domingo, 26 de dezembro de 2010

CARLOS ENCARNAÇÃO E COIMBRA

A saída do Dr. Carlos Encarnação de Presidente da Câmara Municipal de Coimbra está a proporcionar momentos de vendetta política de quem nunca foi capaz de o defrontar politicamente com sucesso e a mostrar imensa falta de carácter de muita gente. Pessoas para quem na vida só interessa o “rei morto, rei posto”.

Entendamo-nos. A discordância sobre atitudes que possam provocar situações de orfandade política é uma coisa. Outra coisa, completamente diferente é promover ataques políticos e pessoais sem fundamento e desfazer injustamente numa obra sólida de nove anos. Nem o Dr. Carlos Encarnação o merece, nem Coimbra tão pouco.

A memória é muitas vezes curta e outras vezes selectiva. Recordo que em 2000 o Concelho de Coimbra era, em todo o Distrito, aquele que passava pela vergonha de ser o que tinha menor superfície de piscina para prática de natação por habitante. E as poucas piscinas que existiam na altura não tinham quaisquer condições de segurança. Será preciso enunciar os excelentes equipamentos de que Coimbra dispõe hoje nessa área e que começam já a dar os seus frutos na preparação de atletas? A existência e utilização do pavilhão multidesportos passa assim tão despercebida que ninguém dê por ele? O facto de o edifício do Estádio Cidade de Coimbra ser o único municipal do Euro 2004 com utilização total não diz nada a ninguém? Nem o facto de tal situação não se traduzir em quaisquer custos para os cofres municipais? Os edifícios de novas sedes de Juntas de Freguesia são transparentes? E as creches construídas e as escolas básicas recuperadas? Também não se vêem? Ninguém passa na circular externa? A obra do Convento de S. Francisco não está finalmente a decorrer, depois de anos de impedimento pela Administração Central? O Coimbra i Parque não tem a sua primeira fase construída? Não se esqueça também o trabalho que não se vê nas infra-estruturas, por estarem enterradas; Coimbra tem hoje uma cobertura de abastecimento de água de praticamente 100% e uma das mais altas taxas de saneamento básico do País: será isso por acaso? A Alta de Coimbra começa a ser outra com elevado número de edifícios habitacionais recuperados e uma Casa da Escrita exemplar. Recordo ainda a Orquestra Clássica do Centro que na sua área proporciona cultura a um nível profissional como nunca antes foi possível em Coimbra, fazendo-o não só em Coimbra, mas em toda a Zona Centro.

Agora quanto ao motivo principal e imediato apontado pelo Dr. Encarnação para se sentir farto: o processo do Metro Mondego. Não deverá haver nenhum conimbricense que, ainda que no íntimo, não lhe dê inteira razão. O Dr. Carlos Encarnação lutou pelo Metro Mondego como ninguém. Forçou a realização das demolições na Baixa para criar condições para que a sua travessia seja possível, sendo esta passagem na Baixa crucial para melhorar as acessibilidades de quem queira aqui viver e trabalhar no comércio de forma sustentável, possibilitando enfim a sua reabilitação. Recordo algo que muita gente hoje faz por esquecer ou omitir neste processo lamentável. Em 2005 houve um concurso internacional para concepção, construção e exploração do Metro Mondego na sequência do qual, caso tivesse avançado, já teríamos hoje metro em Coimbra, em Miranda do Corvo e na Lousã. Só não avançou porque o Autarca da Lousã se recusou a assiná-lo, por prever a possibilidade de transporte em autocarros no curto troço entre a Lousã e Serpins, cuja exploração ferroviária é completamente insustentável. Face ao que se passa hoje, é quase uma piada de mau gosto.

Por tudo isto e muito mais que aqui não cabe, como a ligação estratégica entre o Município e a Universidade que finalmente deixaram de estar de costas voltadas, apetece-me dizer: poupem-nos, por favor, façam política, mas respeitem as pessoas e saibam separar as situações.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 27 de Dezembro de 2010

domingo, 19 de dezembro de 2010

VIDA NA INTERNET

A influência crescente da internet na nossa vida é cada vez mais evidente, e já não se resume à entrada de novas palavras no nosso léxico diário. A vida diária de milhões de pessoas em todo o mundo mudou, e o Facebook e Wikileaks estão aí para o provar. Nomes como os de Mark Zuckerberg e Julian Assange são hoje parte do quotidiano.

O Facebook é a rede social mais bem sucedida, utilizada praticamente todos os dias por mais de 500 milhões de pessoas de todo o mundo. Mark Zuckerberg foi esta semana considerado a personalidade do ano pela revista TIME. Vale a pena referir que se trata de um jovem nascido em 1984 (o leitor leu bem, tem 26 anos de idade), que alterou hábitos de centenas de milhões de pessoas e com isso conseguiu uma fo

rtuna colossal que cresce todos os dias. Reza a história que a invenção se deveu ao seu carácter reservado que o impedia de conhecer raparigas pelo método tradicional, isto é, pela conversa pessoal, enquanto estudante da Universidade de Harvard. Imaginou e montou uma pequena rede de contactos e partilha de conversas pela internet a partir do seu quarto de estudante, que em sete anos se tornou na rede social mais utilizada do mundo, à qual adaptou um modelo de negócio muito lucrativo. O Facebook cresce a uma média de 700.000 novos aderentes por dia. Como diz a TIME, se fosse um país, seria já o terceiro maior do planeta, atrás apenas da China e da Índia, com uma diversidade linguística assinalável: 75 línguas. Aquilo que ainda há pouco não existia, o Facebook, é hoje uma ferramenta poderosa de marketing e de ligações pessoais sem a qual milhões de pessoas provavelmente já não saberiam como viver.

Muita gente considera que a personalidade do ano deveria ter sido Julian Assange, o inventor e mentor do site Wikileaks. Este site é basicamente um portal de denúncias, dedicando-se a recolher informações de carácter reservado ou secreto, disponibilizando-os posteriormente a todo o mundo, após se certificar da sua autenticidade. Depois de ter obtido acesso a centenas de milhares de telegramas trocados entre diplomatas norte-americanos, tem procedido à sua divulgação pública, quer através da internet, quer através de vários jornais de grande divulgação. Com isso, conseguiu embaraçar gravemente a diplomacia e o governo norte americanos, bem como os próprios países a quem esses telegramas se referem, não tendo Portugal escapado incólume.

Discute-se muito sobre o efectivo interesse público do conhecimento deste tipo de informações, sobre a legitimidade da sua divulgação, e sobre o sectarismo da atitude, já que só se debruça sobre a política norte-americana. Mas uma coisa é certa. A simples existência da internet possibilita tudo isto e muito mais, pondo em causa o secretismo da diplomacia tradicional e obrigando a uma completa revisão dos seus procedimentos. Não podemos ser ingénuos ao ponto de pensarmos que o Wikileaks será sempre um filho único deste tipo de activismo cibernético.

O carácter de Julian Assange não o recomendará como amigo de ninguém, e ainda bem que não foi escolhido como personalidade do ano. Mas o que é certo é que ele não é mais que um mensageiro, não tendo nenhum dos telegramas que o Wikileaks divulgou sido desmentido como falso. Assange abriu uma porta pela qual podemos estar seguros que irão passar muitos outros no futuro.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Dezembro de 2010

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

NEO-LIBERALISMO

Para quem ainda não percebeu bem o que é o neo-liberalismo, aqui vai a chave de decifração:
-onde se ler neo-liberalismo, ler capitalismo
-onde se ler neo-liberal, ler defensor do capitalismo.
É fácil: na realidade trata-se apenas de uma adaptação de linguagem dos marxistas e c.ia ao século XXI, já que o velho dicionário do marxismo do século XX ficou subitamente desacreditado após a queda "das paredes de vidro" do bloco soviético adequadamente chamado socialista.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Oscar Wilde

As boas intenções têm sido a ruína do mundo. As únicas pessoas que realizaram qualquer coisa foram as que não tiveram intenção alguma

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A MALDIÇÃO DA ORFANDADE POLÍTICA


Passaram há poucos dias 30 anos sobre a morte de Sá Carneiro. Muita gente falou sobre a sua obra, houve algumas cerimónias, publicaram-se livros e até se fala num novo processo de inquérito ao desastre de Camarate. Já tanto foi dito sobre a sua personalidade e vida, que não me vou debruçar sobre isso. O seu súbito desaparecimento teve no entanto uma consequência que é poucas vezes referida e que teve grandes implicações na vida nacional. Foi a primeira de uma série de orfandades do PSD (tantas, que mais parecem uma maldição ou uma autêntica síndrome).

De facto, após o 4 de Dezembro de 1980, o Governo da AD continuou em funções, com Pinto Balsemão à frente, por escolha interna do PSD. Independentemente das muitas qualidades de Balsemão, o Governo entrou quase imediatamente em desagregação e pouco mais tempo durou. No interior do PSD, e mesmo no Governo, outras individualidades acharam-se com mais qualidades e capacidades do que o Primeiro-Ministro e fizeram-lhe a vida negra, entregando rapidamente o poder ao PS. Começou aqui a série de orfandades do PSD.

