segunda-feira, 14 de maio de 2018

Trump cumpre



Ano e meio depois de ser eleito, o presidente americano cumpriu na semana passada uma das suas promessas eleitorais, ao decidir quebrar a participação do seu país no acordo nuclear com o Irão conhecido por JCPOA (Joint Comprehensive Plan of Action) assinado em 2015 pelos EUA em conjunto com a França, o Reino Unido, a Alemanha, a Rússia e a China além, claro, do Irão. O acordo visa, fundamentalmente, evitar que o Irão venha a desenvolver armas nucleares, constituindo um passo muito importante na luta contra a proliferação nuclear, ainda por cima numa zona com uma conflitualidade histórica permanente, como é o médio-oriente. O Irão viu descongelados os seus bens no estrangeiro e serem retiradas as sanções económicas sendo ainda autorizado a vender petróleo, o que lhe permitiu ser hoje o quinto maior produtor de crude do mundo levando a economia a uma recuperação impossível sem este acordo. Como contrapartida, o Irão reduziu em 13.000 as quase 20.000 centrifugadoras utilizadas para enriquecer urânio, entregou cerca de 98% do stock de urânio enriquecido que possuía e desmantelou o seu único reactor de plutónio. Este complexo nuclear permitiria, logo em 2015, fazer uma bomba nuclear em poucos meses se o Irão decidisse seguir por esse caminho, sendo possível fabricar até dez bombas nucleares com o material já existente. Dos prazos constantes do acordo faz parte o fim do embargo às armas iranianas em 2020, podendo o Irão retomar o seu programa nuclear com fins pacíficos em 2030 terminando as inspecções às centrifugadoras em 2035.

A monitorização deste conjunto de medidas cabe à Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), uma agência que depende da ONU. Desde o início do JCPOA em 1 de Janeiro de 2016 a AIEA já produziu 10 relatórios a certificar o cumprimento do acordo por parte do Irão levando toda a comunidade internacional envolvida a descansar sobre a execução do acordo.
Todos, excepto o presidente americano que, desde a campanha eleitoral tem classificado o acordo como um desastre, em parte pelos prazos indicados que, segundo ele, permitem ao Irão vir a desenvolver armas nucleares, e pelo dinheiro que entende estar a ser “dado” ao Irão com o fim das sanções económicas. Trump encontra-se agora bem acompanhado nestas suas opções, já que o novo Conselheiro de Segurança John Bolton defende igualmente a saída do acordo e o novo Secretário de Estado Mike Pompeo desde há muito que classifica o acordo como desastroso. Não é possível ignorar ainda outra circunstância que não terá nada a ver directamente com o caso, mas ainda que não acreditando em bruxas, que as há, há, como se costuma dizer. O novo presidente da influente NRA (National Rifle Association), o maior lobby a favor da liberdade de venda de armas nos EUA é o tristemente célebre Coronel Oliver North do célebre escândalo Irão-Contras que, nos anos finais da década de 1980, assumiu a responsabilidade por violações á lei americana, precisamente na venda de armas ao Irão.
Curiosamente, o momento escolhido por Trump para esta atitude coincide com o fim da “guerra de palavras” com o líder da Coreia do Norte que parecia seguir uma escalada com um final perigoso. Não podemos deixar de notar esta coincidência temporal, dado que o líder norte-coreano Kim Jong-un, numa reviravolta repentina resolveu, pelo menos aparentemente, restabelecer relações com a Coreia do Sul e sentar-se à mesa para negociações tendo já sido marcada uma cimeira entre os dois líderes para a primeira quinzena de Junho em Singapura
Apesar de tudo, Trump deixou ainda em aberto a hipótese de haver negociações para um novo acordo, o que poderá sugerir que tem em mente a hipótese de o Irão vir a mudar de posição perante posições de força como terá sucedido com a Coreia do Norte. Se for esse o caso, estará completamente enganado. O médio-oriente não é a península da Coreia, neste caso os EUA estão isolados no Conselho de Segurança das Nações Unidas e, fundamentalmente, a República Islâmica xiita dos ayatolás iranianos já mostrou à saciedade que não é para brincadeiras, como aliás os americanos bem sabem, dado o historial do seu relacionamento mútuo desde 1979.

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