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quarta-feira, 10 de março de 2021
segunda-feira, 8 de março de 2021
Música para a ansiedade
Que o Papa Francisco é uma personagem brilhante do nosso tempo, aliando uma inteligência arguta a uma simplicidade desarmante é algo que todos percebemos desde que ocupou a cadeira pontifícia, como Bispo de Roma. Há poucos dias mostrou-nos mais uma sua faceta com a seguinte frase: "A minha ansiedade está bastante controlada. Quando me deparo com uma situação ou tenho de enfrentar um problema que me causa ansiedade, eu ataco-a. Tenho vários métodos para o fazer. Um deles é ouvir Bach". Sendo como é, no seu caso sem qualquer dúvida, um homem de Fé, o Papa Francisco tem certamente a felicidade de ter no seu coração e no cérebro as ligações divinas que lhe permitirão encontrar meios para encarar os problemas que todos os dias se lhe depararão e que grandes serão alguns deles, dada a dimensão da casa que governa. E, no entanto, tem a humildade de reconhecer que um dos métodos para enfrentar as dificuldades é inteiramente humano, recorrendo à satisfação que a beleza da arte transmite, no caso a música de um homem, que por acaso até era protestante, mas que dizia que compunha para maior glória de Deus.
Homem esse, do mais comum que se possa imaginar que, como se costuma dizer, tinha uma catrefada de filhos, que gostava de comer e beber bem e que, muito simplesmente, vivia de compor música para acompanhar as celebrações do Domingo seguinte ou da festa litúrgica importante que se seguia. E é assim que temos as suas Cantatas, Missas e as suas Paixões, mas também os Concertos de Brandeburgo as Sonatas e Partitas, para além de muitas outras obras que o seu cérebro produzia em catadupa, para além de ele próprio as interpretar de forma virtuosa em diversos instrumentos. Agradeçamos ao compositor Felix Mendelssohn que iniciou no século XIX a recuperação da música de Bach então praticamente esquecida, para ser hoje tão amada e considerada no mundo inteiro que o compositor deixou de ser apenas representante do período Barroco para ser um dos maiores, se não o maior, da História da Música.
E não é que, sendo eu o mais comum e mais anónimo dos homens me acontece encontrar aqui um ponto de contacto com o Papa Francisco? Também eu, quando alguma ansiedade me ataca tenho o hábito, já antigo, de ouvir Bach. Adianto mesmo quais as obras do grande compositor da época barroca que uso com esse fim: a cantata BWV 106, dita Actus Tragicus ou, quando o tempo abunda mais, a Paixão Segundo S. Mateus. Já agora, partilho haver outro compositor, mais moderno, que se juntou a Bach naquele papel de ansiolítico auditivo privado que é Mahler em várias das suas composições, nomeadamente a Quarta Sinfonia e alguns Lieder maravilhosos, em particular, por Jessie Norman ou Dieter Fischer Dieskau. Dieskau, cuja audição me faz sempre recordar o excelente amigo que já não está entre nós, o Eng. Azevedo Gomes, com quem mantinha as mais amistosas discussões sobre qual a mais perfeita Paixão de Bach, sendo que ele preferia a segundo S. João, por mais intimista.
Por que caminhos nos leva a música, mesmo que seja apenas falar sobre ela sem a ouvir, embora o esteja a fazer neste momento, através de um dos novos meios que vieram transformar por completo a forma como a ouvimos. O “streaming” através dos vários fornecedores do mercado que hoje já oferecem uma qualidade de som apreciável, bem como a possibilidade de ouvir emissoras de rádio pela internet, permite-nos libertar daquilo de que gostamos menos, através da audição de emissões especializadas nos mais variados tipos de música ou mesmo em compositores ou intérpretes específicos. No caso concreto, delicio-me com Glenn Gould e a sua interpretação ao piano das Variações Goldberg, lá está, de Bach, sem ter que me maçar a trocar de CD no aparelho, já que se controla tudo pelo écran do telemóvel que, neste caso sim, se pode chamar verdadeiramente inteligente.
Há muito tempo que se diz que ouvir 5 minutos de Mozart de manhã é a melhor garantia de um dia feliz. Neste caso simples tratar-se-ia de uma terapêutica preventiva, mas muitos cientistas já mostraram que a Música pode mesmo ter fins terapêuticos, desde o princípio até ao fim da vida, nas mais diversas condições. A musicoterapia pode ser usada nos cuidados paliativos ao promover o relaxamento e ajudando a diminuir a dor, podendo ainda ser benéfica na reabilitação da motricidade e em outros contextos que necessitem de apoio emocional. O conhecimento, ainda que empírico, dos efeitos benéficos da música em contexto de saúde não é uma novidade dos nossos dias A tradição hebraica diz que David tocou harpa para livrar o rei Saul do um espírito e os gregos, certamente não por acaso, tinham Apolo como deus da música e da medicina.
