segunda-feira, 16 de agosto de 2021

“Futebolização” da sociedade


 Peço desculpa aos leitores pelo abuso da língua portuguesa que é a utilização de um termo que não constará dos dicionários, mas não encontrei outro que significasse de forma óbvia e imediata a apropriação da linguagem, mas também da nossa vida pelos fenómenos ligados ao desporto-rei que é o futebol.

Esse jogador genial que se chama Lionel Messi saiu do seu clube de há muitos anos e chorou por isso, mas logo sorriu perante a colossal manifestação de recepção feita pelos adeptos do novo clube. Clube esse, o Paris Saint-Germain, que é hoje financiado pelo monarca do Qatar, facto esse que permite esquecer todos os atropelos aos direitos humanos de que a Europa se ufana ser defensora estreme. Para além dos investidores como o referido Tamin bin Hamad Al Thani, ou os oligarcas russos, o magnífico desporto que é o futebol é hoje uma indústria alimentada pelo entusiasmo dos seus apreciadores, seja pela sua presença nos estádios, seja pelas transmissões televisivas, pagas a preço de ouro e em adiantado. Messi irá receber do novo clube cerca de 41 milhões de euros por ano, havendo notícias de que o Barcelona, o seu anterior clube, gastou com ele cerca de 600 milhões nos últimos três anos, o que deixou o clube na bancarrota, ou quase. Nem vale a pena referir os valores recebidos pelo nosso Cristiano Ronaldo, que é um dos desportistas mais bem pagos do mundo. Os valores dos ordenados das estrelas do futebol, bem como os custos das suas transferências entre clubes, com comissões para os seus representantes e dirigentes constituem uma das facetas mais opacas da indústria do futebol. Tal como os tais investimentos dos «donos» milionários dos clubes que apenas permitem supor que tipo de negócios estão por trás e que muito claros e dignos não serão, certamente.


Entre nós, passados os jogos olímpicos e recomeçado o campeonato nacional, regressam as horas infindáveis de conversa televisiva sobre os jogos realizados, que ocupam praticamente todas as estações, mantendo bem acesa a chama do sectarismo clubístico. Mesmo as intervenções judiciais relacionadas com corrupção dos dirigentes máximos passam para segundo plano, como se não tivessem a ver com toda a organização da indústria do futebol. Embora mais limitados do que internacionalmente, os vencimentos pagos pelos nossos principais clubes não têm nada a ver com o que os portugueses, na sua generalidade, recebem pelo seu trabalho. E é impressionante que se ache um exagero que um primeiro-ministro ganhe uns 5 mil euros por mês, enquanto se aceita calmamente que muitos futebolistas recebam bem mais que isso…diariamente.

Tal como não se percebe que seja admissível que os nossos impostos sirvam para pagar o acompanhamento policial daquelas manifestações de pura barbárie que são as entradas das claques nos estádios. E não me venham com a conversa de que” ah e tal, tu não gostas é de futebol, se não compreendias isso, porque é assim mesmo”. Na minha opinião, é exactamente ao contrário. Ninguém que goste verdadeiramente de ver desporto pode aceitar estas situações fora e dentro dos estádios, que levam a que não se possa levar crianças a assistir, quer por razões de segurança, quer para evitar que achem normais ali situações que em mais lado nenhum são permitidas. A clássica teoria que explica o entusiasmo nas competições desportivas como positivo por permitir, de forma pacífica, sublimar as tensões que sempre se desenvolvem no dia-a-dia não se aplica aqui. Pela simples razão de que aquilo a que se assiste é tudo menos pacífico.


O futebol tem passado, nas últimas décadas, muita da sua linguagem característica para a actividade política, sinal da sua influência crescente na sociedade. A militância política tem-se vindo a tornar em partidarismo cego à medida que os referenciais ideológicos têm vindo a dar lugar à pura e simples procura do poder e sua manutenção, à maneira do sectarismo clubístico que pressupõe que qualquer acto é justificado desde que garanta a “nossa vitória”.

