sexta-feira, 6 de março de 2020

AUSTERIDADE NA SAÚDE

Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades. O Governo mandou embora o responsável pela «linha 24». O homem resolveu mostrar as contas, que dão origem ao gráfico abaixo. Vergonha para os responsáveis governamentais, para os que no Parlamento sustentaram isto como o fim da austeridade, vergonha para quem cala para o povo sofrer. A começar pelo Presidente da República.
 Nota: agora soube-se disto. Esperem pelo resto.



terça-feira, 3 de março de 2020

Cem anos depois, relembrar Weimar, república e cultura


Do Tratado de Versalhes que a Alemanha foi obrigada a assinar em Junho de 1919, fechando-se assim a chamada Primeira Guerra Mundial terminada em 1918 muito se tem dito, designadamente sobre as consequências pesadas para a Alemanha defendendo-se, com muitas razões, que a Grande Guerra que se lhe seguiu vintes anos depois, não foi mais que a continuação daquela. É mesmo possível detectar, aqui e ali, comentários que, de certa forma, parecem desculpabilizar o que se lhe seguiu, Hitler e o Nacional-Socialismo, como uma sequência histórica quase normal, por uma sua inevitabilidade.
Nada de mais errado. À derrota alemã, seguiu-se a queda da monarquia e eleição da Assembleia Constituinte alemã, logo em Janeiro de 1919, a que se seguiu a primeira experiência democrática alemã, a República de Weimar, declarada ainda nesse ano. Esta cidade da Turíngia tinha um passado cultural a que se podem associar nomes como Goethe, Schiller, Bach ou Liszt e havia-se tornado um pólo cultural de grande intensidade, em grande parte pelo classicismo que se deve àqueles e muitos outros artistas.
A partir de 1911 o arquitecto Walter Gropius reuniu uma plêiade de técnicos e artistas das mais variadas áreas na Escola de Artes e Ofícios de Weimar. Assim se desenvolveu um novo tipo de arquitectura que, à função restrita dos edifícios, associava conceitos de simplicidade e de depuração de formas, além da utilização de materiais que permitissem produção em larga escala, como o betão e o vidro para fachadas. De entre os muitos professores convidados podem citar-se Kandisky, Paul Llee ou Laszló Nagy, pelo que se percebe o nível e a sofisticação da investigação e do ensino da Escola. Em Abril de 1919 Walter Gropius publicou um manifesto que se considera como o início da Bauhaus, termo que inverte a palavra que, em alemão, significa «construção de casa» - «hausbau» e que só por si indica o que lá se praticava como inovação. Em 1925 a Escola foi transferida para Dessau e, por fim, para Berlim em 1930, tendo fechado definitivamente as portas em 1933, com a chegada dos nacional-socialistas de Hitler ao poder. Muitos professores e antigos alunos da Bauhaus espalharam-se pelo mundo inteiro, influenciando de forma radical a arquitectura e o design como fusão da arte e da função até aos nossos dias e vários edifícios nas cidades de Weimar e Dessau inspirados na Bauhaus são hoje classificados património mundial pela Unesco.
Enquanto toda esta actividade de vanguarda sucedia na Alemanha, no mesmo país nascia e crescia a verdadeira serpente do mal, o nacional-socialismo. A inflação dos anos vinte, associada ao peso dos castigos de guerra, a que se juntaram as trágicas consequências da «grande depressão» de 1929 criaram nas classes médias-baixas alemãs um sentimento de revolta receptivo aos populismos mais desenfreados A tudo isto Hitler e os seus apaniguados acrescentaram a invenção de um «culpado» genérico por tudo o que de mau acontecia, os judeus. Se nas eleições de 1928 o partido nazi conseguia apenas 2,6% dos votos, em Setembro de 1930 obteve já 18,3% dos votos tornando-se o segundo maior partido no Reichstag, depois do partido social-democrata SPD. Após um governo minoritário fraco e pressões de luta nas ruas, em novas eleições realizadas em Julho de 1932 o partido nazi obteve 37,4%, tornando-se no maior partido do parlamento. Em Janeiro de 1933 Hitler tomou posse como chanceler da Alemanha e, logo em 27 de Fevereiro seguinte dá-se o incêndio no Reichstag, oportunidade para Hitler suspender as liberdades civis e instaurar a ditadura, ditando assim o fim da República de Weimar que durou, portanto, escassos 11 anos
O que se passou a seguir é, infelizmente, bem conhecido de todos nós. Podia não ter acontecido assim, se a falta de coragem, a inércia e o oportunismo de muitos, da esquerda à direita, não tivessem deixado o campo livre à barbárie de um dos piores grupos de assassinos que o mundo já conheceu. Impressionante e perturbador é que, num país em que a Filosofia, o Direito, mas também as Artes, atingiram os píncaros das mais elevadas realizações humanas, tenham surgido as mais baixas pulsões que, a certa altura, tudo devoraram e destruíram. Isto aconteceu há cem anos. Desde então, têm sido construídas as mais variadas pontes entre povos com tratados, uniões, etc., com o objectivo de evitar repetições da História. Mas todos os dias vemos como a Democracia é um edifício frágil, atacado quer por dentro por oportunistas e corruptos vários, quer de fora através dos populismos mais descarados.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra, em 2 de Março de 2020