quinta-feira, 4 de março de 2021
quarta-feira, 3 de março de 2021
segunda-feira, 1 de março de 2021
Stefan Zweig, artista sem concessões
De quando em vez, sem que pareça haver uma razão concreta para tal, pode ser um odor, a passagem num certo local, sei lá o quê, vem-nos à memória algo absolutamente corriqueiro como a compra de um livro ocorrida há dezenas de anos. Se essa compra tiver sido numa loja de praia que até vendia livros e que já não existe por ter dado lugar a um conjunto chocante de falta de gosto de prédios de minúsculos apartamentos de praia para emigrantes e o livro também tiver ficado na memória, estão juntos motivos mais que suficientes para surgir uma crónica algo diferente. E se isso tudo servir para desviar o espírito dos tempos que correm, ainda melhor. O autor do tal livro é Stefan Zweig, o seu título, «24 horas na vida de uma mulher», e ficou-me na memória desde essa altura em que o li, diga-se na juventude dos vinte anos, dando gosto a revisitação. Obra aparentemente simples, mas de uma densidade psicológica enorme e demonstrativa da capacidade de Zweig de analisar as mais profundas emoções e sentimentos do ser humano.
Em Agosto de 1940 Stefan Zweig e a sua mulher Lotte Altmann viajaram de Nova Iorque para o Brasil pela primeira vez, regressando pouco tempo depois para residirem nesse país de que Zweig tanto gostou, tendo mesmo sido o escritor a dar-lhe o epíteto que lhe ficou colado: «Brasil, país do futuro».
Stefan Zweig era um austríaco de ascendência judaica, nascido em Viena em 1881 no seio de uma família de posses. A sua obra variada e extensa é testemunho do seu amor pela dignidade humana, do seu desejo de uma sociedade respeitadora da Liberdade, da noção da necessidade da Cultura para o desenvolvimento humano, bem como da sua admiração pelos autores das mais diversas artes.
Na obra «Momentos Estelares da Humanidade» Stefan Zweig aborda, em catorze episódios, aqueles que considerava serem dos momentos mais importantes da humanidade, numa escolha assim justificada:
«O que normalmente se desenrola devagar, de maneira sucessiva ou sincrónica, comprime-se num único instante que determina e decide tudo […] Procuro aqui evocar, a partir das mais variadas épocas e regiões, alguns desses momentos estelares; chamei-lhes assim porque, resplandecentes e inalteráveis como estrelas, brilham para além da noite do efémero.»
Nos dias de hoje, em que se elege como fundamental o que é tantas vezes ligeiro e inconsequente, impressionará o que Stefan Zwieg considerava verdadeiramente fundamental, como sejam a conquista de Bizâncio pelos turcos, a descoberta do oceano Pacífico por Núñes de Balboa, como surgiu o hino A Marselhesa, a história de amor que inspirou Goethe para a «Elegia de Marienbad» ou mesmo a crise que levou Handel a compor o seu «Messias», entre outros.
De entre as numerosas biografias que Stefan Zweig escreveu, e não esquecendo a de Romain Rolland, saliento a obra «Triunfo e Tragédia de Erasmo de Roterdão» sobre Erasmo de Roterdão, grande defensor do acesso à cultura: «Aquele que sabe sugerir aos homens um novo ideal, a fé no progresso moral da humanidade, torna-se o guia dos seus contemporâneos: Erasmo foi esse homem.». Publicada em 1934, anunciava os temores do escritor perante os totalitarismos que surgiam na Europa que todos hoje sabemos iriam em breve envolver o continente e a seguir o mundo inteiro numa tragédia inominável, consequência dos fanatismos contrários à tolerância e ao diálogo.
Nesse mesmo ano de 1934 Stefan Zweig exilou-se da Áustria prevendo o que se iria seguir após Hitler ter chegado ao poder na Alemanha no ano anterior com as suas políticas anti-semitas. Apesar de a religião não ter na sua vida um papel central e assumindo que apenas por acidente de nascimento os pais eram judeus, Stefan Zweig sabia que as suas origens e o humanismo e pacifismo que adoptava não seriam tolerados pela barbárie que se afirmava.
Sendo nessa altura já um dos escritores mais famosos e vendidos do mundo, passou a viver em Inglaterra, tendo obtido a cidadania britânica. Na sequência da invasão nazi da Europa, Zweig e a sua mulher foram para os Estados Unidos em 1940 estabelecendo-se em Nova Iorque por pouco tempo, dado que após a viagem ao Brasil em Agosto desse mesmo ano, decidiram estabelecer-se no país sul-americano em Petrópolis, perto do Rio de Janeiro. Já no Brasil escreveu a obra autobiográfica «O Mundo que Eu Vi» em que se mostra nostálgico perante um mundo e uma Europa desaparecida com a Primeira Guerra Mundial.