Aos dez anos de governação de Cavaco Silva sucedeu-se o seu famoso abandono em 1995, e ao excelente e empenhado Fernando Nogueira coube o ingrato papel de levar a eleições o cavaquismo-sem-Cavaco, com os resultados que conhecemos. O PSD estava obviamente órfão de novo, com a agravante de estar órfão de alguém vivo e activo na sociedade, mas fora do PSD.

Ao pântano de Guterres, seguiu-se Durão Barroso que logo abandonou o Governo de Portugal para ir presidir à Comissão Europeia O PSD de então ficou outra vez órfão, decidindo entregar o lugar de Primeiro-Ministro a Santana Lopes, de forma orgânica e sem sanção eleitoral. Santana Lopes fez o que pôde naquelas condições. Rapidamente se percebeu que numa situação de aflição económica como a que se vivia, faltava àquele Governo a força que vem da legitimidade democrática das eleições para poder fazer as reformas que se impunham e logo o poder foi de novo para o PS. Até hoje, como bem se sabe. Desde aí, o partido continuou órfão, procurando sistemática e sucessivamente uma liderança que o libertasse dessa condição.

Parece um destino ao qual o PSD não consegue fugir: os seus líderes carismáticos saem dos lugares que ocuparam legitimamente por via eleitoral, sendo o poder entregue a quem previamente tinham escolhido para trabalharem com eles. A consequência desta passagem interna do poder foi sempre a mesma: nas eleições seguintes, lá volta o PS. De facto, o eleitorado tem uma intuição que escapa muitas vezes à teoria política. As eleições constituem cada vez mais uma escolha do líder e não das equipas, embora formalmente isso devesse ser assim apenas para o cargo uninominal de Presidente da República. Quando a transição de líderes não provoca eleições antecipadas, isto é, não devolve a voz ao eleitorado, os sucessores designados tendem a ter o seu destino marcado num futuro bem próximo, pese embora a sua grande qualidade política e capacidade de trabalho.

Resta o triste consolo de ver que o PSD não está sozinho neste hábito. Veja-se o que sucedeu a Gordon Brown após ter substituído Tony Blair à frente do Governo britânico: tendo aceitado o poder político sem eleições, Gordon Brown liderou os Trabalhistas para a derrota eleitoral.

A História ensina-nos muitas coisas. Aqui aprende-se que as orfandades que resultam de decisões unipessoais não dão bom resultado, e aprende-se ainda que o povo não perdoa aos que aceitam ficar “por nomeação”.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 13 de Dezembro de 2010

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

PROT-C, (mas pouco)


Por esta ou aquela razão, diversas autarquias da chamada NUT III (Baixo Mondego), acabam de dar pareceres negativos à proposta de PROT-C (Plano Regional de Ordenamento do Território da Região Centro). De acordo com a legislação que regula a política de ordenamento do território e de urbanismo, o PROT faz parte dos planos de ordenamento do território e pretende “definir a estratégia regional de desenvolvimento territorial, integrando as opções estabelecidas a nível nacional e considerando as estratégias municipais de desenvolvimento local”, situando-se entre o nível nacional (PNPOT) e os planos de âmbito municipal (PMOT).

Coimbra está precisamente entre as Autarquias que manifestaram discordância em relação àquele documento e por boas razões. Esta tomada de posição da Câmara Municipal de Coimbra foi unânime, pelo que todas forças políticas representativas dos munícipes de Coimbra estão de acordo neste ponto, o que é de saudar.

A meu ver há dois planos de leitura da proposta do PROT-C. Um, sob o ponto de vista da própria Região. O outro, tendo em atenção especial a protecção dos interesses de Coimbra. Não tenho qualquer prurido em assumir esta defesa, já que se nós conimbricenses não defendermos Coimbra, quem o fará? Até porque estou firmemente convicto de que a Região Centro só terá a ganhar com Coimbra forte, perdendo também se Coimbra for desconsiderada no planeamento central.

No que respeita à Região, o parecer dos municípios da região Centro é revelador: Por um lado, assinala que a proposta “não traduz os grandes objectivos de desenvolvimento económico e social sustentável, não equaciona medidas tendentes à atenuação das assimetrias intra-regionais”. Por outro lado, refere que “é excessivamente teórico, centralista, revela desconhecimento prático da realidade e não apresenta qualquer estratégia regional de desenvolvimento territorial”. Relativamente ao documento apresentado, estamos esclarecidos sobre a opinião dos eleitos locais da Região Centro

No que toca a Coimbra, não posso deixar de notar mais uma vez que a ideia base de toda a proposta se baseia na defesa do modelo policêntrico para a Região. Isto é, Coimbra aparece a par com todas as outras cidades da Região, sejam Aveiro, Leiria, Castelo Branco, Guarda ou Viseu. E parte-se disto para propor uma distribuição dos serviços públicos e serviços avançados às empresas.

Nesta proposta desenvolve-se toda uma teoria segundo a qual a tenaz constituída pelas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto só pode ser contrariada pelo conjunto das cidades da região Centro, sem prevalência de nenhuma delas, isto é, de Coimbra capital histórica da Região. Até parece que este documento foi preparado em Lisboa ou no Porto e não em Coimbra, de tal forma segue a divisa de dividir para reinar!

Como conimbricense não sofro de nenhum complexo perante as cidades da Região. Devo dizer que gosto de todas elas e em todas encontro bons motivos para se lá viver. O que não suporto é que, com teorias que não estão de forma nenhuma demonstradas, se desfaça permanentemente Coimbra e se contribua para diminuir a sua importância nacional, o que tem aliás claros reflexos negativos para toda a Região, ao contrário do que se diz nesta proposta de PROT-C.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 6 de Dezembro de 2010

domingo, 28 de novembro de 2010

25 DE NOVEMBRO, ONTEM E HOJE

Sem qualquer tipo de comemoração passaram há poucos dias 35 anos sobre o 25 de Novembro (de 1975). Os mais jovens nem deverão saber o que se passou nessa data em que finalmente Portugal foi colocado na via da Democracia. A mitologia instalada por uma determinada esquerda pretende que nessa data a contra-revolução acabou com o 25 de Abril. Na realidade, a clique revolucionária que, com Álvaro Cunhal à cabeça, tentou nessa data realizar o “Outubro de 1917” em Portugal, perdeu definitivamente o caminho da História criando-se as condições para que, perdido enfim o sonho do Império e também dos amanhãs que cantam, Portugal se virasse para a Europa de onde partira cinco séculos antes.

Sabemo-lo hoje claramente, porque algumas das pessoas que na altura participaram nessa aventura como Zita Seabra, contam sem dramas o que se passou realmente no 25 de Novembro, com identificação de pessoas, locais e datas.

Estamos hoje de novo em dificuldades económicas graves. Temos muita facilidade em esquecer as dificuldades do passado, tendendo em salientar apenas os aspectos bons que existiam. No entanto, Portugal é hoje um país completamente diferente do que era em 1975, para melhor em quase todos os aspectos, particularmente no que respeita às condições de vida da população em geral. E, se isso é assim, é porque houve muitos homens e mulheres que nessa altura tiveram coragem e força para assumir atitudes que não eram nada fáceis.

Muito devemos de facto a quem em 25 de Novembro de 75 fez frente à loucura revolucionária da esquerda radical. Recordo entre outros Ramalho Eanes, o grupo dos Nove com Melo Antunes, Costa Gomes que retirou o tapete ao PCP e Jaime Neves que no terreno com os seus homens do regimento de Comandos da Amadora valentemente cortou o pé aos militares revoltosos, particularmente da polícia militar. Assim como Sá Carneiro e Mário Soares que nessa altura compreenderam bem o que estava em causa. Foram Homens que numa altura de conflitualidade extrema souberam agarrar a causa suprema da Liberdade sem adjectivos, acalmando o país e devolvendo ao povo a soberania que lhe ia escapando entre os dedos.

Ramalho Eanes disse em entrevista há poucos dias: "acreditava-se, talvez um pouco utopicamente, que a democracia (...) iria permitir que o país avançasse, evoluísse, se modernizasse, se tornasse mais justo e mais solidário. Pensava-se que tudo isso decorreria normalmente da democracia. Infelizmente não aconteceu".

