez de se limitar os prejuízos provocados pelos desmandos dos administradores aos accionistas do banco, distribuiu-se a factura pelos portugueses e estima-se que o seu valor não andará longe dos 5.400 milhões de euros. Os responsáveis, cujos nomes todos os portugueses conhecem, andam por aí felizes e contentes, não estando nenhum atrás das grades enquanto decorrem vários processos ligados ao caso e outros já prescreveram.
Continuou com o BPP, um “banco de ricos”,que faliu em 2010, tendo o Estado ficado credor em 446 milhões de euros de que já recuperou 165 milhões havendo boas hipóteses de recuperar tudo o resto. Os administradores foram absolvidos do crime de burla qualificada, tendo sido condenados com pena suspensa por terem ocultado contabilisticamente as perdas do Banco.
Não se pode deixar de referir o sucedido no BCP, com a tentativa de tomada de controlo acionista por parte de algumas empresas e personalidades apoiadas financeiramente pela CGD em condições mais que duvidosas. Não faliu, mas viu o seu valor cair a pique, com a necessidade da realização de operações de reavaliação de acções e de entrada de novos accionistas de referência com capital estrangeiro, representando hoje a participação accionista portuguesa cerca de 30% do total. Estes “negócios” que tiveram, no mínimo, a conivência governamental nunca foram devidamente escrutinados, quer pelo Banco de Portugal, quer pela CMVM, quer pela própria Justiça.

O que aconteceu ao BES em Agosto de 2014 é, talvez, o maior escândalo da banca portuguesa, desde sempre. A coberto de um nome com grande prestígio na banca internacional, a administração misturou banco com os negócios privados da família, escondeu prejuízos, em suma, enganou toda a gente. A factura do resgate traduziu-se por 4.900 milhões de euros naquele momento, mas continua a subir, nomeadamente em apoios ao Novo Banco, criado para receber os activos “bons” do ex-BES e que desde 2017 pertence à Lone-Star. Os processos judiciais continuam a decorrer, sem se poder prever quando terminarão.
O BANIF era um pequeno banco que estava em incumprimento de pagamento de 125 milhões de euros de CoCos e respectivos juros desde 2014. Em 13 de Dezembro de 2015 a TVI anunciou que o BANIF ia ter intervenção pública, pelo que nos dias seguintes os depositantes levantaram quase mil milhões de euros, o que provocou imediatamente o processo de resolução do banco. Também neste caso não se conhecem consequências judiciais do sucedido.
O banco dos portugueses que se chama Caixa Geral de Depósitos, cujo único accionista é o Estado, também não escapou ao vórtice em que se tornou a finança. Fosse pelas consequências da crise, ou por erros crassos de gestão, os prejuízos cresceram de tal forma que o accionista Estado, através do Governo, se viu obrigado a meter lá mais de 4.000 milhões de euros.
Em resultado disto tudo os impostos dos portugueses já serviram, nos últimos dez anos, para pagar à banca, de uma forma ou de outra, mais de 22 mil milhões de euros. Corresponde ao BPN que tem atravessado 3 governos, aos 8,2 mil milhões do governo anterior e aos 9 mil milhões do actual governo cujos apoiantes, curiosamente, defendiam até há 3 anos “nem mais um cêntimo para a banca”. Como todos sabemos, quando os bancos dão lucro distribuem dividendos pelos seus accionistas, o que é a normal remuneração do seu empate de capital. Mas hoje em dia, quando estão à beira da falência, são os impostos dos cidadãos que os vão salvar, o que já não é normal. Esta pouca-vergonha tem que ter um fim, que aliás se adivinha para breve, quando todos os bancos tiverem capital maioritário estrangeiro. E acaba por ser este o fecho do ciclo iniciado com as nacionalizações em Março de 1975, com a finança a seguir o caminho das grandes empresas que já foram portuguesas e estão hoje todas em mãos estrangeiras.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 18 de Fevereiro de 2019

António Guterres

Ainda ninguém avisou o Sec. Geral das Nações Unidas sobre a situação na Venezuela? De que está à espera para mandar lá a Angelina resolver a questão? Sempre seria melhor do que mais tarde ter que mandar uns tantos capacetes azuis!

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Estado e economia

Continua a conversa da treta:
"...Num ano de eleições, vai ser preciso fazer mais pelas empresas e pelo investimento para regressar aos níveis de crescimento que nos levem para o pelotão da frente..."
O (magro) crescimento destes últimos anos foi tão consequência do ambiente externo como agora a sua diminuição é consequência das mesmas condições externas. Uma pequena economia aberta como a nossa dependerá sempre do exterior.Claro que o governo diz que o crescimento foi devido à sua acção e a falta dele é culpa do exterior, mas todos sabemos que isso é mentira. E enquanto o nosso trabalho interno não for feito, será sempre assim.
O que o articulista do Público acima refere na citação reflecte o mesmo pensamento de sempre: que é o Estado a puxar pela economia. Ora está mais que provado que isso não é assim. O Estado tem é que reduzir o seu peso, nomeadamente na carga fiscal e melhorar ao ambiente para as empresas. Se fizer isso, em vez de orientar o crescimento, os resultados aparecerão com o aumento de produtividade que está estagnada há quase 20 anos.


 https://www.publico.pt/2019/02/15/economia/editorial/nao-fim-mundo-apenas-fim-festa-1862054?fbclid=IwAR22LAvnpFl8qrxL_AY3Sj6iNSi0jbK4HA2cdavi6Lsgv9Ws7rc3E7jtWkw

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Sempre a crescer. Depende do ponto de vista, claro.