Face à hecatombe da Grande Guerra que não suportavam ver, Stefan Zweig e a sua mulher Lotte decidiram pôr termo à vida em 1942 com uma nota de despedida em que o escritor se explicou: «Deixo saudações a todos os meus amigos: talvez vivam para ver o nascer do sol depois desta longa noite. Eu, mais impaciente, vou-me embora antes deles».
sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021
«Sociedade dividida e democracia»
Citando Joaquim Aguiar, no Jornal de Negócios:
«Uma sociedade dividida é estruturada por polarizações (antagonismos baseados em conflitualidades de tipo étnico, de tipo religioso ou justificados pelas interpretações da origem das desigualdades sociais, que produzem visões do futuro radicalmente distintas) que geram democracias instáveis e poderes políticos débeis. (...)
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021
Uma sociedade em mudança, mas para onde?
Sinal dos tempos: quando abro o jornal de manhã, vou directamente ao obituário verificar, sempre com alguma ansiedade, se entre os numerosos óbitos está o de alguém conhecido ou amigo. Essa secção, há poucas semanas, chegou a ocupar três páginas, andando agora normalmente pelas duas.
E, como é normal que suceda numa hecatombe desta dimensão com mais de duzentas mortes diárias em Portugal durante semanas, lá aparecem mesmo notícias do falecimento de pessoas apenas conhecidas, com quem nos cruzámos uma ou outra vez ao longo da vida ou mesmo com quem mantínhamos relações de amizade. O que se passa no cemitério do Alto de S. João em Lisboa que foi recentemente notícia na comunicação social é apenas um exemplo: uma nova secção de sepulturas aberta que levaria normalmente um ano a ser preenchida foi ocupada em 50% em apenas dois meses.
Os funerais que já por si são sempre para todos nós algo de penoso em que participamos por reverência para com a pessoa falecida ou para com os seus familiares transformaram-se em cenas de um irrealismo estranho.
O vulgar uso do telefone é outra dimensão da alteração dos relacionamentos. É a medo que se liga para alguém para saber como passa, tantas são as vezes em que do lado de lá nos respondem que «fui apanhado pelo bicho» e estou a ver em que dá.
Os casais jovens com filhos em idade escolar passam também por experiências difíceis. Ter os filhos em casa em permanência com «aulas» à distância, enquanto se trabalha em casa em regime do chamado tele-trabalho é uma experiência que até pode ter alguma graça durante uma semana mas que se torna um fardo difícil de suportar durante muito tempo.
A permanência absoluta das notícias sobre a pandemia nos telejornais é cansativa, causa ansiedade generalizada e muita confusão nas mentes. As notícias diárias sobre abusos e atropelos na vacinação que deveria ser um exemplo de dignidade e respeito dada a extrema urgência na sua realização não ajudam nada a que haja confiança generalizada no sistema. Espalha-se a noção de que o tão característico «desenrascanço» português se generaliza mesmo entre responsáveis em diversas áreas, da política à administração pública, privada e social.
Verifica-se a mais completa indefinição e mesmo confusão sobre o confinamento em áreas económicas. O facto de se poder levantar refeições completas em restaurantes de take-away exceptuando bebidas, incluindo uma simples garrafa de água, é algo que não lembra a ninguém. Tal como as únicas lojas que vendem livros que estão fechadas serem as livrarias também é algo de surreal.
As proibições. Claro que se têm que aceitar limitações aos contactos pessoais para evitar os contágios ao máximo. Mas uma sociedade democrática e liberal não pode aceitar essas proibições durante muito tempo sem que tal tenha consequências graves no seu funcionamento normal futuro. Algo que já é muito evidente nos dias de hoje é uma radicalização de posições pessoais a propósito de tudo e mais alguma coisa. Desde a política até às redes sociais, passando pelo simples contacto diário entre as pessoas, uma espécie de violência endémica parece vir à tona à mínima contrariedade. A substituição do milenar aperto de mão por uns murros, ainda que pacíficos, poderá ser muito mais significativa do que à primeira vista possa parecer.
E o medo, sempre o medo omnipresente. O medo que os portugueses têm entranhado no mais fundo do seu ser, depois de centenas de anos de Inquisição, e uns tantos de ditadura política de que só agora estávamos verdadeiramente a aprender a sair. Como não se sabe onde está escondido um bufo que nos denunciará, também o maldito vírus pode estar na maçaneta da porta de casa, no saco do supermercado, no teclado do multibanco ou no ar no interior do autocarro.
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021
Vacinas: prioridades
Tendo em vista este gráfico referente às mortes até 17 de Fevereiro, as prioridades de vacinação não deviam ser as idades, sem mais tretas?
Autárquicas em Coimbra
Recordo os resultados das autárquicas de 2017.
Somando as candidaturas do PSD/CDS e Somos Coimbra são só 5.000 votos de diferença, à partida. Só.
Claro que o PSD, ao entregar a liderança a José Manuel Silva que nas anteriores eleições teve menos 7.000 votos está por um lado a reconhecer que sozinho não chega lá e por outro, em caso de vitória, a assumir não poder contabilizar a Câmara de Coimbra como sendo sua. Porque, na verdade, não será.
Claro que, para mim, o importante é a gestão da Câmara, para bem do Concelho e dos seus munícipes.