segunda-feira, 17 de maio de 2010

FACTURA MENSAL DE ELECTRICIDADE


O leitor sabe o que está a pagar todos os meses quando paga a sua factura à EDP?

Com uma grande probabilidade de acertar, direi que na verdade não sabe, embora pense que está simplesmente a pagar a electricidade que consome. Pois saiba que nao: de facto, paga muitas outras coisas mais, que tem toda a vantagem em conhecer. Já que é obrigado a pagar sem poder negar-se a fazê-lo, deve pelo menos saber para onde vai o seu dinheiro.

Na realidade, cada euro que pagamos na nossa factura eléctrica mensal distribui-se da seguinte forma: 31 cêntimos pagam a energia eléctrica e o seu fornecimento, 27 cêntimos pagam o uso das redes e gestão do sistema, e finalmente 42 cêntimos pagam subsídios a diversas entidades.

A ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) deveria servir para criar condições concorrenciais às empresas que teoricamente nos poderiam fornecer electricidade em situação de sã concorrência. Claro que, na realidade, o fornecimento de electricidade às nossas casas é um monopólio bem conhecido, em que actuam a REN e a EDP com condições tarifárias definidas administrativamente. Reside aliás aqui a razão de quem protesta contra os prémios das administrações destas empresas que prestam os seus serviços a preços que, na prática, são tudo menos concorrenciais. Embora esta sua função seja praticamente inexistente, ao menos a ERSE serve para sabermos exactamente para onde vai o dinheiro que os consumidores pegam na sua factura eléctrica.

Pelo relatório anual da ERSE, ficamos a saber que aqueles 42% da nossa factura mensal são a parte que todos nós temos que pagar para os chamados CIEG (Custos de Interesse Económico Geral). Por exemplo, daqueles 42 cêntimos que referi, 6,51 cêntimos destinam-se a pagar a chamada PRE (Produção em Regime Especial). Corresponde à subsidiação de preços para a produção de energia eólica (sim, aqueles moinhos que agora enchem os cumes dos nossos montes), da co-geração (renovável e não renovável), da energia fotovoltaica (por exemplo aquela famosa central da Amareleja) e outras renováveis residuais.

Numa altura em todo o país começa finalmente a ter consciência da situação económica do país, é conveniente conhecermos os pesos que a economia tem em cima, e que dificultam ou impossibilitam a sua recuperação, porque lhe introduzem à partida custos adicionais que, comparativamente, lhe retiram competitividade.

O custo da energia é um desses pesos. Na realidade, num país rico e provavelmente com excedentes de balança comercial, faria sentido investir em energias renováveis que eventualmente poderiam trazer vantagens competitivas num cenário hipotético de combustíveis fósseis raros e muito caros. Num país em que as empresas lutam desesperadamente por um lugar ao sol, tentando competir com economias mais baratas, colocar-lhes uma canga em cima é tudo menos apoiá-las, e é isso que sucede com os custos da electricidade em Portugal. Só para comparar, o preço de referência espanhol de compra de energia eólica em Espanha anda pelos 26 euros por MWh, enquanto em Portugal varia entre 92 e 72 MWh nos últimos contratos. Não admira que haja por aí tanta gente interessada em colocar moinhos por tudo o que é monte.

Agora que ao PEC sucede o PEC2, com todo um rol de sacrifícios para todos os contribuintes, bom seria que esta questão da energia, essencial para a vida económica, fosse devidamente reavaliada em função do interesse de todos nós e de supostas vantagens futuras que poderão ou não surgir.

Publicado no Diário de Coimbra em 17 de Maio de 2010

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Silva Lopes ao DN

O Governo tinha alternativa?

Não! O problema é que se não tomássemos essas medidas não conseguiríamos financiamento externo. Isso seria o desastre completo, uma catástrofe garantida. Estes sacrifícios são o menor dos males que temos de encarar. Mas não vale a pena enganar as pessoas e dizer que se consegue isto e o crescimento económico ao mesmo tempo.


"Portugal e Espanha apresentam livro da candidatura aos Mundiais 2018/2022"

Quem pára isto já?

via Publico.pt - Geral em 14/05/10
Portugal e Espanha apresentam esta sexta-feira na FIFA o livro da candidatura ibérica à organização .

quarta-feira, 12 de maio de 2010

BENTO XVI


«um povo, que deixa de saber qual é a sua verdade, fica perdido nos labirintos do tempo e da história»

segunda-feira, 10 de maio de 2010

TEMPOS DIFÍCEIS

As últimas semanas têm vindo a revelar dificuldades acrescidas para o país, com possíveis consequências graves para o futuro. Já não se fala apenas do futuro longínquo, mas do futuro imediato.

As dificuldades da Grécia estão a espalhar-se de uma forma que parece difícil de conter, colocando o nosso país na primeira linha dos países que poderão vir rapidamente a confrontar-se com uma situação semelhante.

Está na moda acusar as “agências de rating”, como se fossem elas as causadoras da actual situação. É mais uma vez a tendência de matar o mensageiro, em vez de enfrentar o problema. Claro que as “agências de rating” já falharam algumas vezes, mas isso não significa que não tenham um papel importante; o facto de as suas análises terem como consequência o aumento do custo da nossa dívida soberana deve-se aos nossos próprios problemas, e nao à sua exposição pública. Todos os investidores internacionais precisam de quem faça o trabalho de analisar o verdadeiro valor dos papéis que circulam, como é o caso das obrigações emitidas pelos países para financiarem as suas actividades. A ideia peregrina de criar uma “agência de rating” europeia que utilizasse critérios de análise diferentes e que portanto fosse mais "simpática" para países em dificuldades seria apenas ridícula, se não fosse mesmo perigosa pelo que revela de ignorância ou mesmo vontade de manipular os mercados, por parte de quem a propõe.

Os nossos verdadeiros problemas têm a ver com uma dívida externa muito alta, mas também com um crescimento anémico ao longo de toda a última década, com um Estado gastador em excesso e com falta de competitividade externa. A própria Grécia cresceu na última década cerca de três vezes mais do que Portugal. Na realidade, em termos de crescimento médio anual, a última década só tem paralelismo com outra década na nossa história económica recente, que foi a década de 1911/1920, sendo conveniente ter este dado bem presente, antes de atirarmos pedras a quem dá as más notícias.

O valor excessivo do euro face à nossa capacidade económica, associado à falta de reforma do nosso sistema produtivo e ainda à existência de sobrecustos artificiais sobre a economia, está a ter um efeito corrosivo permanente na nossa afirmação económica no exterior.

É voz corrente que o país está a viver pelo menos dez por cento acima das suas possibilidades. Isto é, todos os anos nos endividamos em cerca de dez por cento do que produzimos, para pagar o que gastamos, e esta situação vai-se acumulando.