Em 2015, os sábios economistas capitaneados por aquele que viria a ser o ministro das Finanças da geringonça, previram que, com eles a governar, o país iria crescer a uma média de 2,7% nos quatro anos da legislatura.
Claro que, infelizmente, aquele valor nunca foi alcançado. Para este ano, a Comissão Europeia prevê mesmo 1,7% em vez dos 2,1 do governo.
O rendimento per capita dos portugueses relativamente à média europeia diminuiu de 82% em 2000 para 74% em 2018.
Vergonha de políticos e pobre país.


segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

O PSD E O PAÍS



“É, pois, da confluência destes legados - social-cristão, social-liberal com afloramentos social-democráticos e social-tecnocrático – que nasce o PPD!”
Pela caneta insuspeita de Marcelo Rebelo de Sousa no seu “A REVOLUÇÃO E O NASCIMENTO DO PPD” sabemos tudo o que historicamente se passou nos primeiros tempos do PSD. Nos primeiros dias de Maio de 1974 os fundadores do PPD, Sá Carneiro, Pinto Balsemão e Magalhães Mota, disputavam com o PS os membros e aderentes da SEDES que se distribuíram pelos dois partidos, moldando em grande medida, o que estes viriam a ser no futuro. Foi assim que, no PSD, desde logo conflituaram duas grandes linhas programáticas que, se durante a maior parte do tempo conviveram e até se apoiaram numa visão reformista mais abrangente, por vezes levaram a lutas e divergências com dissensões graves e abandonos do partido. Tal foi mais visível nos anos a seguir ao 25 de Abril, tendo Sá Carneiro tido que travar lutas muito sérias até à sua morte em Dezembro de 1980, para conduzir o PSD à linha que pensava ser a mais adequada ao desenvolvimento do país, saído de uma ditadura de mais de quarenta anos e de uma tentativa de revolução socialista após a libertação de Abril de 74.
Logo em Maio de 74 Sá Carneiro mostrou a Barbosa de Melo um anteprojecto de bases programáticas para o novo partido, que de imediato foram consideradas por este como sendo de um partido liberal e não social-democrático. O grupo de Coimbra foi então encarregado de elaborar as linhas programáticas do novo partido, aí aparecendo as palavras “socialismo” e mesmo “projecto socialista”. Era um tempo em que até Mário Soares definia o PS como um partido “não burguês” e como sendo o partido da classe operária.
Como sabemos, a realidade da vida ditaria coisas muito diferentes. Sá Carneiro defrontou sucessivas investidas esquerdizantes, por vezes com contornos épicos. Primeiro foi Sá Borges e o seu grupo que acabaram por abandonar o PPD em Dezembro de 1975. Em Junho de 1978 a luta interna acentuou-se surgindo o chamado “documento dos inadiáveis” a que se seguiu em Abril de 79 o abandono do partido por parte de 37 deputados, ficando o grupo parlamentar do PSD com apenas 36 deputados. Contudo, no fim desse ano Sá Carneiro é eleito primeiro-Ministro ao vencer pela primeira vez as eleições legislativas com a Aliança Democrática, vitória repetida em Outubro do ano seguinte, dois meses antes de ser assassinado.

Foi com Cavaco Silva que o PSD viria a ser governo sozinho em 1987 e 1991, tendo vencido essas eleições com maioria absoluta, federando as direitas, já que o CDS obteve menos de 5% em cada uma delas. Em 1985 Cavaco Silva havia chegado ao governo em minoria, pelo fenómeno anómalo do PRD, depois da experiência do Bloco Central de 83, com Mário Soares como primeiro-Ministro e Mota Pinto vice primeiro-Ministro, ter provocado forte contestação dentro do PSD.
Em 1999 seria Marcelo Rebelo de Sousa a tentar outra aliança à direita, enquanto líder do PSD. A sua liderança foi então objecto de pesadas críticas internas por parte de sectores liderados por Durão Barroso que entendiam não poder o PSD aliar-se a um CDS liderado por Paulo Portas, o que levou mesmo à demissão de Marcelo da presidência do partido. O líder seguinte, o próprio Durão Barroso, não teve no entanto quaisquer problemas em formar governo com Paulo Portas a seguir às eleições de 2002, após a desistência de Guterres perante o pântano que ele próprio criou.
O PSD voltou a ganhar as eleições em 2011, formando governo com o CDS sendo primeiro-Ministro Pedro Passos Coelho, na sequência da pré-bancarrota que obrigou Sócrates a chamar a troica com um programa de ajustamento e consequente forte austeridade. Em 2015 a coligação PSD/CDS foi a mais votada, mas o PS com António Costa conseguiu negociar o apoio parlamentar da extrema-esquerda - comunistas e bloquistas, e tornar-se primeiro-Ministro, até hoje.
Todo este histórico ensina várias coisas. Em primeiro lugar, as veleidades de socialismo democrático do PSD foram ultrapassadas pelo próprio Sá Carneiro e não passam hoje de curiosidade histórica de um momento político bem datado do país. Por outro lado, o PSD só governou quando, sozinho ou coligado com o CDS, se conseguiu afirmar convictamente como alternativa ao PS.

