domingo, 29 de agosto de 2010

HUMANIDADE E BOM SENSO

Vários países europeus estão a proceder à deportação de ciganos para a Roménia e para a Bulgária, de onde são oriundos. À frente está a França, que expulsa ciganos aos milhares, obtendo o seu"acordo" com 300€ por cada adulto e 100€ por cada criança.

A forma como os actuais líderes europeus olham para os cidadãos está bem à vista desde a entrada da Roménia e da Bulgária na União Europeia. De facto, a União Europeia decidiu pagar anualmente quatro mil milhões de euros à Roménia para impedir a saída dos seus ciganos para os outros países da UE. Isto é, para dar o seu acordo à entrada de países no seu seio, a UE definiu condições contra uma determinada etnia. A simples existência deste acordo diz muito sobre a actual União Europeia, que se farta de bradar que tem uma política social avançada, que é uma Europa dos cidadãos, etc. etc. Vê-se. A própria Convenção Europeia dos Direitos Humanos está a ser violada, dado que proíbe as expulsões colectivas de estrangeiros.

Aqui reside, quanto a mim, o maior problema. Os ciganos estão a ser objecto de tratamento colectivo, e não a ser tratados como indivíduos. Se uma determinada pessoa comete um crime, é lógico que deve sofrer uma condenação, que poderá incluir a deportação, se for caso disso. Coisa muito diferente é condenar comunidades inteiras com base da diferença étnica e impedir um direito de todos os cidadãos europeus que é o da livre circulação.

O argumento francês principal é o da segurança, como é hábito. Ouvi-o aliás ser repetido por um euro-deputado português que disse compreender perfeitamente a atitude francesa, porque a segurança é fundamental e dentro daquelas comunidades há pessoas que se portam mal. Claro que o facto de Sarkozy ser responsável pela segurança há 7 anos, primeiro como ministro e depois como presidente, e de sondagens recentes indicarem que 70% dos franceses se sentem inseguros justificará este novo surto de deportação: há que recuperar apoio eleitoral. Curiosamente, parece que muitos franceses ainda se lembram de "Liberdade, Igualdade e Fraternidade", e Sarkozy terá dado um tiro no próprio pé.

Apetece lembrar duas ou três coisas. A primeira é uma citação de Benjamin Franklin: "quem prescinde da liberdade em nome da segurança não merece nem uma nem a outra, e acaba normalmente sem as duas". A outra é que ainda não passaram cem anos desde que muita gente aceitou atitudes de perseguição com base na raça, porque muitas das pessoas que lhe pertenciam não se portariam bem e vestiam diferente ou eram feias. Deu numa das vergonhas que para sempre mancharão a humanidade, com milhões de judeus mortos e uma barbaridade indescritível. As seguranças a que muitas vezes damos importância escondem afinal verdades feias e desgraças de outros que muitas vezes não estão à nossa vista.

A questão tomou tal dimensão que o próprio Papa Bento XVI fez questão de tomar posição em língua francesa contra este repatriamento em massa, apelando ao acolhimento dos homens de todas as origens.

O que a União Europeia tem a fazer, depois de ter aceitado a entrada da Roménia e da Bulgária, é adoptar planos de integração ao nível da União, e não pagar a países para manterem alguns cidadãos no seu interior, com base em critérios de etnia.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 30 de Agosto de 2010

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Terra e Lua


A Terra e a Lua vistas de bem longe, numa imagem tirada pela sonda Messenger (foto da Nasa)

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Boom Festival

Diz o agente da GNR: "o pessoal é muito sensível, não pode ver uma farda".
(Do jornal i de hoje)

Segundo o mesmo jornal, foram as seguintes as substâncias apreendidas este ano pela GNR em Idanha-a-Nova:
-15 855 doses de heroína
-4 448 selos de LSD
- 3 240 doses de cocaína
- 686 doses de ecstasy em pó
- 670 cogumelos mágicos
- 358 pastilhas de ecstasy
- 171 doses de haxixe

E depois ainda há quem não acredite que Portugal é o paraíso europeu das drogas!

domingo, 22 de agosto de 2010

A SAÚDE TEM PREÇO?

O Doutor Manuel Antunes costuma dizer que a saúde não tem preço, mas custa dinheiro. E tem, claro está, imensa razão. Aliás, a saúde custa mesmo muito dinheiro, já que o Estado gasta por ano cerca de dez mil milhões de euros com o Serviço Nacional de Saúde. Como todo esse dinheiro sai dos nossos impostos, convém que seja bem gasto, e que seja gasto com justiça, isto é, que não deixe de fora os mais desprotegidos.

O Serviço Nacional de Saúde foi uma opção nacional pós 25 de Abril, que entrou na vida dos portugueses como um direito adquirido e inquestionável. Na verdade, permitiu um acesso à saúde digno, à altura dos países mais ricos e avançados do mundo. Os índices relativos à saúde pública foram completamente alterados para melhor, de que a mortalidade infantil é um bom exemplo: em poucos anos, passou de 70 por mil crianças nascidas para os actuais 3.

Sucede, no entanto, que hoje se verificam dois problemas graves: por um lado, o custo da saúde tem vindo a subir de uma forma quase incontrolável pelos mais diversos motivos, entre os quais se contam a sofisticação crescente dos meios auxiliares de diagnóstico e dos próprios tratamentos e o aumento da idade média da população. Por outro lado, cresce o sentimento de que a justiça está a fugir da prestação dos cuidados de saúde, sendo esta melhor para quem tem dinheiro do que para a população carenciada. Isto é, quando deveria ser "tendencialmente gratuita", o que se está a verificar é que tal será impossível de acontecer, pura e simplesmente porque o país não tem posses para o garantir.

Desde há quase dez anos que o SNS tem sido objecto de alterações na sua organização, agravando a tal injustiça social. Exemplos? A opção por parcerias público-privadas, pela chamada "empresarialização" dos hospitais públicos, e o encerramento de unidades do interior, sob a capa de garantia de qualidade da prestação de cuidados de saúde.

Na realidade, o Estado não tem dinheiro para manter o sistema como está, e muito menos para custear os aumentos de despesas previstos. Assim, corta nos custos, muitas vezes de forma sub-reptícia, e quase sempre com maior prejuízo para quem menos pode.

Não há coragem para dizer aos cidadãos que a actual situação não se pode manter. Para dizer que os serviços prestados têm custos, que deverão ser comparticipados de forma diferente por quem tem mais posses e por quem não tem, não no acto da prestação do serviço, mas num relacionamento fiscal entre o cidadão e o SNS. Que o financiamento do SNS deverá ser completamente alterado, talvez à imagem da Segurança Social ou estendendo a toda a população um sistema semelhante à ADSE. Que as parcerias público-privadas deverão acabar, para que se saiba quem paga o quê, devendo os sectores público e privado ser completamente separados. Que a prestação dos serviços de saúde que por qualquer motivo os hospitais públicos não possam garantir em tempo útil sejam convencionados com o sector privado de forma transparente. Que os profissionais de saúde deverão trabalhar o dia inteiro nos hospitais públicos, sendo devidamente pagos, acabando-se de vez com a promiscuidade entre os sectores público e privado.

A actual situação tem custos incomportáveis para o Estado, e dá vantagens injustificadas a um sector que de privado só tem o nome, porque vive pendurado nas ineficiências e desorganização do sector público. Haja coragem para enfrentar este problema, sem demagogias e complexos ideológicos, em nome precisamente dos mais carenciados. Os outros, sabemo-lo bem, têm boas alternativas.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 23 de Agosto de 2010

domingo, 15 de agosto de 2010

JÁ FEZ O SEU "STRESS TEST"?

Em 2009 a Reserva Federal Americana entrou nos livros das contas dos bancos americanos numa operação dirigida ao estilo militar e efectuou os chamados "stress tests". O objectivo era verificar até que ponto os bancos americanos estavam preparados para enfrentar novas situações de emergência, depois de todos os sarilhos de 2008 e assim transmitir alguma tranquilidade aos mercados. Claro que a transparência nunca foi o forte da actividade bancária, nem o poderá ser nunca, pela sua própria essência. Mas que é conveniente que as entidades reguladoras tenham uma ideia clara do que se passa no interior dos bancos, lá isso também é verdade, até porque se há actividade económica que necessita de confiança como de pão para a boca é a bancária.