A situação está muito perigosa e exige não só sangue frio e coragem dos diversos responsáveis políticos, como também uma grande dose de bom senso e disponibilidade para encontrar respostas adequadas às novas situações que surgem todos os dias. O conceito de desenvolvimento sustentável não poderá ser deixado apenas para o ambiente em termos restritos, devendo ter em conta a evolução da economia que se reflectirá de forma muito séria na qualidade de vida das próximas gerações.

Publicado no Diário de Coimbra em 10 de Maio de 2010

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Europa - ora vejamos quem deve a quem...


via Corta-fitas de Pedro Quartin Graça em 03/05/10

Fonte: New York Times, edição de 1 de Maio


SEGURANÇA RODOVIÁRIA, PRECISA-SE


Se há algum sector em que Portugal melhorou sensivelmente nos últimos anos é o da sinistralidade rodoviária. O número de acidentes e, principalmente os números de mortos e de feridos graves, são hoje em dia muito inferiores ao que se verificava há uns vinte anos. As causas são diversas, mas podemos salientar a melhoria geral das estradas e a renovação da frota automóvel.

O outro factor clássico para a definição das condições de segurança rodoviária é o comportamento dos condutores. Quanto a isso, não se sente que haja uma grande melhoria, em grande parte porque quem circula pela estrada raramente sente a presença dissuasora das forças policiais, a não ser para controlar a velocidade excessiva.

Tendo as estradas melhorado sensivelmente desde a nossa entrada na actual União Europeia, há no entanto muitas situações que necessitam de atenção urgente por parte das autoridades que superintendem nas estradas.

As estradas, mesmo quando de construção ou beneficiação recente, necessitam de manutenção. Em particular, no que diz respeito à sinalização, a falta de manutenção das pinturas e de substituição imediata de sinais de trânsito degradados ou desaparecidos é motivo de muitos acidentes, por vezes de grande gravidade. Em alerta publicado há poucos dias, a Associação Portuguesa de Sinalização e Segurança Rodoviária estima mesmo que entre 20 a 30 por cento dos acidentes rodoviários sejam provocados pela má sinalização.

É notória e frequente a falta de conhecimento prático e de experiência por parte de muitos projectistas de estradas. Em consequência, surgem situações pontuais de falta de segurança em que os automobilistas se encontram de repente perante situações que fogem ao “ambiente” rodoviário em que circulam, obrigando a manobras que deviam ser desnecessárias. Mesmo a própria fiscalização da construção das estradas deixa muito a desejar. A perda da experiência e do conhecimento tácito acumulado durante muitas dezenas de anos pelos técnicos da antiga JAE ajuda a explicar boa parte destas situações e é de lamentar.

Entrou ao serviço há poucos meses em Coimbra uma infra-estrutura rodoviária que é bem o paradigma do que acima escrevi.

A “rotunda do Almegue” junto à Escola Superior Agrária de Coimbra parece acumular todos os erros de projecto e de execução que se possam imaginar. A sua geometria e a própria dimensão dificultam aos automobilistas a percepção de que se trata de uma rotunda. As inserções das diversas vias são feitas com ângulos desadequados. A variação do número de vias é permanente, impossibilitando uma sinalização horizontal coerente que ajude de facto à orientação dos automobilistas. Por fim, a diferença de cotas entre as vias de acesso e da própria rotunda impede uma boa percepção visual de quem circula.

Há muitos anos que defendo uma entidade reguladora para as estradas, que proteja de facto a segurança dos seus utentes e impeça asneiras e disparates na construção das estradas. De facto, nem a Estradas de Portugal nem boa parte dos Municípios são capazes de garantir, quer a qualidade exigível de projectos e sua correcta execução, quer a necessária manutenção para que continuem ao serviço nas condições mínimas de segurança de circulação rodoviária.

Publicado no Diário de Coimbra em 3 de Maio de 2010

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Behaviour of the sexes: The hormone of laddishness


Oestrogen, not testosterone, is what makes a male act like a male

IN ALL species that practise sexual reproduction, males and females show gender-specific behaviours. These range from the way they mate to the way they defend—or fail to defend—their territory. Both males and females start out with the same template at birth, but then something acts on the male to masculinise him for life. But nobody knows just how that happens.

It is well known that sex hormones like oestrogen, which is typically seen as a female hormone, and testosterone, similarly seen as a male one, play a role in shaping the neural circuits in the developing brain, and that much of that moulding takes place before birth. It has also been established that testosterone, as well as being a fully functional hormone in its own right, can be (and often is) converted into oestrogen in the body. ..

terça-feira, 27 de abril de 2010

Bolsa perde 5,36% após descida do rating


via Expresso em 27/04/10
A agência de rating Standard & Poor's desceu a notação de risco de Portugal, com receios de que o país não consiga pagar a sua dívida. O risco de incumprimento aumentou para o nível mais elevado de sempre.


DE MAL A PIOR

Do Diário Económico:

Tal como Económico antecipou em primeira mão, a S&P acaba de reduzir a notação da dívida portuguesa em dois níveis, de 'A+' para 'A-'.

Trata-se da pior classificação desde a primeira classificação da S&P para Portugal, em 1992, ainda no tempo do escudo, segundo dados da Bloomberg.

Tão negativo quanto isso é o aviso da agência de notação financeira de quer poderá voltar a cortar a classificação da dívida portuguesa se o défice e a dívida nacional derem sinais de descontrolo.

"O 'downgrade' de dois níveis reflecte o nosso entendimento de que Portugal enfrenta riscos orçamentais acrescidos", justifica Kai Stukenbrock, da S&P, uma das mais poderosas agências de notação financeira.

A nova classificação da dívida portuguesa, de 'A-' significa que Portugal é tido como segundo país mais arriscado pela zona euro, deixando de estar ao mesmo nível de Chipre, Itália e Eslováquia. Pior que Portugal só a Grécia, que tem um 'rating' de 'BBB+'.

O 'rating' funciona como uma espécie de cartão de visita quando um Estado ou uma empresa procura financiamento nos mercados internacionais. Quando mais baixo for a classificação atribuída pelas agências, mais caro sairá a emissão de dívida.

Conjuntura: Custo dos 'credit default swaps' já sobe 40,7 pontos e atinge no...


via Expresso em 27/04/10
Lisboa, 27 abr (Lusa) - O preço para segurar a dívida portuguesa, os 'credit default swaps' (CDS), subiu para 351.9 pontos base, atingindo novos máximos históricos pelo décimo primeiro dia consecutivo, de acordo com os números da CMA Datavision.