Mas existe outro aspecto do futebol que tem tido uma influência verdadeiramente desastrosa na política. Trata-se do eterno recomeço que é a história dos campeonatos de futebol. Terminado um, logo começa outro que pode ser completamente diferente, não tendo nada a ver com o anterior. Esta lei da vida do futebol transposta para a política significa que os diversos governos que se sucedem agem como se não tivessem nada a ver com os anteriores porque, lá está, trata-se de ciclos diferentes. Nada de mais errado. As consequências das medidas tomadas em cada governação mantêm-se durante muitos anos depois de tomadas, para o bem e para o mal, mesmo durante os novos «ciclos» que lhes sucedem. Muito diferentemente do que sucede no futebol. E as pessoas parecem tender a esquecer-se cada vez mais disso, à medida que a linguagem imediatista do futebol invade o mundo mediático.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 16 de Agosto de 2021

Imagens retiradas da internet

Caravaggio

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

O estado da Nação


Realizou-se há poucos dias o chamado «debate sobre o estado da Nação» na Assembleia da República. Se a intenção destes debates é a indicada no título, na realidade o debate foi sobre o estado dos partidos políticos, tendo-se deliberadamente escondido o que interessaria discutir. O partido do governo a debater a real situação do país, de que é largamente responsável, mostrou estar mais interessado em garantir o apoio dos comunistas para a aprovação do próximo Orçamento de Estado, o mesmo é dizer garantir a sua sobrevivência. Como é seu timbre, o PCP respondeu colocando de imediato as suas cartas na mesa. Já o Bloco de Esquerda continua indeciso entre assumir as suas responsabilidades na defunta geringonça com as temidas possíveis consequências a nível eleitoral ou assumir-se definitivamente como oposição clara ao governo socialista e às suas políticas. À direita, bem, à direita a deputada do CDS Cecília Meireles foi uma excepção evidenciando mais uma vez as suas capacidades parlamentares no meio do deserto de ideias e de intervenção efectiva das bancadas à direita da do PS, não se percebendo se tal se deve a preguiça ou a um sonho de que o poder lhes caia nas mãos aos trambolhões. O PSD primou praticamente pela inexistência e, quando tentou levantar a cabeça, melhor fora que não o tivesse feito.

E se o estado da Nação precisa de ser dissecado e discutido! O problema maior é mesmo por onde começar, já que há vinte anos que o país praticamente não cresce, a não ser na dívida. Apesar dos milhões recebidos da União Europeia, Portugal continua na sua rota descendente do ranking de riqueza dos países da União a 27: em 1995 éramos o 15º, em 2015 já éramos o 17º e em 2020 passámos para 19º. Entre 1995 e 2020, Portugal e a Grécia foram, de longe, os países da União que mais se afastaram da convergência em termos de PIB per capita em PPC. Como resultado, o PIB per capita de Portugal relativamente à média da União Europeia passou de 72% em 1995, para 68% em 2010 e 66% em 2019. Realço que durante os últimos 25 anos, recebemos da EU uma média de 9 milhões de euros por dia, todos esses 9.125 dias, essencialmente destinados a fazer-nos convergir com a UE. Relembro igualmente que, nesses 25 anos, o PS governou em 17 anos e o PSD/CDS nos restantes, sendo que em 2002 sob castigo por défice excessivo e em 2012 para aplicar o programa negociado pelo governo socialista com a troika chamada pelo mesmo governo após a desgraça da sua governação. O esforço fiscal suportado pelos portugueses é dos maiores da Europa, razão dos altíssimos preços da energia eléctrica e combustíveis que temos que pagar. A realidade é o que foi e o que é e não outra coisa qualquer, acabando como sempre, por se impor às «narrativas» enganadoras.


As moratórias que andam pelas várias dezenas de milhares de milhões de euros, boa parte delas não serão satisfeitas e, como os bancos não as poderão incluir nas suas folhas de balanço, haverá falências em série ou o Estado as avalizará, com subida vertiginosa da dívida pública que já ultrapassa os 270 mil milhões de euros.