Isto é, os homens que em 75 foram capazes de perceber os perigos da chamada “revolução socialista” e de a impedir, não tinham a percepção de que a Democracia não se esgota nos votos. Muitas pessoas ainda hoje não percebem que um determinado nível de conflitualidade é inerente à democracia. Muitos entre nós têm dificuldade em perceber que em democracia os políticos que nos governam são eleitos e que os não eleitos podem ter toda a razão do mundo, e muitas vezes têm, mas isso é irrelevante porque não têm oportunidade de exercer o poder e aplicar as suas ideias. E percebe-se também que muitos têm dificuldade em aceitar que as políticas praticadas devem ter em conta a vontade dos eleitores manifestada pelo voto. E que no fim do mandato haverá novas eleições. Claro está que isto não significa que os políticos possam mentir nas campanhas, até porque não se pode enganar toda a gente durante todo o tempo. Mas apenas que a Democracia é um delicado jogo de balanço entre o que se deve fazer e o que se aceita como sendo a vontade soberana do povo em cada momento. E que o sistema democrático deve ter filtros e contra-balanços que permitam escolher os melhores e que estes não se estraguem e não estraguem o bem comum.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 29 de Novembro de 2010

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Retrato de um país

Algumas afirmações retiradas da revista Visão de hoje:

Defensor de Moura: O candidato presidencial e deputado do PS diz que Governo, oposição e Cavaco são os culpados da crise.

João Proença (Líder da UGT e militante do PS): É preciso uma mexida na equipa governamental.

Torres Couto (Líder da UGT em 1988 e militante do PS): PS e PSD têm andado a brincar com o povo.

Que mal fizeram os portugueses para terem que aturar isto?

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

SOFTWARE ou HARDWARE? (de novo)


O leitor sabe o que é o “centro de Portugal”? Talvez tenha uma ideia, mas na realidade não sabe, porque isso não existe. Mas sabe com certeza o que é Coimbra. Nesse conhecimento está aliás acompanhado por quase todo o mundo. No mundo globalizado em que as marcas dominam a vida económica, desperdiçar uma marca com o valor de Coimbra é, não só disparatado, mas um crime económico.

Dir-me-ão que esta é uma verdade lapalissiana que nada tem de novo e será verdade. Mas, pelos vistos, é necessário recordá-la permanentemente. Coimbra continua inundada de belos cartazes do Turismo de Portugal numa campanha com o lema “Descubra Portugal – um país que vale por mil”. Descontando a frase pateta, que é apenas publicidade sem sentido (vale por mil quê? mil países? mil euros? mil publicitários?) as três fotografias de Lisboa, Porto e Coimbra são de facto muito bonitas. Claro que sobre a foto de Lisboa está escrito “Lisboa e Vale do Tejo”, sobre a foto do Porto aparece escrito “Porto e Norte”. Já sobre a foto da nossa Cidade aparece “Centro de Portugal”. A palavra Coimbra parece ser proibida no “Turismo de Portugal”. Talvez por isso a capital do “Turismo da região Centro” tenha ido para Aveiro. Mas para a foto representativa, Coimbra já serve. É preciso ter lata para colocar estes cartazes em Coimbra!

Coimbra não precisa de se por em bicos de pés para se afirmar turisticamente. Apenas precisamos de aproveitar o que temos. Já em tempos referi aqui o valor turístico e económico da História de Coimbra, fundamentalmente no período em que se confunde em absoluto com a de Portugal que é a Primeira Dinastia.

Recorda-se o essencial. O nosso primeiro Rei poderá ou não ter nascido em Coimbra, mas foi aqui que estabeleceu a primeira Capital do Reino e é aqui que está sepultado. O seu filho Rei D. Sancho I cá nasceu e está sepultado como o Pai, na Igreja de Sta. Cruz. Cá nasceram os reis seguintes, D. Afonso II, D. Sancho II e D. Afonso III.

A nossa Rainha Santa (Isabel de Aragão) é uma figura de tal densidade e tão conhecida que dispensa mais comentários, estando sepultada em Coimbra. O seu marido, o Rei D. Dinis, fundou a primeira Universidade portuguesa em Coimbra através da “Magna Carta Priveligiorum”.

Aqui decorreram os amores de Pedro e Inês; na Quinta das Lágrimas está a “fonte dos Amores” e cá se passaram os actos trágicos da morte de Inês e subsequentes.

Foi nas “Cortes de Coimbra” de Abril de 1385 que o Mestre de Aviz foi proclamado Rei, encerrando-se a Primeira Dinastia, resolvendo-se a crise política de 1383/85 e dando-se início à Segunda Dinastia que projectou Portugal no mundo como ninguém na altura poderia supor.

Em Coimbra está a Sé Velha construída durante o reinado de D. Afonso Henriques, onde está sepultado D. Sesnando Conde de Coimbra e em Coimbra está também o Mosteiro de Sta. Cruz fundado pelo primeiro Rei e que é Panteão Nacional por lá estar o seu túmulo.

Em Coimbra estão o Mosteiro de Sta. Clara-a-Nova onde se encontra o túmulo da Rainha Santa, o Mosteiro de Sta. Clara-a-Velha que foi alvo de uma recuperação extraordinária e a Quinta das Lágrimas local do drama dos amores de Pedro e Inês. Em Coimbra está também a primeira universidade portuguesa ocupando aquele que foi o Paço de El-Rei onde decorreram as Cortes de Coimbra.

Em Coimbra existe o Convento de Celas fundado por D. Sancha, filha do segundo Rei de Portugal.

Com tudo isto, basta juntar as peças e organizar um programa turístico de carácter histórico-cultural sobre a Primeira Dinastia associado a Coimbra, para ter um produto concreto de altíssimo valor económico. Com ou sem Turismo do Centro. Nem é preciso construir nada. Software e não hardware, de novo.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 22 de Novembro de 2010

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

SOFTWARE ou HARDWARE?


A minha crónica da semana passada terminava com esta frase:

Daqui para a frente, precisamos é de organização, convergência de esforços e ideias claras: software e já não hardware.

O que tinha em pensamento, na sequência da ideia que tinha desenvolvido no resto do texto, era que se chegou a um ponto em que se deve deixar a quantidade e pensar mais na qualidade. Se isto é importante para uma Cidade, é verdadeiramente crucial para o país, sobretudo na situação especial em que nos encontramos.

Já todos perceberam que acabou o tempo em que se julgava possível basear o desenvolvimento do país em obras públicas e mais obras públicas, à custa do endividamento das gerações futuras. A saída para os nossos problemas, já o aqui escrevi mais que uma vez, é a produção de bens transaccionáveis, que se vendam no estrangeiro. Para se ver isto não é necessário ser economista, basta olhar para os grandes números.

O desvio dos rendimentos produzidos pelas empresas para o Estado, que por sua vez o gasta cada vez mais apenas para existir e para pagar juros, tem sido a grande causa dos nossos problemas. Chegámos a um ponto em que a taxa da nossa dívida soberana ultrapassou os 7%, muito acima das taxas de trabalho entre os bancos, entre os bancos e o BCE e muito acima das taxas praticadas entre os bancos e as empresas ou pessoas individuais. Depois ainda há para aí quem se queixe dos “mercados”: tendo-se deixado criar estas condições e não se fazendo nada para as contrariar, o que esperar dos especuladores internacionais que sempre existiram e toda a gente sabe que estão lá a aproveitar precisamente estas condições favoráveis para fazer fortunas instantâneas? O resultado é o Estado sugar o dinheiro gerado pelas empresas, para por sua vez ser ele mesmo sugado pelos famosos “mercados”. Verdadeiramente inacreditável! E o país sem capacidade de resposta, porque o sistema político está assim mesmo: como temos em breve eleições presidenciais, só a partir de Maio o povo poderá dizer o que pensa sobre a saída da solução, seja ela qual for. O que é certo é que as opções, mesmo as políticas, têm todas um preço e é esse que se está a pagar neste momento e se irá sempre pagar no futuro, não nos iludamos.

Hoje muitos políticos descobrem com admiração que as nossas exportações estão a aumentar, o que ajuda à recuperação económica. São os empresários a fazer o que lhes compete e sabem fazer, assim os deixem. E é este o caminho! Nunca percebi o dirigismo da nossa classe política que tudo quer orientar e definir. Os fundos europeus que deviam apoiar as empresas nos seus esforços de modernização e internacionalização são canalizados para “formações” cujo resultado pouco mais é que melhorar estatísticas internacionais na área da educação (assim, com minúscula, de propósito).

Nunca nenhum governo foi capaz de fazer como se faz aqui ao lado em Espanha, por exemplo, onde quem gere esses dinheiros são as próprias associações patronais que não vão em fantasias de “desígnios nacionais” que a primeira brisa leva para longe. Se os deixarem, os nossos empresários vão alargar o leque do destino dos seus produtos e deixar de vender quase tudo na União Europeia, ampliando de forma gigantesca os nossos mercados. Apetece dizer: deixem trabalhar os empresários!

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 15 de Novembro de 2010

domingo, 14 de novembro de 2010

Vasco Pulido Valente, hoje no Público. Sem comentários.

