segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Populismo ou falta de cultura?




Fala-se hoje muito de populismo e de ressurgimento de nacionalismos. Há muita razão nessas preocupações, mas devo dizer que o que mais me impressiona nas personagens habitualmente referidas é a sua aparente falta de cultura. Ouvimos Trump, Bolsonaro, Maduro, Salvini, Farage, Duterte e tantos outros líderes políticos e qual é o factor comum a todos eles? Uma notória dificuldade de expressão, com recurso a frases em que a repetição de palavras é uma constante, sem qualquer referência a conceitos minimamente elaborados e muito menos a um reconhecimento da importância histórica da Cultura no desenvolvimento da humanidade. 
Claro que não é um problema só de hoje. Se olharmos para os últimos cem anos, não é preciso ir mais longe, os destinos da humanidade foram em grande parte decididos por personalidades sem qualquer sombra cultural na sua formação e na sua acção política. E os resultados foram as mais das vezes trágicos. Quer Hitler, quer Mussolini ficaram conhecidos em consequência da aplicação das suas ideologias primárias, mas também pelas diatribes dos seus discursos e pelo desprezo ou mesmo ódio que nutriam pelas mais diversas manifestações culturais. E Estaline perseguiu os artistas cujas obras não eram da preferência da liderança política, ainda que fossem dedicados comunistas. Mao não lhe ficou atrás e a chamada “revolução cultural” incluiu uma das mais atrozes perseguições à Cultura que a História regista.

Ser Culto exige muito mais do que ser literato ou ter mesmo uma formação académica que tantas vezes equivale apenas a um amontoado de conhecimentos específicos. Exige um conhecimento da História nas suas diversas facetas, que possibilite uma visão abrangente da sustentação ideológica das diferentes alternativas que se foram colocando ao Homem ao longo dos tempos, das escolhas feitas e das respectivas consequências. Exige um reconhecimento e respeito pela pluralidade e pela diferença que evitam desde logo pretensas superioridades e posições extremistas. Ninguém é culto se, perante algo novo ou diferente, se fechar na tradição ou em conhecimento anterior, isto é, se não cultivar uma verdadeira humildade perante a novidade e o desconhecido.
Infelizmente a Cultura está a passar de moda. A própria Arte se transforma em espectáculo que toma todo o espaço, mesmo aquele que poderia e deveria ser de introspecção e silêncio. Tudo passa a ter um valor monetário, não interessando o significado do “Grito” de Munch mas sim por quanto se vende em leilão.
Parece haver mesmo um campeonato entre os diversos Artistas, para saber quais são aqueles cujas obras são todas vendidas por centenas de milhões, garantindo bons investimentos financeiros. Dizem-nos que nunca se editaram tantos livros como agora e isso seria bom à partida, não fora surgirem notícias que informam sobre o elevado número de pessoas que nem sequer um livro lêem por ano, o que sugere que muitos livros vendidos não são abertos.
Num cenário destes não podemos ficar admirados com a triste manifestação de falta de Cultura dos diversos actores políticos que apenas acompanham o resto da sociedade. E Portugal não está imune a esta situação que se verifica um pouco pelo mundo inteiro. Também entre nós a política é cada vez mais espectáculo e menos substância, com o uso e abuso de utilização de rótulos e insultos aos adversários, escondendo opções e propostas concretas. E, para alguns, a Cultura transforma-se numa flor que colocam na lapela, como se dar uns subsídios claramente insuficientes para a Criação Artística pudesse esconder a circunstância de serem incultos, por nem sequer serem capazes de construir uma simples frase em português escorreito. Enquanto outros, ao contrário, até pensam construir carreiras políticas através do ataque sistemático à Cultura e aos seus agentes.
Parece esquecermo-nos de que, ao contrário do que muitos pensam, quando a Democracia rejeita as elites, ou permite que estas se escondam, acaba por se entregar à falta de Cultura e à barbárie que leva à autodestruição, como os tristes exemplos da História nos deviam ensinar.

Publicado originalmente no Dia´rio de Coimbra em 14 de Janeiro de 2019

Politiquices

"Presunção e água benta, cada um toma a que quer"
E, já agora, politiquice também.

Elis Regina - Fascinação - Transversal do Tempo - 1978

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

PSD e Portugal

Portugal, como qualquer democracia, precisa de alternativas governativas claras. A invenção da geringonça está a fazer muito mal ao país, empurrando-nos para a cauda da Europa, numa governação mentirosa e falha de qualquer vontade de reformas.
O PSD não se tem afirmado como A alternativa a este estado de coisas, como devia. Imaginar sequer que o PSD possa servir de muleta ao PS para se livrar do PCP e do BE é estúpido e um insulto a toda a História do Partido.
É por isso que esta direcção amorfa e sem orientação clara para o país tem que dar lugar a outros que mostrem querer e ter capacidade para  fazer esse serviço.
O resto, discussão de lugares de deputados e coisas assim não interessam para nada nesta situação.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

HOMENS E MULHERES

Uma coisa que não percebo é esta mania de querer provar que as mulheres são capazes de fazer tudo o que os homens podem fazer, quando podiam mostrar tudo o que fazem e que os homens nunca conseguirão fazer.

