O tal anexo não era mais do que a “reportagem” completa da lapidação de uma rapariga por um grupo de homens num qualquer país islâmico. A cena passou-se há pouco tempo, tendo sido filmada com o telemóvel por um dos participantes no acto. Aliás, entre os eufóricos participantes, era possível reparar na intensidade com que se empurravam, de maneira a poder assistir em primeiro plano às cenas mais “excitantes”.
O filme, que tem a duração de pouco mais de dois minutos, mostra o início da lapidação, em que a rapariga ainda está em aparente bom estado, continua com o apedrejamento com ela já caída no chão, com o arrancar de roupas, até às cenas finais em que um dos energúmenos lhe bate sucessivamente na cabeça com um tijolo, até acabar de a esmagar, conseguindo pelo caminho partir o tijolo ao meio.
Tudo isto é acompanhado de grande gritaria, risos nervosos e o que se supõe ser insultos à desgraçada que, para mal dela, teve a desdita de nascer e viver em 2008 num país que observa a “sharia” ou lei muçulmana. Repare-se: nem sequer digo que teve o azar de dar um beijo ou de amar alguém num país que observa aquela “lei”. Do que se trata é mesmo do azar de nascer e viver numa sociedade baseada naquele código, em pleno século XXI.
É escusado argumentar com acções da nossa civilização ocidental e cristã passadas há centenas de anos, na infrutífera tarefa de desculpabilização ou mesmo compreensão de semelhantes actos. Não nos dias de hoje, no mundo de hoje.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi proclamada em 1948 porque os países vencedores da Segunda Guerra Mundial compreenderam que há barbaridades que são total e liminarmente inaceitáveis entre os humanos. Embora a Declaração não tenha força de lei, é absolutamente necessário que a comunidade internacional reconheça que os seres humanos têm dignidade moral enquanto pessoas, criando instrumentos que obriguem todos os países a aceitar os mínimos definidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
O respeito pelas culturas diferentes, que é necessário, não pode incluir a aceitação de actos destes ou ainda de outros, como a mutilação genital feminina. Há limites ao relativismo cultural.
Num tempo em que as alterações económicas mundiais ocupam as preocupações gerais da população, apenas entrecortadas com as notícias do mundo do futebol, a divulgação de imagens como as deste pequeno vídeo não pode deixar de nos revoltar e obrigar a trazer para o primeiro plano as preocupações com as violações constantes e por vezes extremas dos direitos humanos.Publicado no Diário de Coimbra em 2 de Junho de 2008
Sem comentários:
Enviar um comentário