«Luís Amado, ministro dos Negócios Estrangeiros, pede na primeira página do Expresso um governo de coligação. Na terceira página, o director do Expresso, Henrique Monteiro, declara "este governo", o que formalmente existe, "quase um cadáver" e discute com a maior solenidade a formação do seguinte. Na pagina 13, o Expresso também informa que António Costa, o n.º 2 do PS, desistiu de suceder a Sócrates (já vamos nisso?), a favor de Francisco Assis, que por sua vez terá (ou não terá) de concorrer com António José Seguro, o putativo representante da esquerda socialista. Entretanto, vozes soltas, como a de Ana Gomes (que muita gente julgava desaparecida), pedem a demissão imediata do ministro das Finanças, de que ninguém gosta, ou uma remodelação mais drástica, para o PS "ganhar fôlego". No meio desta balbúrdia, consta que certas "figuras" proeminentes do partido (entre as quais vários "soaristas") preferem um Congresso imediato para substituir Sócrates, como ele merece, e fabricar um "governo patriótico", presidido por António Vitorino (a título de Nossa Senhora do Socorro) e apoiado no Parlamento pelo PSD, coisa que Passos Coelho com toda a clareza recusa. A preocupação geral dos socialistas parece ser o absoluto descrédito do governo, a sua previsível incapacidade para executar o Orçamento de 2011 e o medo de que as tensões sociais "rebentem" na rua. Há mais quem partilhe estes sentimentos. Paulo Portas no Diário Económico exigiu um "governo de salvação nacional" (fervorosamente "patriótico", como é óbvio) com o PS, o PSD e o CDS. Santana Lopes, que nunca consegue ficar quieto e caladinho, trouxe logo o seu apoio à ideia. E Pacheco Pereira apelou para "o afastamento voluntário de Sócrates", que ele considera "o principal factor subjectivo da crise", e com mais realismo (e menos marxismo) voltou a sugerir o mesmíssimo governo de "salvação nacional" ou um acordo parlamentar ou (em desespero) um simples "pacto de estabilidade", que ele jamais conseguirá definir, excepto presumivelmente com a ajuda do filósofo e eurodeputado Paulo Rangel que propôs (no Porto) um pacto entre os "partidos do arco governativo" até 2020. Não restava a menor dúvida que vivíamos numa casa de loucos. Mas sempre ia persistindo uma vaga esperança de que a loucura não fosse tanta. Agora sabemos que é. E que não tem cura.»

sábado, 13 de novembro de 2010

O ESTADO (SEM) DA VERGONHA

Vasco Pulido Valente escreveu sobre a vergonha que é a PGR pedir denúncias anónimas, coisa que incrivelmente é saudada por muita gente (enquanto não lhes baterem à porta, claro):

«O Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) instalou na Internet um site (de que os jornais se apressaram a dar o "endereço") para denúncias de "casos de corrupção e fraude" e, pior ainda, para os denunciantes seguirem passo a passo o resultado do seu honroso "trabalho" e, se necessário, acrescentarem um ou outro pormenor que faça falta. A dra. Cândida de Almeida, directora do DCIAP, explicou a posição oficial: o Ministério Público quer "interagir" com os facínoras que apontam o próximo à polícia para os tranquilizar sobre a eficácia do seu imprescindível civismo e para, eventualmente, lhes pedir ajuda. Antigamente, havia regimes que usavam "caixinhas" para a carta anónima. Hoje a Internet permite o mesmo anonimato e uma cooperação mais sofisticada. Qualquer cidadão que deteste a prima, a tia ou cunhada, ou que se queira livrar de um concorrente, pode com uma simples "visita" ao site da DCIAP meter a criatura num enorme sarilho, com a paternal protecção da autoridade. O que sucede às vítimas aparentemente não interessa ao Ministério Público. Elas, por assim dizer, que se arranjem. A dra. Cândida de Almeida sabe com certeza que a mais leve suspeita chega para arruinar uma reputação. E que uma reputação arruinada nunca ou quase nunca se recompõe. Mas não parece que esse pequeno facto a perturbe. Como certamente não a comove convidar os portugueses (principalmente, o funcionalismo e os trabalhadores do "sector empresarial do Estado") à baixeza sem nome da denúncia. É preciso que a noção de "serviço público" se tenha degradado a um ponto difícil de imaginar para que se ache natural - e até louvável - recorrer a métodos como o site da DCIAP. A dra. Cândida de Almeida responderá talvez que se limita a lutar contra a corrupção e a fraude, sem perceber que o seu site corrompe o carácter da cidadania e, em última análise, também ele indirectamente promove a fraude. Acabámos por chegar a isto.»

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Troleys

Parece que querem colocar troleys na linha da Lousã. Coisa esperta.

O MAR


Há muitos anos virámos costas à Europa e fomos para o mar. Depois virámos costas ao mar e fomos (?) para a Europa. Já é tempo de deixarmos de ser parvos e usar o melhor dos dois mundos.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

ESTA NOSSA CIDADE



Esta nossa Cidade que é Coimbra está hoje perante escolhas cruciais que definirão qual será o seu futuro nas próximas dezenas de anos. É já um lugar-comum dizer-se que a competição internacional se faz hoje entre cidades e não entre países. E se isso se verifica a nível mundial onde as grandes cidades com Singapura, Xangai, S. Paulo, Londres ou Nova Iorque claramente competem entre si, é particularmente verdade no interior da União Europeia onde as cidades médias lutam hoje pela sua própria competitividade num espaço económico, social, e político comum.

É para este espaço e para este mundo que Coimbra tem que olhar e já não para uma região que hoje a limita. Longe vai o tempo em que políticos de vistas curtas olhavam para a região centro como um região multipolar em que Coimbra surgiria apenas como mais uma entre as cidades da região. Chegou a propor-se uma Região em que a respectiva capital rodaria entre as suas diversas cidades.

A sua localização geográfica é privilegiada e isso não depende da vontade de políticas nacionais, por mais desastradas que sejam. Claro que as ligações rodoviárias ao interior são basicamente as mesmas de há dezenas de anos, afastando cada vez mais Viseu, a Guarda, a Covilhã e Castelo Branco de Coimbra, o que tem consequências económicas claramente negativas para a nossa cidade, já que favorece as ligações daquelas cidades a Lisboa e ao Porto. Mais uma vez a nossa disparatada macrocefalia a funcionar e não é certamente por acaso. A nossa estação de caminho de ferro cuja remodelação ficará eternamente à espera de um mítico e fantasioso TGV entre Lisboa e Porto é uma vergonha nacional e não de Coimbra.

As fraquezas e forças da nossa cidade, todos nós as conhecemos e não vale muito a pena falar delas. Qualquer empresa de consultadoria exterior que elabore um plano estratégico diz o que nós todos sabemos, porque vemos, ouvimos e lemos todos os dias (embora eventualmente uma listagem seriada do que há e do que poderá haver seja certamente útil) .

Também não é a gritar muito alto e com voz grossa por Coimbra, que se consegue algo, a não ser conseguir ser ouvido pelos vizinhos do lado.

Coimbra tem dentro de si todas as potencialidades para se afirmar num contexto internacional. A sua História que se confunde com a História de Portugal durante toda a Primeira Dinastia é motivo mais do que suficiente para criar todo um “cluster” turístico verdadeiramente excepcional. A existência de um serviço de Turismo próprio de Coimbra, seja empresa ou outro qualquer está mais que justificada. E ao ver há poucos dias espalhados pela cidade cartazes do Turismo de Portugal em que aparecia uma foto do Porto com a legenda “região norte, Douro e Porto”, uma foto de Lisboa com a legenda “região vale do Tejo e Lisboa” e ainda uma foto de Coimbra com a legenda “região Centro” sem a palavra Coimbra, fiquei ainda mais convencido da justeza dessa opção. Só estranhei que ninguém por cá tivesse dado por isso, mas os habituais berradores por Coimbra deviam andar distraídos.

As novas actividades económicas sofisticadas de Coimbra, quase todas saídas da excelente incubadora do Pedro Nunes colocam-nos já no mundo global e não na região. Neste contexto, o Centro de Congressos do Convento de S. Francisco finalmente em obra, é uma das últimas infra-estruturas de que Coimbra precisava para ser competitiva. Juntamente com o i Parque, claro. Mesmo porque Coimbra já dispõe hoje de infra-estruturas básicas ao melhor nível do país.

Daqui para a frente, precisamos é de organização, convergência de esforços e ideias claras: software e já não hardware.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 8 de Novembro de 2010

sábado, 6 de novembro de 2010

CUNHAL 2

Claro que hoje sabemos de tudo, nomeadamente pelo livro da Zita Seabra, mas é impressionante ver Cunhal em acção ao vivo!

CUNHAL

A RTP Memória está a transmitir o célebre debate entre Soares e Cunhal em 75. Impressionante o discurso de Cunhal: não foge um milímetro da revolução bolchevique para Portugal. Aquele homem sabia bem o que estava a fazer.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Bancos em Portugal

Os lucros dos bancos portugueses são de 4 milhões de euros por dia (CGD não incluída). No circuito entre o Estado, o BCE e os bancos que deixa a liquidez completamente fora do resto da economia, parece que há alguém que ganha.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

na ONU é que Guterres está bem (longe daqui)

Ler este post de "O cachimbo de Magritte" sobre o papel de Guterres nos nossos problemas de hoje

A ler

Acege em Coimbra

Continuando a abordagem do tema geral escolhido pela Acege para o corrente ano - “Portugal tem futuro: a missão dos líderes empresariais cristãos” – iremos ter o nosso próximo almoço-debate do Núcleo da ACEGE de Coimbra no dia 11 de Novembro, como habitualmente no salão da Sé Velha a partir das 13:00 horas.

