Fala-se hoje muito de populismo e de ressurgimento de nacionalismos. Há muita razão nessas preocupações, mas devo dizer que o que mais me impressiona nas personagens habitualmente referidas é a sua aparente falta de cultura. Ouvimos Trump, Bolsonaro, Maduro, Salvini, Farage, Duterte e tantos outros líderes políticos e qual é o factor comum a todos eles? Uma notória dificuldade de expressão, com recurso a frases em que a repetição de palavras é uma constante, sem qualquer referência a conceitos minimamente elaborados e muito menos a um reconhecimento da importância histórica da Cultura no desenvolvimento da humanidade.
Claro que não é um problema só de hoje.
Se olharmos para os últimos cem anos, não é preciso ir mais longe, os destinos
da humanidade foram em grande parte decididos por personalidades sem qualquer
sombra cultural na sua formação e na sua acção política. E os resultados foram
as mais das vezes trágicos. Quer Hitler, quer Mussolini ficaram conhecidos em
consequência da aplicação das suas ideologias primárias, mas também pelas
diatribes dos seus discursos e pelo desprezo ou mesmo ódio que nutriam pelas
mais diversas manifestações culturais. E Estaline perseguiu os artistas cujas
obras não eram da preferência da liderança política, ainda que fossem dedicados
comunistas. Mao não lhe ficou atrás e a chamada “revolução cultural” incluiu
uma das mais atrozes perseguições à Cultura que a História regista.
Ser Culto exige muito mais do que ser
literato ou ter mesmo uma formação académica que tantas vezes equivale apenas a
um amontoado de conhecimentos específicos. Exige um conhecimento da História
nas suas diversas facetas, que possibilite uma visão abrangente da sustentação
ideológica das diferentes alternativas que se foram colocando ao Homem ao longo
dos tempos, das escolhas feitas e das respectivas consequências. Exige um
reconhecimento e respeito pela pluralidade e pela diferença que evitam desde
logo pretensas superioridades e posições extremistas. Ninguém é culto se,
perante algo novo ou diferente, se fechar na tradição ou em conhecimento
anterior, isto é, se não cultivar uma verdadeira humildade perante a novidade e
o desconhecido.
Infelizmente a Cultura está a passar de
moda. A própria Arte se transforma em espectáculo que toma todo o espaço, mesmo
aquele que poderia e deveria ser de introspecção e silêncio. Tudo passa a ter
um valor monetário, não interessando o significado do “Grito” de Munch mas sim
por quanto se vende em leilão.
Parece haver mesmo um campeonato entre os diversos Artistas, para saber quais são aqueles cujas obras são todas vendidas por centenas de milhões, garantindo bons investimentos financeiros. Dizem-nos que nunca se editaram tantos livros como agora e isso seria bom à partida, não fora surgirem notícias que informam sobre o elevado número de pessoas que nem sequer um livro lêem por ano, o que sugere que muitos livros vendidos não são abertos.
Parece haver mesmo um campeonato entre os diversos Artistas, para saber quais são aqueles cujas obras são todas vendidas por centenas de milhões, garantindo bons investimentos financeiros. Dizem-nos que nunca se editaram tantos livros como agora e isso seria bom à partida, não fora surgirem notícias que informam sobre o elevado número de pessoas que nem sequer um livro lêem por ano, o que sugere que muitos livros vendidos não são abertos.
Num cenário destes não podemos ficar
admirados com a triste manifestação de falta de Cultura dos diversos actores
políticos que apenas acompanham o resto da sociedade. E Portugal não está imune
a esta situação que se verifica um pouco pelo mundo inteiro. Também entre nós a
política é cada vez mais espectáculo e menos substância, com o uso e abuso de
utilização de rótulos e insultos aos adversários, escondendo opções e propostas
concretas. E, para alguns, a Cultura transforma-se numa flor que colocam na
lapela, como se dar uns subsídios claramente insuficientes para a Criação Artística
pudesse esconder a circunstância de serem incultos, por nem sequer serem
capazes de construir uma simples frase em português escorreito. Enquanto
outros, ao contrário, até pensam construir carreiras políticas através do
ataque sistemático à Cultura e aos seus agentes.
Parece esquecermo-nos de que, ao
contrário do que muitos pensam, quando a Democracia rejeita as elites, ou
permite que estas se escondam, acaba por se entregar à falta de Cultura e à barbárie
que leva à autodestruição, como os tristes exemplos da História nos deviam
ensinar.
Publicado originalmente no Dia´rio de Coimbra em 14 de Janeiro de 2019
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