A situação da banca europeia também não tem estado famosa nos últimos tempos, o que se reflecte negativamente na restante actividade económica. Basta ver os últimos dados que apontam para as previsões da economia europeia e nos dizem que a pequena retoma dos últimos meses já terá terminado. A actividade bancária de apoio à actividade económica tem estado algo parada, dado que as operações inter-bancárias ainda não retomaram a sua normalidade. Os bancos continuam a recorrer ao BCE para obterem fundos, o que diz muito sobre a falta de confiança dos bancos uns nos outros.

Quando os bancos não têm confiança uns nos outros, quem terá? Perante esta situação que já dura há demasiado tempo, o "Comité das Autoridades Europeias de Supervisão Bancária" e o Banco Central Europeu organizaram uma operação de "stress test" à banca europeia. Esta acção tornou-se mais complicada do que a operação americana porque foi feita não ao estilo militar mas um pouco caoticamente e, além disso, o sistema bancário europeu é muito mais complexo que o americano. Basta dizer que na Europa foram testados 91 bancos e em Wall Street apenas 19.

E o que são os tais "stress tests" cujo nome faz lembrar exames médicos? De facto são testes realizados para verificar a capacidade de resposta dos bancos a situações que não cabem na normalidade previsível. Monta-se um cenário adverso caracterizado por exemplo, por subidas anormais do petróleo, por uma grande queda na bolsa, por uma variação súbita de taxas de juro, por uma subida exagerada dos preços das casas, etc. Vai-se aos livros dos bancos e calcula-se a reacção do capital do banco comparando o cenário adverso com o cenário habitual ou de referência. Se o rácio de capital chamado "Tier 1" estiver acima de 6%, a situação do banco é segura; se estiver abaixo, é necessária uma recapitalização do banco, para que esteja preparado para enfrentar as dificuldades.

No caso dos bancos portugueses a boa notícia é que todos os bancos sujeitos aos "stress tests" responderam de forma positiva, isto é, apresentaram valores acima daquele mínimo. Na realidade, em toda a Europa apenas 7 bancos falharam estes testes, entre os quais o gigantesco Hypo Bank Estate, curiosamente alemão.

A má notícia é que as consequências que se esperavam, de reanimação do mercado inter-bancário face à retoma previsível de confiança, ainda não se verificaram. Provavelmente porque os bancos sabem muito bem qual a sua verdadeira situação e a sua capacidade de resposta a uma nova crise. Sabem também, melhor do que ninguém, que a montagem do tal cenário mais adverso foi algo medrosa e visou acima de tudo restaurar a tal confiança, aparecendo assim aos olhos de muita gente como uma operação algo artificial e pouco realista.

A ideia do "stress test" é, contudo, bem curiosa e poderia ser seguida em muitos outros sectores. Claro que a iliteracia financeira crónica da maioria dos portugueses os impedirá de perceber o que está em causa para além da barragem "informativa" que lhes foi imposta sobre o tema. Mas até em termos pessoais todos teríamos vantagens em ensaiar os nossos próprios "stress tests" para conhecer a nossa capacidade de reacção a cenários desfavoráveis.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 16 de Agosto de 2010

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

LÁGRIMAS COM GOSTO

Ter o privilégio de escrever com regularidade e inteira liberdade no Diário de Coimbra tem-me proporcionado muitas vezes a satisfação de poder comentar factos e situações que mostram a relevância e qualidade da nossa Cidade em numerosas áreas.

Terminou há cerca de uma semana a segunda edição do Festival das Artes que se saldou por um sucesso notável, a vários níveis.

O Festival das Artes é uma organização da Fundação Inês de Castro que está intimamente ligada à Quinta das Lágrimas. No entanto, os seus 42 eventos não se limitaram à Quinta das Lágrimas, tendo alguns deles sido realizados noutros espaços como o Museu da Água, o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha, o Teatro da Cerca de S. Bernardo ou o próprio rio Mondego. Os eventos abarcaram diversas formas de arte como a música, a dança, o cinema, a declamação e ainda outras áreas culturais como a culinária, o debate e visitas guiadas a locais emblemáticos da região como o Buçaco, o rio Mondego e as ruas da nossa Cidade. Os espectáculos realizados na "Colina de Camões" na Quinta das Lágrimas beneficiaram, é certo, do cenário absolutamente excepcional conseguido naquele espaço. A integração dos vários elementos como a zona do palco, o lago e as bancadas espalhadas pela colina, em conjunto com a proximidade da "Fonte dos Amores" e a colina da Universidade bem enquadrada pela mata da Quinta, proporcionam um ambiente de sonho perfeitamente adequado à realização deste tipo de espectáculos.

Segundo os responsáveis pelo Festival, os oito concertos de música que tiveram lugar ao ar livre na "Colina de Camões" tiveram uma média de 570 espectadores por cada, tendo um deles atingido o recorde de 1.250 pessoas a assistir. Por outro lado, foi anunciado que 70% dos espectadores são de Coimbra e 30% de visitantes. Estes números expressivos significam pelo menos três coisas: primeiro, que as gentes de Coimbra têm grande apetência por manifestações culturais; depois, que também em Coimbra é possível organizar com sucesso um festival cultural e artístico de elevada qualidade com apoios de mecenas e diversas entidades públicas e privadas; por fim, que é vantajoso misturar o tradicionalismo de Coimbra consubstanciado pelo fado e pelos agrupamentos ligados à Academia, com outras formas de arte e de cultura.

O sucesso deste Festival das Artes prova que apesar dos murmúrios maldizentes e das críticas permanentes de muitos dos ditos "coimbrinhas", Coimbra é das cidades portuguesas mais vivas e actuantes na área cultural. Na realidade, talvez o pudesse ser ainda mais se determinados "donos da cultura" deixassem de lado muita da arrogância intelectual que ostentam e tivessem a humildade de aceitar outras ideias e formas de trabalhar.

Em Portugal a área da promoção cultural está desde há muito ligada em demasia aos subsídios estatais, o que ao longo do tempo permitiu o estabelecimento de uma rede bem evidente de distribuição de vantagens mútuas, excepto para o público pagante de impostos que costuma deixar às moscas boa parte dos "eventos culturais" que nos ficam a todos bem caros.

O Festival das Artes é bem a prova de que é possível oferecer aos diversos públicos aquilo que eles quer ver e ouvir, indo ao encontro das suas diferentes apetências e necessidades culturais, sem ceder minimamente à exigência de qualidade.

Por tudo isto e como todas as realizações têm um nome por trás, como cidadão de Coimbra tenho todo o gosto em dizer: obrigado, Dr. Júdice e dê continuação ao Festival das Artes.

Publicado no Diário de Coimbra em 9 de Agosto de 2010

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Um tiro no porta-aviões ou na água?

Do Público:

"Nem a Fitch, nem a Moody"s nem a Standard & Poor"s vão ser submetidas a um controlo por parte da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), entidade a quem o Governo atribuiu ontem a responsabilidade de supervisionar as agências de rating que actuam em Portugal."

Afinal que agências de rating é que a CMVM vai controlar?



quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Excelente negócio?

Do jornal "i" de hoje:

"A Portugal Telecom prepara-se para pagar entre seis e dez vezes mais que o valor de mercado para ficar com posições minoritárias no capital de dois dos controladores da Oi - o Grupo La Fonte e Andrade Gutierrez -, segundo contas de analistas brasileiros. "É um prémio estrondoso", comentou um dos especialistas ouvidos pela agência Estado, que pediu para não ser identificado. Pelas suas contas, "no caso da oferta da Telefónica pela Vivo, o prémio foi de 3,4 vezes o valor de mercado e já foi considerado alto". Mas para ficar no Brasil a PT "vai pagar seis a dez vezes mais que o valor de mercado", disse.

A PT vai desembolsar 1,04 mil milhões de reais - 435 milhões de euros, metade para cada uma das empresas - para garantir uma fatia de 35% das sociedades que fazem parte do núcleo que controla a Oi, sem que as mesmas percam a mão da Telemar Participações, holding que manda na nova operadora brasileira onde a PT está presente."

Lê-se e não se acredita! Portugal é mesmo um país rico (ou será o resultado de os Governos se meterem em negócios privados?)

Nota: voltei a comprar o "i". A experiência com o Público foi tão má, que desisti dele logo no primeiro dia.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Políticas culturais alicerçadas no poder local?

