Na última semana a Orquestra Clássica do Centro deu-nos a
oportunidade de assistir a dois concertos notáveis e completamente diferentes
do habitual. Tratou-se de duas incursões em tipos de música não erudita, que se
saldaram em êxitos longa e entusiasticamente aplaudidos pelas assistências dos
espectáculos.
O primeiro desses concertos teve lugar no auditório do
Conservatório de Música de Coimbra e integrou-se nas iniciativas da passagem de
30 anos sobre a morte de José Afonso, sob o mote “Insisto não ser tristeza” do
poema do autor com o mesmo nome. Os arranjos das canções de José Afonso para
orquestra tiveram diversos autores, como José Firmino, Sérgio Azevedo ou
Virgílio Caseiro, entre outros. Deve-se salientar que o concerto se iniciou com
a estreia de uma peça para orquestra da autoria de José Firmino, intitulada “In
Memorian”, em que o compositor de Coimbra homenageia José Afonso. O interesse
das canções de José Afonso vai muito para além da intervenção política de muitos
seus poemas, certamente importante, mas limitativo do seu valor, se a tal for
reduzido. Particularmente no que respeita à nossa cidade, a ele muito se deve a
evolução profunda da chamada “música de Coimbra” que se operou no fim dos anos
50 e na década seguinte. Muitos consideram que se pode considerar que há uma
canção de Coimbra antes de José Afonso e outra depois dele, o que diz muito
sobre a sua importância artística.
No concerto do passado dia 30 de Setembro a OCC foi dirigida
pelo seu Maestro titular José Eduardo Gomes, tendo as canções sido
interpretadas por João Afonso que está a construir uma carreira própria há
vários anos, com diversos CD’s muito interessantes já publicados, dentro de um
estilo musical que nada tem a ver com a canção de Coimbra. Contudo, o facto de
ter uma voz com características que se assemelham bastante à do seu Tio José
Afonso fez do concerto uma experiência única, que talvez devesse mesmo ser alvo
de publicação em CD para ser desfrutada por mais gente do que aquela que
esgotou completamente o auditório do Conservatório de Música. A novidade de
temas célebres como “Cantares de Andarilho”, “Minha Mãe”, “Por detrás daquela
janela”, “Venham mais Cinco” ou “Traz outro amigo também” serem interpretadas
por uma orquestra clássica acompanhando o cantor, traz uma nova vida à obra do
autor e permite uma fruição diferente e especialmente envolvente. Alguns temas,
como “Pastor de Bensafrim” ou “Verdes são os Campos”, foram (muito bem) acompanhados
pela guitarra clássica de Rui Pato que, como é sabido acompanhou José Afonso
durante muitos anos, em actuações ao vivo e em gravações de discos.
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