segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

HOLLANDE, político

Pressionado pela difícil situação económica do seu país, o presidente da República Francesa viu-se na necessidade de se juntar ao clube dos líderes que antes das eleições dizem uma coisa e depois fazem outra bem diferente. De facto, o défice orçamental francês é actualmente o maior da zona euro; acresce o crescimento económico apenas anémico de 0,8% ao ano desde o início do euro, tendo depois da Itália o pior crescimento europeu nos últimos 25 anos, isto no país que era, não há muito tempo juntamente com a Alemanha, o motor da Europa. Se lhe somarmos um desemprego de 11% a crescer, exportações a cair fragorosamente, custos de trabalho altíssimos e o início de uma nova recessão económica, temos um retrato que, no mínimo, é preocupante.
Foi perante este quadro negro que coloca a França no centro dos problemas económicos europeus, ultrapassando os países periféricos em que nos inserimos que, na sua conferência de imprensa da semana passada, o inefável presidente François Hollande travou a fundo na sua política e fez uma volta de 180º. Hollande mandou as suas reticências sobre a austeridade às urtigas e definiu um novo caminho para a França. Faz lembrar a resposta que em tempos Clinton deu aos republicanos americanos na sua primeira campanha eleitoral: “é a economia, estúpidos!”. As prioridades passam agora por cortar nas despesas do estado, designadamente nas prestações sociais, no sector da Saúde e nas pensões da segurança social. Nada que nós portugueses não conheçamos bem. A diferença é que nós estamos a cumprir um compromisso apertado que assumimos perante a troika, o que não sucede em França que, por enquanto, ainda pode escolher os próprios caminhos a seguir.
François Hollande diz agora que foi eleito com o apoio do PS e da esquerda, “mas que não professa uma ideologia, embora tenha ideias”, adiantando ainda “sou social, reformista e realista, mas sobretudo patriota”.
Como marco político importante em todo este quadro, estão as eleições europeias já no próximo mês de Maio. A França não foge a um movimento que tem alastrado por toda a Europa, levando a um crescimento dos partidos de direita nacionalista com rejeição clara da União Europeia. A Frente Nacional, agora dirigida por Marine Le Pen, fugiu às suas tradicionais bandeiras do tempo de Jean-Marie le Pen, o racismo, a xenofobia e a intolerância, virando-se para o populismo anti-União Europeia, para a imigração ilegal e para a soberania, incluindo o proteccionismo das empresas francesas perante a competição estrangeira. Bruxelas, como símbolo do poder da União Europeia com a sua carga burocrática, passou a ser a origem de todos os males. Em resultado de tudo isto, cerca de 55% dos estudantes franceses colocam a hipótese de votar na Frente Nacional, tal como grande parte do mundo rural e até mesmo uma boa fatia dos imigrantes já estabelecidos em França.
Claro que a causa do descontentamento popular que alimenta os partidos populistas por toda a Europa, e não apenas em França, reside na realidade nas políticas consumistas promovidas pelos governos durante anos que levaram ao estado caótico das contas públicas e à incapacidade manifesta de garantir as políticas sociais entretanto assumidas perante os cidadãos.
Os actuais líderes políticos europeus poderão ser fracos, mas enfrentam uma situação de extrema dificuldade que não foi criada por eles e sim pelos que os antecederam durante décadas. E os cidadãos comuns conhecem bem as consequências de tudo isto, porque são eles que estão hoje a pagar pelos erros cometidos. O terreno para a progressão dos populismos extremistas está aplainado. Não nos admiremos se nas próximas eleições europeias os partidos populistas e eurocépticos tiverem uma votação que virará do avesso o parlamento europeu, com consequências que ainda não conseguimos antecipar, mas que não serão certamente boas para o futuro da Europa. Como sabemos da História, já Dario III, rei da Pérsia, após a vitória de Alexandre sobre as suas tropas, mandou matar o seu conselheiro que o tinha avisado sobre as consequências das suas decisões.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Janeiro de 2013

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Só p´ra lembrar

Em 2009, eram estas as conversas:

CONFIANÇA NOS POLÍTICOS


Estou certo que não chocarei ninguém ao afirmar que a política e os políticos sofrem de uma das maiores crises de confiança de que há memória, entre nós. Muitas razões contribuem para isso, algumas de fundo e outras que têm a ver com as características da vida actual. Já o humorista Rafael Bordalo Pinheiro representava a política como uma porca a amamentar muitos bácoros, o que mostra que a má ideia que os portugueses têm dos políticos não é dos dias de hoje. Haveremos no entanto de convir que já era tempo de essa situação se ter alterado, o que não é manifestamente o caso. Nos dias de hoje a internet com as suas redes sociais ajuda a manter essa má imagem, às vezes com razão, mas frequentemente sem nenhuma. O imediatismo das respostas, a superficialidade das análises e uma boa dose de anonimato mal-intencionado ajudam aos velhos comentários que não acrescentam nada às soluções para os problemas: “isto é uma vergonha”, “eles são todos iguais” e “eles andam todos ao mesmo”.
A sensação de separação entre a vida política e o resto do país vai-se ampliando e a organização política, bem como o funcionamento dos partidos (da esquerda à direita) não contribuem em nada para melhorar a situação.
Um exemplo: o leitor, que sei ser uma pessoa interessada e preocupada com os destinos do país, sabe quem são os deputados eleitos pelos partidos no seu círculo eleitoral, no caso, o de Coimbra? Atrevo-me a apostar que não sabe e, mais significativo, provavelmente não conseguirá sequer identificar com precisão os deputados do partido a que deu o seu voto. Claro que também não fará a mínima ideia dos critérios que ditaram a escolha dos nomes que integraram as listas e, pior, deverá desconhecer por completo o trabalho que têm ou não produzido na Assembleia da República desde que foram eleitos, pelo que em próximas eleições não terá quaisquer hipóteses de avaliar esse trabalho com consciência e seriedade.
Nos últimos dias, felizmente, têm vindo para a discussão pública algumas ideias sobre reformas da lei eleitoral, que em parte eu próprio já aqui defendi nestas linhas, por mais que uma vez. Uma das propostas contempla a criação de um círculo nacional que escolheria 100 deputados e 115 círculos uninominais, para além dos círculos da Madeira, dos Açores e da Emigração. O círculo nacional permitiria a entrada no Parlamento de representantes de partidos com pequena percentagem, o que não acontece hoje, com a vantagem de surgirem na Assembleia da República outras vozes e opiniões, assegurando uma melhor representação do sentir dos portugueses. Quanto aos círculos uninominais, seriam possíveis as candidaturas independentes, possibilitando a escolha de candidatos que valham por si próprios, que as populações conheçam e em quem tenham confiança.
Claro que os partidos maiores teriam a vida dificultada, em particular as distritais por onde passam hoje as escolhas dos candidatos a deputados, com negociações completamente estranhas aos interesses das populações e favorecendo os amiguismos e outras dependências, tantas vezes inconfessáveis. Ver-se-iam obrigados a escolher candidatos credíveis, que não tenham feito toda a carreira dentro das comissões políticas e nada dizendo ao cidadão comum para quem os seus representantes têm é que resolver os problemas da sociedade. Uma alternativa interessante será dar aos eleitores a possibilidade de ordenar os eleitos do seu círculo, de acordo com as suas preferências, sem ter que votar em listas fechadas.
Curiosamente, parece até que uma alteração às leis eleitorais deste tipo nem precisaria de uma Revisão Constitucional. Claro que não se vê os actuais detentores do poder dentro dos partidos a promoverem por si uma alteração destas. Resta-nos a nós, cidadãos comuns militantes ou não de partidos, mas com consciência da situação actual, fazer tudo para que essa alteração seja de alguma forma imposta pela sociedade aos partidos.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 13 de Janeiro de 2014