Retirado de "AS BEIRAS" de hoje:

"Em visita a Coimbra, a primeira no exercício de funções, Gabriela Canavilhas reconheceu que a cidade, nos últimos anos, "deixou-se ultrapassar por outros centros, como Lisboa e o Porto". Mas, para a ministra da Cultura, os projectos que ontem visitou – o Centro de Artes Visuais, A Escola da Noite e o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha – fazem, entre outros, nomeadamente o Festival das Artes, um conjunto capaz de "inverter essa situação".

Em declarações aos jornalistas no âmbito da visita que realizou a estes três projectos estruturantes no tecido cultural da cidade, a ministra recordou ainda a importância fundamental de as políticas culturais estarem "alicerçadas no poder local". A "autarquia tem de ser um parceiro incontornável, em todas as iniciativas culturais", disse Gabriela Canavilhas, afirmando que "em Coimbra ainda temos algum trabalho a desenvolver". E "é isso que estamos a fazer", garantiu a responsável".

A senhora ministra, acompanhada pelo responsável da Direcção Regional de Cultura, disse isto enquanto visitava vários equipamentos municipais, sem qualquer responsável autárquico por perto, provavelmente porque nem souberam da visita que deve ter sido organizada pela Direcção Regional que regularmente vai sempre aos mesmos organismos e esquece outros sempre com a mesma regularidade, vá-se lá saber porquê.

SONDAGENS DE VERÃO

Após meses seguidos em que as sondagens foram sistematicamente definindo uma tendência contínua de crescimento das intenções de voto no PSD até ao limiar da maioria absoluta, surgiu uma sondagem em que alguma imprensa logo destacou que "Passos cai nas intenções de voto". Claro que o facto essencial de a liderança das intenções de voto continuar solidamente nas mãos de Passos Coelho fica nas letras mais pequenas, sendo destacada aquela frase acima referida.

Curiosamente, a sondagem em causa refere como responsáveis por aquela variação, duas situações concretas ocorridas no período a que diz respeito: proposta de revisão constitucional do PSD e aplicação da "golden share" na PT.

As implicações do uso da "golden share" na PT na formulação das intenções de voto revelam algo interessante, embora esse reflexo tenha apenas a ver com o momento da utilização dos direitos preferenciais. Na realidade, o posterior desenvolvimento da questão, com a aceitação da proposta da Telefónica espanhola por mais 350 milhões de euros ainda era desconhecido aquando da realização da sondagem. Esta revela que os portugueses, com o seu patriotismo algo cego, terão ficado sensibilizados com a argumentação da defesa dos interesses estratégicos nacionais face às intenções comerciais da empresa espanhola. Acredito que depois da aceitação da nova proposta os portugueses tenham ficado um pouco baralhados com o súbito desaparecimento do tal interesse estratégico nacional podendo ser levados a concluir, ainda que eventualmente de forma errada, que a tal "golden share" terá sido usada para negociar um valor de venda mais elevado. Até porque quem lucrou com esse aumento de valor foram os accionistas de referência da PT, entre os quais não se conta o Estado. A influência nas sondagens desta questão da venda da Vivo aos espanhóis parece-me assim muito limitada no tempo e com contornos indefinidos à data desta sondagem que poderão ainda vir a revelar implicações políticas bem diversas das que actualmente parecem evidentes para muitos.

Já a questão da influência da proposta de revisão constitucional merece outro tipo de abordagem. De acordo com as análises da imprensa, a subida do PS deve-se ainda a ter retomado a "defesa do Estado Social" que as propostas de revisão constitucional do PSD colocariam em causa. Cabe aqui referir três aspectos: primeiro, a actual legislatura tem poderes de revisão constitucional a partir de 12 de Agosto, pelo que o PSD tem todo o direito a apresentar propostas suas para revisão de aspectos da Constituição que considere serem actualmente menos adequados ao País e ao seu desenvolvimento que está estagnado há mais de dez anos; segundo, essa revisão constitucional terá de ser sempre aprovada por 2/3 dos deputados da Assembleia da República; terceiro, quem efectivamente detém poderes de revisão da Constituição é a Assembleia da República e não qualquer outro órgão de soberania, seja ele Presidente da República, Governo ou Tribunais de qualquer instância, que estarão obrigados a aplicar qualquer revisão constitucional aprovada nos termos definidos na própria Constituição.

O PSD apresentou propostas que, essencialmente, tentam encontrar alternativas de financiamento da Saúde e da Educação, sectores que consabidamente gastam dinheiro a mais para os rendimentos do país e essencialmente, apresentam resultados maus demais para os níveis das respectivas despesas. Além de que, como estão actualmente organizados, propiciam eles mesmos graves injustiças sociais e são geradores de aumento das disparidades entre pobres e ricos. No que respeita a propostas de índole mais política como poderes presidenciais e outras do mesmo tipo, o PSD faz muito bem em apresentar propostas que ache adequadas sem pedir autorização a ninguém; quem tem que aprovar ou reprovar que o faça, no exercício dos seus poderes. Sá Carneiro, por exemplo, não fez outra coisa no seu tempo.

O PSD, que ao que tudo indica será Governo depois do actual, faz o seu papel ao dizer aos portugueses quais serão as linhas de força da sua governação, sem enganar os eleitores para ganhar eleições. É assim que se costuma fazer nas democracias as quais, como se sabe, não têm donos. E as coisas têm que ser feitas no tempo certo: em altura de revisões constitucionais apresentam-se as respectivas propostas em sede de Assembleia da República; em altura de eleições, submetem-se aos eleitores os programas eleitorais que, como se sabe, são coisas muito diferentes. Em cada momento as sondagens flutuam ao sabor das questões do dia-a-dia e ai dos políticos que lhes submetem as suas estratégias para o país.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 2 de Agosto de 2010

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Fim do "i" (para mim, claro)

Para mim, o Público volta a ser o jornal do dia. Até achava piada ao "i", mas o último parágrafo da crónica de Hugo Gonçalves de ontem acabou com isso. Impedir quem escreve de usar determinadas expressões pode ser censura, mas usá-las nas páginas de um jornal numa crónica diária é falta de gosto e mais, de respeito pelos leitores. Até porque todos os dias dou o jornal a ler à minha Mãe que também tem direito a ser respeitada. E mais, um jornal não é um livro, onde aí sim, a liberdade de expressão é total.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

GRANDE MÚSICA



Embora haja quem discorde, quanto a mim existe mesmo a "grande música". Para além de muitos outros compositores, basta ouvir Mahler para se saber imediatamente que isso é verdade. Todos nós teremos certamente trechos musicais que nos acompanham quase desde sempre. Pela minha parte há dois compositores que desde há muitos anos trago permanentemente no carro, primeiro através das cassetes, depois pelos CDs e agora através do leitor de MP3.São eles Bach e Mahler, concretamente através da Cantata BWV 106 conhecida por "Actus Tragicus" e os Concertos Brandeburgueses do primeiro e pelo "Adagietto" da quinta sinfonia, pelo canto do quarto andamento da quarta sinfonia e por toda a primeira sinfonia de Mahler. Não poderei dizer nunca que estas músicas serão suficientes para a satisfação da minha necessidade musical, mas que me acompanham sempre, isso é verdade.

Como não sou especialista, não identifico claramente as razões interiores à estrutura interna das músicas que me levam a gostar mais de umas ou de outras. Mas é um facto que desde que me foi dado ouvir Mahler fiquei instantaneamente rendido à sua música.

Se levou a sua leitura desta crónica até este ponto, o leitor perguntar-se-á provavelmente por que razão estarei para aqui a partilhar gostos pessoais de música. Acontece que a música é uma forma de arte muito própria e completamente diferente das outras. A música entra-nos pelos ouvidos, invade-nos o cérebro e podemos "fechar" todos os outros sentidos, que a música continua. A música "vive" assim completamente dentro de nós e provoca-nos sentimentos íntimos e pessoais como provavelmente nenhuma outra forma de arte. Não há pois outra maneira de abordar este tema senão através da partilha de alguns dos nossos gostos.

Fez no início deste mês 150 anos que nasceu Gustav Mahler. Morreu novo, com 50 anos, e a sua carreira musical verdadeiramente excepcional desenvolveu-se essencialmente como maestro. Era um maestro perfeccionista até ao limite e de uma exigência extrema dos seus músicos, que costumava dizer: "na vida, faço todas as concessões; na arte, não faço nenhuma".