O mágico plano dito da Recuperação e da Resiliência, ainda mal chegou o primeiro cheque, já está com mais de 40% de destino definido. Há dias a Área Metropolitana da Lisboa anunciou que fez a maior encomenda de autocarros de sempre. Por seu lado, a CP anunciou encomenda de idêntica classificação de material circulante. A Infra-Estruturas de Portugal anunciou planos para construir uma «auto-estrada» ferroviária entre Lisboa e Porto. A TAP, como se uma companhia aérea fosse um desígnio nacional, que não é, absorve milhões do erário público para o destino que se adivinha: uma companhia aérea pequenina e irrelevante vendida à Lufthansa ou outra semelhante. O PRR destinou 5,5 mil milhões de euros para replicar umas tais «novas oportunidades» socráticas de má memória que entregaram diplomas por todo o país aos milhares sem que se visse resultado na produtividade nacional; mas assim se «acalmam» sindicatos e associações patronais.

Como se vê, nada que já não tivéssemos visto antes. Os portugueses, históricos nefelibatas encartados, imaginarão que com as mesmas políticas levadas a cabo pelas mesmíssimas pessoas se chegará a resultados diferentes dos anteriores. Engano fatal. Se já caminhávamos, tristes e empobrecidos, para o lugar humilhante do pedinte mais pobre da União Europeia, as consequências sociais e económicas da pandemia só vieram apressar essa viagem. Alguns culpam o Euro pelo que nos está a suceder. Mentem, porque sabem perfeitamente que o que mudou foram as circunstâncias decorrentes do Euro, isto é, perda de domínio sobre taxas de câmbio e de juro, bem como da inflação. E os governantes continuaram a agir como se tal mudança radical não tivesse acontecido, com as consequências de défices públicos (mesmo que hábil mas temporariamente escondidos) e dívidas pública e privada crescentemente incomportáveis acompanhadas por produtividade deficiente e inerentes ordenados cada vez mais afastados das médias europeias.

Este, o verdadeiro «estado da Nação» por todos os partidos, cada um pelas suas razões próprias, escondido dos portugueses.

 Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 9 de Agosto de 2021

Imagens recolhidas na internet

 

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

A PONTE DO «JÁ AGORA»

 Uma das primeiras coisas que me ensinaram num grande grupo económico quando lá trabalhei há uns anos, foi que ali não havia »obras do já agora». Durante as obras era proibido ir metendo mais isto ou aquilo, supostamente para melhorar. Exactamente o contrário do que acontece no Estado, Autarquias incluidas.

Vejam só esta notícia recolhida hoje no jornal e a calma olímpica com que um presidente da Câmara justifica um aumento de 50% nos custos.

Assim , nunca iremos lá.



segunda-feira, 2 de agosto de 2021

HEROÍNAS VERDADEIRAS

 


Lembro-me bem do espanto colectivo que aquela menina de 14 anos provocou por todo o mundo através da transmissão directa pelas televisões, entre nós e infelizmente ainda a preto e branco, a partir de Montreal no Canadá aquando dos Jogos Olímpicos de 1976. A ginasta romena Nadia Comăneci atingia a perfeição na sua actuação nas barras assimétricas, sendo a primeira da história dos jogos a obter a nota 10. Não se ficando por aí, a ginasta acabou por conquistar três medalhas de ouro e ainda mais seis notas 10 durante aqueles jogos, tendo estado presente nas seis finais em que tal era possível.

A sua execução dos exercícios, em particular na trave, era demonstrativa de uma forma absolutamente natural de se mover no aparelho que tanto medo provoca aos atletas vulgares, algo que com Nadia pura e simplesmente não acontecia. Essa atitude foi uma constante em toda a sua carreira de ginasta, desde a idade de seis anos em que chamou a atenção pelo seu completo à-vontade sobre os aparelhos. Durante a sua carreira como atleta olímpica, Nadia Comăneci conquistou nove medalhas incluindo cinco de ouro, além de quatro medalhas mundiais e doze europeias. Recordo ainda esses jogos de Montreal quando o nosso grande Carlos Lopes, dando tudo o que tinha, perdeu nos últimos metros a final dos 10.000 metros contra Lasse Viren, para vir a vencer a maratona, oito anos mais tarde, em Los Angeles para orgulho e entusiasmo de todos os portugueses.


