Estamos no fim de Junho,
Julho já é mês de férias para muita gente e de Agosto, nem se fala, fica o país
parado. Isto é, sendo as eleições legislativas na primeira semana de Outubro,
restará Setembro para os partidos apresentarem as suas propostas e argumentos,
sem que haja tempo para discutir seriamente, seja o que for. Isto significa
que, caso não haja nenhum cataclismo, por natureza imprevisível, os eleitores
pouco mudarão o seu sentido de voto daqui para diante. As opções políticas
serão, assim, mais fruto do que se passou nos últimos anos, do que daquilo que
a imaginação dos dirigentes partidários conseguirá ainda produzir para tentar
convencer eventuais indecisos.
E o que se passou em
Portugal nos últimos quatro anos? As eleições ocorreram no final de 2015 quando
o país tinha dado a volta e todos os índices já tinham invertido a trajectória
descendente anterior, casos do crescimento económico e do desemprego. A
esquerda parlamentar deu ao PS a possibilidade de formar Governo minoritário,
garantindo-lhe a estabilidade através da aprovação dos Orçamentos de Estado.
Contudo, essa garantia foi obtida com negócios bilaterais, nunca tornados
públicos, do PS com o PCP e o BE (além dos Verdes) construindo uma maioria
aritmética, mas não uma plataforma política comum. Esta circunstância, que pode
parecer de somenos, não o é, tendo implicações muito sérias na governação do
país, cujos sinais se revelam neste momento, a poucos meses das novas eleições.
O primeiro orçamento do Governo
socialista, que ainda seguia as orientações políticas propostas eleitoralmente,
embateu com violência em Bruxelas, regressando para ser alterado, iniciando-se
aí uma reviravolta que erigiu o défice como prioridade máxima. Embora os
partidos apoiantes do governo na AR tenham aqui e ali manifestado alguma
discordância, o que é facto é que, nos momentos cruciais da aprovação dos
orçamentos, não falharam permitindo ao PS apresentar-se, no fim da legislatura,
como o novo campeão da luta pelas boas contas públicas. Claro que, como “não há
sol na eira e chuva no nabal”, a reversão das privatizações no transportes e a
recuperação dos cortes ao funcionalismo público tiveram que ser suportadas por
aumentos de impostos, no caso os indirectos, estando o país com a maior carga
fiscal desde 1995, sendo mesmo a “pressão fiscal”, que relaciona a carga fiscal
com os rendimentos das famílias, a maior de toda a União Europeia. Mas como os
impostos não foram suficientes, assistiu-se nesta legislatura a um corte
gigantesco no investimento público, enquanto as cativações foram utilizadas no
controlo da despesa pelas Finanças como nunca antes, em Democracia. As
consequências são já, neste momento, claramente visíveis no SNS e nos
transportes públicos, mas irão agravar-se seriamente nos próximos tempos. O anémico
crescimento económico dá uma sensação de recuperação muito bem aproveitada pelo
Governo, que vai dizendo que o país cresce acima da média europeia; esconde é
que essa média tem sido atirada para baixo pelos grandes países e que Portugal
desceu um lugar por ano durante a legislatura, aproximando-se perigosamente na
lanterna vermelha. Ao longo da legislatura, PCP e BE não foram mais do que
instrumentos de poder do PS, pelo que os seus resultados eleitorais deverão
reflectir isso mesmo.
E quanto à oposição de
direita? A passagem do PS para o lado dos defensores das boas contas, contrariando
o que fez antes, parece ter deixado PSD e CDS sem discurso. Em vez de saudarem
a passagem do PS para o lado da disciplina orçamental, manifestam incapacidade
de perceber que essas regras são um patamar mínimo de entendimento dos europeístas
convictos. É a partir daí que a direita deverá apresentar as suas próprias
propostas de actuação política, começando pelo crescimento económico, pela
liberdade de iniciativa, por uma reorganização mais eficiente do Estado a todos
os níveis e por garantir uma sustentabilidade social e ambiental na ocupação do
território, incluindo uma efectiva política de cidades. Propostas em tudo alternativas
ao actual estado de coisas, com outro modelo de sociedade. São aquilo que não
se tem visto a direita propor aos portugueses o que, ao que tudo indica, se
traduzirá num péssimo resultado eleitoral em Outubro, pelo que será a grande
responsável por uma maioria absoluta de António Costa.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 24 de Junho de 2019