Viveu num período particularmente conturbado da História, que foi a transição do século XIX para o século XX. Nasceu também numa zona particularmente exposta a conflitos sociais, étnicos e políticos: a Boémia. Tendo nascido pobre e judeu e sofrido com todas as dificuldades inerentes a essa condição, tornou-se um maestro respeitadíssimo desde muito novo e chegou a Maestro Titular da Ópera Imperial de Viena com tudo o que isso significava à época. Dirigiu ainda a Metropolitan Opera de Nova Iorque. Com uma vida ocupadíssima como maestro, ficava-lhe pouco tempo para compor. Ainda assim, deixou-nos um legado musical que marca a História da Música de forma indelével, tendo feito a transição da música antiga e do romantismo para o modernismo do século XX com acordes dissonantes e novas sonoridades, pertencendo em simultâneo a esses mundos tão diferentes.

A exigência e rigor extremos que praticava enquanto maestro, verificam-se com igual grau nas suas composições. Nota-se nelas um rigor e um despojamento de artificialismo tais que a sua beleza é indescritível. A complexidade e estrutura das suas obras exigem que seja interpretada por orquestras sinfónicas completas. Uma das suas sinfonias, a oitava, é mesmo conhecida pela "sinfonia dos mil" pelo número de intérpretes que exige para a sua interpretação entre orquestra, solistas e corais. Felizmente, hoje em dia temos os suportes musicais mais variados que nos permitem apreciar a música de Mahler onde e quando queremos. Estimado leitor, não deixe que a "balbúrdia musical" que hoje invade constantemente os nossos ouvidos substitua a Grande Música e ouça Mahler, que vale a pena.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 26 de Julho de 2010

domingo, 25 de julho de 2010

segunda-feira, 19 de julho de 2010

AS RESPOSTAS NECESSÁRIAS

O conhecido economista Jean Tirole deu há poucas semanas uma entrevista à revista Exame onde entre outras coisas, afirmou que Portugal deverá permanecer no euro, para o que será necessário "assegurar que o país é solvente" isto é, conseguirá pagar as suas dívidas. Mas depois disse ainda que provavelmente Portugal terá uma recessão decorrente das medidas de redução abrupta do défice (exigência alemã, como é sabido). Já nesta semana, o Banco de Portugal publicou o seu habitual Relatório de Verão onde se aponta que o crescimento da actividade económica em Portugal deverá ser este ano de 0,9% devido a um primeiro semestre favorável, mas que deverá descer já neste segundo semestre até uma previsão de 0,2% em 2011. Isto é, ou teremos estagnação ou mesmo recessão, de novo. O relatório do BP conclui ainda que "neste contexto, assume um papel primordial a implementação de alterações ao enquadramento institucional em que se desenvolve a actividade empresarial de forma a melhorar a afetação de recursos internos e a atrair projetos inovadores". Na linguagem um pouco cifrada do BP, isto significa apenas que é urgente alterar o ambiente em que se processa a actividade empresarial. Isto é, o mercado laboral português tem uma rigidez que gera demasiada contratação a prazo e elevado número de recibos verdes, com consequências nefastas no normal crescimento da economia.

A consequência desgraçada é que a produtividade da nossa economia é muito baixa comparada com a dos outros países nossos concorrentes. Note-se que isto não significa que os portugueses trabalhem poucas horas: significa é que a rentabilidade média de cada uma dessas horas é muito baixa.

Temos todos que tomar consciência de que são as empresas e os impostos sobre aquilo que produzem que pagam todo o funcionamento do país. As despesas do Estado, quer seja para as suas funções de soberania, quer seja para as funções sociais e outras que entende por bem exercer, vêm todas das receitas do Orçamento Geral do Estado (directa ou indirectamente). É a produção económica isto é, os resultados daquilo que as empresas fazem e vendem que gera impostos para pagar tudo isto. Ou devia ser, já que o Estado gasta tanto que se vê permanentemente na necessidade de pedir dinheiro emprestado para pagar apenas o seu funcionamento. Dentro da produção económica, o que propulsiona crescimento real é aquilo que é exportado, ou que evita importações. Se o nosso problema crónico é o da competitividade, fácil é concluir ser absolutamente necessário proporcionar aos empresários condições para que a sua actividade possa gerar rentabilidades a médio e longo prazo que tragam sustentação e sustentabilidade para a economia nacional.

Contrariando o negativismo em que temos vivido, na semana passada foi assinado o contrato de instalação de uma fábrica de alta tecnologia em Coimbra, mais concretamente no Coimbra Inovação Parque (iParque). Trata-se da primeira fábrica de nanomateriais em Portugal, criada pela empresa Innovnano. Tal só é possível porque o iParque está construído, porque em Coimbra há os recursos humanos qualificados que uma unidade de alta tecnologia exige e porque hoje em dia a Câmara Municipal tem vontade e é capaz de fazer esforços para atrair e apoiar a instalação de investimentos de qualidade. Trata-se de um investimento de dez milhões de euros que dará origem a 40 empregos de grande qualificação acima de licenciatura, e que gerará produtos de altíssimo valor acrescentado e com uma procura em todo o mundo com acentuado crescimento real e potencial. Ainda melhor, para além desta, outras empresas ligadas a alta tecnologia se preparam para se instalar no iParque graças aos esforços e competentíssima acção do Prof. Norberto Pires.

É certamente este o caminho certo. Claro que há muitas actividades económicas tradicionais que fecham, muito por causa da globalização e concorrência de países emergentes e isso é uma grande infelicidade para quem lhes dedicou tanto esforço e se vê sem empresa e sem trabalho para sustentar as suas famílias. Mas o que é essencial é que em sua substituição surjam novas actividades altamente rentáveis que contribuam para melhorar decisivamente a competitividade da economia nacional.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 19 de Julho de 2010

quarta-feira, 14 de julho de 2010

TOUR


A etapa de hoje foi ganha por Sérgio Paulinho! Desde 1989 (Acácio da Silva) que nenhum português ganhava uma etapa do Tour.

Haja festa.
(imagem retirada de sapo.pt)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

SEGURANÇA RODOVIÁRIA

Já por diversas vezes abordei nestas crónicas a questão da segurança rodoviária, nas suas diferentes vertentes.

A ocorrência recente de um trágico acidente na nossa cidade, num local em que as condições de segurança de circulação não são de facto as melhores leva-me, de novo, a abordar este tema.

Sabe-se que para além do comportamento dos utentes das vias, sejam eles automobilistas, motociclistas ou peões e das condições externas que se verificam em cada momento, as próprias vias são cruciais para a segurança da circulação rodoviária. Essa segurança depende de muitos factores, quase todos de ordem técnica, incluindo a manutenção dos pisos e da sinalização.

Como é evidente, a maior parte dos utentes das vias não tem formação técnica que lhes permita ter uma percepção clara das inconsistências de projecto ou de construção das vias, nem é suposto que a tenha. Por isso mesmo, as vias devem proporcionar um ambiente rodoviário que facilite a rápida percepção da envolvência, não devendo esse ambiente ser alterado radicalmente em determinados pontos. No entanto, é fácil verificar a existência de muitos locais com elevada perigosidade para os utentes, apenas por causa das condições da via.

O próprio Plano Nacional de Prevenção Rodoviária de 2003 referia já a existência de "infra-estruturas rodoviárias com deficiências de vária ordem nas diferentes fases do respectivo ciclo de vida, nomeadamente no que respeita a inconsistências a nível de projecto, a falta de qualidade na construção…". Aquele Plano apontava também para a necessidade da criação de uma entidade reguladora para a qualidade das infra-estruturas rodoviárias e da elaboração de um manual de regras obrigatórias a seguir em projecto, necessidades essas que eu próprio já referi nestas linhas, por mais que uma vez. Essas regras são necessárias e urgentes para todas as vias rodoviárias, desde as auto-estradas às ruas urbanas, a fim de proibir aquela "imaginação" e capacidade de desenrascanço tão portugueses, através da invenção de "novas soluções" que amiúde dão maus resultados e garantir uma qualidade mínima dos projectos. Dever-se-ão ainda evitar aquelas situações que todos conhecemos em que o Estado, aos seus diversos níveis, se desresponsabiliza dos erros através da simples colocação de sinalização a limitar drasticamente a velocidade: isso poderá ser uma solução provisória mas nunca definitiva, substituindo as obras de correcção dos defeitos.