Já não tenho uma memória tão vívida da actuação de outra grande ginasta, a soviética Olga Korbut, nos Jogos Olímpicos de Munique em 1972, talvez porque esses jogos ficaram impressivamente marcados pelo massacre levado a cabo por terroristas palestinianos sobre atletas israelitas. Mas nesses jogos e apenas com 17 anos, um pouco mais de 1,5m e 40 kg de peso, Olga Korbut deu nas vistas pelas suas extraordinárias actuações acrobáticas, recebendo três medalhas de ouro e a prata nas barras assimétricas. Há mesmo dois movimentos na ginástica acrobática inventados por Olga Korbut e que por isso levam o seu nome, um nas barras assimétricas e outro na trave. Também Korbut manifestava uma total naturalidade em cima dos aparelhos enquanto executava movimentos de extraordinária dificuldade e enorme perigo, tanto maior quanto mais espectaculares e motivadores de entusiasmo do público. Nesses jogos de Munique, um extraordinário atleta português, Fernando Mamede, mostrava quanto a condição mental pode afectar as prestações físicas, não sendo capaz de ultrapassar o stress que sempre acompanha a competição desportiva a alto nível, não o deixando obter as suas marcas habituais de treinos. Como prova da sua real categoria, ficou o recorde mundial dos 10.000 m obtido em Estocolmo em 1984.


Em Julho de 2021 realizaram-se finalmente em Tóquio os Jogos Olímpicos que deveriam ter tido lugar no ano anterior, adiados por causa da pandemia COVID-19. E, na equipa norte-americana de ginástica artística está incluída Simone Biles, já consagrada como a melhor ginasta de sempre. Biles, de 24 anos de idade, 1,42m e menos de 50 kg de peso é a atleta mais medalhada de sempre na modalidade, em campeonatos mundiais e jogos olímpicos, num total de 25 medalhas, sendo 19 delas de ouro. Nos jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016, os únicos em que tinha anteriormente participado, subiu 5 vezes ao pódio, para receber 4 medalhas de ouro e uma de bronze. Foi a primeira ginasta a ganhar três Campeonatos Mundiais consecutivos no individual e é a única a ter o seu nome em quatro movimentos tendo sido, há poucos meses, a primeira mulher a conseguir fazer um salto (Yurchenko Double Picke) no cavalo, algo que até então apenas alguns homens conseguiram executar. A sua capacidade física extraordinária permite-lhe executar movimentos quase impossíveis de imaginar, com uma elegância, uma destreza e um domínio do corpo unanimemente considerados pelos especialistas como a perfeição.

E no entanto…em Tóquio Simone Biles sentiu, logo nas primeiras actuações ainda nas eliminatórias, que “quando estava no ar, não sabia onde estava”. E desistiu da competição. De facto, aqueles exercícios realizados a uma velocidade vertiginosa exigem, não só um completo e perfeito controlo muscular, mas também uma atitude desprendida perante a sua concretização. E terá sido este aspecto que falhou a Simone Biles. Já muito se disse e escreveu pelos mais diversos especialistas para tentar explicar o sucedido, falando-se mesmo em saúde mental. Penso que a realidade é muito mais simples. Aquelas grandes ginastas Olga Korbut e Nadia Comăneci tinham 14 anos aquando dos seus maiores sucessos na ginástica. Tal como em outros desportos que necessitam de controlo físico e mental extremos, há um limite de idade (pessoal) a partir do qual o cérebro tem que tratar de muito mais informação do que quando se é praticamente criança. E, seja qual for o motivo da desistência de Simone Biles, não se trata de um fracasso, uma vez que ela já não tem nada a provar. E sim, é uma verdadeira heroína. Não só pelos sucessos, mas também por como lidou com as suas falhas.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 2 de Agosto de 2021

Imagens recolhidas na internet

Jonas Kaufmann - Turandot, Atto III: "Nessun Dorma"

segunda-feira, 26 de julho de 2021

A MANGA

 


À partida o título desta crónica poderá, na sua simplicidade, nada significar para os leitores do Diário de Coimbra. Contudo, tanto por mim próprio como por muitos outros clientes, é assim que carinhosamente é designado um restaurante de Coimbra cujo nome completo é “Jardim da Manga”.