Portugal sobe para 6º lugar

Ai ai ai


via Expresso em 27/04/10
No monitor de risco disponível para as 12,30h, o país ultrapassou o Dubai e o Iraque, e subiu ao 6º lugar, com mais de 26% de risco de bancarrora. Grécia mantém-se em 1º lugar e risco de Irlanda e Espanha continua a subir


segunda-feira, 26 de abril de 2010

TEMOS SARILHOS

Bolsa de Lisboa é a que mais cai no mundo, PSI 20 tomba 3% (DE)

Num dia em que as principais praças europeias até protagonizaram ganhos, o PSI 20 fechou a perder mais de 3%, acompanhado pela bolsa grega.


COIMBRA NO SEU MELHOR

Como alguns dos meus leitores já terão certamente reparado, reservo a subtítulo “Coimbra no seu melhor” para aquilo que na nossa Cidade me surpreende pela positiva e que merece ser divulgado. O espírito geral destes escritos é o de relevar o que há de bom e de apontar o que me parece negativo, mas sempre numa perspectiva construtiva, tentando apontar alternativas ou caminhos diferentes. Mas não há nada que me satisfaça mais que mostrar o que é feito e melhora a nossa cidade, aquilo que demonstra espírito empreendedor, aquilo que claramente fazemos melhor.

A Feira do Livro de Coimbra já vai na sua 33.ª edição, tendo portanto uma longa tradição. Lembro-me bem que muitas vezes foi criticada, justa ou injustamente, lamentando-se a falta de iniciativas.

A Feira do Livro deste ano ultrapassa tudo isso. Poder-se-á mesmo falar de uma reinvenção da Feira. De facto hoje em dia, compram-se livros com desconto durante todo o ano nas livrarias. Mas a Feira do Livro deste ano é muito mais que uma feira de livros desse tipo. À exposição e venda de obras, ainda assim com descontos superiores aos habitualmente praticados pelas livrarias, a organização acrescentou muitas outras actividades científicas, culturais e artísticas.

Do programa, retiro:

As oficinas de encadernação e douramento de livros e também a formação em restauro do livro antigo;

Os diversos concertos e recitais de música de variados géneros, bem como workshop de dança;

As sessões de leitura para diferentes públicos-alvo;

As tertúlias com Professores convidados bem conhecidos de todos nós, como Marcelo Rebelo de Sousa, Luís dos Reis Torgal, Manuela Delille, Sá Furtado, José Carlos Seabra Pereira, Manuel Portela, Rui Bebiano e Carlos Fiolhais, entre outros.

São quinze dias em que os livros, para além de peça central, constituem pretexto para que os conimbricenses se desloquem à Praça da República até ao próximo domingo dia 2 de Maio, a fim de participar ou apenas assistir aos mais diversos acontecimentos ou eventos, como agora se costuma dizer. Até ao próximo fim-de-semana, o leitor ainda terá a oportunidade de conhecer melhor Aquilino Ribeiro, ouvir declamar poesia de Miguel Torga e José Régio, recordar a figura de Fernão Mendes Pinto, discutir o futuro do livro ou aprender a ter “cuidado com a língua”. Hoje mesmo, será inaugurada a exposição Ex-Libris, “ESTE LIVRO É MEU E DOS MEUS AMIGOS”.

A sua designação oficial é 33ª Feira do Livro de Coimbra. Na realidade, trata-se de uma verdadeira Festa Cultural à Volta dos Livros. Parabéns aos organizadores que, com dedicação e certamente muito trabalho, conseguiram “dar a volta” a um acontecimento rotineiro e fazer dele uma novidade de grande qualidade e que assim ajuda ao prestígio de Coimbra na área cultural.

Verdadeiramente Coimbra no seu melhor.

Publicado no Diário de Coimbra em 26 de Abril de 2010

segunda-feira, 19 de abril de 2010

QUESTÕES DE DEMOGRAFIA

Não é a primeira vez que abordo a questão da demografia em Portugal, e não será certamente a última, dada a gravidade de que se reveste e das consequências trágicas que pode vir a provocar na sociedade nas próximas décadas.

As análises da evolução demográfica indicam que os portugueses se estão a transformar num povo em risco de extinção a curto prazo. Em 1960, nasciam 214.000 portugueses e morriam 95.000. Em 1980, já só nasceram 158.000 para 94.000 óbitos. Em 2008, nasceram 104.500, tendo falecido 104.200. Embora ainda não haja dados oficiais, no ano passado o n.º de nascimentos terá sido inferior a 100.000, tendo morrido mais pessoas do que aquelas que nasceram, pela primeira vez. Chegámos verdadeiramente ao inverno demográfico.

Como resultado desta evolução, verifica-se que o índice sintético de fecundidade diminui em Portugal para valores à volta de 1,3, quando o valor que garante a renovação é de 2,1. As mulheres portuguesas têm cada vez menos filhos, e mais tarde. A descida da natalidade é acompanhada por um aumento da longevidade da população portuguesa, tendo, em escassos dez anos, duplicado a importância relativa da população com 80 ou mais anos de idade, enquanto o n.º de pessoas com 65 ou mais anos de idade por cada 100 pessoas em idade activa passou de 19 para 26. Estima-se que nos próximos 25 anos o número de idosos poderá ultrapassar o dobro do número de jovens.

As consequências desta evolução demográfica que acompanha, aliás, o que se passa no resto dos países desenvolvidos, são muitas e variadas.

Os custos da segurança social disparam, colocando claramente em risco a sua sustentabilidade e o próprio modelo social, por falta de contribuintes líquidos face ao elevado número de reformados.

Os custos da saúde aumentam também de forma acentuada: os custos de saúde de uma pessoa com 65 anos são, em média, cerca de três vezes os custos com pessoas entre os 30 e os 50 anos.

O número de alunos nas escolas diminui, eliminando muitos postos de trabalho ligados à Educação.

A própria competitividade das nossas sociedades, face aos países emergentes em época de globalização, é colocada permanentemente em causa: esses países são muito mais jovens, com as vantagens inerentes. No mundo do trabalho, as consequências são também importantes. O aumento da esperança de vida vai adiando o momento da reforma, com implicações na produtividade das empresas. Mas, como acontece muitas vezes, são as próprias empresas que mostram ter capacidade de adaptação às diferentes condições que estão a desenvolver-se com o aumento da idade média dos trabalhadores. Muitas empresas pelo mundo inteiro estão preocupadas com este assunto, e desenvolvem estratégias para o enfrentar.

A HBR (Harvard Business Review) de Março conta-nos como o fabricante de automóveis alemão BMW se prepara activamente para enfrentar o facto de que, enquanto hoje a média de idade dos seus trabalhadores é de 39 anos, daqui a escassos dez anos será superior a 47 anos. Foi constituída uma unidade piloto, com a média de idades prevista de acordo com esta previsão e dando atenção a cinco factores: gestão de saúde, competências, ambiente do posto de trabalho, políticas de reforma e mudança de processos de laboração. O sucesso da experiência, levada a cabo com a participação dos trabalhadores que propuseram mais de 70 pequenas alterações aprovadas foi de tal ordem que a própria produtividade da unidade subiu 7% num ano. Isto é, para além de promover a integração de trabalhadores mais velhos, ainda se obtiveram ganhos produtivos. A empresa está neste momento a promover alterações semelhantes nas suas fábricas pelo mundo inteiro.

