segunda-feira, 21 de outubro de 2019

CIDADANIA AOS PEÕES


Na sequência do acentuado movimento demográfico de abandono das áreas rurais das últimas dezenas de anos, as cidades passaram a ser o habitat natural da grande maioria das pessoas. Para que os seus habitantes tenham uma vida confortável e mesmo saudável os espaços públicos urbanos devem ser dimensionados tendo em conta esse facto devendo, para além disso, ser motivo dos maiores cuidados de manutenção e conservação. Essa obrigação deverá ser mesmo ser considerada como a preocupação número um de qualquer autarquia.
Nas ruas das cidades convivem diversos tipos de utentes entre os quais uma das maiores diferenças reside nos respectivos modos de deslocação. E, se há zonas destinadas exclusivamente a pessoas que se deslocam a pé ou bicicleta como os parques verdes outras há, caso das ruas, em que os conflitos entre os diversos modos de deslocação são permanentes. Nem falo de situações espúrias e absolutamente inaceitáveis, de utilização abusiva dos passeios que são exclusivamente destinados a peões como o estacionamento de viaturas automóveis ou aquela outra mais recente da circulação de trotinetas eléctricas. Contudo, as situações de conflito mais graves verificam-se quando os peões têm que atravessar as vias e é aí que as autoridades responsáveis pela gestão da via pública têm particulares responsabilidades em adoptar medidas que promovam uma efectiva melhoria da segurança rodoviária. Cabe lembrar aqui aos automobilistas uma norma do Código da Estrada que, entre nós, parece muito esquecida: os condutores que mudam de direcção devem ceder passagem aos peões que estejam a atravessar a faixa de rodagem da rua em que vão entrar, sob pena de contra-ordenação grave.
Concretizando com o que se passa na nossa cidade
, verifica-se que o número de atropelamentos com mortos ou feridos graves foi de nove durante o ano de 2018, abaixo da percentagem nacional em que os atropelamentos constituíram 15,4% dos acidentes graves, de acordo com as estatísticas oficiais. Um daqueles atropelamentos ocorreu na Rua Miguel Torga, onde também são frequentes os choques de traseira junto às passadeiras existentes. Saúda-se, portanto, a Câmara Municipal por ter colocado semáforos nas 4 passadeiras daquela rua.
Aquele tipo de acidentes deve-se, em muito, à exagerada velocidade de circulação em muitas das nossas ruas, mas também à deficiência de visibilidade e de sinalização das passadeiras. No que respeita à velocidade, fazem falta mais locais com semáforos dotados de detectores de velocidade, em particular em ruas onde há também um elevado número de peões a circular. Estou a lembrar-me da Av. Armando Gonsalves de acesso aos HUC, mas também da Av. Navarro, da Rua Bernardo Albuquerque, da Av. Fernando Namora, etc. Mesmo a colocação de painéis informativos da velocidade, sem semáforos ou sem câmara fotográfica tem um efeito altamente dissuasor do excesso de velocidade como era possível verificar na descida da Circular Interna enquanto o equipamento ali colocado funcionou devidamente.
Algumas passadeiras da Cidade, particularmente aquelas localizadas nas proximidades de escolas, foram em tempos dotadas de equipamentos sinalizadores da sua existência, com iluminação própria, além de colocação de pavimentos especiais. Urge proceder à sua manutenção para que voltem a ser a ser eficazes, para além de se dever aumentar o seu número para protecção de jovens estudantes, mas não só.
A maioria dos passeios de Coimbra possui pavimentos desadequados a uma confortável e segura circulação dos peões, para além do mau estado de muitos deles. É frequente encontrarmos pessoas a caminhar pela faixa de rodagem, entre os carros, por uma razão muito simples: os pavimentos rodoviários estão em muito melhor estado que os dos passeios. É uma situação caricata que deveria envergonhar os responsáveis autárquicos, para além da insegurança que provoca. Na zona histórica e em locais em que os passeios têm calçadas com desenhos justifica-se a sua manutenção, embora tenha que haver cuidados e despesas suplementares para garantir o seu bom estado. Já o mesmo não se pode dizer de toda a restante cidade em que o conforto deve ser a regra dominante na escolha do tipo de pavimentos, devendo-se abandonar calçadinhas sem qualidade, desconfortáveis e de difícil manutenção.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 21 de Outubro de 2019

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