Em Coimbra é fácil verificar a existência de vários locais em que as infra-estruturas viárias são por si mesmas perigosas, quer em vias de responsabilidade municipal, quer em vias cuja competência é do Instituto de Estradas, apontando-se desde logo, por exemplo, os acessos da Ponte Rainha Santa em ambas as margens (a rotunda ao pé do Hotel D. Luís é todo um programa), a nova rotunda do Almegue, a Av. Gouveia Monteiro em boa parte da sua extensão e a Avenida da Guarda Inglesa.

Em termos locais, não ficará nada mal aos municípios que elaborem uma carta de pontos negros rodoviários permitindo projectar e programar as acções de correcção necessárias. Sabe-se que algumas delas acarretarão despesas consideráveis que serão no entanto perfeitamente justificadas e mesmo necessárias face a outras bem menos prioritárias, tendo em conta a gravidade e consequências dos acidentes que aí se verificam.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 12 de Julho de 2010

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Tour


À partida para a 6ª etapa (hoje) entre Montargis e Guegnon com 227,5 km, a classificação dos primeiros é a seguinte:
1º - Cancellara
2º - Thomas
3º - Evans
4º - Hesjedal
5º - Chavanel
6º - Schleck
7º - Hushovd
8º - Vinokourov
9º - Contador
10º - Van Den Broeck

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Claro!

Para não nos esquecermos nunca, Santana Lopes respondeu ao jornalista quando perguntado sobre se faria a mesma coisa quanto à chamada "golden share" da PT: Claro!
Não há mesmo volta a dar.

Tour

À partida para a 5º etapa (hoje) entre Épernay e Montargis com 187,5 km, a classificação dos primeiros é a seguinte:
1º - Cancellara
2º - Thomas
3º - Evans
4º - Hesjedal
5º - Chavanel
6º - Schleck
7º - Hushovd
8º - Vinokourov
9º - Contador
10º - Van Den Broeck


quarta-feira, 7 de julho de 2010

Tour

À partida para a 4º etapa (hoje) entre Cambrai e Reims com 153,5 km, a classificação dos primeiros é a seguinte:
1º - Cancellara
2º - Thomas
3º - Evans
4º - Hesjedal
5º - Chavanel
6º - Schleck

segunda-feira, 5 de julho de 2010

MORREU O SR. SWATCH


Uma das frases mais escritas nestes tempos de dificuldades que parecem nunca mais ter fim é que “as crises representam também oportunidades”.
Na realidade é mesmo verdade que as crises trazem oportunidades dentro de si. O que é preciso é génio para detectar essas oportunidades, agarrá-las como deve ser e transformar em ouro brilhante o que parecia chumbo. A grande questão é que os mesmos dirigentes políticos que cometeram tantos disparates por essa Europa fora nos últimos anos, dificilmente serão capazes de detectar as tais oportunidades por estarem demasiado dentro dos problemas, quando não são eles próprios o problema.
Na semana passada morreu um desses génios: Nicolas Hayek. A indústria relojoeira suíça foi sempre um dos símbolos de realização técnica e de organização daquele país. Recorda-se que, apesar de não dispor de recursos naturais, a Suíça esteve sempre na vanguarda da qualidade dos seus produtos. Todos os materiais componentes dos relógios são importados pela Suíça. O mesmo sucede aliás, com o cacau com que os suíços produzem algum do melhor chocolate do mundo.
A evolução tecnológica dos anos sessenta e setenta do século passado parecia ter ditado o fim anunciado de toda a indústria relojoeira suíça. De facto, os novos relógios movidos a quartzo, bem mais baratos que os mecânicos suíços e proporcionando uma maior precisão, constituíam uma ameaça mortal para toda uma indústria histórica que parecia ultrapassada pela evolução tecnológica e comercial.

A situação da indústria relojoeira tornou-se nessa altura verdadeiramente aflitiva, com dívidas gigantescas, o que em 1980 levou um grupo de bancos suíços a contratar um consultor financeiro com formação científica profunda nas áreas da física e da matemática, com o objectivo de tentar salvar o que fosse possível daquela indústria. Em boa hora o fizeram. Nicolas Hayek pegou nas armas da ameaça e usou-as para salvar a indústria tradicional. Inventou o SWATCH, cujo nome aponta logo para relógio suíço, um relógio de quartzo tecnologicamente evoluído, com uma construção optimizada com menos cinquenta peças que os outros o que permite um preço mais favorável e, acima de tudo, com uma caixa de plástico colorido que permite todas as variações de design. Com uma campanha de marketing extremamente bem montada, colocou o mundo inteiro a comprar colecções sucessivas desses relógios baratos e bonitos, que se transformaram em objectos de culto, ultrapassando a simples funcionalidade de dar as horas. Os relógios vindos do Japão transformaram-se de repente nuns objectos feios, nada apelativos e, ainda por cima, mais caros que os Swatch.
Até hoje venderam-se mais de 500 milhões de relógios Swatch. Este gigantesco sucesso comercial serviu de locomotiva a toda a indústria relojoeira suíça, que recuperou da agonia em que se encontrava. O grupo Swatch possui hoje marcas como a Omega, a Blancpain, a Breguet, a a Glashütte e a Jacket Droz, mas também a Longines, a Tissot e a Hamilton entre outras.
Todo o resto da indústria relojoeira suíça beneficiou, fabricando e vendendo peças de enorme valor acrescentado por todo o mundo. Como entretanto já muita gente percebeu que a precisão dos relógios de quartzo é absolutamente irrelevante para o nosso dia-a-dia e que quando a pilha acaba são objectos sem qualquer utilidade, abriu-se todo um mundo de novas oportunidades para a tradicional indústria relojoeira suiça.
Nestes tempos conturbados em que vivemos, este é um sucesso a ter em conta, porque mostra que com imaginação, trabalho e profundo conhecimento da área, se podem transformar as armas do “inimigo” em vantagens próprias, permitindo sair por cima de situações que antes pareciam becos sem saída.


Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 5 de Julho de 2010

segunda-feira, 28 de junho de 2010

CARAVAGGIO



Roma é uma cidade magnífica que no mesmo espaço geográfico alberga várias cidades de diferentes épocas, a merecer visita cuidada por cada uma delas: a antiga capital do Império Romano, com os seus monumentos, ruínas e memórias um pouco espalhadas por toda a cidade, mesmo nos locais mais improváveis, sem esquecer os vestígios anteriores, dos Etruscos; a cidade que alberga a capital da cristandade, com toda a História da Igreja Católica desde os primeiros cristãos, do Vaticano e Praça de S. Pedro, às magníficas Igrejas e conventos; a cidade do Renascimento, com as obras de Miguel Ângelo, Rafael e Cellini entre outros, com os palácios, pinturas e esculturas espantosos, da Capela Sistina à própria Basílica de S. Pedro; a cidade do Barroco de Bernini, Borromini, Nicola Salvi e a Fontana de Trevi e ainda Caravaggio; finalmente, a cidade da actualidade, com toda a vida artística, da moda ao cinema, e o somatório de todas as outras.
Muitos dos artistas ligados a Roma ficaram conhecidos desde que fizeram as suas obras. Tal não aconteceu com Caravaggio que só se tornou conhecido há pouco mais de cem anos, apesar de se comemorarem este ano 400 anos sobre a sua morte. Encerrou há poucos dias, precisamente em Roma, junto ao palácio do Quirinal, a maior exposição de sempre de obras deste pintor, que teve uma afluência de público gigantesca. Apesar de ter morrido com apenas 39 anos, Caravaggio teve uma uma influência extraordinária na pintura, tendo ainda hoje as suas telas uma contemporaneidade invulgar. A sua técnica de utilização de luz, aliada a um realismo da forma humana invulgar para a época, bem como a utilização de modelos da vida real e vulgar que ele bem conhecia para representar as figuras clássicas do cristianismo, trazem para as suas pinturas uma crueza mas também humanidade que até então eram desconhecidas.
A sua obra encontra-se distribuída por vários locais, mas em Roma basta entrar numa série de Igrejas para descobrir o mundo da sua pintura que ainda hoje nos deixa impressionados e esmagados pela sua intensidade. Na Igreja de S. Luís dos Franceses pode-se apreciar o tríptico dedicado a S. Mateus: Vocação, Martírioe e S. Mateus e o Anjo. Na Basílica de S. Agostinho, a Madona do Loreto. Em S. Maria del Popolo, a Conversão de S. Paulo e a Crucifixão de S.Pedro. Também na Galeria Borguese está David com a cabeça de Golias e na Galeria Doria Pamphili o lindíssimo Descanso da Fuga para o Egipto.
Nesta comemoração dos 400 anos da morte de Caravaggio, lembra-se um homem que viveu muito e depressa, sempre em conflito com tudo e com todos. Mas lembra-se sobretudo um artista que usou de forma sublime a sua capacidade artística para representar as cenas clássicas do cristianismo a que pertencia, de uma forma verdadeiramente humana e não artificial, alterando para sempre a forma de arte que assumiu como sua.