Este é um exemplo a estudar com atenção e a replicar onde for possível. É socialmente muito mais justo do que mandar os trabalhadores para casa só por causa da idade, ou mesmo mudar em massa trabalhadores para trabalhos mais leves, dentro das unidades produtivas.

Publicado no Diário de Coimbra em 19 de Abril de 2010

segunda-feira, 12 de abril de 2010

OS CIDADÃOS FACE À POLÍTICA

Nos últimos tempos temos assistido a uma violenta alteração do ambiente político em Portugal. Nada que nos deva surpreender, porque as crises económicas profundas e prologadas trazem sempre dentro de si o fermento para mudanças políticas significativas. O contrário, isto é, a manutenção do “status quo” que muitas vezes provocou ou potenciou a crise económica é que seria de espantar.

Não estou a falar das alterações de liderança no interior dos partidos, necessárias como resposta às insatisfações e anseios de mudança da população, mas da forma como o próprio sistema político funciona.

Os resultados das últimas eleições legislativas que retiraram a maioria absoluta ao partido do Governo poderão explicar muito do que se passa. Mas a actual situação vai muito para além disso.

Primeiro, temos uma chocante mistura entre política e Justiça, que só pode dar maus resultados, se não for travada rapidamente. Infelizmente, os principais responsáveis pelas diversas instituições que têm a ver com a aplicação da justiça parecem apostados em convencer toda a gente de que têm uma agenda política própria ou, no mínimo, que não têm suficiente independência relativamente a outros poderes.

Os casos “alegadamente” relacionados com corrupção ligada a decisões políticas surgem com uma regularidade impressionante. Sugestivamente, e certamente não por acaso, a tentação de culpar os portadores de más notícias isto é, a comunicação social, é algo em que muitos dos decisores políticos caem hoje em dia de forma clara e evidente.

Como consequência, a população tende a olhar para todos os políticos com doses cada vez maiores de desconfiança. O facto de os vencimentos dos gestores das principais empresas participadas pelo Estado serem obviamente exagerados face à economia nacional, o que, aliás, foi vincado pelo Sr. Presidente da República há uns dois anos, está a envenenar todo o ambiente político. A isso não será alheia a evidência para toda a gente de que esses responsáveis já passaram praticamente todos pelas cadeiras dos governos de diversas cores políticas.

Os custos associados ao funcionamento da Assembleia da República circulam por toda a internet, com os comentários mais díspares, mas manifestando sempre choque e muitas vezes repulsa pelos números envolvidos, como se a Democracia não tivesse custos. O que se deve colocar em questão não são os custos em si mesmos. De facto o número de deputados é que é excessivo. E diga-se também que o processo interno de escolha dos candidatos a deputados por parte dos partidos é muitas vezes obscuro e utilizando critérios no mínimo facciosos, para não ser demasiado antipático. Isso reflecte-se posteriormente na constituição da Assembleia, como é patente nos dias de hoje quando olhamos para boa parte dos diversos grupos parlamentares. Digo olhar, porque quanto a ouvi-los bem, nem vale a pena comentar. A consequência desta prática dos partidos é a difusão da ideia de que os deputados só servem para gastar dinheiro, já que não produzem nada, o que é inteiramente errado e mesmo perigoso.

Mas em relação à Assembleia da República há uma alteração mais significativa e importante. Uma das suas funções constitucionais é a fiscalização da actividade governativa, para além da actividade legislativa. Ao longo dos anos, essa função tem sido claramente relegada para segundo plano. Essa prática e esses hábitos estão hoje a sofrer uma mudança radical, com o surgimento de duas Comissões Eventuais de Inquérito e a possibilidade de surgir ainda mais alguma a curto prazo. A consequência é que a actividade dos Deputados que nos entra todos os dias em casa através da TV, é quase exclusivamente a de inquirirem as mais diversas personalidades da vida política e económica. Isto nada tem de mal, é algo que se passa nos parlamentos de todas as democracias. Mas entre nós ainda se reveste de alguma novidade, e é bom que nos vamos habituando, porque vai contribuir para dessacralizar boa parte da actividade governativa do país e isso tem consequências.

Publicado no Diário de Coimbra em 12 de Abril de 2010

segunda-feira, 5 de abril de 2010

TESOUROS DE COIMBRA

Alguns dos tesouros mais escondidos de Coimbra encontram-se na Catedral de Santa Maria de Coimbra.

Muitos leitores se perguntarão onde fica tal catedral. Pois bem, é a nossa bem conhecida Sé Velha e esse era o seu nome no século XI.

O seu interior foi quase limpo quando em Outubro de 1772 se procedeu à transferência do cabido para a Igreja que fora do extinto Colégio de Jesus e que assim passou a ser a Sé Nova. Na velha igreja restaram apenas peças consideradas sem grande valor ou que, pelas suas dimensões não seriam fáceis de transferir.

Quanto ao retábulo principal de madeira dourada e policromada, da autoria dos flamengos Olivier de Gand e Jean de Ypres, já aqui me referi por algumas vezes. Além de excepcional pelas suas dimensões e beleza artística, é o único daquela altura que se mantém no seu local original em toda a Península Ibérica. Fez há pouco 500 anos, facto que foi devidamente assinalado e celebrado.

Lá se encontra o túmulo de D. Sesnando, falecido em 1091. Recorda-se que o moçárabe D. Sesnando nascido em Tentúgal foi um importante apoio de Fernando Magno, tendo depois governado de forma excepcional e infelizmente pouco conhecida por nós o condado de Coimbra, para aquele Rei de Castela e Leão.

A Porta Especiosa de João de Ruão é talvez o tesouro mais conhecido da Sé Velha, porque se vê bem e porque foi restaurada há pouco tempo.

Mas outro tesouro da Sé Velha deveria ser mais conhecido. Trata-se da Capela do Santíssimo Sacramento, que ocupa o absidíolo do lado direito. O retábulo desta capela é também da autoria de João de Ruão e data de 1566.

O retábulo é espantoso e um pouco intrigante à primeira vista para leigos na matéria, como eu. Trata-se de uma representação do Concílio de Trento e o significado das suas figuras é ainda matéria de estudo de especialistas. Socorri-me, para estas notas, do escrito pelo Prof. Pedro Dias no seu Guia para uma visita a Coimbra, que recomendo para um melhor conhecimento da nossa Cidade.

