A década de sessenta do século XX está ainda na memória de muitos de nós, naquilo que teve de negativo ou mesmo de perigos para a Humanidade, mas também nos grandes feitos conseguidos. Vivia-se um tempo de “guerra fria” entre dois blocos políticos armados até aos dentes, que foram tendo umas guerras “de teste”, normalmente em zonas periféricas. Foi o caso da guerra do Vietname que marcou tragicamente essa década com consequências que demoraram décadas a esbater-se na sociedade americana.
Foi a década da
grande aventura da exploração espacial. Depois da URSS enviar o primeiro homem
ao espaço Yuri Gagarin, o presidente Kennedy estabeleceu a meta americana de
pousar um homem na Lua e trazê-lo de volta à Terra, precisamente antes da
década terminar. O que foi conseguido com a Apolo XI no dia 20 de Julho de
1969, feito que está firmemente marcado na minha memória com a transmissão
directa na televisão a preto e branco.
A década que
vivemos está também a ser marcada por acontecimentos marcantes, como o
terrorismo global, a guerra na Síria, o ressurgimento dos nacionalismos de tão
má memória, as crises financeiras globais, o medo das consequências da
intromissão da cibernética em todos os aspectos da nossa vida, as alterações
climáticas.
E no entanto….a
aventura humana continua no espaço, embora a comunicação social esteja quase
completamente alheada do facto. No próximo mês de Setembro vai acontecer o clímax
daquilo a que os cientistas da NASA chamaram o “Grande Final” da missão Cassini
ao planeta Saturno, aquele planeta gigante do nosso sistema solar, conhecido
pelos seus anéis, no que foi a maior e mais complexa missão espacial até aos
dias de hoje.
Terminando a sua última missão científica, no passado sábado dia
22 a nave espacial alterou a sua trajectória, dando início às últimas orbitas
em redor de Saturno que culminarão num mergulho na atmosfera do planeta dos
anéis em 15 de Setembro que ditará a sua destruição programada, levando também ao
desaparecimento de alguma espécie de vida da Terra que ainda possa conter, a
fim de evitar qualquer contaminação daquele planeta.
Ao contrário da
missão Apollo de 1969 em que a ida da Terra à Lua demorou apenas 4 dias, na
altura sentidos como muito longos, a missão Cassini começou há 20 anos, em
Outubro de 1997 e só a viagem desde a Terra até entrar na órbita de Saturno durou
7 anos, tendo para lá chegar usado os impulsos gravitacionais de duas voltas a
Vénus, uma à Terra e uma a Júpiter. No fim do ano de 2004, a nave Cassini enviou
a sonda Huygens que pousou nos primeiros dias de Janeiro de 2005 na superfície
de Titan que, sendo uma das luas de Júpiter, é maior que o planeta Mercúrio. A
Huygens começou de imediato a enviar informações sobre esse planeta para a
Terra. Assim se ficou a saber que Titan tem chuva, rios, lagos e mares, sendo a
sua atmosfera rica em azoto, tal como se pensa que terá sido a atmosfera da
Terra em tempos muito antigos.
A quantidade de
informação obtida pela missão Cassini ultrapassou em muito aquilo que estava
inicialmente previsto já que, originalmente, o seu fim ocorreria em 2008 mas
foi possível prolongá-la em várias fases que ampliaram a sua duração.
A missão Cassini representou
um esforço técnico e financeiro gigantesco e foi tornada possível pelo trabalho
conjunto da NASA, da Agência Espacial Europeia e da Agência Espacial Italiana.
Em concreto, a sonda Huygens que poisou na superfície de Titan foi projectada e
construída na Europa e fica a marcar um feito extraordinário, por ser o
primeiro artefacto humano a pousar num planeta do sistema solar exterior e daí
enviar mensagens para a Terra.
Quer a missão
Apollo, quer a missão Cassini são a prova da capacidade humana mas, acima de
tudo, a demonstração de que ao contrário do que se possa vulgarmente pensar,
mesmo em tempos conturbados e perigosos a Humanidade ainda é capaz de
surpreender pela positiva, transformando sonho em realidade.