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

O DOENTE DETERMINADO

Quando lhe começaram a fazer os tratamentos aceitou a contra gosto, mas com alguma esperança nos resultados, porque bem sabia da gravidade da doença de que padecia. Na realidade, o diagnóstico já tinha sido feito há algum tempo e, no fundo, ele tinha consciência de que desta vez não havia volta a dar e tinha mesmo que passar pelos tratamentos que sabia serem dolorosos e demorados. Mesmo nessa altura ainda houve uns amigos que mais uma vez o tentaram convencer a tomar umas aspirinas porque não, aqueles médicos só queriam o mal dele e fazê-lo passar por um mau bocado escusado. Mas o diagnóstico estava ali bem à vista na sua crueza e a junta médica estrangeira deixou-o sem grande alternativa: ou fazia os tratamentos preconizados ou o deixavam sozinho sem qualquer esperança de cura e o fim estaria próximo e seria bem cruel.
Os tratamentos começaram e foram muito dolorosos desde o princípio. Não ajudava nada ter que tomar os medicamentos e verificar, de cada vez que a junta médica vinha ver se os resultados estavam a surgir de acordo com o previsto, que lhe prescreviam novas e mais fortes doses que lhe iam aumentando o sacrifício. E sempre a ouvir que era asneira prosseguir, que os tratamentos não iam fazer nada, que as aspirinas é que lhe teriam resolvido os problemas e, ainda por cima, sem dores. Mesmo aqueles que durante anos o tinham aconselhado mal e levado para caminhos viciosos, provocando-lhe a grave doença de que padecia, continuavam a cantar-lhe músicas agradáveis aos ouvidos, na esperança de que ele não topasse as verdadeiras causas dos seus padecimentos. Para ajudar às dificuldades, havia quem o tentasse baralhar garantindo-lhe que, se sofria, era por causa dos medicamentos e não pela doença, e que mais valia deixar de os tomar, que tudo ficaria bem de repente.
Mas o doente lá foi resistindo a tudo: cantos das sereias, conselhos inúteis dos bem-intencionados de sempre; mesmo uns safanões e uns tantos empurrões quando ia ao hospital fazer os tratamentos não o impediram de continuar os seus sacrifícios, na esperança de que os bons resultados surgiriam, livrando-o daquele mal horrível que tanto o atormentava. Ele sentia que o seu corpo tinha mais dores e se ia abaixo notoriamente com a dureza dos medicamentos que tomava e tinha plena consciência de que, por vezes, os médicos tateavam na posologia e nas doses a aplicar. Mas também foi sentido aos poucos que algo começava a mudar no seu corpo e que os músculos começavam a ganhar alguma tonicidade.
O fim dos tratamentos estava já à vista e a esperança de que passaria esta provação por cima dava-lhe cada vez mais forças. Talvez, afinal, o esforço viesse a valer a pena e pudesse de novo respirar o ar a plenos pulmões e até participar em provas desportivas com outros como ele.Caro leitor, faço votos de que neste ano de 2014 este doente tão especial para todos nós se liberte dos tratamentos a que se sujeita há quase três anos e consiga finalmente caminhar sem ajuda, o que constitui a melhor mensagem de bom ano novo que consigo imaginar.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 6 de Janeiro de 2014