O retábulo foi encomendado pelo Bispo D. João Soares, que foi um dos representantes portugueses no Concílio de Trento.

O Concílio de Trento foi importantíssimo para a Igreja Católica. Decorreu em três períodos: entre 1545 e 1548, entre 1551 e 1552 e entre 1562 e 1563.Foi convocado pelo Papa Paulo III e foi a resposta da Igreja Católica à Reforma Protestante. Influenciou decisivamente o futuro da Igreja Católica, mas teve ainda grande importância política e social em muitos países europeus, designadamente Portugal.

O retábulo da Capela do Santíssimo Sacramento apresenta as figuras do Concílio de Trento de forma simbólica e com profundo significado religioso. No plano superior estão as estátuas de Cristo e de dez dos Apóstolos. No plano inferior aparecem a Virgem, outro santo e os quatro Evangelistas. Como refere Pedro Dias na sua obra, Cristo é representado como o Sumo Pontífice que preside ao concílio, enquanto os padres participantes no concílio ouvem e as suas palavras e os Evangelistas verificam os seus escritos.

Todo o conjunto é verdadeiramente extraordinário no pormenor do simbolismo e merece uma visita atenta, se possível com a companhia de alguém conhecedor.

Esta nossa cidade tem realmente tantos tesouros desconhecidos a descobrir. Amigo leitor, desafio-o a descobri-los por si, porque o conhecimento é cultura e é por ela que verdadeiramente nos desenvolvemos.

Publicado no Diário de Coimbra em 5 de Abril de 2010

segunda-feira, 29 de março de 2010

A CIGARRA E A FORMIGA


As últimas duas semanas têm sido pródigas em espectáculos verdadeiramente indecorosos na União Europeia, que só vêm demonstrar o que aqui tenho repetidamente escrito sobre a liderança da União e a situação perigosa que pode vir surgir a breve prazo.

A situação calamitosa das contas públicas da Grécia é conhecida, e não vale a pena estar a falar muito nisso. Ainda por cima é relativamente pacífico que os seus responsáveis governamentais andaram durante anos a enganar deliberadamente as instâncias financeiras internacionais sobre a verdadeira situação das suas contas públicas.

Vem agora o Governo Grego, nomeadamente através do vice-primeiro ministro Sr. Theodoros Pangalos, acusar a Alemanha de ser responsável pelo estado das finanças gregas e exigir aos alemães que passem o cheque da estabilização financeira grega. Chegou ao ponto de tentar chantagear os alemães pelo sucedido na Segunda Guerra Mundial, o que, convenhamos, não deverá ser a melhor maneira de os convencer, depois de Konrad Adenauer, Willy Brandt, Helmut Schmidt e Helmut Khol, alguns dos chanceleres que antecederam Angela Merkel, terem trazido a Alemanha para o concerto das nações democráticas, ao mesmo tempo que recuperavam a economia alemã de uma forma espectacular no pós guerra.

Curiosamente, esta posição não é novidade. Há poucos dias, um ministro francês veio igualmente de forma deplorável acusar a Alemanha de ser responsável pelos problemas deficitários de boa parte dos países europeus.

Pelo seu lado, o presidente da Comissão Durão Barroso tem vindo a vincar a necessidade de a Alemanha participar fortemente no plano de ajuda à Grécia, no que não tem tido grande sucesso.

E qual a razão apresentada por tantos responsáveis europeus para esta hostilidade em relação à Alemanha actual? É simultaneamente muito simples e muito complexo: a Alemanha está presentemente com um excedente de balança comercial, isto é, exporta mais do que importa. Os parceiros europeus tentam impor ao Governo alemão políticas que promovam o consumo interno e portanto, que gastem mais. Exactamente o contrário do que os alemães, com grande sacrifício, fizeram nestes últimos dez anos, o que levou à recuperação da economia alemã e à situação que hoje vivem as suas finanças públicas. É bom lembrar que a Alemanha se viu obrigada, no início da década, a rever os sistemas de mercado de trabalho e de segurança social, retirando regalias aos trabalhadores alemães. As próprias empresas e sindicatos acordaram reduções de salários. Enquanto no resto do mundo, designadamente em França e em Inglaterra os custos salariais foram crescendo sempre perto de 1%, na Alemanha esses custos reduziram-se em 1,4% ao ano. O resultado foi que a produtividade alemã se afirmou perante os outros países, permitindo que as suas exportações crescessem, sendo ainda hoje o segundo maior exportador mundial, depois da gigante China.

Não é de espantar, pois, a resistência alemã a ajudar os seus parceiros europeus já que estes, como aconteceu com a Grécia, gastavam à tripa forra, enquanto os alemães passavam por sacrifícios e poupavam. Em suma, a velha história da cigarra e da formiga, que todos conhecemos.

É evidente que a Alemanha se encontra integrada na zona Euro e que sendo a sua economia o motor da Europa pela sua competitividade, qualidade e dimensão dificilmente se poderá alhear dos problemas dos parceiros. Mas não é com atitudes tontas e insensatas como as que temos visto nas últimas semanas por parte de responsáveis europeus que lá vamos. É inteiramente compreensível e até justo que os alemães exijam garantias fortes ao resultado da aplicação do seu dinheiro que tanto trabalho lhes deu a ganhar, e isso deve ser tido em conta.

Publicado no Diário de Coimbra em 29 de Março de 2010

segunda-feira, 22 de março de 2010

AS MULHERES VALEM CADA VEZ MENOS


O leitor desculpará o título deliberadamente provocatório desta crónica. Ainda por cima, duas escassas semanas depois da celebração do “dia internacional da Mulher.

Nas nossas sociedades de matriz judaico-cristã, a Mulher tem sido olhada de uma forma que tem evoluído imenso ao longo dos séculos, no sentido de um respeito cada vez maior pela Igualdade, que se acrescenta, e bem, à tradicional veneração à Mulher enquanto tal. Há hoje, entre nós, um sentimento generalizado de que homens e mulheres devem ser respeitados de forma semelhante, tanto na sociedade em geral, como no mundo do trabalho, em particular. Embora ainda persistam injustas diferenças de pagamento diferenciado por trabalho igual entre homens e mulheres em muitos sectores, a necessitar de correcção, a situação é hoje muito mais equilibrada do que há uns anos. Isto reconhecendo que homens e mulheres são diferentes, residindo na sua complementaridade a riqueza da humanidade.

Como escrevi acima, estas considerações referem-se ao nosso mundo e, se os problemas ainda existentes nos parecem graves e complexos, eles serão mínimos se tivermos em consideração o que se passa em outras partes do mundo.