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

POPULISMO

O populismo à portuguesa é, de repente, a nove meses das eleições, desatar a prometer tudo e mais alguma coisa, depois de se ter estado mais de três anos sem fazer absolutamente nada, a não ser distribuir dinheiro pela função pública.
Algumas promessas: novo aeroporto, plano de investimentos públicos de 20  mil milhões de euros, montes de residências para estudantes, propinas gratuitas para estudantes universitários, hospital pediátrico no S. João . E por aí fora.
Quem é que não concorda com isto tudo?
Populismo é isto, antes das eleições. Telefonar para apresentadoras de televisão é apenas popularucho.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Breves encontros com a morte




A notícia breve surgiu na última página de uma das últimas edições deste jornal. Um casal, vindo de França para passar uns dias de férias com a família, foi encontrado morto, provavelmente devido à intoxicação com monóxido de carbono produzido por uma braseira, enquanto dormiam. Infelizmente é uma notícia que se repete e que toca sempre muito ao autor destas linhas. 
Aquando da minha adolescência nos anos 60, a minha família ia de férias para o Algarve na altura uma região ainda quase desconhecida do turismo de massas. Num desses anos os meus pais arrendaram uma casa em Portimão, no mês de Agosto, sendo a praia frequentada a então magnífica Praia da Rocha.
Uma tarde, ao tomar duche depois do regresso da praia, comecei a sentir tonturas e tentei desligar a água. Não fui capaz. Rodava as torneiras da água quente e da água fria para um lado e para o outro sem controlo, não tendo já consciência completa dos movimentos que fazia. Até que desmaiei e caí no chão da casa de banho. Por sorte, o meu Pai ouviu o ruído provocado pela queda e retirou-me do compartimento, levando-me para um quarto. O esquentador de gás, que estava instalado dentro da própria casa de banho, como era vulgar nesse tempo, tinha uma deficiência de funcionamento e foi produzindo monóxido de carbono que foi aumentando de concentração na atmosfera do compartimento sem ventilação. O meu estado de consciência ficou rapidamente alterado sem que desse conta da causa, dado que o gás é incolor e inodoro. O monóxido de carbono é um gás altamente tóxico por interferir com a capacidade do sangue de transportar oxigénio.
Vários minutos se passaram, antes que fosse possível dispor de uma viatura que me transportasse ao hospital. Foi nesse intervalo de tempo que passei por uma experiência que calei durante muitos anos, dado que a sua estranheza me impedia de a contar com facilidade, mas que hoje já me é possível partilhar, mesmo nas páginas de um jornal.
Tive aquilo a que os autores chamam “experiência de quase morte - EQM”. No meu caso observei, a partir do tecto do quarto, a família à minha volta na maior aflição, chamando-me na tentativa de me acordar, enquanto o meu pai corria a buscar o automóvel. Estava fora do corpo e via-me a mim mesmo de cima deitado e os familiares em redor. Não sei quanto tempo durou esse estado, mas terei começado a reagir alguns minutos depois com o ar da janela aberta do carro, tendo ficado totalmente desperto já no hospital, com o oxigénio puro a ser-me administrado através do nariz. O sucedido foi ultrapassado, tendo no entanto deixado uma sequela que consistiu num notório enfraquecimento da capacidade de memorização que alterou de forma substancial o funcionamento intelectual, já que estava habituado a uma excelente memória que, como tal, desapareceu. A vontade de falar sobre o caso com estranhos nunca foi muito grande e a internet não existia para fazer pesquisas, pelo que só mais tarde abordei o sucedido com alguém que me pudesse prestar algum esclarecimento.
Sei hoje que este tipo de experiência é muito mais frequente do que supunha, havendo outras semelhantes como o surgimento de um túnel ou de uma luz brilhante. Cientificamente dever-se-á a uma espécie de alucinação provocada pela falta de oxigenação do cérebro, embora haja ainda hoje quem creia numa consciência de separação da alma do corpo e outras justificações mais do tipo religioso. Talvez seja também este um motivo que leve a que este assunto tenha estado “enterrado” tanto tempo na minha mente, sem lhe tocar.
Mas o importante é que passar por uma experiência destas tem duas consequências vivenciais a que não se pode fugir. Em primeiro lugar, adquire-se a certeza concreta de que só temos uma vida que é muito frágil e que deve ser vivida plenamente. Depois, ao contrário da prática da nossa sociedade actual que tende a escondê-la, a morte deixa de ser algo a temer permanentemente com a consciência de que virá quando tiver que ser, já que faz tanto parte da nossa existência como o nascimento.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 7 de Janeiro de 2019