Vários
perigos globais nos ameaçam nos dias que correm. E ameaçam-nos porque se
percebe estarem completamente fora de controlo. Desde logo, o auto denominado
Estado Islâmico que, mercê das conflitualidades regionais, políticas e mesmo
hipocrisias políticas e medos de carácter supostamente religioso, está a
colocar todo o médio oriente e parte de África a ferro e fogo, com possíveis
repercussões em todos os países mediterrânicos ou próximos, como Portugal.
Mas
uma ameaça biológica está a desenvolver-se perante os nossos olhos, podendo em
muito pouco tempo tomar proporções dantescas. O vírus Ébola foi descoberto em
1976 na aldeia de Yambuku, hoje congolesa e deve o nome a um rio que pasa nas
proximidades. Desde essa altura houve vários surtos nessa zona africana, mas
todos locais, embora extremamente mortíferos. A baixa mobilidade das populações
não facilitava a propagação do vírus, limitando o contágio às aldeias onde
surgia e matava quase toda a gente.
Desta
vez a situação é completamente diferente. Nos diversos países daquela zona
verificaram-se guerras, com deslocações de populações e desmantelamento dos já
de si frágeis sistemas de saúde. Os médicos praticamente desapareceram da
Libéria, Serra Leoa e Guiné-Coacri e boa parte dos que ficaram a combater o
Ébola já morreram com a doença. Foi assim que o confinamento do vírus foi
praticamente inexistente, tornando possível a sua propagação com uma facilidade
extraordinária.
Com
a actual mobilidade, era só uma questão de tempo até o Ébola começar a surgir
noutros locais do mundo, levado por quem tenha estado naqueles países africanos
ou que tenha estado em contacto com alguém vindo de lá e tenha sido contagiado.
O facto de os sintomas poderem surgir entre 2 a 21 dias depois da infecção
implica que alguém infectado pode andar duas a três semanas com o vírus,
podendo contagiar outras pessoas, sem fazer ideia disso.
E,
se durante o período de incubação o perigo de contágio é relativamente
reduzido, a partir da manifestação dos sintomas torna-se extremamente elevado,
exigindo precauções sanitárias extremamente rigorosas.
O
caso da auxiliar de enfermagem espanhola infectada com o Ébola em pleno
hospital madrileno é bem exemplificativo do que se deve e não deve fazer. A
técnica terá seguido os procedimentos indicados nos chamados “protocolos”, mas
o facto é que foi infectada durante a operação de retirar o fato de segurança,
depois de trabalhar no interior do quarto onde tinha estado um doente com Ébola
proveniente da Libéria que faleceu.
Em
Portugal houve alguém que teve receio de estar contaminado, o que felizmente
não se confirmou. Mas terá utilizado transportes públicos na sua deslocação
para o hospital. A leitura dos procedimentos seguidos pelas organizações
internacionais que neste momento ajudam a combater o Ébola em África dá-nos a
correcta indicação da extrema perigosidade da manipulação de material
infectado. Quem algum dia teve formação em “guerra NBQ” (nuclear, biológica ou
química) reconhece de imediato a semelhança das situações de emergência,
levando mesmo a sugerir que a segurança das instalações hospitalares destinadas
a possíveis doentes com Ébola seja confiada a quem está profissionalmente
preparado, tem experiência e sabe como reagir em situações de emergência
passível de se descontrolar, como os militares de algumas unidades.
As
últimas notícias sobre a possível propagação pelo mundo inteiro são
assustadoras, temendo-se o pior. As informações sobre cuidados a ter não podem
ficar apenas pelos técnicos de saúde. Já deveriam estar a ser difundidas pela
população em geral, não para alarmar, mas para prevenir situações ridículas e
perigosas como a de um possível infectado ir para as urgências gerais do hospital
pelo próprio pé e utilizando transportes públicos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 Outubro 2014
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