Não me vou referir ao mundo muçulmano com referências às célebres “burkas”, nem às práticas de mutilação genital feminina praticada em algumas partes de África. Não que isso não seja grave e inadmissível, porque o é sob todos os pontos de vista, mas já vai sendo conhecido e motivo de atenção generalizada. Nos últimos dias foi conhecida outra situação de discriminação em relação às mulheres que ultrapassa muito aquelas em gravidade.

O actual crescimento económico em vários países asiáticos, associado a tradições que não se perdem senão em várias gerações está a ter um efeito devastador sobre as mulheres, ainda pouco conhecido e muito menos discutido. O que se trata é de um verdadeiro e infame “generocídio” das mulheres de uma dimensão assustadora.

Em muitos países do oriente, mas mais particularmente na China, houve desde sempre uma valorização maior dos homens do que das mulheres, o que leva a que os bebés do sexo masculino sejam muito mais bem-vindos do que as meninas. A prática de matar meninas recém-nascidas era relativamente frequente e foi mesmo patrocinada pelo Estado, mas, apesar de tudo, não generalizada por motivos óbvios: não há dúvidas para ninguém que um bebé acabado de nascer é uma pessoa real e não um mero “ser humano em potência”.

Ora, hoje em dia a tecnologia permite saber muito cedo se o futuro bebé é do sexo masculino ou do sexo feminino. As ecografias são baratas e, fruto do desenvolvimento económico daqueles áreas, disponíveis para um maior número de pessoas. Por outro lado, mantém-se uma política de filho único. O resultado é que, se o casal só pode ter um filho, prefere que seja rapaz. Para isso, não há qualquer problema em se irem fazendo abortos sucessivos até se conseguir o objectivo de gerar um menino. Se o leitor julga que estou a exagerar e a fazer campanha contra o aborto, desengane-se. Estou antes a defender o fim de uma autêntica mortandade de mulheres, que já se conta em centenas de milhões. Os números não mentem.

No fim dos anos oitenta, a relação entre nascimentos de meninos e meninas na China era de 108 para 100. De acordo com os especialistas esta pequena diferença está pouco acima do que seria de esperar, porque a mortalidade infantil dos rapazes é naturalmente superior à das meninas, por aqueles serem mais frágeis, havendo assim uma compensação natural para esse facto. No princípio da actual década, essa relação era já de 124 para 100, havendo zonas da China em que actualmente atinge os 130 para 100. Se o leitor tem uma ideia da população chinesa, pode facilmente chegar àquele número assustador que justifica a designação de “generocídio”.

E o problema está a alastrar. Esta evolução demográfica destruidora das mulheres já não é exclusivo da China, sendo hoje em dia claramente perceptível em vários países asiáticos como Taiwan e Singapura, mas também começa a chegar perto de nós, a países como a Sérvia e a Bósnia, para além da Índia, da Arménia, do Asserbeijão e da Geórgia, por exemplo.

Trata-se de uma questão até agora escondida, que deveria ser encarada de frente por todos os defensores dos direitos humanos e dos da Mulher em particular.

Publicado no Diário de Coimbra em 22 de Março de 2010

segunda-feira, 15 de março de 2010

SHAME ON YOU

Santana Lopes organizou um Congresso, supostamente para promover a salutar discussão interna no PSD. No fim, percebeu-se que era o ressentimento que o orientava e propôs aquela parvoíce da "Lei da Rolha" que acaba por ser a única marca visível do Congresso. A mim nunca me enganou, mas consegue surpreender sempre...pela negativa. Faço votos que ainda lhe caia em cima.

ONDE PÁRA A EUROPA?


A crise económica portuguesa que, para falar verdade, já não sei bem se é sistémica ou conjuntural, leva-nos frequentemente a esquecer o ambiente externo. Felizmente para todos nós, Portugal está hoje inserido naquilo a que se poderá chamar com propriedade um clube de ricos, que é a União Europeia. Mas como muitos clubes desse tipo, a União Europeia tem tiques de aristocracia falida com alguma incapacidade de acompanhar as mudanças do mundo e mesmo de as compreender.

A União Europeia tem definido objectivos irrealistas acompanhados por belos slogans, dando a entender que é muito sofisticada e ambiciosa, mas falhando de forma sistemática e completa na sua concretização prática. Relembro, a propósito, a “Agenda de Lisboa”, que apontava para que a economia europeia fosse a mais competitiva do mundo em apenas dez anos, através do conhecimento. Os resultados são hoje evidentes: a Agenda falhou, clamorosamente.

A Comissão Europeia, consciente do fracasso, ensaia agora uma fuga para a frente, abandonando a estratégia da Agenda de Lisboa e inventando a Estratégia 2020, baseada nas novas condições de governação da União trazidas pelo Tratado de Lisboa. A Comissão Barroso aposta claramente num governo económico comum que trabalhe a par com o Pacto de Estabilidade e Crescimento, o que não parece muito viável, pela oposição da Alemanha pouco interessada em pagar pelos erros dos outros, como se está a verificar com a Grécia. Mais uma vez a União aponta objectivos ambiciosos que ninguém no seu juízo perfeito poderá achar maus: criar 5,6 milhões de empregos, passar o investimento em I&D de 1,9% para 3% do orçamento, reduzir as emissões de CO2 em 20%, reduzir a pobreza em 20 milhões e aumentar a população com estudos universitários de 31% para 40%. Entretanto, enquanto o dirigismo europeu continua alegremente o seu caminho, o “mundo pula e avança” como disse o poeta. E não espera pela ainda rica Europa. À saída da recente crise, prevê-se que este ano os EUA cresçam uns 3%, a China 10% e a Índia 8,5%. Quanto à Europa, a previsão, se a coisa correr bem serão uns somíticos 1,5%, ainda assim bem melhores do que os portugueses 0,5.

A nova governança da Europa na sequência do Tratado de Lisboa tem-se traduzido por falhanços espectaculares, como foi o caso da recente conferência do clima em Copenhaga. Como é hábito, a União Europeia foi para lá armada com grandes objectivos, tentando impor a sua experiência ao resto do mundo. Como resultado, ficou a falar sozinha, tendo-se estado muito perto do falhanço total das negociações. Face ao eminente fracasso, Obama reuniu com os representantes do Brasil, Índia e África do Sul, para dar a volta à situação. O que saiu daquela sala foi a humilhação da União Europeia, que teve que prescindir de tudo o que pretendia e aceitar o que lhe impuseram.

O relacionamento com a América de Obama anda também pelas ruas da amargura, tendo este já adiado a cimeira que chegou a estar prevista para Espanha em Maio. Hoje em dia, um líder mundial não europeu tem ainda mais dificuldade do que antes do Tratado de Lisboa em saber para quem ligar o telefone em nome da União Europeia, usando a famosa imagem de Kissinger. Tem de facto muita gente à escolha: o Presidente da Comissão Durão Barroso, o Presidente do Conselho Van Rompuy, o Presidente rotativo Zapatero, o Presidente do Parlamento Jerzy Buzec ou a Representante para os Assuntos Externos Catherine Ashton. Isto claro, para não falar em quem efectivamente manda, porque paga boa parte da conta, a chanceler alemã Angela Merkel.