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

ARTE DEGENERADA

A relação das ditaduras com a liberdade de criação artística, por o ser, é inevitavelmente caracterizada por atitudes de reserva, na versão mais suave e de perseguição obstinada e cruel na maior parte das vezes.
Desde a “orientação ideológica” da criação artística com perseguição dos que fogem à “linha correcta” como sucedeu no estalinismo até à pura perseguição dos artistas cuja criação não é do agrado dos detentores do poder absoluto, de tudo se tem visto na História da Humanidade, independentemente mesmo das opções políticas dos criadores.
Como em tudo o resto, o Nazismo fez também questão de mostrar o “mal absoluto” no que dizia respeito à criação artística. A definição de “arte degenerada” serviu para perseguir artistas de ascendência judaica, mas também todos aqueles cujas criações não estavam de acordo com as regras estritas do nazismo.
À custa desse conceito, artistas foram perseguidos, muitos deles até à morte e muitas obras de arte foram confiscadas pelas autoridades alemãs. Corrupto como era o regime nazi, grande parte dessas obras de arte foi parar às mãos dos mais altos responsáveis do regime, tendo-se destacado nesse aspecto Martin Bormman que organizou o roubo sistemático de obras de arte em todos os países ocupados, tendo mesmo morrido muitas pessoas só por serem possuidoras de peças de arte alvo da cobiça dessa gente.
Há poucas semanas soube-se da descoberta de uma colecção de mais de 1.500 quadros num apartamento em Munique, da autoria de pintores famosos, entre os quais Henri Matisse, Pablo Picasso, Marc Chagall e Paul Klee, num valor estimado superior a mil milhões de dólares. Os quadros, todos da tal arte classificada como “degenerada” pelo regime nazi, tinham sido objecto de confisco durante a guerra e estavam dados como desaparecidos desde o seu fim.
Como foi possível a alguém guardar todo este acervo durante tantos anos, é uma pergunta incómoda que levanta muitas outras questões sobre o destino, não só de muita arte roubada pelos nazis, mas também sobre o ouro que o regime de Hitler tinha acumulado, com origens que envergonham toda a Humanidade. Mais ainda, as actuais autoridades alemãs tinham conhecimento da existência desta colecção há vários anos, não tendo tomado qualquer iniciativa, suspeitando-se mesmo de encobrimento oficial. Afirma-se mesmo que o proprietário do apartamento, filho de um negociante de arte credenciado pelo ministro da Propaganda de Hitler, Joseph Goebbels, para vender internacionalmente quadros confiscados a judeus com objectivo de financiamento do regime, não existia sob o ponto de vista fiscal. No entanto, Cornelius Gurlitt vivia da venda periódica de quadros da colecção, tendo mesmo conseguido vender um quadro do pintor Max Beckmann por cerca de um milhão de dólares em Colónia, já depois das autoridades terem descoberto a colecção.
O “negócio” da venda de quadros saqueados a judeus pelos nazis abrangia o mundo inteiro e Portugal não escapou. Também cá foi estabelecido um ponto da rede que “exportava” quadros roubados pelos nazis para a América do Sul e para os Estados Unidos. O “mal absoluto” que invadiu a Europa na primeira metade do século XX continua a surpreender ainda hoje pelos mais diversos motivos, cada um mais vergonhoso e assustador que o outro.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 30 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

NATAL



O Natal é certamente o símbolo da cristandade mais adoptado e aceite em todo o mundo. Há boas razões para isso: junta uma criança inocente nascida num meio pobre, a sua mãe e o seu pai que o é, porque o aceita como filho. Um conjunto notável de circunstâncias a que se juntam outras, como o momento Histórico e o local, que instantaneamente suscitam afectividade e adesão, antes mesmo do carácter religioso que advém do facto de a criança ser Jesus Cristo. A representação de Natal de S. Francisco de Assis que lhe juntou os simpáticos animais, só veio consolidar uma imagem que resiste até aos dias de hoje.
Na realidade, o dia em que se celebra o Natal não terá a ver com a verdadeira data do nascimento de Cristo que, através do cruzamento da análise dos evangelhos e da história do império romano (datas dos recenseamentos) poderá ter ocorrido no mês de Agosto, alguns anos antes da data fixada no século IV.
Mas o que interessa é o significado. E a data escolhida pelo cristianismo faz uma ponte para as antigas culturas que davam um grande significado ao solstício de Inverno que ocorre a 21 de Dezembro, data em que a noite tem a maior duração, mas também o momento a partir do qual os dias passam a ser cada vez maiores, simbolizando a vida que se renova. Por isso mesmo, na antiguidade, todos os grandes monumentos se orientavam para o Sol no momento do solstício de Inverno, o que indica a importância que esse momento desde muito cedo tinha para todas as civilizações.
Na nossa civilização ocidental perdeu-se grande parte da ligação à Natureza, sendo tudo muito artificial, até mesmo nas culturas que se tornaram quase independentes do clima de cada estação do ano. No entanto, o Natal significa essencialmente paz e harmonia, simbolizados na simplicidade do carinho que uma criança merece, por mais simples que seja o contexto em que nasce. Toda a exploração comercial que a nossa actual sociedade, estupidamente consumista e materialista faz associar a esta época surge como uma barbaridade sem nome perante a existência de tantas crianças que à nossa volta padecem de sofrimentos a começar pela fome e falta de carinho.
Caro leitor, tenha um feliz natal, mas não deixe que as luzes, a música e as compras façam esquecer a ternura intrínseca do simples presépio, de todos os presépios humanos.
Publicado originalmenteno Diário de Coimbra em 23 Dezembro 2013

