segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Portugal ao espelho

Os portugueses são permanentemente inundados com discussões acaloradas sobre resultados e treinadores de futebol, dramas folhetinescos da televisão e até mesmo discussões largamente ensaiadas sobre orçamentos de Estado e supostos êxitos governativos, sempre num dia-a-dia intenso que não nos deixa respirar no meio de tanta informação e espectáculo.
Contudo, a visão global do país, serena e abrangente, essa mantém-se longe dos holofotes, talvez porque dá trabalho conhecê-la e dá-la a conhecer, não constituindo matéria de entretenimento suficientemente excitante para atrair audiências. E no entanto…de vez em quando convém parar um pouco para saber qual a nossa real posição perante o mundo e a Europa a que pertencemos e como tem sido a nossa evolução. Até para conhecermos a verdade sobre a forma como temos sido governados ao longo dos anos, para além das notícias gordas e da propaganda permanente a que somos sujeitos.
A PORDATA publicou a Edição 2018 do “Retrato de Portugal na Europa”, dando-nos a conhecer a imagem real do Portugal que somos, sem enganos nem falácias em que, muito apropriadamente, colocou como sub-título “um convite à discussão informada sobre os factos”. Da grande quantidade de indicadores há, pelo menos, duas conclusões muito gerais: Portugal aproximou-se da Europa até aos anos imediatamente anteriores ao fim do século XX após o que voltou a atrasar-se, estando hoje genericamente apenas à frente da Grécia e dos antigos países comunistas, tendo já sido ultrapassado por alguns deles como a Eslovénia e a República Checa. Respiguei alguns dos indicadores, sem fazer comentários concretos, já que me parece serem óbvias as implicações para o nosso desenvolvimento colectivo.
No que respeita à População, se somos um país velho de muitos séculos, somos também um país de velhos que envelhece cada vez mais. Somos o terceiro país da UE com maior nº de idosos por 100 jovens. 
E estamos a piorar porque o nosso índice sintético de fecundidade é igualmente o 3º pior (1,36) bem abaixo da média europeia de 1,6. A taxa de mortalidade infantil de 3.2 por mil é um indicador de que nos podemos orgulhar já que a média europeia é de 3,6 mas devemos preocupar-nos, porque melhorámos até ao mínimo de 2,5 em 2010 e depois disso estamos a piorar consistentemente.
Em termos de Educação, apesar de todos os esforços e da propaganda constante de “paixões pela educação” das últimas dezenas de anos, é surpreendente a nossa situação, pela negativa. Temos 52% de população residente sem ensino secundário ou superior, contra uma média de 22,5% na União Europeia, sendo o 2º pior a seguir a Malta.
No Emprego, um indicador coloca-nos na pior situação de toda a Europa: de entre os empregadores são 54,5% os que não têm ensino secundário ou superior contra 16,6% de média europeia. Acresce que somos o país europeu com maior percentagem de trabalhadores por conta de outrem sem o ensino secundário ou superior, com o valor de 43,3% contra uma média de 16,7%.
Em termos de Economia não nos devemos admirar como nº médio de horas de trabalho por semana, mesmo depois da redução do trabalho público para 35 horas: a nossa média é de 35,6 contra uma média europeia de 30,1. A remuneração média portuguesa em PPS é de 25,7 contra uma média de 36,2. Já o PIB per capital é, em Portugal, de 23 PPS contra 29,9 na média europeia. E, claro, por último mas não menos relevante, como consequência de tudo isto a nossa produtividade laboral por hora de trabalho é de 66,4 contra os 100 da Europa e, pior, este valor mantém-se constante desde 2.000 até agora.
Outros indicadores sobre a nossa qualidade de vida vão no mesmo sentido, isto é, somos dos países mais pobres da União, sem conseguirmos subir no ranking, muito antes pelo contrário.

Esta é verdadeira imagem de Portugal quando se vê ao espelho. É da responsabilidade de todos os responsáveis governantes que temos tido, uns mais que outros, claro. Não é à toa que se leva um país à bancarrota e que se governa para benefício de lobbies eleitorais e outros, não havendo qualquer estratégia de futuro para o país, exercendo-se apenas uma gestão dos problemas trazidos pelo dia-a-dia.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 10 de Dezembro de 2018

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