Teremos connosco o Dr. Alexandre Relvas, empresário bem conhecido e interventor social e político de grande notoriedade.

Na sua intervenção, o Dr. Alexandre Relvas irá começar por apresentar uma visão geral da “Estratégia da Logoplaste” e, aproveitando a sua experiência empresarial, passará de seguida a um conjunto de Reflexões e propostas para uma nova Política Económica que permita promover a competitividade e as exportações.

Agradecemos que as inscrições nos sejam comunicadas até ao fim do dia 8 de Novembro para nos facilitar as tarefas logísticas, podendo os associados da ACEGE levar convidados que possam ter interesse em participar.

O custo da participação é de 20€, sendo o pagamento efectuado no local.


segunda-feira, 1 de novembro de 2010

DO MAR QUE FOI PORTUGUÊS


Sucede por vezes na nossa vida sermos obrigados a fazer coisas que não desejamos, que não queremos, mas a que não podemos ou não devemos fugir. E às vezes, depois de as fazermos, fica-nos um sabor a sal na boca e uma saudade para sempre. Há muitos anos fui chamado a cumprir o Serviço Militar Obrigatório, num ramo das Forças Armadas que me era totalmente desconhecido: a Marinha de Guerra. Aí aprendi muito, fiquei a admirar com conhecimento de causa todos os que ganham a sua vida no mar e a conhecer melhor o potencial fabuloso para Portugal, que é o facto de ter Zona Económica Exclusiva absolutamente gigantesca por os Açores e a Madeira serem portugueses. Na Europa, apenas o Reino Unido, a França e a Dinamarca têm áreas superiores.

Infelizmente, nas últimas dezenas de anos assistimos a um definhar das actividades ligadas ao mar. Estamos muito longe da época de quinhentos em que o Mar era português. Isto, pese o facto de alguns dos nossos melhores andarem há anos a alertar para o desperdício que é virarmos as costas ao mar, com o Doutor Ernâni Lopes à cabeça e a sua defesa do “Hipercluster do mar”.

Nas pescas, deixámo-nos embalar pela conversa dos eurocratas e a nossa frota é hoje diminuta: em resultado, 2/3 do peixe que hoje consumimos é importado. Deve ser recordada a epopeia hoje quase esquecida dos homens dos “doris” dos bacalhoeiros na Terra Nova. A indústria conserveira portuguesa que sempre foi considerada de altíssima qualidade consistia há cinquenta anos em cerca de 400 fábricas; hoje existem 20!

O desporto náutico quase não existe entre nós, não havendo estruturas que favoreçam o interesse da juventude por essa actividade, apesar de Portugal ter 1187 Km de costa marítima.

A nossa frota mercante praticamente desapareceu. A indústria de construção naval já quase não existe, restando felizmente alguma capacidade de reparação naval, muito abaixo do que era há quarenta anos. Os portos estão quase como eram há vinte anos; as suas ligações ferroviárias à Europa são inexistentes. Só temos auto-estradas e milhares de camiões a transportar mercadorias: pura estupidez e desperdício!

Com a consciência crescente do enorme buraco de competitividade económica do país, começam finalmente a surgir sinais de que começamos a acordar para as possibilidades económicas que o mar tem à nossa espera. Assim os responsáveis pela economia e pelo planeamento estratégico do país o entendam e metam mãos à obra, para além das palavras.

No dia em que faz cinco anos que estas crónicas semanais existem, não posso deixar de colocar aqui uma nota de agradecimento ao Diário de Coimbra por tão amavelmente me acolher nas suas páginas. Este jornal com oitenta anos de idade, que se intitula orgulhosamente regionalista e republicano é assim dos mais antigos do País. Este jornal é o resultado de uma luta diária de todos os que nele trabalham, desde os proprietários aos redactores, aos jornalistas e aos fotógrafos que na rua recolhem o quotidiano e no-lo dão a conhecer nas suas páginas. Seria já muito difícil imaginar a nossa Cidade sem o seu Diário de Coimbra. Nesta oportunidade, aproveito ainda para enviar a todos aqueles que também escrevem nas suas páginas um abraço que significa respeito por todos os que têm a coragem de assumir publicamente o que defendem, concorde-se ou discorde-se deles. Aos meus leitores um abraço reconhecido, pois sem as suas manifestações sempre amigas de apoio crítico, há muito que teria deixado esta “obrigação” semanal.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 1 de Novembro de 2010

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

OS DONOS


É comum considerar que o desenvolvimento das sociedades é sempre acompanhado por uma evolução das mentalidades. Mas muitas vezes isso não é verdade. Particularmente quando se confunde desenvolvimento com simples crescimento económico. De facto, quando se investe essencialmente em infra-estruturas (a partir de certa altura equipamentos acessórios ou mesmo redundantes) e não no conhecimento e na Educação, favorece-se a ocorrência de desfasamento entre uma aparente qualidade de vida e as atitudes das pessoas. É aquilo a que hoje se chama diferença entre “software” e “hardware” que, em termos sociais, faz ressaltar velhos e anquilosados preconceitos dos que se consideram a si próprios “donos” de alguma coisa e tentam impor aos outros as suas próprias vontades.

Lembro-me dos donos da Constituição. Depois de várias revisões feitas desde 1976 que foram todas no sentido contrário ao da vontade dos que na altura chegaram a sequestrar a Assembleia Constituinte para evitar que ela saísse, os mesmos aparecem ainda hoje como os seus donos. Se alguém se atreve a colocar em causa algum princípio em função da evolução política, social e económica do país e do mundo, aqui d’el-rei, que é neo-liberal!

Temos ultimamente os donos do “Estado social”. Perante quem pretende corrigir injustiças óbvias que funcionam sempre contra os mais desfavorecidos, acudam, que querem destruir o Estado Social.

Existem igualmente os donos do politicamente correcto. Não se pode dizer bicha em vez de fila, nem preto em vez de “de cor” que, como se sabe, até pode ser branco, amarelo ou vermelho. Não se pode dizer Homens ao falar da Humanidade e sim homens e mulheres; qualquer dia, temos que acrescentar mistos, quando nos dirigirmos a uma assistência.

Depois temos os donos da correcção do vestuário (incluindo calçado e cor das meias). No século XXI temos ainda quem se arrogue o direito de criticar os outros pela indumentária que escolhe. Pior ainda, quem se ache no direito de classificar ou mesmo insultar politicamente os outros, em função do que escolhe vestir. Claro que em tempos que já lá vão e se espera não voltem, criticavam-se os jovens por usarem cabelo comprido e se vestirem com cores garridas. Felizmente, hoje em dia a liberdade de escolha chegou também ao vestuário. Mas resistem alguns que, agora ao contrário, criticam os outros por usarem a roupa de que gostam, seja uma gravata ou um laço. Ainda a propósito daquele célebre sequestro da Constituinte, lembro-me de José Luís Nunes, excelente e saudoso constituinte socialista, ser insultado pelos “operários da cintura industrial” e mesmo por alguns colegas de bancadas mais à esquerda e retorquir que não faltava mais nada ter que mudar de indumentária só por causa dos arroubos revolucionários daquela gente. E tinha toda a razão, acho eu.

Há também os donos da verdade, que acham que nunca se enganam, provavelmente porque nunca leram um livro de filosofia. Felizmente e para azar deles, já que a verdade tem muitas cores, a História vem sempre provar que se enganaram muitas vezes, embora raramente o reconheçam.

Há mesmo os donos de pessoas que, por uma razão ou por outra, pensam que ficam donos de alguém para toda a vida. As relações entre as pessoas, particularmente as que envolvem afectos que não são contratualizáveis, têm que ser construídas diariamente. Os filhos por exemplo, não pertencem aos pais, ao contrário do que muitos julgam. Os pais devem apenas tratar deles o melhor possível enquanto os filhos deles dependem, dando-lhes asas para poderem voar o mais alto e longe possível.

Muitos “donos” há por aí. Na maior parte das vezes são apenas donos do seu próprio umbigo que lhes parece ser do tamanho do universo, não tendo humildade para reconhecer que “somos todos humanos, demasiado humanos”, e que a vida é muito curta para ser gasta a olhar apenas para o espelho e a perguntar “se há alguém mais belo do que eu”.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 25 de Outubro de 2010

domingo, 24 de outubro de 2010

Evangelho do dia

Evangelho segundo S. Lucas 18,9-14.