Texto publicado originalmente no Diário de Coimbra de 11 de Fevereiro de 2019

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

"Don't let the door hit you on the way out."



Ou em português corrente, “a porta da rua é a serventia da casa” deve ser o que os outros 27 membros da União Europeia terão vontade de dizer perante as posições do Reino Unido depois de, por sua livre iniciativa, terem decidido sair da União onde, desde que entrou, é notório que o país não se sente bem.
Relembrando o início disto tudo, foi o antigo primeiro-Ministro britânico David Cameron que, perante dificuldades dentro do seu próprio Partido Conservador, resolveu colocar a possibilidade de um referendo para o Brexit no programa eleitoral e, pior ainda, propô-lo ao povo britânico em Junho de 2016. Para surpresa geral, os eleitores escolheram sair da União Europeia e David Cameron é hoje lembrado como o pior primeiro-Ministro da História do Reino Unido.
Nestas últimas semanas os políticos britânicos têm mostrado ao mundo uma estranha forma de reagir aos acontecimentos, mais parecendo uma fuga desnorteada à realidade. Após dois anos de negociações difíceis, com marcação de limites mútuos impossíveis de transpor, as chamadas linhas vermelhas, o governo britânico e a União Europeia chegaram ao Acordo possível. Contudo, num espectáculo seguido por todo o mundo, o Parlamento Britânico, enquanto ouvia as chamadas à razão “Order, Order, Order”pelo seu carismático e improvável speaker John Bercow, reprovou o Acordo e logo depois reprovou igualmente uma Moção de Censura ao Governo apresentada pelo líder do Partido Trabalhista. A primeira-Ministra referiu que, a partir daquele momento, se sabia o que o Parlamento não queria, mas não o que queria. Não passaram muitos dias sem que o Parlamento aprovasse uma Emenda segundo a qual o Reino Unido não poderá sair da União Europeia sem acordo. Theresa May veio logo dizer que agora sim, já se sabe o que o Parlamento quer, garantindo ter forças para novas negociações com a União Europeia.
Para quem observa de fora, tudo isto seria patético, se não fosse trágico. Os políticos britânicos agem como se as decisões do seu Parlamento fossem ordens para a União Europeia. Ainda não perceberam que os tempos do Império Britânico acabaram no fim da 1ª Grande Guerra, tal como os outros impérios que nesse momento histórico tiveram o seu fim, o Império Austro-Húngaro e o Império Otomano.

Acontece que a vitória do referendo do Brexit se deveu muito ao apelo dos populistas precisamente à memória de quando os britânicos governavam o mundo e não precisavam de mais ninguém para serem uma grande potência comercial. E, de cada vez que Theresa May vai a Bruxelas armada com as grandes decisões do parlamento britânico, vem de lá de mãos a abanar por razões muito simples, mas muito fortes. Do outro lado estão 27 países que também têm os seus próprios interesses e, fundamentalmente, o essencial daquilo que os mantém unidos. A União Europeia não pode aceitar livre trânsito de mercadorias sem que seja acompanhada da livre circulação de pessoas, bem como não pode prescindir da fronteira externa comum, o que choca com o estatuto da Irlanda do Norte que partilha a ilha com a República da Irlanda que não vai sair da União. E é nestas matérias, precisamente, que o Reino Unido quer lhe sejam permitidas excepções.
Por escolha do próprio Reino Unido, foi definida a data de 29 de Março de 2019 para abandono da União Europeia. O prazo aproxima-se e os britânicos continuam a tomar decisões como se a União Europeia tivesse que fazer alguma coisa, quando já negociou o acordo de saída. A emenda aprovada que exige um acordo antes da saída, ao contrário do que o Governo britânico parece pensar, obriga-o a ele e não à União Europeia. Por outro lado, dentro de 4 meses haverá eleições para o novo Parlamento Europeu, no qual já não haverá representantes do Reino Unido. Acredito que, em nome de um espírito de colaboração europeu, a União Europeia aceite uma prorrogação do prazo, a pedido do Reino Unido. Mas cabe aos britânicos decidir o que fazer, eventualmente um segundo referendo de que ninguém, verdadeiramente, pode prever o resultado.
Texto publicado originalmente no Diário de Coimbra em 4 de Fevereiro de 2019