Publicado no Diário de Coimbra em 28 de Junho de 2010

segunda-feira, 21 de junho de 2010

SOLSTÍCIO DE VERÃO

Como se sabe, ocorre hoje o solstício de Verão, que corresponde ao ponto de viragem astronómico em que a eclíptica se afasta mais do equador celeste ou, de forma mais comum, o Sol atinge o ponto mais alto sobre o horizonte. A partir de hoje a duração dos dias começa a diminuir até ao próximo solstício, o do Inverno. Mais uma lei da Natureza que qualquer radicalismo humano nunca conseguirá mudar, por mais fracturante que se queira ser. Felizmente podemos contar com leis da Natureza que já existiam antes do Homem e continuarão muito depois de a Humanidade terminar a sua História.

Já o mesmo não se pode dizer infelizmente, das chamadas ciências sociais, como as que têm a ver com a economia e a nossa organização social e política que, na realidade têm muito pouco de científico.

A actual crise económica que hoje é uma crise do euro foi prevista por muita gente durante anos, gente essa considerada iconoclasta e ignorante pelos grandes especialistas e mesmo cientistas da economia. Hoje em dia é fácil perceber que meter no mesmo saco diferentes economias como a alemã, a francesa, a grega, a espanhola e a portuguesa só podia mesmo dar mau resultado, principalmente por não terem sido construídos mecanismos de compensação, deixando à solta a possibilidade de financiamento externo a cada país e possibilitando os endividamentos que hoje se conhecem.

O leitor lembra-se de no início do Euro, nas eleições de 1995, o então candidato a primeiro-ministro António Guterres se ter atrapalhado cá em Coimbra com uns números relativos a despesa pública e crescimento do PIB? Na altura gozou-se muito com a atrapalhação de Guterres com os números, mas a questão principal não era essa, até porque Guterres sempre foi muito bom em matemáticas e atrapalhações com contas em público acontecem a qualquer um. A questão principal era o raciocínio que lhe estava subjacente. Guterres explicava que a despesa orçamental poderia subir bastante porque a economia estava a crescer e esse facto dava margem para o Estado gastar mais. E a verdade é que nos anos seguintes o Estado gastou cada vez mais, mesmo com recurso a crédito que parecia ilimitado e barato para sempre. O Estado gastou, endividou-se e levou toda a sociedade a endividar-se porque nunca mais haveria problemas com falta de dinheiro. Foi também nessa altura que se inventaram as SCUTs, o leitor está recordado? O ministro João Cravinho contra toda a evidência comum, provava com estudos económicos feitos pelos maiores especialistas que as SCUTs se pagariam a sim mesmas pelo acréscimo de produção económica do país que iriam gerar só por serem construídas. Viu-se; claro que esses especialistas virão agora explicar calmamente que os pressupostos dos estudos não se verificaram e que portanto não têm qualquer responsabilidade na tragédia que foram esses investimentos (menos para os construtores, claro está). Dava jeito é que esses pressupostos tivessem na altura sido divulgados e explicados ao povo eleitor e pagante de impostos.

Como na Astronomia, o solstício de Verão da nossa economia passou e agora aproxima-se inexoravelmente o solstício de Inverno, sem que ninguém assuma o papel de explicar devidamente aos portugueses o que se está verdadeiramente a passar. Não basta que venha o Presidente da República agora dizer apocalipticamente, mas também de forma algo encriptada, que Portugal chegou a uma “situação insustentável”. É preciso saber o problema que temos, para podermos discutir como o resolver.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 21 de Junho de 2010

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Escrito para os dias de hoje?

Evangelho segundo S. Mateus 6,1-6.16-18.

«Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos homens, para vos tornardes notados por eles; de outro modo, não tereis nenhuma recompensa do vosso Pai que está no Céu. Quando, pois, deres esmola, não permitas que toquem trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, a fim de serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: Já receberam a sua recompensa. Quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua direita, a fim de que a tua esmola permaneça em segredo; e teu Pai, que vê o oculto, há-de premiar-te.» «Quando orardes, não sejais como os hipócritas, que gostam de rezar de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando orares, entra no quarto mais secreto e, fechada a porta, reza em segredo a teu Pai, pois Ele, que vê o oculto, há-de recompensar-te. «E, quando jejuardes, não mostreis um ar sombrio, como os hipócritas, que desfiguram o rosto para que os outros vejam que eles jejuam. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para que o teu jejum não seja conhecido dos homens, mas apenas do teu Pai que está presente no oculto; e o teu Pai, que vê no oculto, há-de recompensar-te.»

segunda-feira, 14 de junho de 2010

DISPARATE PEGADO

Pelos vistos, para se circular nalgumas estradas de Portugal vai passar a ser preciso um dispositivo electrónico no carro. Isto não faz sentido nenhum. Para se andar nas actuais auto-estradas, dá jeito ter a via verde, mas ninguém é obrigado a tê-la. Agora, obrigar todas viaturas a ter um dispositivo electrónico, para circular nalgumas estradas? Mesmo os carros estrangeiros? E a liberdade de circulação? Já não interessa?

Mas não há por aí ninguém com um pouco de bom senso que possa mandar parar toda esta anedota?

LE MANS 2010


De novo a Audi em 1º, 2º e ...3º lugares, ou a "brigada dos TDI" (private joke para o amigo José Miguel que gosta de provocar com o M3)

LUGAR À CULTURA


Chegámos finalmente a um ponto em que já todos percebemos de que forma o caminho da nossa economia está traçado; sabendo isso, devemos ter consciência de que a vida tem muito mais para além das dificuldades económicas que nos esperam por muitos e bons anos, para que a nossa satisfação interior seja alcançada, o que é essencial para o equilíbrio das pessoas, mas também das sociedades.

De entre outras, é essa uma das razões por que a Cultura tem hoje em dia, e deverá continuar a ter no futuro, uma grande importância social e até económica. Os cortes em despesas, tantas vezes cegos, não deveriam pois atingir de forma insensata a cultura, tão importante para a sociedade.

Uma das áreas culturais mais importantes em todo o mundo é a chamada música erudita. Importante, porque define claramente o nível cultural de um povo. Importante, porque permite aos jovens, que a ela têm acesso, adquirirem uma postura social completamente diferente daqueles que infelizmente não têm essa oportunidade.

Contra ventos e marés, apenas com o apoio permanente e possível da Câmara Municipal de Coimbra e de alguns patrocínios, a Orquestra Clássica do Centro que sucedeu à Orquestra de Câmara de Coimbra, tem vindo a afirmar-se em toda a região Centro, com dezenas e dezenas de concertos e centenas de presenças em acontecimentos diversificados. Isto para além de proporcionar condições para formação musical de crianças e jovens. Com nove anos de existência, a OCC desde há dois que ocupa o Pavilhão Centro de Portugal no Parque Verde do Mondego.

Pessoalmente, já por diversas vezes referi nestas páginas a relevância cultural da actividade da Orquestra Clássica do Centro. Tenho ainda dado conta da mágoa sentida por muitos, pelo facto de o Ministério da Cultura não apoiar a OCC como pareceria ser sua estrita obrigação, escudando-se muitas vezes com desculpas esfarrapadas e mesmo injustas, como a acusação de falta de qualidade, ou por apoiar já outra orquestra clássica na região, que na realidade é uma formação mais pequena e com uma actividade pública bem mais reduzida. Se a Cultura apoia, e porventura bem, numerosas companhias teatrais na mesma região, porque não o fará com a música clássica? Estará a música erudita condenada a ser sempre o parente pobre da Cultura entre nós? Acaso entenderão os responsáveis políticos pela área da Cultura que a Música não ajuda à formação dos jovens? Ou será mesmo porque está sedeada em Coimbra?

