1. Já deixou de ser uma surpresa, por mais desagradável e mesmo assustadora que a situação seja para os portugueses em geral. Há anos que determinadas épocas do ano vêm acompanhadas com tais dificuldades no acesso a urgências hospitalares que cerca de quatro milhões de cidadãos se assustaram e subscreveram seguros de saúde.
No Verão passado aconteceu com as urgências das maternidades. O desnorte foi completo, com grávidas a serem transportadas centenas de quilómetros entre diferentes maternidades até encontrarem uma com vaga para realizar o parto. Muitas crianças nasceram mesmo nos mais diversos tipos de ambulâncias. Isto enquanto se soube que há actualmente um “turismo” de parturientes com origem nos mais diversos países continentes que vêm até ao nosso país ter os seus bebés em segurança e de uma forma muito mais económica. Económica para elas, claro, já que são os nossos impostos que pagam tudo. Como no resto do SNS o serviço prestado, quando o é, reveste-se normalmente de excelente qualidade. O problema é o acesso às urgências, entupidas por uma falta de organização sistémica gritante, com custos elevadíssimos, quer para o Estado em termos financeiros, quer para os doentes em termos de ansiedade. E não só, como se viu há poucos dias nos CHUC na nossa cidade, em que um doente morreu sentado na cadeira à espera de socorro tendo o serviço passado adiante quando ele não respondeu à chamada em vez de ir ver o que se passava. Para não falar do próprio INEM.
É urgente reformular tudo isto, mas é urgente há anos. Quanto ao Governo, é de lhe lembrar o que Sá Carneiro disse aos seus novos ministros: V. Exªs têm seis meses para se queixar da situação que receberam dos anteriores governos. Depois desse prazo, não há desculpas”.
2. 2. Soube-se agora que os autos do processo Marquês deixaram de ser urgentes, apesar de se saber que vários dos crimes dele constantes estão em risco de prescrição.
Relembro que a prisão de José Sócrates ocorreu há precisamente dez anos, em Novembro de 2014, estando em causa “crimes de fraude fiscal, branqueamento de capitais e corrupção” num processo cuja investigação tinha começado anos antes. José Sócrates esteve detido em Évora durante 288 dias e ainda 42 dias em casa. A acusação do Ministério Público ocorreu em Outubro de 2017, num total de 28 crimes, para além de corrupção. Em Abril de 2021 ficou conhecida a decisão da instrução do processo, a cargo do Juiz Ivo Rosa que, de forma pública inédita, praticamente destruiu a acusação do MP. Destruiu a acusação e praticamente todo o processo, levando na enxurrada a dignidade do sistema judicial português. Como prémio, foi promovido para a Relação de Lisboa. A mesma Relação que, em Janeiro de 2024, por sua vez destruiu o despacho de Ivo Rosa, recuperando a quase totalidade da antiga acusação do MP.
Na realidade, a classificação do processo Marquês como não urgente só veio dar-lhe a categoria que os portugueses já há muito lhe tinham atribuído. Além de outros, que me abstenho aqui de dizer, quando se sabe que ainda nem há data para o julgamento.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 25 Novembro 2024