sábado, 21 de dezembro de 2013

Solstício de Inverno


O ponto 1 corresponde ao solstício de Inverno, que ocorreu hoje às 17 horas. No ponto em que a eclítica mais se afastou do equador celeste, esta noite é a mais longa do ano. Daqui para a frente, os dias são sempre a crescer. Festejemos.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

AS “PESSOAS”

Nas últimas eleições não havia candidatura à mais recôndita das freguesias por esse país fora que não elegesse as “pessoas” como alvo das suas atenções. Fenómeno curioso, dado que, por definição, a política se destina precisamente a cuidar do bem comum, isto é, do que às pessoas interessa directamente.
 Suspeito que a utilização do termo “pessoas” a torto e a direito visa apenas esconder algo: a incapacidade ou, pior que isso, falta de interesse em esclarecer devidamente as opções políticas concretas com os custos e consequências económicas e sociais inerentes.
Mas mostra ainda um mal que, depois de se ter vindo a desenvolver nas profundidades no nosso sistema político, chega à superfície manifestando-se das mais diversas formas, com consequências sérias a curto prazo. Os partidos políticos portugueses, foram desenvolvendo sistemas internos de defesa perante o exterior, cortando muitas vezes as ligações ao mundo real e fechando-se em si mesmos. Os slogans passaram a ser escritos em agências de publicidade, nada mais sendo do que frases eventualmente apelativas, sem qualquer substância ou conteúdo político. Claro que na realidade não se afastam muito dos próprios candidatos que, a maior parte das vezes, são também fabricados dentro dos partidos, não apresentando quaisquer qualidades que os recomendem para os cargos a que se candidatam. Os partidos foram tomados por dentro pelas diversas lógicas que ao longo dos anos foram sustentando, desde as juventudes partidárias, aos lobbies familiares, de negócios e outros, daí surgindo as mais surpreendentes e tristes escolhas para as diversas candidaturas, seja para as autarquias, para o parlamento nacional ou mesmo para o parlamento europeu.
Em consequência, o florescimento das candidaturas independentes às autarquias locais vai certamente continuar. O que se passou no Porto vai servir de exemplo para todo o país. É provável que os partidos tenham muita dificuldade em responder à nova situação, fechando-se ainda mais. Quando se olha de fora, é quase inacreditável o autismo partidário que leva directamente às derrotas mais previsíveis não havendo, aparentemente, qualquer possibilidade de as estruturas concelhias, distritais e mesmo nacionais verem o que é óbvio para toda a gente, menos para quem lá está dentro. Hoje em dia, quem no interior dos partidos tentar falar a linguagem exterior, absolutamente normal para os restantes cidadãos, rapidamente se sente como um ser estranho que fala uma linguagem de outro mundo.
A Democracia não existe sem os partidos. Mas estes não a esgotam. E muito menos os que existem num determinado momento histórico. A sociedade portuguesa tem passado por momentos de grandes dificuldades. Todos sabemos que a origem dessas dificuldades está na actuação de agentes políticos incapazes de olhar para as receitas do orçamento de Estado como a contribuição dos portugueses e da economia para o bem comum, em vez de um montão de dinheiro para gastar e satisfazer egos, ambições pessoais e clientelas. E esses agentes políticos são o resultado das escolhas internas dos partidos. Perante a dificuldade de mudar os partidos por dentro as alternativas, á esquerda e à direita, irão naturalmente surgir e mudar toda a paisagem política.
Os partidos têm enchido a boca com a palavra “pessoas”. Rapidamente vão descobrir que são essas mesmas pessoas que lhes vão virar as costas, voltando-se para quem sentem que lhes fala uma linguagem compreensível e, acima de tudo, de confiança.
Publicado originalemnte no Diário de Coimbra em 16 de Dezembro de 2013