Coimbra deve muito à Direcção da Orquestra Clássica do Centro e ao Maestro Virgílio Caseiro, como é já sobejamente conhecido. Muitos não saberão, no entanto, que há mais pessoas sem as quais os resultados já alcançados não seriam possíveis. Desde logo, o presidente da Câmara, Dr. Carlos Encarnação, sem quaisquer dúvidas. Mas há outro responsável que aqui deve ser referido. O Prof. Linhares Furtado é bem conhecido pela sua extraordinária relevância no campo da Medicina não apenas em Coimbra, mas em todo o mundo. Para além do pioneirismo das suas cirurgias e das técnicas sofisticadíssimas que desenvolveu nessa área que passaram a ser praticadas em hospitais um pouco por todo o lado, é conhecido por ser um Médico, para além de cirurgião. Isto é, para ele os doentes existem muito para além das mesas cirúrgicas, em toda a complexidade do ser humano que sofre.

Este humanismo não podia deixar de ser transportado para outras áreas. Foi assim que a certa altura o Prof. Linhares Furtado, grande amante e conhecedor da música erudita ou clássica, como muitos lhes chamam, se dedicou de alma e coração à obra da Orquestra Clássica do Centro. Certamente que sem a sua acção e apoio discreto, mas decisivo, a OCC não seria o que é hoje. Coimbra teve a sorte de acolher este Açoriano de origem que, para além de uma vida inteira como Médico e Cientista do melhor que há no mundo, tanto tem feito em prol da Cultura na nossa cidade. Saibamos merecer.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 14 de Junho de 2010

domingo, 13 de junho de 2010

FACEBOOK

Estou a encarar o fim da minha página no facebook. Começo a ficar farto. Ora aparecem pedidos de "amizade" inventados por quem apenas quer aceder à minha página que está reservada aos amigos aceites, ora aparecem pessoas a pedir contas por não as aceitar como amigas, quando não apresentam foto, nem sequer quaisquer elementos pessoais identificativos. Já é demais!

O CARTOON DE KAL


Da Economist desta semana

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Euro Zone Dialogue - does the euro have a future?




  Economist Conferences | Euro Zone Dialogue. Does the euro have a future? September 23rd 2010 * Berlin  
 

Dear reader,

Europe's sovereign debt crisiscan the euro survive?

A decade after the euro's introduction, crisis has hit Europe and exposed weaknesses in the single currency. With the Greek debt crisis spreading, and confidence shaken, corporate leaders are struggling to make sense of the maelstrom, and asking how the euro's future will impact their business.

Chaired by John O'Sullivan, The Economist's European economics correspondent,
Euro Zone Dialogue boasts an unrivalled agenda featuring senior policy makers, leading executives and economists.

Take a look at the latest programme to find out more.

Confirmed speakers include:

  • Olli Rehn, European Commissioner for Economic and Financial Affairs
  • George Papaconstantinou, Minister of Finance, Government of Greece
  • Fernando Teixeira dos Santos, Minister of Finance, Government of Portugal
  • Michael Heise, Chief Economist, Allianz SE
  • Otmar Issing, President, Centre for Financial Studies, and Former Member of the Board, European Central Bank
  • Thomas Mayer, Chief Economist, Deutsche Bank

Plus, join one of our breakfast briefings with senior editors of The Economist, including Brooke Unger, Berlin Bureau Chief and Jonathan Rosenthal, European Finance and Business Correspondent.

Early booking rates available before 25th June—save €200

To take advantage of this offer, register online at
www.economistconferences.com/eurozone quoting code: EMBA/IN.

The next few years may well be the toughest the euro has ever faced. Join us as we tackle the issues behind the headlines, and learn how the euro zone's future and your company's future are interlinked.

Yours sincerely,

Claire Wolstenholme signature
Claire Wolstenholme
Conferences Director, Europe

Economist Conferences

Online www.economistconferences.com/eurozone
Email cemearegistrations@economist.com
Tel +44 (0)20 7576 8550
Fax +44 (0)20 7576 8534
   
P.S. For details of other upcoming events in Europe, keep our new website bookmarked at www.economistconferences.eu

 
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segunda-feira, 7 de junho de 2010

NOTÍCIAS DOS VELHOS ALIADOS


Nestes tempos conturbados e de deriva política, não nos faz mal nenhum recordar as nossas antigas ligações e ver o que o que os nossos mais velhos aliados andam a fazer. De facto, negócios podem fazer-se com toda a gente ou quase, pelo que não virá grande mal se algumas empresas portuguesas ganharem dinheiro na Líbia, na Venezuela ou nos países do Magreb. O que não podemos de forma nenhuma é imaginar que nos virá alguma vantagem política ou social de um contacto mais íntimo com os regimes desses países. Aquilo a que muitos chamam a “magrebização” do país significaria apenas um retrocesso lamentável na nossa organização social económica e política, que deve ter como modelo a Europa.

Voltando aos nossos aliados da “Aliança Inglesa”, devemo-nos recordar que essa é a mais antiga aliança diplomática do mundo em vigor. Significa uma ligação quase umbilical entre Portugal e Inglaterra, hoje Reino Unido. O Tratado de Windsor foi firmado em Maio de 1386, mas a “Aliança Inglesa” era já de 1373. Da ascensão ao trono de D. João I e seu casamento com Filipa de Lencastre, filha de João de Gant, duque de Lencastre, veio a Ínclita Geração e uma época de grande prosperidade económica com grande desenvolvimento do comércio que hoje chamaríamos de exportação, e ainda o início da época dos descobrimentos com todos os seus sucessos e prosperidade.

Não esqueçamos ainda que a Inglaterra é a mais antiga Democracia, e que aos ingleses se deve a tenaz resistência à barbárie nazi, não apenas militar, mas também, e sobretudo, ideológica e civilizacional.

Tudo isto para dizer que o Reino Unido resolveu finalmente deitar fora a “Terceira Via”, nome que Tony Blair e os seus amigos resolveram dar à política do Partido Trabalhista a que até chamaram “Novo Partido Trabalhista”, no fundo enterrando a social-democracia tal como a conhecíamos.

A coligação que o Partido Conservador e o Partido Liberal Democrata montaram é um modelo político a estudar e a seguir com o maior interesse. E isto porque os respectivos líderes, David Cameron e Nick Clegg, não construíram a coligação através de uma simples divisão de ministérios ou de pessoas. Os dois partidos partiram dos seus programas para as negociações e, sector a sector, analisaram com seriedade aquilo que para cada partido era crucial e aquilo em que podia ceder. Por exemplo, o Partido Conservador não cedeu nas suas propostas sobre Educação que foram uma das suas bandeiras principais, mas acrescentou-lhe os apoios financeiros para as crianças pobres, como o Partido Liberal Democrata propôs nas eleições. Bem interessante é constatar que ambos os partidos acordaram em reduzir drasticamente as despesas do Estado em vez de aumentar os impostos, para cortar no défice. A construção da terceira pista do aeroporto de Heathrow, por exemplo, foi abandonada. Em praticamente todas as áreas da governação houve negociações a sério e encontro de soluções aceitáveis por ambos os parceiros, o que permitiu um pacto de não agressão entre os dois partidos até às próximas eleições, daqui a cinco anos.

Bem refrescante, devo dizer. E um exemplo a ter em conta entre nós, acrescentarei ainda. Exemplo que, obviamente, não nos chegará do Magrebe ou da Venezuela.

Publicado no Diário de Coimbra em 7 de Junho de 2010

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Chá verde retarda envelhecimento cerebral, conclui investigação da Universid...


via Publico.pt - Geral em 31/05/10
Uma equipa de investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) concluiu que ...

MAGNIFICAT

Evangelho do Dia



Segunda-feira da Semana IX - Visitação da Virgem Maria

(Lc 1, 39-56) Naqueles dias,
Maria pôs-se a caminho
e dirigiu-se apressadamente para a montanha,
em direcção a uma cidade de Judá.
Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel.
Quando Isabel ouviu a saudação de Maria,
o menino exultou-lhe no seio.
Isabel ficou cheia do Espírito Santo
e exclamou em alta voz:
«Bendita és tu entre as mulheres
e bendito é o fruto do teu ventre.
Donde me é dado
que venha ter comigo a Mãe do meu Senhor?
Na verdade, logo que chegou aos meus ouvidos
a voz da tua saudação,
o menino exultou de alegria no meu seio.
Bem-aventurada aquela que acreditou
no cumprimento de tudo quanto lhe foi dito
da parte do Senhor».
Maria disse então:
«A minha alma glorifica o Senhor
e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador.
Porque pôs os olhos na humildade da sua serva:
de hoje em diante me chamarão bem-aventurada todas as gerações.
O Todo-poderoso fez em mim maravilhas,
Santo é o seu nome.
A sua misericórdia se estende de geração em geração
sobre aqueles que O temem.
Manifestou o poder do seu braço
e dispersou os soberbos.
Derrubou os poderosos de seus tronos
e exaltou os humildes.
Aos famintos encheu de bens
e aos ricos despediu de mãos vazias.
Acolheu a Israel, seu servo,
lembrado da sua misericórdia,
como tinha prometido a nossos pais,
a Abraão e à sua descendência para sempre».