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

«O TRIBUNAL DE CONTAS DE MENTECAPTOS»


Porventura, já pouca gente se lembrará de uma questão que encheu os cabeçalhos dos jornais e os telejornais há bem poucas semanas. De facto, as agendas políticas construídas para despistar os cidadãos incautos servem para isso mesmo: inundar os media permanentemente com notícias bombásticas, de preferência escabrosas, cujo fim último é o de provocar escândalos e correspondentes gritarias de indignação (gatunos, são todos iguais!) adormecendo consciências e afastando o interesse das pessoas da coisa comum. A história do Pedro e do lobo é bem conhecida, pelo que se tornam dispensáveis mais comentários sobre o assunto, a não ser que num dia destes o ovo da serpente abre-se mesmo e ninguém dará conta disso.
O título desta crónica recupera o comentário de um político socialista com grande notoriedade, logo também responsabilidades correspondentes, sobre uma auditoria do Tribunal de Contas que se debruçou sobre a venda de património imobiliário da Segurança Social à Câmara Municipal de Lisboa.
A justificação para essa venda deu-a o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, sendo os imóveis em causa destinados a concretizar as suas políticas de habitação social para o Município de Lisboa.
A primeira questão que se levanta com este negócio tem a ver com a natureza da entidade pública que vendeu o património e quais os fins a que se destina. De facto, deve o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, ao alienar património, procurar que a receita, que reverte obrigatoriamente para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, seja a mais elevada possível. O facto de os trabalhadores e empresas de todo o país descontarem dos seus vencimentos para a Segurança Social tendo em vista garantir as verbas necessárias para as prestações sociais, designadamente as pensões dos reformados, exige o máximo rigor e cuidado na gestão desses activos, principalmente num tempo em que a sustentabilidade da Segurança Social é um problema nacional. 
Entre os objectivos da Segurança Social não consta o apoio à prossecução de uma política habitacional, ainda que nacional, e muito menos de uma determinada Autarquia, mesmo que seja a capital do país, o que se traduz, de imediato, num tratamento de favor em prejuízo das restantes trezentas e tal autarquias.
Por outro lado, o Tribunal de Contas verificou que a venda dos 11 imóveis ficou 3,5 milhões abaixo das avaliações. Para além das próprias avaliações que não terão sido feitas por entidades externas e sim pelo comprador e pelo vendedor, a diferença no valor traduz um frete da Segurança Social à Câmara Municipal de Lisboa.
Tudo isto cheira, a léguas, a compadrio político e política da mais rasteira que pode haver, ainda por cima à custa da sustentabilidade da Segurança Social e já seria suficiente mau se tivesse ficado por aqui. Mas não. Perante a denúncia do Tribunal de Contas que, note-se, é um Tribunal, as reacções foram demonstrativas de uma arrogância e demonstração de “quero, posso e mando” inaceitáveis num regime que se quer democrático.
O presidente da Câmara Fernando Medina reagiu de forma violenta e mesmo algo descontrolada, com acusações ao Tribunal de Contas de estar a «fazer política», de lhe fazer perseguição política e mesmo de “fazer relatórios de baixíssima qualidade técnica”. As reacções chegaram ao ponto de o tal deputado socialista ter escrito na internet: "O relatório do Tribunal de Contas sobre o negócio entre a Câmara de Lisboa e a Segurança Social deve ter sido escrito por mentecaptos, lido por mentecaptos e sancionado por mentecaptos…”. Fica provado que a linguagem própria das discussões futebolísticas das televisões invadiu já a política, para o pior.
Depois disto, o Governo encontrou uma solução à medida para resolver este e outros problemas semelhantes no futuro: retirar competências ao Tribunal de Contas e acrescentar camadas de obscuridade à já pouco transparente política governativa. Assim, no Orçamento Geral do Estado para 2020, o Governo isentou de visto prévio do TdC "os contratos e demais instrumentos jurídicos que tenham por objeto a prestação de serviços de elaboração e revisão de projeto, fiscalização de obra, empreitada ou concessão destinada à promoção de habitação acessível ou pública ou alojamento estudantil”. A isto acrescentou-se ainda «as reabilitações e aquisições de imóveis».
Pode haver quem ache tudo isto muito bem e está no seu direito. Contudo, direito ainda maior é o de todos sabermos o que se passa com transparência, de que forma são executadas as políticas e como são utilizados os dinheiros que não são do governo nem de um presidente de câmara e sim dos portugueses que pagam isto tudo com os seus impostos.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 24 de Fevereiro de 2020

John Lee Hooker & Johnny Rivers - Satisfaction ( Long ) ( 1973 )

sábado, 22 de fevereiro de 2020

Edith Piaf Non Je Ne Regrette Rien [Live]

Vasco Pulido Valente

Já não voltaremos a ter o prazer de ler novas crónicas de Vasco Pulido Valente.

Para recordar, aqui fica a sua análise ao grande livro «Portugal Contemporâneo» de Oliveira Martins que, em muitos aspectos, é bem contemporâneo dos nossos dias,além de o ser do sec. XIX português.
Foto levada do blogue portadaloja.blogspot.com/.