Logo após o sucesso da obtenção de acordo para o “Tratado Reformador” da União Europeia, a chanceler alemã Angela Merkel resolveu brindar o nosso Primeiro-ministro e Presidente em exercício da União com um sonoro e expressivo “obrigado José”.
Como os alemães não costumam ser muito dados a reacções efusivas e não são propriamente conhecidos por brincarem a feijões nestas coisas da política da União, o entusiasmo com que aquele agradecimento foi feito despertou-me curiosidade sobre as suas razões.
Desde logo, a chanceler alemã ficou naturalmente satisfeita, porque as negociações difíceis sobre o Tratado que dirigiu durante a presidência alemã, foram levadas a bom porto pela presidência portuguesa.
Por outro lado, parece agora possível ultrapassar os problemas de gestão da União decorrentes dos sucessivos alargamentos e dos chumbos dos referendos à anterior Constituição em França e na Holanda em 2005, o que naturalmente será bom para toda a União e não para nenhum membro em particular.
Do texto da anterior “Constituição” foram deixados cair o hino, a bandeira e o ministro dos negócios estrangeiros da União, que continuará ser o “Alto Representante da União para os Assuntos Externos e Política de Segurança”. Também a livre concorrência deixou de ser um objectivo da União, para passar a ser apenas um instrumento. Como se vê, as diferenças são meramente de pormenor e até de designação, mas enfim, já não há formalmente Constituição Europeia, o que dá jeito para evitar referendos.
Manteve-se o reforço do Conselho de Ministros diminuindo os poderes da Comissão, o que evidentemente é muito bom para os países grandes, com a Alemanha à cabeça.
Foi ainda criado o cargo de Presidente fixo do Conselho Europeu, acabando a partir de 2009 as presidências rotativas de seis em seis meses, que simbolizavam a igualdade entre os países membros.
Foi adoptado o sistema de decisão por dupla maioria com aplicação a partir de 2014, pelo qual o Conselho de Ministros decidirá quando tiver uma maioria de 55% dos Estados, com 65% da população, facilitando a formação de maiorias entre os países grandes, deixando os pequenos com menos influência.
Com o novo sistema, a representação de Portugal, que pelo método anterior era de 3, 47%, passa a ser de 2,14%. Curiosamente, o peso da Alemanha passa dos actuais 8,4% para 16,7%.
Isto é, verifica-se facilmente que o novo Tratado beneficia os países maiores da União, em particular a Alemanha, pelo que se compreende agora bem o entusiasmo do agradecimento de Angela Merkel.
Já Portugal fica muito satisfeito porque o acordo final foi alcançado durante a presidência portuguesa, o que levará a que a sua assinatura seja feita em Lisboa, ficando naturalmente a ser conhecido por “Tratado de Lisboa”.
Enfim, nestas negociações difíceis cada um ficou com o que conseguiu e, curiosamente, todos os líderes europeus regressaram a casa a reclamar vitória.
Publicado no DC em 29 Outubro 2007
1 comentário:
bom texto !
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