Disse também a seguinte parábola, a respeito de alguns que confiavam muito em si mesmos, tendo-se por justos e desprezando os demais: «Dois homens subiram ao templo para orar: um era fariseu e o outro, cobrador de impostos. O fariseu, de pé, fazia interiormente esta oração: 'Ó Deus, dou-te graças por não ser como o resto dos homens, que são ladrões, injustos, adúlteros; nem como este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de tudo quanto possuo.' O cobrador de impostos, mantendo-se à distância, nem sequer ousava levantar os olhos ao céu; mas batia no peito, dizendo: 'Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador.' Digo-vos: Este voltou justificado para sua casa, e o outro não. Porque todo aquele que se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado.»

sábado, 23 de outubro de 2010

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

TEMPOS DIFÍCEIS


Não são fáceis os tempos que atravessamos e os que se aproximam não parecem vir trazer mais facilidades, como se pode inferir de tudo o que “vemos, ouvimos e lemos”.
A discussão política tem vindo a ser muito centrada em volta do orçamento de Estado para o próximo ano, por uma razão muito simples. As finanças públicas estão a um nível próximo da hecatombe que se chama bancarrota. De acordo com os observadores externos, as medidas duríssimas em termos de impostos que aí vêm vão implicar uma recessão económica no próximo ano ou muito perto disso, quer por via do desinvestimento, quer por via da descida abrupta do consumo interno (et pour cause…).
Temos dois problemas muito graves: o primeiro está agora à vista de toda a gente e consiste num Estado com uma despesa desmesurada que tem que ser alimentada com impostos. O outro é o estado da Economia que será gravíssimo, embora não haja ainda uma noção clara do que se passa. De facto, o critério que foi adoptado internacionalmente para medir o crescimento económico dos países é o do Produto Interno Bruto porque permite obter medições fáceis de comparar. De acordo com muitos especialistas, o país está a viver uns dez por cento acima das suas possibilidades, tendo em conta precisamente critérios de produtividade associados ao PIB. Desconfio, no entanto, que a situação seja muito mais grave. Na medição do PIB entram bens tangíveis e bens não tangíveis. Ora bem, o que verdadeiramente interessa em termos económicos, é aquilo que se faz e que pode ser vendido, nomeadamente exportado. E aí, o nosso défice deverá ser muito mais elevado, talvez três vezes maior do que aquele que acima indiquei. Desde pelo menos a década de 90 que a Economia portuguesa, aquela que origina produtos vendáveis em concorrência, tem vindo a ser erodida. O que se passou na agricultura e nas pescas está à vista de todos. Mas também boa parte da indústria tem vindo a sofrer com as políticas seguidas pelos governantes. Quer isto dizer que as medidas de arrefecimento do nível de vida vão continuar e ainda acentuar-se, se queremos recuperar competitividade e voltar a convergir com a média europeia, o que é crucial para nos podermos manter no clube de ricos que é a União Europeia com o seu Euro fortíssimo.
Há noções que temos que ter bem conscientes, quer ao nível de despesas nacionais, quer locais. A loucura despesista que nos assolou a todos nas últimas décadas tem de ser contida. A nível nacional já todos percebemos os disparates das SCUTS, dos novos e menos novos aeroportos (como o do Porto), dos TGV’s, dos estádios vazios de assistentes, das auto-estradas ao lado umas das outras, dos centros culturais faraónicos, das sedes ceaucesquianas de bancos do Estado, dos moinhos de vento pagos pelas nossas facturas de electricidade, etc. etc. etc.
Mas a nível local também não é mais possível pretender que cada povoação tenha o seu pavilhão coberto como eu costumo dizer. Nem se compreende que uma Universidade tenha edifícios inteiros às moscas e continue a querer meter o Rossio na Betesga como a futura (?) biblioteca da Faculdade de Direito, bem como aquela colina inteira do pólo III junto aos HUC. Peço desculpa a quem não gosta, mas alguém tem que dizer que “o rei vai nu”.
Esta crise vai tocar a todos. Este é o tempo de por os pés no chão, repensar tudo e decidir onde melhor gastar o dinheiro dos impostos. Não nos esqueçamos fundamentalmente, que o Estado aos seus diversos níveis existe para as pessoas e não o contrário, porque se trata do Bem Comum. Que todos tenhamos consciência disso e saibamos contribuir ao nosso nível para a mudança necessária e urgente.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 18 de Outubro de 2010

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

PREFERIR ORIGINAIS


Nos últimos tempos surgiram em Portugal notícias sobre a descoberta de fraudes de pinturas de pintores conhecidos cujas obras atingem elevados valores no mercado. Embora seja relativamente frequente, a falsificação de quadros não deixa de ser surpreendente. Os compradores são normalmente pessoas com grande poder económico e supostamente com suficientes conhecimentos técnicos que lhes deveriam permitir evitar serem enganados de forma por vezes grosseira. Mas o desejo de possuir originais valiosos é tão grande que cega muitas vezes.
Já noutra forma de arte, a música, os originais são as obras tocadas ao vivo. De facto, as gravações, ainda que ouvidas com os melhores aparelhos reprodutores de som não passam disso mesmo: reproduções de originais. As obras musicais tocadas ao vivo nunca se repetem em absoluto, pelo que esses espectáculos são sempre uma experiência nova. Isto é válido para diversos tipos de música. Há poucos dias tivemos o exemplo da vinda dos U2 a Coimbra. Todas aquelas dezenas de milhares de pessoas que se deslocaram a Coimbra para os ouvir e ver ao vivo têm as gravações das suas músicas em casa, nos carros e nos aparelhos de MP3. Mas o entusiasmo pelo original é tão grande que motivou aquela festa gigantesca. Acresce que a música dos U2, sendo em si mesma algo limitada em termos harmónicos e melodiosos como toda a música rock e pop, é acompanhada nos concertos por toda uma parafernália tecnológica que entusiasma vivamente os assistentes, o que é impossível de suceder na audição da música gravada.
Os apreciadores de Jazz, cuja característica principal é o improviso, sabem bem que ouvir um CD nunca substituirá uma sessão ao vivo. Os festivais de Jazz atraem sempre milhares de fans em todo o mundo que não perdem a oportunidade de ir ouvir presencialmente os seus músicos preferidos e sentir toda a emoção da música a ser construída à sua frente.
Na chamada música clássica passa-se algo semelhante. Não há dois maestros que interpretem a mesma obra de maneira rigorosamente igual. Para além das partituras permitirem sempre alguma margem de interpretação, a sensibilidade pessoal dos maestros, a sonoridade própria das diferentes orquestras e as diferentes combinações de programas permitem obter sensações diferentes de cada vez que se vai a um concerto, que se torna assim uma experiência irrepetível. O hábito de ouvir gravações, possibilidade tecnológica que tem evoluído de forma impressionante, veio alterar os comportamentos dos públicos dos concertos de música clássica, nem sempre para melhor. À audição dos diferentes andamentos segue-se agora um silêncio quase litúrgico, mesmo em peças que literalmente pedem aplausos nessas alturas. Mas hoje em dia batem-se palmas de maneira muito circunspecta apenas no final das peças, olhando-se mesmo de lado para os assistentes que, entusiasmados pela música que ouviram nos diversos andamentos, são automaticamente levados a aplaudir os músicos que, esses sim, ficam bem satisfeitos quando percebem que o público gostou mesmo do que ouviu.
Outra originalidade bem curiosa, mas na realidade sem graça nenhuma, passou-se no último “dia mundial da música”, entre nós. Segundo uma notícia deste mesmo jornal de 2 de Outubro último, “nas principais comemorações do dia Mundial da Música no distrito de Coimbra que decorreram ontem, no mosteiro de Lorvão, não houve música”. Pelo resto da notícia, percebe-se que houve mais uma promessa de reabilitação futura do órgão de tubos daquele Mosteiro. Não está mal. Bem podem esforçar-se os elementos da Orquestra Clássica do Centro a fazer chegar a música de qualidade a todo o lado e a toda a gente, que as comemorações oficiais do Dia Mundial da Música se fazem “a dar música”, como se costuma dizer: mais uma originalidade dos nossos tempos e da nossa região.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 11 de Outubro de 2010