Para o resto do mundo, a imagem é a da capa da revista Time de há poucas semanas: um mapa do mundo de onde desapareceu a Europa. Espera-se que os dirigentes europeus sejam capazes de nos surpreender pela positiva mas, sinceramente, não tenho grandes esperanças em que isso aconteça, olhando para aqueles nomes e para o lento e talvez inexorável caminho de descredibilização e falta de competitividade face ao resto do mundo que se tem verificado.

Publicado no Diário de Coimbra em 15 de Março de 2010

sexta-feira, 12 de março de 2010

Evangelho do Dia



(Mc 12, 28b-34) Naquele tempo, aproximou-se de Jesus um escriba e perguntou-Lhe: «Qual é o primeiro de todos os mandamentos?» Jesus respondeu-lhe: «O primeiro é este: ‘Escuta, Israel: O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor: Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças’. O segundo é este: ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo’. Não há nenhum mandamento maior que estes». Disse-Lhe o escriba: «Muito bem, Mestre! Tens razão quando dizes: Deus é único e não há outro além d’Ele. Amá-l’O com todo o coração, com toda a inteligência e com todas as forças, e amar o próximo como a si mesmo, vale mais do que todos os holocaustos e sacrifícios». Ao ver que o escriba dera uma resposta inteligente, Jesus disse-lhe: «Não estás longe do reino de Deus». E ninguém mais se atrevia a interrogá-l’O.

terça-feira, 9 de março de 2010

Pérolas

Algumas frases do actual presidente brasileiro Lula e da sua candidata Dilma (retiradas da revista Veja, de onde haveria de ser?):

"Se uma mulher é capaz de parir um político, por que também não é capaz de parir uma administração mais competente do que o político que ela conseguiu colocar no mundo?"

Lula, preparando o lançamento da candidatura de dona Lindu a presidente do Céu.


"Esse hospital é uma homenagem à vida. Esse hospital é um avanço. Porque esse hospital mostra que a mulher pode ser atendida com qualidade. É impressionante o que tem dentro do hospital, tanto no sentido de equipamento, né? De garantia que tanto a mulher, como a criança ao nascer vão ser atendidas, mas também a delicadeza que tem dentro do hospital no sentido de garantir que ele seja simples. Porém, você está num lugar humano, num ambiente em que tudo foi feito".

Dilma Rousseff, no comício na Baixada Fluminense, explicando que um hospital tem médicos, atende também a mulheres e crianças e, sempre que possível, tenta evitar que os pacientes morram.


"Ainda vi esses dias o que é a subserviência, quando veio a Hillary Clinton… é engraçado que a imprensa queria saber 'se o senhor vai tratar de tal assunto' com a Hillary Clinton. Não, quem vai tratar é o ministro Celso Amorim. Eu vou recebê-la numa deferência, porque o Celso Amorim pediu para recebê-la, mas a conversa é de ministro para ministro… quando for o Obama, e espero que ele vem ainda esse ano, aí eu converso".

Lula, ao revelar que topou receber Hillary Clinton para atender a um pedido de Celso Amorim



"Eu, se pudesse, na hora que eu viajasse para o exterior, eu fazia um rosário das frutas brasileiras. Eu levaria todas as frutas nordestinas, que ainda são pouco conhecidas, até em São Paulo. Levaria graviola, levaria pinha, tudo pendurado no pescoço, para mostrar lá. Porque as frutinhas deles são bem mixurucas diante das nossas, são mirradinhas. Eles são tão grandões, mas as frutinhas são tão mirradas, têm tão pouco caldo, que… E o Brasil tem um espaço".

Lula, capturado por Thuya durante a entrevista a emissoras de rádio de Juazeiro e remetido ao Sanatório com a seguinte observação da comentarista: "Já ouvi a expressão 'se você quer aparecer, pendure uma melancia no pescoço'. Mas um rosário?"



"Depois, você tem a eólica. A eólica, a Dilma é especialista, porque passou um ano medindo um vento lá em Osório para construir a primeira usina eólica do Brasil, que foi lá em Osório, no Rio Grande do Sul".

Lula, capturado por Thuya durante entrevista a emissoras de rádio da região de Juazeiro e remetido ao Sanatório com as seguintes observações da comentarista: "A Dilma passou um ano medindo um vento? Como é que a anta fez a medição? Deve ter corrido atrás do vento com um fita métrica".



"É verdade que a Rocinha deve ter algum bandido. É verdade que no Pavão-Pavãozinho deve ter algum bandido e no Complexo do Alemão também, mas quem disse que não tem bandido naqueles prédios chiques em Copacabana? Quem disse que não tem bandido em outros lugares desse país?"

Lula, em comício na Rocinha



"Assim como o povo americano elegeu Obama, elegeu um negro, e nós votamos aqui a lei de cotas raciais, é um claro sinal de que o Brasil está preparado para ser governado por uma mulher".

Jorge Picciani, presidente da Assembleia Legislativa do Rio,



"O Sérgio, depois de muitos anos, é o único governador que pensa carioca, age carioca e fala como se fosse carioca, tendo alma de carioca".

Lula, durante discurso na Favela da Rocinha, 



NOTA: Isto é aprendermos a não nos rirmos demasiado do que temos

Música do momento

segunda-feira, 8 de março de 2010

A TERRA É DO HOMEM?


Mais um grande sismo com consequências trágicas veio perturbar a convivência do Homem com o planeta que habitamos, a Terra.

A relação da humanidade com a natureza tem variado muito ao longo dos séculos. A evolução do conhecimento científico, principalmente nos últimos cem anos, tem vindo a recolocar o Homem no Ambiente que o rodeia, trazendo humildade para o lugar da arrogância criada pelo iluminismo e pelo racionalismo.

Mas a Humanidade continua a considerar a Terra como sua propriedade e como se estivesse aqui para seu usufruto completo e para sempre.

Os próprios conceitos de Ecologia e de desenvolvimento sustentável têm ainda, muito frequentemente, o Homem como medida de todas as coisas e na prática, ainda considerado como centro do Universo, quando o que está em causa é todo o Ambiente em que o Homem se deveria inserir em harmonia com tudo o que o rodeia E não se conclua que esta visão é contra o progresso da humanidade, longe disso.

Ainda assim, para além dos estragos que o Homem provoca na Natureza, o pior é esquecermo-nos do nosso papel minúsculo no Espaço em que a Terra evolui e no Tempo de que a existência da Humanidade é um período de quase nada, mesmo tendo em consideração apenas a Terra.

