segunda-feira, 24 de junho de 2019

AÍ ESTÃO AS ELEIÇÕES


Estamos no fim de Junho, Julho já é mês de férias para muita gente e de Agosto, nem se fala, fica o país parado. Isto é, sendo as eleições legislativas na primeira semana de Outubro, restará Setembro para os partidos apresentarem as suas propostas e argumentos, sem que haja tempo para discutir seriamente, seja o que for. Isto significa que, caso não haja nenhum cataclismo, por natureza imprevisível, os eleitores pouco mudarão o seu sentido de voto daqui para diante. As opções políticas serão, assim, mais fruto do que se passou nos últimos anos, do que daquilo que a imaginação dos dirigentes partidários conseguirá ainda produzir para tentar convencer eventuais indecisos.
E o que se passou em Portugal nos últimos quatro anos? As eleições ocorreram no final de 2015 quando o país tinha dado a volta e todos os índices já tinham invertido a trajectória descendente anterior, casos do crescimento económico e do desemprego. A esquerda parlamentar deu ao PS a possibilidade de formar Governo minoritário, garantindo-lhe a estabilidade através da aprovação dos Orçamentos de Estado. Contudo, essa garantia foi obtida com negócios bilaterais, nunca tornados públicos, do PS com o PCP e o BE (além dos Verdes) construindo uma maioria aritmética, mas não uma plataforma política comum. Esta circunstância, que pode parecer de somenos, não o é, tendo implicações muito sérias na governação do país, cujos sinais se revelam neste momento, a poucos meses das novas eleições.

O primeiro orçamento do Governo socialista, que ainda seguia as orientações políticas propostas eleitoralmente, embateu com violência em Bruxelas, regressando para ser alterado, iniciando-se aí uma reviravolta que erigiu o défice como prioridade máxima. Embora os partidos apoiantes do governo na AR tenham aqui e ali manifestado alguma discordância, o que é facto é que, nos momentos cruciais da aprovação dos orçamentos, não falharam permitindo ao PS apresentar-se, no fim da legislatura, como o novo campeão da luta pelas boas contas públicas. Claro que, como “não há sol na eira e chuva no nabal”, a reversão das privatizações no transportes e a recuperação dos cortes ao funcionalismo público tiveram que ser suportadas por aumentos de impostos, no caso os indirectos, estando o país com a maior carga fiscal desde 1995, sendo mesmo a “pressão fiscal”, que relaciona a carga fiscal com os rendimentos das famílias, a maior de toda a União Europeia. Mas como os impostos não foram suficientes, assistiu-se nesta legislatura a um corte gigantesco no investimento público, enquanto as cativações foram utilizadas no controlo da despesa pelas Finanças como nunca antes, em Democracia. As consequências são já, neste momento, claramente visíveis no SNS e nos transportes públicos, mas irão agravar-se seriamente nos próximos tempos. O anémico crescimento económico dá uma sensação de recuperação muito bem aproveitada pelo Governo, que vai dizendo que o país cresce acima da média europeia; esconde é que essa média tem sido atirada para baixo pelos grandes países e que Portugal desceu um lugar por ano durante a legislatura, aproximando-se perigosamente na lanterna vermelha. Ao longo da legislatura, PCP e BE não foram mais do que instrumentos de poder do PS, pelo que os seus resultados eleitorais deverão reflectir isso mesmo.

E quanto à oposição de direita? A passagem do PS para o lado dos defensores das boas contas, contrariando o que fez antes, parece ter deixado PSD e CDS sem discurso. Em vez de saudarem a passagem do PS para o lado da disciplina orçamental, manifestam incapacidade de perceber que essas regras são um patamar mínimo de entendimento dos europeístas convictos. É a partir daí que a direita deverá apresentar as suas próprias propostas de actuação política, começando pelo crescimento económico, pela liberdade de iniciativa, por uma reorganização mais eficiente do Estado a todos os níveis e por garantir uma sustentabilidade social e ambiental na ocupação do território, incluindo uma efectiva política de cidades. Propostas em tudo alternativas ao actual estado de coisas, com outro modelo de sociedade. São aquilo que não se tem visto a direita propor aos portugueses o que, ao que tudo indica, se traduzirá num péssimo resultado eleitoral em Outubro, pelo que será a grande responsável por uma maioria absoluta de António Costa. 

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 24 de Junho de 2019

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