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

REPÚBLICA


Os acontecimentos que de alguma forma alteraram o rumo da nossa História devem ser recordados ou mesmo comemorados quando essa alteração se veio a revelar benéfica. Faz amanhã cem anos que foi implantada a República em Portugal. Data importante, porque marcou uma viragem na nossa História.
A Monarquia que, de tantos séculos de existência se havia entranhado na História de Portugal tinha claramente envelhecido no início do Séc-XX, do que é prova toda a História do Séc- XIX português. Curiosamente, foi o Ultimato inglês que veio acabar por cortar laços históricos de relação íntima entre o povo urbano e a Coroa, laços esses já enfraquecidos desde a ida da Coroa para o Brasil e da revolução Liberal, cerca de cem anos antes.
Hoje em dia, um século após 1910, a comemoração da República já tem pouco a ver com o fim da Monarquia e sim com o que aconteceu desde então.
Cabe aqui dizer que sou republicano, mas que não renego a nossa História e não esqueço os mais de setecentos anos em que Portugal foi uma Monarquia com muitos momentos altos de afirmação ao mais alto nível mundial.
Também não partilho da ideia de que a Democracia e a Liberdade são exclusivos da República. As actuais Monarquias constitucionais actualmente existentes por essa Europa fora são a prova de que os valores democráticos e o desenvolvimento económico e social são compatíveis com a manutenção de Monarquias. Há apenas uma pequena diferença que me faz ser republicano e que é a não aceitação de que alguém possa exercer cargos públicos, ainda que de simples representação, apenas por direito de nascimento. É o princípio da Igualdade. Como se costuma dizer, a diferença poderá parecer pequena, mas viva a diferença!
A comemoração da República é assim, para mim, um acto de cidadania porque significa a possibilidade de todos serem iguais perante a Lei, residindo na vontade do Povo a escolha de quem o governa e representa, aos diversos níveis.
Não é, definitivamente, uma comemoração da primeira República que de facto, pouco tem para ser comemorada. Na realidade, à chamada “ditadura de João Franco” dos últimos anos da Monarquia, sucedeu-se a “ditadura do Partido Republicano Português” e uma sucessão de oito presidentes e 45 governos que tiveram o fim que se sabe escassos dezasseis anos depois com a ditadura militar instaurada por Gomes da Costa que abriu a porta ao Estado Novo. A violência que tomou conta das ruas durante a primeira República principalmente em Lisboa, com os seus pontos máximos nas lutas de 1915 e assassinato do presidente Sidónio Pais, bem como a incapacidade de os partidos ultrapassarem as lutas entre si continuam como exemplo acabado do que não se deve fazer.
Felizmente, temos hoje um quadro completamente diferente. Portugal é um país democrático bem integrado em comunidades internacionais. A União Europeia constitui-se hoje na instância que nos chama à pedra quando caímos nos velhos hábitos de falta de controlo nas despesas públicas e nos afastamos do caminho do desenvolvimento económico, como infelizmente acontece hoje. Está assim afastada a hipótese de alteração de regime por via de “putsh” militar sempre presente há cem anos, vindo de fora e sem grandes possibilidades de contestação a obrigação de regresso aos equilíbrios financeiros e às boas contas.
Os problemas pontuais como a crise que vivemos hoje não nos podem fazer esquecer que, apesar de tudo, Portugal está integrado no grupo dos países mais desenvolvidos, tendo níveis de desenvolvimento sociais e económicos quase impensáveis há cem anos. Razões para não perdermos a esperança e comemorarmos a República que temos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 4 de Outubro de 2010

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

CASA ONDE NÃO HÁ PÃO


Há um velho aforismo que diz que “casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”. Com uma observação mais cuidada das situações concretas, verifica-se que muitas vezes em substituição de “ninguém tem razão” se poderia antes dizer “todos têm razão” – pelo menos alguma.
A situação política do país teve uma evolução acelerada nas últimas semanas, acompanhando de perto a evolução das taxas de colocação da dívida soberana nos mercados internacionais.
A conversa deslocada que acompanhou o processo de apresentação da sua proposta de revisão constitucional por parte do PSD, foi subitamente substituída pela questão orçamental.
Aproveito para referir aqui que o PSD fez muito bem em propor uma revisão constitucional. O momento foi adequado, dado que a legislatura que agora começa tem poderes para rever a Constituição, fazendo todo o sentido que um partido reformista como o PSD sempre foi, olhe para a evolução social e económica do país que qualquer observador reconhece não ser famosa, antes pelo contrário, e proponha as reformas da lei fundamental que ache necessárias. Claro que as críticas e ataques à proposta são compreensíveis, dado que algumas posições ideológicas olham como sua uma Constituição que deve servir para que todo e qualquer partido legal possa governar segundo o seu programa, quando vencer eleições. Apropriação essa que, claramente, não é legítima. O exemplo da luta de Sá Carneiro para rever a Constituição no seu tempo não deve ser esquecido. Também nessa altura havia muita gente que se achava dona da Constituição, o que não impediu na altura o PSD de ir em frente, arrostar com muitas incompreensões e mesmo divisões e dissensões internas que acabam por fazer parte destes processos políticos.
A grande discussão sobre o Orçamento do Estado para 2011 faz todo o sentido. Será um documento fundamental para a credibilização externa do país mas sobretudo, para possibilitar um início de regresso a uma convergência económica com a União Europeia, que é o que verdadeiramente interessa. Só um crescimento sustentado em boas contas públicas abrirá caminho a uma recuperação económica que possibilite descidas da taxa de desemprego para níveis aceitáveis. E é na Assembleia da República que se deve discutir o Orçamento de Estado. O exemplo do “orçamento do queijo limiano” de má memória e que tão graves consequências teve não deve ser esquecido.
A possível vinda do FMI para nos obrigar a tomar medidas rigorosas e gravosas para todos não deve ser usada como chantagem sobre o Governo pelos partidos da oposição, nem ser aceite como única forma de o país tomar aquelas medidas que já todos sabemos muito bem quais são, porque a receita é sempre a mesma e já a conhecemos desde a década de 80.
Resta o presidente da República, em quem votei e por quem fiz campanha aquando da sua eleição e em quem irei muito provavelmente votar de novo. Penso que faz mal ao colocar-se de fora da solução, dando apenas sugestões e conselhos. Nas actuais circunstâncias exigir-se-ia muito mais, mesmo tendo em conta que as eleições presidenciais estão para breve. Não se percebe como é que ainda não convocou os líderes dos principais partidos para se definirem caminhos de convergência para a saída da actual situação, evitando em concreto a vinda do FMI. Tal como não se percebe que exija às propostas de revisão constitucional um “certificado” de qualidade que ninguém percebe bem qual é e que, tenho a certeza, receberia de Sá Carneiro uma resposta pouco agradável, se ainda fosse vivo.
NOTA: depois de escrita esta crónica, foi tornado público que Cavaco Silva convocou os partidos. Até que enfim.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 27 de Setembro de 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

BUSSACO FOI HÁ DUZENTOS ANOS



Faz este mês duzentos anos que se travou a Batalha do Bussaco, um dos recontros militares essenciais para impedir que as tropas napoleónicas ocupassem Portugal. De facto, foi em 27 de Setembro de 1810 que as tropas francesas comandadas por Massena encontraram os exércitos português e inglês comandados por Wellington na Serra do Buçaco.
Era já a Terceira Invasão Francesa, depois das anteriores comandadas por Junot e Soult. Desta vez, no intuito de resolver as coisas em definitivo, Napoleão enviou como comandante o Marechal Massena, a quem Napoleão chamava o “filho favorito da vitória”. A derrota do exército francês no Buçaco, não tendo sido definitiva, atrasou a marcha para Lisboa permitindo melhorar a preparação da defesa da capital nas Linhas de Torres Vedras e quebrou o moral francês. Massena provou o sabor amargo da derrota, tendo perdido no Buçaco cerca de 4.500 soldados, entre os quais 5 generais.
As Invasões Francesas foram um período decisivo da nossa História, com repercussões que duraram muitos anos. A derrota dos franceses foi crucial para a continuação de Portugal como Nação. Recorde-se que pelo Tratado de Fontainebleau de 1807, na sequência do Bloqueio Continental, Portugal seria dividido em 3 reinos. A integração das invasões francesas na História Europeia é aliás fácil de perceber apenas pelas suas diferentes designações: para nós, foram as Invasões Francesas, para os ingleses foram a Guerra Peninsular e os franceses chamaram-lhe Guerra da Libertação!
A fuga da família Real para o Brasil no dia 29 de Novembro de 1808, um dia antes da chegada de Junot a Lisboa, viria a ter consequências históricas de grande importância. Desde logo, a saída do país de toda a família real, juntamente com grande parte da aristocracia, quebrou laços sociais e permitiu a expansão das novas ideias do liberalismo, quando o país se viu finalmente livre dos invasores franceses. Apesar da derrota dos franceses, parece hoje pacífico que o “antigo regime” acabou também nesta altura. Depois, criou as condições para que poucos anos depois o próprio D. Pedro IV desse o grito do Ipiranga que tradicionalmente é tido como o momento que marca a independência do Brasil.
Durante as Invasões Francesas, o território português foi varrido por numerosos exércitos. Lembra-se que nessa altura os exércitos invasores se alimentavam daquilo de que se apropriavam à sua passagem, deixando tudo destruído. Por outro lado, os defensores adoptavam políticas de terra queimada, para impedir os invasores de encontrarem víveres. Os próprios ingleses, nossos aliados, foram de extremo rigor nessa actuação, punindo muitas vezes com a morte quem não queimasse e destruísse todos os seus bens para que os franceses não se pudessem alimentar. Caso para dizer que para os desgraçados camponeses o remédio foi muitas vezes pior que a doença!
É sobejamente conhecido que os franceses pilharam tudo o que puderam durante as invasões. Desapareceram obras de Arte, mobiliário, peças de ouro e prata, ficando apenas as pedras nuas dos palácios e das igrejas. Os campos ficaram arrasados. Com a independência do Brasil, deixaram de vir as riquezas que costumavam vir. As chamadas “lutas liberais” que se seguiram impediram a recuperação económica do país depois das invasões francesas, tendo ainda contribuído para aumentar a pobreza nacional. A governação do resto do século XIX foi quase sempre uma desgraça. Portugal perdeu o comboio do desenvolvimento do resto da Europa que se verificou durante esse século, com tremendas consequências que entraram bem dentro do século XX.
O conhecimento mínimo da nossa História é uma condição para percebermos o que somos hoje. Relembrar momentos cruciais como foi a “Batalha do Bussaco” é de grande importância. No Convento de Santa Cruz do Buçaco onde Wellington pernoitou depois da Batalha, está neste momento uma colecção de excelentes fotografias de reconstruções históricas de batalhas das Invasões Francesas, da autoria do Coronel Ribeiro de Faria. Caro leitor, a mata do Buçaco pode não ter sido escolhida para ser uma das nossas dez melhores maravilhas naturais. Mas não é por isso que deixa de ser uma maravilha. Vá lá por estes dias e visite a exposição, que vale a pena.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Setembro de 2010