A ciência do século XX veio esclarecer muito do que se passa na Terra e que provoca os sismos. Aos nossos olhos, os continentes e oceanos parecem bem delimitados e que sempre ali estiveram e para sempre estarão. Nada de mais errado. Já há vários séculos que alguns mais atentos observaram semelhanças geométricas entre as costas de África e da Europa com as costas das Américas, o que levantava a hipótese de algures no passado ter havido um continente que se teria rompido, tendo-se as partes resultantes afastado e o espaço no meio sido ocupado pelo oceano. Era a teoria da deriva dos continentes, que levou à consideração de primeiro continente único, a Pangea.

Só no século XX a instrumentação científica desenvolvida veio permitir conhecer melhor a constituição física e química da crosta terrestre e a evolução da litosfera terrestre, tendo-se desenvolvido a teoria da tectónica de placas. Através desta teoria, considera-se hoje que as placas terrestres que constituem a litosfera como que flutuam sobre o manto, mais profundo e viscoso. Nas zonas de contacto entre estas placas tectónicas em movimento criam-se tensões gigantescas que de vez em quando têm que ser libertadas, originando os tremores de terra. Trata-se de fenómenos a uma escala que o Homem não domina, e dificilmente virá a prever com exactidão quando e onde acontecerão.

Não vale a pena culpar Deus por estes acontecimentos. Eles já se verificavam antes de existir a Humanidade e continuarão certamente a verificar-se após o seu desaparecimento. Deus tem mais que fazer a ajudar-nos por dentro a todos e cada um de nós, do que provocar catástrofes naturais.

No estado actual da ciência, sabe-se no entanto com exactidão quais são as zonas de contacto entre as placas tectónicas e portanto, quais os locais de maior probabilidade de ocorrência de sismos de grande envergadura.

O que podemos fazer é evitar ocupar os locais mais perigosos e adoptar medidas de prevenção adequadas a cada zona. O Chile está precisamente numa dessas zonas mais perigosas, o conhecido anel do Pacífico.

A nossa capital, Lisboa, está também localizada numa zona de alguma perigosidade, como aliás o mostrou o terramoto de 1755, um dos mais mortíferos de que há conhecimento. Segundo a lei das probabilidades, mais cedo ou mais tarde irá verificar-se um novo grande terramoto no nosso país, pelo que não é ser catastrofista ter essa hipótese em atenção. E a nossa proverbial falta de planeamento e de cultura de prevenção aliadas a uma atitude de deixar andar e ligar apenas ao dia-a-dia não será certamente a melhor ferramenta para prevenir as suas consequências.

Publicado no Diário de Coimbra em 8 de Março de 2010

segunda-feira, 1 de março de 2010

SERIEDADE E RESPEITO NA POLÍTICA, PRECISA-SE


Como penso que acontecerá com a esmagadora maioria dos militantes do PSD, também eu observo com atenção o que se diz e escreve pelo lado das diversas candidaturas. A independência pessoal sem enfeudamentos que sempre defendi é crucial para permitir fazer as escolhas nas alturas em têm que ser feitas que, em minha opinião, dependem dos próprios candidatos que se apresentam a votos e das suas propostas, bem como das circunstâncias das candidaturas e das pessoas que os acompanham.

Entendo as campanhas eleitorais pela positiva, o que se aplica igualmente ao interior dos partidos. Claro que, com a minha idade, já não sou ingénuo ao ponto de me convencer que as campanhas não têm sempre um lado escondido, ou mesmo negro. Não esqueço o célebre comentário de Churchill, esse grande político e fazedor de frases geniais que um dia, em pleno Parlamento Britânico, elucidou um sobrinho de que os seus inimigos estavam na sua própria bancada, já que do outro lado estavam adversários.

Ainda a campanha interna do PSD não começou formalmente e já se vê ser utilizada a mais desgastada das armas políticas que existe em Portugal que é a de acusar um candidato que não se apoia de direitista, juntando-se-lhe ainda o epíteto de populista. Não fica bem, dentro de um partido como o PSD fazer isto, acho eu.

Quando vejo situações destas lembro-me sempre de Francisco Sá Carneiro e da sua luta para tirar o país da deriva esquerdista onde o PREC o colocou para nossa desgraça colectiva. Desde os congressos em que sucessivas “alas à esquerda” o iam tentando atirar pela borda fora até aos célebres “Inadiáveis” que lhe tiraram quase metade do grupo parlamentar antes da formação da Aliança Democrática, essa perigosa aliança que iria fazer o país “voltar ao fascismo”.

Lembro-me ainda da tentativa gorada de criação da Alternativa Democrática por parte de Marcelo Rebelo de Sousa, violentamente combatida no interior do partido como cedência a uma direita dura de Paulo Portas, exactamente pelos mesmos que logo a seguir às eleições se foram aconchegar nos braços do PP.

Seria muito melhor que se discutissem as ideias e as propostas concretas dos outros companheiros que se apresentam a votos, sem chavões que apelem a instintos primários nem falsos papões.

A conjugação das velhas teses de que as eleições se ganham ao centro e de que basicamente as eleições se perdem mais por quem está desgastado no poder do que se ganham pela afirmação de alternativas claras, tem conduzido a um pântano político e ideológico de que o beneficiário será sempre o Partido Socialista, desde que se distancie o suficiente da esquerda clássica em termos de políticas económicas.

Historicamente, o PSD foi forte e teve sucessos eleitorais quando se assumiu como personalista e reformista, sem medo e complexos de assumir as expectativas de um eleitorado que vê na Liberdade um bem maior do que a Igualdade.

Vir neste ano de 2010 classificar militantes do seu partido como de direita, verdadeiros social-democratas ou liberais será, no mínimo desajustado e menos respeitador para com os companheiros e, no limite, uma atitude que releva de alguma arrogância, já que o cargo de classificador ideológico não consta de nenhum regulamento ou estatuto.

O estado do nosso país é suficientemente grave para que se deva evitar que a discussão interna no PSD resvale para níveis impróprios, sob pena de o partido se tornar definitivamente irrelevante para o país. Faço notar, com veemência, que todo o país está de olhos postos nesta eleição, pelo que as responsabilidades dos contendores são gigantescas.

Caros companheiros de partido peço-vos, por favor, e dirijo-me principalmente aos mais responsáveis porque mais formação intelectual e académica possuem, que evitem manipulações fáceis e gratuitas que criam divisões artificiais. Não se esqueçam de pensar no dia seguinte às eleições, isto é, na responsabilidade que terão perante o país que vos olhará com a expectativa e esperança de poder haver finalmente uma alternativa política clara e assumida para a governação do país.

Publicado no Diário de Coimbra em 1 de Março de 2010