Como são as pessoas que fazem as instituições, não é possível a um cliente já com alguma antiguidade falar da “Manga” sem referir quem faz o restaurante. Dirigido desde os anos 70 pelo Sr. Xico de saudosa memória que nos deixou há poucos anos, está hoje sob a responsabilidade dos filhos Pedro e Francisco que, com o resto do pessoal de que saliento a excelente cozinheira Sra. D. Judite e o Sr. Miguel na recepção personalizada, sabedora e inexcedível de simpatia aos clientes, souberam dar continuidade a esta casa marcante da gastronomia conimbricense. A ementa que varia todos os dias responde aos mais diversos gostos, mas pessoalmente não posso deixar de salientar o cozido à portuguesa, o cabrito assado, os crepes de bacalhau e a tarte de laranja. Tudo o que descrevi acima, e muito mais, permitiu a criação de um ambiente quase familiar que proporcionou, ao longo dos anos, a criação e manutenção de diversas mesas quase constantes, de diversos grupos profissionais, associativos, familiares e mesmo institucionais que frequentam a “Manga” como se de a sua cantina se tratasse. Por isso mesmo, a “Manga” não é um segredo bem guardado de Coimbra, mas um restaurante bem conhecido mesmo fora de portas.

Mas a “Manga” tem ainda algo de distintivo. A vista privilegiada de que se usufrui, quer no interior, quer na esplanada, é a de uma obra de arte que é classificada como Monumento Nacional desde 1934 e que dá o nome ao restaurante. De facto o restaurante está localizado por trás do interessante e belíssimo conjunto arquitectónico que actualmente tem a designação de “JARDIM DA MANGA”. Para descrever esta obra, socorro-me de um reconhecido especialista da História e da Arte Conimbricense, o meu estimado Amigo Doutor Pedro Dias que, na sua obra «Coimbra, Arte e História» propõe um Roteiro de Coimbra que inclui precisamente o “Jardim da Manga”. 


É assim que ficamos a saber que se trata de uma construção renascentista datada de 1533, construída portanto durante o reinado de D. João III, da autoria de João de Ruão que traçou o plano e executou os baixos-relevos para o interior das quatro capelas, tendo a obra de pedraria ficado a cargo de Pero de Évora, Diogo Fernandes e Fernando Luís. A sua construção foi promovida pelo Prior do Mosteiro de Santa Cruz, Frei Brás de Braga e localizou-se num dos três claustros do Mosteiro. Ainda de acordo com o Prof. Pedro Dias, trata-se de “uma das primeiras obras arquitectónicas inteiramente renascentistas feitas em Portugal e alia-se a este facto o seu valor simbólico, e a sua estrutura evocativa da Fonte da Vida, a que não terá sido estranha a intervenção de Frei Brás de Braga”.

Ainda de acordo com os professores Pedro Dias e Nelson Correia Borges, citados a partir do livro «Património Edificado com Interesse Cultural – Concelho de Coimbra editado pela Câmara Municipal, “o complexo do jardim é formado por um conjunto de construções circulares, interligadas entre si e rodeadas por pequenos tanques, tendo no centro um templete de planta circular, com um tanque ao centro…Este conjunto representa a Fonte da Vida, com o templete central a representar a Eternidade, ao qual dão acesso escadas com sete degraus, que simbolizam a Caridade, a Graça e o Espírito Santo, enquanto que os oito tanques unidos em pares simbolizam os quatro rios do paraíso e os jardins o próprio paraíso”.


Trata-se de uma obra arquitectónica que mais parece uma escultura, que permite uma visita informal dada a sua abertura que permanente, servindo ainda de cenário a belas fotografias, o que aliás acontece diariamente. Os pormenores de alvenaria são pequenas maravilhas, destacando por exemplo as gárgulas ou as oito colunas coríntias do templete central que sustentam uma abóbada esférica.

A designação antiga do conjunto seria «Fonte da Manga», mas a partir de certa altura generalizou-se a tradição de que o próprio rei D. João III o teria desenhado na manga do seu gibão. E assim ficou a ser conhecido como «Jardim da Manga» e é esta a designação que actualmente prevalece. E, como se costuma dizer, se não é verdade, é uma história bem encontrada. O que importa é que, à frente do excelente Restaurante Jardim da Manga, se encontra este Monumento sempre aberto ao público, coisa rara nos dias que correm.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 26 de Julho de 2021 

Fotos retiradas da internet