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

SEGURANÇA RODOVIÁRIA (de novo)


Já por diversas vezes abordei nestas linhas a questão da sinistralidade rodoviária, nas suas diversas vertentes. Talvez por durante alguns anos ter tido relação profissional com matérias relacionadas com a segurança rodoviária desenvolvi um interesse especial por esta área, que se mantém até hoje.
O número de acidentes rodoviários e de vítimas teve nas últimas duas décadas um decréscimo notável em Portugal mas mantém-se, ainda assim, num nível excessivamente elevado com grandes custos sociais e muito sofrimento. Esse decréscimo está sem dúvida ligado a uma melhoria acentuada da segurança das novas estradas e ainda ao aumento de qualidade do parque automóvel.
Continuam, no entanto, a verificar-se circunstancialismos graves à volta da segurança rodoviária com consequências muitas vezes trágicas.
Desde logo, a manutenção de pontos negros claramente identificados que são autênticas armadilhas para os automobilistas incautos. Por exemplo, na semana passada verificou-se mais um acidente com vários automóveis envolvidos e uma série de feridos com gravidade na curva ao fundo da Av. Gouveia Monteiro. Claro que estava a chover; claro que algum automobilista seguiria a mais de 30 Km/h. Mas qualquer técnico de segurança rodoviária assegura que aquele local não oferece condições mínimas de segurança de circulação, daí a frequência dos acidentes.
A atitude geral dos automobilistas perante a estrada também tem que ser radicalmente modificada. Não pode continuar a ver-se automóveis e mesmo camiões literalmente “colados” uns aos outros nas auto-estradas. Não pode continuar a ver-se que muitos automobilistas não reduzem a velocidade quando as condições meteorológicas se alteram. É verdadeiramente assustador ver automóveis a circular a 140 km/h ou mais, com chuva.
E o que dizer da fiscalização do trânsito? Hoje em dia podem fazer-se centenas de quilómetros em auto-estrada e fora dela, sem se ver um único veículo de fiscalização de trânsito. Eventualmente, lá se lobrigam uns veículos escondidos ao lado da auto-estrada a tirar fotografias de controlo de velocidade actividade bem triste de caça-multa a que, pelos vistos, está reduzida a Brigada de Trânsito, ou o que resta dela. A esse propósito, aliás, não se percebem as vantagens de ter substituído a Brigada de Trânsito por 20 unidades territoriais, com comandos diferentes e autonomia própria. As consequências que se observam na atitude generalizada dos condutores estão bem à vista e só não vê quem não quer. O que se espera por reconhecer o erro e recuperar a unidade nacional de controlo de trânsito, com critérios uniformes de actuação e aproveitando as capacidades profissionais criadas ao longo dos anos, chame-se-lhe Brigada de Trânsito ou outra coisa qualquer, se o problema é o nome? A segurança rodoviária e por extensão, todos nós que diariamente circulamos nas estradas, exigem-no.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 13 de Setembro de 2010

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

RTP de todos nós

Da entrevista de ontem ao Sr. Televisão, retive a expressão dele quando a entrevistadora a deu por terminada: "JÁ ACABOU?". O Sr. televisão pareceu aborrecido por qualquer coisa. Sei lá, se calhar achava que tinha comprado mais tempo de antena.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

RTP

A RTP, paga por todos nós, está ao serviço de Carlos Cruz um tipo que já foi condenado por pedofilia. Os portugueses são uns carneirinhos.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Jarno Saarinen

O piloto de motos japonês Shoya Tomizawa com dezanove anos, morreu ontem num acidente no Grande Prémio de San Marino.

Já quase ninguém se lembra, mas em 20 de Maio de 1973 houve um terrível acidente numa corrida de motos, em que morreram dois pilotos: Jarno Saarinen e Renzo Pasolini. Nesse acidente ficaram feridos mais doze pilotos.

Saarinen foi um dos maiores pilotos de motos de sempre e quem inventou a maneira de virar com o corpo fora da mota e o joelho a raspar o pavimento. Antes dele nunca ninguém tinha feito tal coisa.

Aqui fica a lembrança e fotos.

Jarno Saarinen - Já Passaram 35 Anos -

O QUE É ISTO?

Do DR de 2 de Setembro:

...Primeira alteração ao Dec. Lei nº 26/2010, de 30 de Março, que procede à décima alteração ao Dec. Lei nº 555/99 e procede à primeira alteração ao Dec. Lei nº 107/2009:

O art.º13º do do Dec. Lei nº 555/99...passa a ter a seguinte redacção:
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10 - O disposto nos nºs 8 e 9 não se aplica às especialidades de electricidade e de gás que serão reguladas por legislação especial que assegure a segurança das instalações.
11 - (Anterior nº 10)

Comentário: A CERTIEL agradece, enquanto o resto do país assiste estupefacto.

TRÂNSITO LOCAL: EM COIMBRA NÃO, P.F.


O leitor lembrar-se-á de uma invasão de placas a dizer “trânsito local” que ocorreu nas nossas estradas aqui há uma vintena de anos. Grande parte delas via-se nas então novas estradas, os a partir de então chamados itinerários principais e complementares, que faziam parte do que muitos apelidavam de forma depreciativa de “política de betão”. Esses sinais indicadores, absolutamente ridículos e inúteis, surgiram porque os gabinetes projectistas da capital tinham à época muito trabalho, e prescindiam de ir aos locais verificar quais as povoações servidas pelas ligações secundárias. Inventaram assim uma designação genérica que servia a todos e a ninguém, e apenas demonstrava o que sucede quando o centralismo se sobrepõe a uma correcta análise das necessidades locais.
Vem isto a propósito da actual polémica acerca das alterações ao projecto do IC3 na zona urbana de Coimbra.
Esta estrada ligará Coimbra a Tomar, e faz parte da “Concessão do Pinhal Interior” recentemente aprovada pelo Tribunal de Contas. O estudo do traçado foi objecto de negociações entre a Estradas de Portugal (EP) e a autarquia de Coimbra há dois anos, tendo sido definido um corredor cujo EIA (estudo de impacte ambiental) foi também recentemente aprovado.
Dentro da actual filosofia de financiamento de construção de estradas, a Estradas de Portugal (EP) adjudicou a “Concessão do Pinhal Interior” a um consórcio privado que procede agora à elaboração do Projecto de Execução da nova estrada, para depois a construir e explorar a utilização durante o período da sub-concessão. Como é evidente, a empresa sub-concessionária elabora um projecto que, dentro dos condicionalismos do concurso, lhe permita diminuir os custos de instalação.
E foi aqui que se estabeleceu nova discussão, porque os elementos agora entregues à Câmara de Coimbra alteram o anteriormente acordado, embora mantendo basicamente o traçado dentro do corredor aprovado. Mas, ao subir significativamente as cotas de projecto, diminui a extensão de túneis prevista e introduz viadutos com grande extensão e muito altos, agredindo a paisagem de forma violenta e desnecessária. Por outro lado, as ligações previstas à rede viária urbana são também alteradas, com consequências muito negativas na organização viária da Cidade. Isto sucede quer na ligação do IC3 à cidade na margem direita do Mondego que estava prevista para a zona da Portela com acesso imediato à circular da Boavista e que agora se propõe directamente para a Av. Fernando Namora, quer na ligação à Circular Externa, que passa a ser excessivamente extensa.
Estas alterações lembram bem aquela antiga posição centralista de desprezo pelos interesses locais representada de forma anedótica pelas placas de “trânsito local”.
As forças políticas representadas na Câmara, maioria e oposição, manifestaram uma posição unânime na rejeição das alterações agora propostas.
Acredito que perante uma posição unida e coerente da cidade e dos seus representantes legítimos, quer a Estradas de Portugal quer o consórcio sub-concessionário entenderão a importância de conciliar os seus interesses com os de Coimbra encontrando as necessárias soluções técnicas para que esta nova estrada corresponda aos critérios de eficiência e sustentabilidade exigíveis. Não nos esqueçamos que o objectivo de construir estradas é servir as populações que no fim acabam sempre por as pagar com os seus impostos.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 6 de Setembro de 2010