Maria ficou junto de Isabel cerca de três meses
e depois regressou a sua casa.

QUESTÕES VERDADEIRAMENTE FRACTURANTES

Já poucos se lembram, mas no Verão de 2008 começou uma séria crise financeira internacional cujo sinal maior foi a falência do banco Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimento dos Estados Unidos. A partir daí foi toda uma catadupa de falências de instituições bancárias, compra de outras, fusões, etc. Os governos de muitos países do Ocidente resolveram salvar o sistema financeiro que durante anos fez disparates sobre disparates com produtos que não tinham sustentabilidade real e se auto-alavancavam de maneira insana, com o beneplácito de todas as entidades com responsabilidade reguladora ou, no mínimo, um fechar de olhos e assobiar para o lado. Na realidade, tratou-se de uma crise séria, mas de ajustamento do sistema à realidade.

As iniciativas dos governos estenderam-se depois a toda a economia, tentando tapar os buracos, como se o fundamental não fosse ir às causas, em vez de maquilhar as consequências.

Como resultado, os défices dispararam e vieram acumular-se às tradicionais deficiências de muitos desses países: dívida externa exagerada, fraco crescimento, desadequação das economias aos novos tempos da globalização.

Na Europa do Euro, esses problemas são muito mais graves para os países nessa situação, porque não possuem meios próprios para responder, dado que prescindiram voluntariamente deles ao aderirem à moeda única. Em particular, esses países deixaram de ter a possibilidade de desvalorizar moeda e de influenciar as taxas de juro, meios desde sempre utilizados para combater situações de crise económica e de falta de competitividade. Nesta situação verdadeiramente aflitiva, que se pode comparar a um duche gelado logo depois de um banho quente, estão a Grécia e a Espanha, mas também Portugal. Muitos países europeus estão a adoptar medidas excepcionais para controlo dos seus défices a curto prazo. Como sempre, os défices são combatidos através da redução de despesas, ou então através do aumento de impostos, ou mesmo por uma mistura das duas soluções. Todos os países aumentam os impostos, uns mais do que os outros. O que os governos não prescindem é de dar sinais à sociedade de que acompanham os cidadãos nos seus sacrifícios. Por exemplo, os ministros ingleses deixaram de ter direito a carro oficial próprio com motorista, devendo usar transportes públicos ou carros oficiais partilhados, e em França os ministros passaram a utilizar pequenos carros utilitários e económicos, para além de terem acabado com despesas supérfluas, como flores frescas nos ministérios. Muitos outros exemplos se podem contar. Cá por Portugal, país onde a subida de impostos vai ser acentuada, verifica-se em todos os níveis do Estado a continuação do espectáculo de organismos com inúmeros carros parados à porta com os respectivos motoristas à espera.

A moeda única tornou-se uma verdadeira armadilha para os países que nela entraram alegremente sem preparar as suas economias para a nova situação criada. Fica-nos a amarga sensação de que grande parte dos dirigentes políticos que desde há décadas têm aparecido por essa Europa fora são no mínimo inconscientes, quando não totalmente incompetentes. Se não, como se compreenderia que países tenham aderido a uma moeda única sem garantir meios de combate a crises para além de descerem generalizadamente os salários, como agora os gurus como Paul Krugman lhes vêm candidamente explicar?

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 31 de Maio de 2010

segunda-feira, 24 de maio de 2010

HERÓI DA INFORMAÇÃO

Estamos a viver uma época de rápidas transformações em todas as facetas da vida colectiva, que se sucedem a uma velocidade sem paralelo na história da Humanidade. Uma das razões para que isto se esteja a passar tem certamente a ver com a facilidade e velocidade de transmissão de informação. O aparecimento e a disseminação da utilização da internet vieram introduzir alterações cruciais no acesso à informação e ao seu tratamento e transmissão. Por exemplo, é hoje muito mais importante e eficaz disponibilizar obras na internet do que manter grandes bibliotecas abertas ao público, como as grandes universidades do mundo já fazem há algum tempo. É assim que todos temos a possibilidade de estudar obras portuguesas antigas que não estão disponíveis entre nós, por se encontrarem em universidades ou museus estrangeiros, sem haver necessidade de deslocações.

As televisões e os próprios jornais têm hoje um papel completamente diferente na informação do que se passa pelo mundo e no nosso país e mesmo na formação da opinião pública. Os meios de comunicação social tradicionais fazem hoje um esforço enorme de adaptação às novas realidades, sem o que o seu futuro se encontrará irremediavelmente comprometido. Alguns sobreviverão, necessariamente diferentes, mas muitos desaparecerão sem apelo nem agravo, aniquilados pela imensa e diferenciada oferta de informação disponibilizada pela internet.

Este jornal que o leitor tem na mão faz hoje 80 anos. Desde que nasceu em 24 de Maio de 1930 que se assume como um jornal republicano e regionalista, “defensor dos interesses das Beiras”, como afirmava orgulhosamente sob o título, logo a partir do primeiro número.

As suas páginas ao longo destes anos são testemunho de tantos acontecimentos que ocorreram no mundo, em Portugal e na nossa região, que o próprio jornal merece ser também notícia, sendo os seus oitenta anos motivo de satisfação para todos os que o lêem e certamente muito mais ainda para os que o fazem. Grandes nomes de Coimbra e das Beiras têm o seu nome eternamente fixado nas páginas do Diário de Coimbra: desde logo o seu fundador, Adriano Viegas da Cunha Lucas, mas também Bissaya Barreto, justamente homenageado pela Cidade logo em 1931, os jogadores da Académica que em 1939 venceram a Taça de Portugal, Linhares Furtado que fez o primeiro transplante de rim em 1969, Miguel Torga, galardoado com um prémio mundial de poesia em 1976, o saudosamente recordado Elísio de Moura, mas também Jorge Anjinho, João Paulo II, que nos visitou em 1982, o Senhor D. Albino cuja próxima saída nos deixa já com saudades, Ferrer Correia, excepcional e clarividente reitor da Universidade verdadeiramente Magnífico, Manuel Antunes, médico notável e organizador de serviços de saúde, Mendes Silva, que morará para sempre na memória de quem o conheceu, Pinho Brojo e António Portugal, cultores maiores do Fado que leva o nome da nossa Cidade, Carlos Mota Pinto, excepcional professor universitário e político grande, António Arnaut, defensor sempre coerente de causas sociais.

Tantos outros passaram até hoje pelas suas páginas de forma positiva. Dos que por lá passaram de forma algo triste não valerá muito a pena falar, embora façam também parte da História. Referi propositadamente pessoas, e não factos ou acontecimentos, porque são o que verdadeiramente interessa e quem faz a História e nos marca definitivamente pelo exemplo de vida.

Os tempos estão a mudar como disse acima, e no futuro o papel dos jornais como o Diário de Coimbra não será certamente igual ao que foi nos últimos oitenta anos. Vivemos hoje imersos num mar de informação global. Há, no entanto, uma função que o Diário de Coimbra tem exercido de uma forma excepcional e que justifica talvez a sua já longa existência e que ultrapassa tudo aquilo que a internet, os blogues e redes sociais não serão capazes de substituir com vantagem: a sua excepcional capacidade de estabelecer redes entre os diversos intervenientes públicos da nossa Região, com respeito por todas as correntes de pensamento e opinião, e ainda a forma notável como liga a Cidade a milhares de pessoas que numa ou outra altura da sua vida se relacionaram com Coimbra.

Ao jornal que me acolhe todas as segundas-feiras desde há quase cinco anos, o agradecimento por esta oportunidade e os votos das maiores felicidades por mais oitenta anos. Desejo ainda a todos seus colaboradores as maiores venturas pessoais e profissionais.

Publicado no Diário de Coimbra em 24 de Maio de 2010